Rodrigo Constantino, O GLOBO
Cristina Kirchner foi reeleita logo no primeiro turno. A “família K” ocupará a Casa Rosada pelo terceiro mandato seguido. A economia argentina apresenta sinais de recuperação, mas seus pilares são insustentáveis. A inflação real passa de 20% ao ano, enquanto o governo manipula os dados oficiais. A fuga de capitais é crescente. Os investimentos privados recuam de forma acentuada.
A triste história do país vizinho serve como importante alerta aos brasileiros. Afinal, a Argentina já foi um ícone para a região no passado. O período entre 1860 e 1930 compreendeu seus anos dourados. Milhões de imigrantes foram para o país, e Buenos Aires transformou-se em uma grande metrópole, capital cultural da América hispânica. A Argentina era o celeiro do mundo. O valor total das exportações multiplicou-se mais de 13 vezes entre 1865 e 1914. Os investimentos britânicos foram especialmente importantes. O padrão de vida do argentino estava entre os melhores do mundo.
Mas nem tudo que reluz é ouro. Como na obra de Kafka, a Argentina foi dormir bem, e acordou um inseto feioso. A burocracia estatal no país crescia rapidamente. O surgimento de uma retórica nacionalista exigia a intervenção política contra a competição de produtos importados. A Primeira Guerra Mundial, e a Crise de 1929 depois, geraram enormes dificuldades para o país, dependente da exportação de seus recursos naturais. Foram introduzidas tarifas protecionistas, sucessivamente elevadas.
O controle da máquina política tornou-se o elemento-chave para o sucesso nos negócios, incitando a formação de grupos de interesse, suplantando os mecanismos da livre concorrência. Após o golpe de 1943, o intervencionismo estatal rapidamente se expandiu, chegando ao ápice durante a presidência do populista Perón, de 1946 a 1955. Inspirado em Mussolini, Perón buscou o apoio das bases sindicais, e criou inúmeras barreiras protecionistas.
O militar baixou grande número de decretos conferindo vastos benefícios artificiais aos trabalhadores. Como ocorre em ditaduras, houve forte culto à personalidade. Foi posta em marcha uma “peronização” do Estado argentino, com opositores sendo perseguidos. Uma nova Constituição foi adotada em 1949, e a doutrina do “justicialismo”, derivado de “justiça social”, tornou-se o fundamento ideológico da nação. As despesas públicas explodiram, concomitantemente à inflação. Estas e outras medidas demagógicas de Perón e sua esposa Eva lastrearam o declínio espetacular da Argentina, que nunca mais seria a mesma.
Isto ocorreu, convém lembrar, em um país com ampla classe média, instituições relativamente sólidas e povo educado. Nada disso foi suficiente para impedir o avanço populista no país. A própria “família K”, agora sob o comando da viúva, vem dando continuidade a esta prática nefasta, perseguindo com virulência e abuso da máquina estatal o principal grupo de imprensa do país. Quando o termômetro mostrou a doença econômica, pelo aumento da inflação, o governo resolveu quebrar o termômetro. O modelo argentino aproxima-se rapidamente do venezuelano.
Este tango argentino (está mais para ópera bufa) tem importantes lições a nos oferecer. Muitos brasileiros insistem que a solução para nossos males está na educação, mas poucos se aprofundam a ponto de questionar qual educação. Jogar dinheiro público no setor não é panacéia. Além disso, educação pode ser condição necessária para o progresso, mas está longe de ser suficiente, como prova a Argentina. Sem um modelo de livre mercado, será mais lucrativo investir no suborno de políticos do que na competitividade. Vencem os amigos do rei – ou da rainha.
Outra importante lição diz respeito à oposição. O “peronismo” tomou conta da política argentina, e faltaram alternativas sérias aos eleitores, algum partido com um projeto decente para o país. Basta notar que Cristina Kirchner venceu contra um candidato socialista! A hegemonia esquerdista é total no país. Não há uma oposição firme, e a negligência de hoje é sempre paga com a escravidão de amanhã. Os populistas tiveram o caminho livre para seu projeto de poder por lá.
Não é preciso dizer que o lulopetismo vem tentando seguir a mesma trilha no Brasil. Vários ingredientes estão presentes: culto à personalidade; populismo desmedido; tentativa de perseguir a imprensa; modelo desenvolvimentista; protecionismo comercial; inflação crescente; oposição fraca; e corrupção como meio aceitável para o único fim existente: perpetuar-se no poder. Vamos conseguir evitar o destino trágico dos nossos vizinhos?
Muito bom texto Rodrigo. Hum...e o que mais me assusta é esta "oposição" fraca (se é que existe oposição). Sei não viu, mas a coisa está muito estranha.
ResponderExcluirRodrigo, o Olavão falou de tu de novo, no último true outspeak
ResponderExcluirMas nem foi esculhambando, foi mais falando que tu era mais pra um publicitário do que um filósofo
Ele tem as frescuras de astrologia mas fala umas verdades: 'a burguesia não é a classe dominante coisa nenhuma, ela só quer puxar o saco de qualquer porcaria que tenha o poder político-militar'
A burguesia vende a mãe pra ficar rica.
ResponderExcluirO que a gente enfrenta é o avanço desenfreado do comunismo na América Latina.
O Serra não poderia ter sido candidato do PSDB. A queda do PSDB representa o fim do último resquício de direita no Brasil.
O próprio Serra não era oposição em 2010. É o início do fim.