terça-feira, outubro 13, 2009

Pode-se dizer que há sinais de espuma no mercado

Rodrigo Constantino, Jornal Valor Econômico
13/10/2009

Desde o seu fundo do poço atingido em 2008, o Índice Bovespa praticamente já dobrou de valor. Se calculado em dólares, a alta é ainda mais expressiva, pois a moeda nacional vem se valorizando bastante em relação ao dólar. O retorno em peso dos investidores estrangeiros explica boa parte dessa recuperação. Até o presente momento, a previsão do presidente Lula de que a crise chegaria apenas como uma "marolinha" ao país tem se mantido. A questão que surge é: até quando?

De fato, a fotografia econômica do Brasil não é das piores. Vários indicadores macroeconômicos melhoraram e o país se saiu relativamente bem na crise atual. Os problemas surgem quando passamos para uma análise mais dinâmica. O superávit fiscal praticamente desapareceu com os estímulos anticíclicos do governo, que não tiveram caráter temporário.

Os aumentos nos gastos, como na folha de pagamento dos funcionários públicos, têm caráter permanente. Os programas como o "Minha casa, Minha vida" colaboram para o crescimento econômico no curto prazo, mas levantam dúvidas quanto à sua sustentabilidade. A expansão no crédito, feita basicamente por bancos estatais, acende o alerta da inflação. São vários aspectos ignorados durante o boom, mas que podem servir como justificativa para a venda caso o clima fique menos otimista por algum motivo qualquer.

Há inegavelmente alguns sinais de "espuma" no mercado financeiro nacional. O otimismo em relação ao futuro econômico do país contagiou investidores do mundo todo. O Brasil parece ser a bola da vez. A agência de risco Moody's finalmente concedeu o esperado grau de investimento ao país. O bilionário investidor de imóveis, Sam Zell, anunciou seu compromisso de aumentar investimentos no país, alegando que o Brasil é o numero um entre os países para se apostar no momento. E, talvez o principal indicador de otimismo excessivo, foi o Santander, que realizou emissão de capital para ocorrer justamente no mercado brasileiro, aderindo a uma nova onda de emissões. Trata-se da maior emissão já feita no mercado de capitais brasileiro.

O banco espanhol levantou mais de R$ 14 bilhões no país para financiar seu crescimento mundo afora. Antigamente, o oposto sempre foi verdade, ou seja, empresas multinacionais emitiam capital em países desenvolvidos, com custo de capitação menor, para financiar investimentos em países emergentes como o Brasil. Os atuais acionistas do banco confessam com isso considerar o preço de seus ativos no Brasil interessante para a venda. Se eles achassem que o valor está baixo, provavelmente não estariam vendendo, mas comprando suas ações. A nova onda de emissões demonstra que muitos acionistas controladores encaram os preços atuais dos seus ativos como bem valorizados. E os acionistas controladores costumam conhecer melhor suas próprias empresas que o investidor leigo.

A verdade é que uma nova bolha de ativos pode estar se formando. Governos do mundo todo expandiram de forma preocupante seus gastos, boa parte financiada com a emissão de moeda. Os bancos centrais reduziram as taxas de juros no mundo todo, chegando à praticamente zero em vários países.

Essa liquidez, sem utilização imediata na economia real, é atraída para os ativos financeiros, causando uma forma diferente de inflação: a dos preços desses ativos. O dinheiro começa a arder parado nas mãos. Deixar recursos entesourados nos títulos públicos americanos não gera retorno algum e ainda carrega o risco da desvalorização do dólar. O ouro, que não rende dividendos, atingiu o patamar de mil dólares a onça, demonstrando o desespero dos investidores em busca de alguma proteção de capital. A falta de "yield" na renda fixa faz com que os especuladores busquem ativos mais arriscados e ilíquidos. Com a injeção maciça de liquidez nos mercados desenvolvidos, o oceano acaba transbordando para as piscinas menores, levando a uma forte valorização nesses mercados emergentes.

Além disso, não há nada pior que ver todos os vizinhos ganhando rios de dinheiro enquanto seus recursos rendem cada vez menos nos títulos de renda fixa. A psicologia das massas se encarrega de incentivar cada vez mais apostas nas bolsas. Afinal, errar em conjunto não fere tanto a reputação individual. Se todos estão aproveitando a alta das ações, por que justo eu vou ficar de fora da festa? Eis a mentalidade que ajuda a construir bolhas. Se já estamos diante de uma, não é possível dizer. Mas que há claros sinais de espuma, isso é fato.

Rodrigo Constantino é economista e gestor de recursos

3 comentários:

  1. Anônimo12:02 PM

    Engraçado, quando o dono deste blog escreve um artigo falando bem da economia do país e imaginando possíveis melhorias para o futuro *coisa rara de acontecer) nenhum daqueles "intelectuais" conhecedores de diversas teorias econômicas, que costumeiramente postam comentários por aqui, aparecem para defender essa idéia e concordar com o autor.
    Ou esse pessoal tem um ódio mortal do PT (e do Lula) ou gostam de falar apenas de desgraça e fazer as mais impressionantes críticas a tudo e a todos.

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  2. É, Antonio. Acontece que a teoria econômica clássica tem dado com os burros n'água a cada dia. E imbecís, ignorantes, estão acertando em políticas sociais (que deveriam ser o objetivo das políticas econômicas). Quando os econmistas descobrem que as políticas sociais são as melhores alternativas econômicas, desparecem.

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  3. Caro Constantino,

    Mas afinal qual é o tamanho e o papel do Estado?

    Para dimensioná-lo devemos primeiro entender o princípio da subsidiariedade.

    A adoção do princípio da subsidiariedade implicaria limitar ao máximo as transferências orçamentárias entre o governo federal, os estados e os municípios. A exceção ficaria por conta das transferências do governo federal necessárias para equalizar as possibilidades das instâncias menores de governo nas áreas de educação e saúde. Não seriam feitas transferências para financiar projetos de políticos locais. As transferências do governo federal ficariam limitadas a programas que potencialmente pudessem beneficiar qualquer cidadão, impedindo o governo federal de transferir renda para grupos de interesse específicos. Acabariam os subsídios e as renúncias fiscais que beneficiam setores que não precisam delas e retiram recursos das áreas essenciais. Por exemplo, as renúncias fiscais de IPI e de imposto de importação representam hoje mais de R$10 bilhões. Só o fim dessas renúncias teria representado cerca de um terço do programa de ajuste fiscal, que foi todo realizado em cima do aumento de impostos.



    É preciso que o orçamento se transforme em um instrumento de gestão. O que o governo chama de orçamento da União em nada se parece com o significado tradicional do termo, que normalmente espelha a quantidade de recursos necessários para se realizar determinados projetos. O total de recursos é determinado pela quantidade de recursos humanos e físicos necessários multiplicados pelos seus preços. É assim que uma empresa ou instituição privada faz o seu orçamento, e não há nenhuma razão para que o processo seja diferente na administração pública.



    É fundamental que o orçamento deixe de ser a repetição dos gastos realizados no ano anterior. Programas e despesas que perderam a razão de ser devem ser eliminados. Para atingir esse objetivo, o governo deveria adotar o orçamento base zero no plano plurianual.



    O conceito do orçamento base zero é fazer com que o administrador, no caso as instituições públicas, planejem seus gastos justificando suas atividades de baixo para cima, como se elas estivessem se iniciando.

    Mas afinal qual é o tamanho e o papel do Estado?

    Abraços,

    Gerhard Erich Boehme
    gerhard@boehme.com.br
    (41) 8877-6354
    Skype: gerhardboehme
    Caixa Postal 15019
    80811-970 Curitiba PR

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