Cabo de guerra entre inflação e deflação. Quem leva a melhor?
Rodrigo Constantino
Existe um cabo de guerra entre forças deflacionárias e inflacionárias nos mercados hoje. De um lado, o estouro da bolha de crédito pressiona os ativos para baixo. Do outro, as políticas monetária e fiscal dos governos estimulam os preços dos ativos. Quem vai vencer esta batalha? Como ganhar dinheiro neste cenário tão incerto? São estas questões que Anthony Boeckh tenta responder no livro "The Great Reflation".
Quando tanto dinheiro sem lastro é criado pelos bancos centrais, algum destino precisa ser encontrado para ele. Um dos resultados desta política costuma ser o aumento da volatilidade e instabilidade na economia e nos mercados financeiros. Esta seria a primeira conclusão do autor.
Nos últimos 15 anos, durante a fase da formação da bolha, falou-se muito na grande moderação, com a crença de que os bancos centrais tinham domado a inflação, a despeito do acelerado crescimento mundial. O estouro da bolha mostrou que isso não passou de uma ilusão, alimentada pelo fator China. Boeckh acredita que, daqui para frente, o esforço das autoridades monetárias para inflar os ativos será estupendo, como já está sendo. Repiques econômicos temporários serão inevitáveis com tanto estímulo, mas isso fará apenas com que a inflação de crédito fique maior, aumentando a fragilidade do sistema.
Entretanto, Boeckh acredita que a inflação dos ativos não vai durar tanto quanto nos últimos ciclos, pois o nível de endividamento privado chegou possivelmente ao seu limite, e o mesmo deve ocorrer no setor público em breve. Os balanços dos principais governos desenvolvidos estão sendo testados no limite. O resultado deverá ser um déficit fiscal cada vez maior para os governos, e um crescimento econômico menor. Se a crise recente foi causada em parte pelo excesso de dinheiro e crédito, mais dinheiro e crédito deverão causar crises ainda maiores à frente.
Para se proteger dos riscos e da volatilidade, manter o dinheiro parado pode não ser a solução. Afinal, os impostos crescentes e a inflação poderão corroer o ganho nominal. Para ganhar bons retornos reais, o investidor terá de correr mais risco. O problema é que, no cenário atual, o patamar de risco será maior do que o nível de conforto da maioria das pessoas. E a estratégia de simplesmente comprar e carregar ativos poderá ser um fracasso maior do que já foi nos últimos dez anos. Quem comprou ações das empresas americanas há uma década, ainda se encontra debaixo d'água. Será preciso uma atitude mais ativa dos investidores.
Quando os bancos centrais podem criar dinheiro do nada, sem lastro em ouro, a tentação de fazê-lo é grande, especialmente durante crises. Os políticos, olhando só as próximas eleições, desejam estimular a economia artificialmente, jogando a conta para frente. Juntando tudo isso, a tendência natural das economias sob o sistema fiduciário é inflacionária. O problema é que a festa não pode durar para sempre, pois o endividamento fica insustentável. Inflação demais acaba em deflação, quando a bolha estoura. A alternativa é a completa destruição da moeda, como ocorreu no Zimbábue recentemente.
Como dificilmente os bancos centrais dos países mais avançados agiriam de forma tão irresponsável, parece razoável supor que, em algum momento, a maciça injeção de liquidez será revertida. Na hora do enxugamento, as taxas de juros são pressionadas para cima e o preço dos ativos e a atividade econômica, para baixo. A prosperidade será ilusória, e os investidores deverão tomar cuidado para não embarcar novamente na euforia irracional. Confundir a recuperação artificial com um novo "bull market" sustentável poderá ser fatal para o retorno do portfólio.
Acertar o "timing" dessas oscilações mais bruscas e curtas será o "x" da questão para o desempenho do patrimônio. Entretanto, se trata de uma tarefa praticamente impossível na prática. Os cenários para a economia mundial são incertos demais, podendo tanto seguir na direção de uma era do gelo no estilo japonês, como no caminho de uma inflação fora de controle. Dizem que a diversificação é um hedge para a ignorância. O problema é que todo mundo está perdido quanto aos possíveis resultados deste cabo de guerra, com medidas sem precedentes por parte dos governos.
Cautela deve ser o nome do jogo agora. Não parece adequado apostar todas as fichas num cavalo. A única previsão mais concreta é que tempos de elevada volatilidade virão. Melhor se preparar.
Rodrigo Constantino é economista e gestor de recursos
Rodrigo Constantino,me diga aí:
ResponderExcluirUm cenário de deflação nos EUA não tornaria a dívida americana impagável de fato?
Como os investidores correriam para os treasuries,se o calote num cenário de deflação americana deixar de ser apenas uma hipótese remota para se tornar algo bastante crível?