Carlos Alberto Sardenberg, O GLOBO
Capitalismo de amigos não é novidade, portanto. Mas temos outro tipo hoje, o do medo. Dia desses, o executivo de uma grande empresa brasileira, embora enraivecido com confusões feitas pelo Ministério da Fazenda com alíquotas de impostos, explicava por que não pretendia reclamar, muito menos brigar: os caras vão ficar muitos anos por aí.
Os caras são os do PT, claro. É verdade que o governo federal tem caras de muitos partidos, mas não há dúvida sobre quem manda. Precisa de mais uma prova?
Aqui, em dados divulgados nesta semana pela Justiça Eleitoral: no ano passado, sem eleições, o PT arrecadou nada menos que R$ 50,7 milhões com doações de empresas. Isso é 21 vezes superior à arrecadação do PSDB, o principal partido da oposição e que ainda pode ter alguma competitividade em eleições presidenciais. E mais: o PSDB detém governos em estados tão economicamente poderosos como São Paulo e Minas.
Conclusão: o federal vale 20 vezes mais que o estadual.
Normal, dizem. Algo assim: queriam o quê? Que os empresários dessem dinheiro para a oposição, abertamente, registrado na Justiça Eleitoral?
Por que não? Nos EUA, por exemplo, Obama, quando candidato da oposição, em 2008, arrecadou mais que seu adversário governista. Neste momento da campanha americana, Obama, agora presidente, ainda arrecada mais, mas o republicano Romney chega bem perto.
E não é só por aí que acontecem coisas anormais no Brasil. O governo federal e suas estatais contratam serviços de empresas, compram produtos e ainda emprestam dinheiro a juros favorecidos, sem contar a função tradicional do Estado de arrecadar impostos, aqui travestida do poder de escolher quem vai pagar mais ou menos.
Ter boas conexões com Brasília pode ser mais eficiente para uma empresa do que buscar competitividade no mercado. Entre os principais doadores do PT, estão companhias amplamente beneficiadas por contratos, regimes tributários especiais e empréstimos do governo.
Por outro lado, uma canetada da Fazenda, mudando impostos, pode eliminar ganhos de produtividade obtidos com investimentos em tecnologia e métodos.
Ou seja, é conveniente ser amigo dos caras. Se não der, convém ao menos não ser visto como adversário.
Reparem: não se trata de uma negociata do tipo "ou passa lá no balcão do PT (ou do PMDB ou do PP) ou não leva nada". Ninguém pode dizer que acontece assim no BNDES, no Banco do Brasil, nas compras da Petrobras ou nos gabinetes da Fazenda, para citar apenas os locais de decisões governamentais mais importantes.
Também não se pode dizer que a forte participação da administração federal e suas estatais seja uma novidade. O que é diferente é a mão pesada e o ativismo dos governos do PT. Isso vem especialmente desde o segundo mandato e está em franca escalada.
O governo Dilma intervém em todos os setores. Muda constantemente alíquotas de impostos, para diminuir e aumentar, altera regras do comércio externo, age sobre a taxa de câmbio e empresta mais dinheiro a juros favorecidos a grupos favorecidos. É um modelo oficial: o Estado manda, escolhe e indica onde as empresas devem trabalhar. A presidente dá lições a todos.
Cria-se uma teia de interesses, mas não de todos. São claramente favorecidos alguns setores, considerados pelo governo como os mais importantes para o país.
Daí os vícios. Primeiro, as escolhas de Brasília podem estar erradas, e frequentemente estão, como prova a História do Brasil recente, dos anos 70, no governo Geisel.
Segundo, o modelo distorce o comportamento dos agentes econômicos, que ficam entre o temor e a bajulação ao governo. Repararam na propaganda dos grandes bancos privados depois que levaram a bronca da presidente Dilma? Agradar o governo, fazer favores a seus membros, torna-se comportamento quase de sobrevivência.
Terceiro, mais importante, o modelo gera corrupção. Reparem: se a maior doadora para o PT é uma companhia amplamente favorecida pelo governo (a JBS), ainda que seja tudo legal, por que o diretor do terceiro escalão de um ministério não pode pedir dinheiro para seus projetos políticos e negócios pessoais?
Não é verdade que sempre foi assim no Brasil e que é assim pelo mundo afora. Acontece em muitos países, certo, mas não podem ser o exemplo que queremos. Nas democracias, o governo é submetido a regras que limitam o poder do governante de plantão - e, inversamente, garantem a liberdade e a autonomia dos cidadãos, em qualquer atividade, além da igualdade de oportunidades.
Lembro-me de uma matéria na Exame em que perguntam a uma multinacional qual é o segredo para ter sucesso aqui no Brasil. E um dos itens da resposta é claro: Boas relações com o governo.
ResponderExcluirQueriam o quê? Os empresários foram correndo louvando o lula quando esse assumiu. Não leram nada do que aconteceu no mundo nos últimos 60 anos. Agora vem a conta e só vai sobreviver quem lamber bem o saco do PT!
ResponderExcluirRodrigo,
ResponderExcluirfico me perguntando sobre como será nossa democracia, sobre sua viabilidade após estes governos do PT. Os partidos de oposição são hoje uns pobres - em vários outros sentidos - perto da dinheirama que o PT e seus membros arrecadaram nesses últimos anos.
Abraço.
Flavio Santos - Rio/RJ
ps. e aí, você já falou sobre as baixas forçadas nos juros do empréstimo, mas procurei aqui nos "older posts" e não vi nada sobre esse "pequeno" empréstimo do BB para o desGoverno do Rio. Que achou da operação em si? O banco fez isso por decisão da direção como bom negócio para instituição e seus acionistas? Voltamos aos velhos tempos dos "empréstimos" dos bancos estaduais aos Estados?