terça-feira, agosto 21, 2012

Caixa de Pandora


Rodrigo Constantino, O GLOBO
Agora que os principais bancos divulgaram seus balanços do primeiro semestre de 2012, podemos fazer uma análise melhor dos rumos do setor. O que vemos em relação à expansão creditícia, especialmente nos bancos estatais, é inquietante. Não é trivial dizer se há ou não uma bolha de crédito no Brasil. Mas, se o governo seguir na tendência atual, isso claramente será um risco concreto.
A Caixa Econômica Federal expandiu em 45% sua carteira de crédito em apenas 12 meses. Trata-se de um crescimento espantoso, boa parte voltada para o programa "Minha Casa, Minha Vida". O Banco do Brasil, por sua vez, aumentou em 20% a carteira no mesmo período. Juntos, esses dois bancos possuem uma carteira acima de R$ 750 bilhões!
Os bancos privados seguem em mão contrária, reduzindo o ritmo de crescimento. Itaú Unibanco e Bradesco expandiram, na média, em apenas 12% a carteira de crédito nos últimos 12 meses. A inadimplência em alta acendeu o sinal de alerta, e os banqueiros decidiram pisar no freio, apesar da pressão do governo.
O grau de alavancagem dos bancos públicos é bem maior. O Banco do Brasil e a Caixa possuem, somados, mais de R$ 1,6 trilhão em ativos, para míseros R$ 83 bilhões de patrimônio líquido. Ou seja, uma alavancagem de quase 20 vezes! Por outro lado, os três maiores bancos privados possuem, juntos, alavancagem de 10,5 vezes.
Em outras palavras, os bancos públicos apresentam o dobro de risco. A Caixa é o mais agressivo de todos, com quase R$ 600 bilhões em ativos para singelos R$ 21,4 bilhões de patrimônio. Uma alavancagem assustadora de quase 28 vezes! Para explicar de outra forma, basta uma perda de 4% nos ativos para reduzir todo o patrimônio da Caixa a pó.
Ciente do enorme risco, o governo já fala em injetar mais capital no banco. Isso significa, em linguagem clara, que os "contribuintes" serão chamados para pagar pela farra de crédito dos mais endividados. A prudência é punida, enquanto o comportamento de cigarra irresponsável é premiado. O show precisa continuar.
Quando observamos esses dados, a incômoda pergunta feita séculos atrás pelo poeta romano Juvenal vem à tona: Quis custodiet ipsos custodes? Traduzindo: quem vigia os vigias? Se o próprio governo deve cuidar da saúde do sistema financeiro, como garantir que ele não será o grande responsável pela criação de bolhas com foco no curto prazo?
Muitos culpam a desregulamentação pela crise americana recente. Ignoram que o epicentro da crise estava justamente em um setor bastante regulamentado: o de hipotecas. Dois gigantes do setor, empresas semiestatais, bancaram verdadeira orgia de crédito imobiliário, principalmente para as classes mais baixas, com os famosos "subprimes".
Tanto a Fannie Mae como a Freddie Mac sofreram intensa pressão de Washington para expandir a carteira de crédito voltada para os mais pobres. É muito popular o governante que ajuda no sonho da casa própria, independentemente da capacidade futura de pagamento.
Essas empresas, atreladas até a alma ao governo, contavam com um órgão regulador exclusivo, cuja única missão era assegurar sua saúde financeira. Isso não impediu que seu grau de alavancagem chegasse a 50 vezes! O resultado agora é conhecido: os pagadores de impostos foram obrigados a cobrir o rombo bilionário.
É muito tentador para um governante usar bancos públicos para financiar uma farra de crédito sem lastro. Ele colhe os louros no curto prazo, com mais crescimento econômico, enquanto os problemas só aparecem lá na frente, no mandato de outro. Estamos cansados de saber disso com os históricos fracassos do BNH, Banco do Brasil, Banerj, Banespa, etc.
O brasileiro já se encontra bastante endividado. O modelo de consumo calcado em crédito se esgotou. A economia não cresce e a inflação segue elevada. O inverno chegou para as cigarras. Os bancos privados percebem isso, mas sofrem forte pressão do governo para expandirem ainda mais o crédito.
Os bancos públicos assumem a iniciativa, roubando mercado de forma irresponsável. Já correspondem a quase metade do total de crédito do país, lembrando que Marx e Engels defendiam o controle estatal do crédito como instrumento para a revolução comunista.
Quando Pandora abriu a caixa que ganhara de presente, contra todos os alertas, ela espalhou pelo mundo vários males. Sobrou na caixa a esperança, a última que morre. Espera-se que o governo saiba parar com essa política inflacionária a tempo. Caso contrário, teremos muito sofrimento depois. Assim diz Cassandra, cuja maldição era prever o futuro, mas não ser escutada...

5 comentários:

  1. amauri10:46 AM

    Bom dia Rodrigo!
    Depois de decadas com atitudes "irresponsaveis", nao fazer reformas na economia, ter deficit todo ano... ainda assim o governo brasileiro pode com algumas atitudes pontuais nao ter problemas? Incrivel, somos O PAÍS. Os petistas estao certos, nunca antes na historia... abs

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  2. O brasileiro médio tem dois drenos enormes: O juro bancário e a Justiça.
    A justiça pois a promotoria está ahi para acusá-lo de qualquer coisa e sem provas. VAI-SE A ECONOMIA DO CIDADÃO PELO DRENO PARA PAGAR ADVOGADO (necessário pois a acusação é falsa).
    O Banco pois aqueles sucessivos empréstimos para cobrir a conta levaram o seu Saldo Devedor a alturas nunca dantes suspeitada (189%aa que se usados vão a 400%aa. - é o juro sobre juro, stupido!)
    O que sobra?

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  3. Como é grande a estupidez ou o mal caratismo das pessoas.
    Não querem pagar juros sobre juros, mas nunca vi ninguém desses aí, reclamar de receber juros sobre juros na poupança.
    ABAIXO O JUROS SOBRE JUROS NA POUPANÇA!!!
    Comunistas imbecis!!!

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  4. Anônimo8:15 AM

    "bancaram verdadeira orgia de crédito imobiliário, principalmente para as classes mais baixas, com os famosos "subprimes"."

    Eu vejo as causas da crise americana como algo mais profundo. A pergunta não deveria ser "por que forneceram créditos à subprimes", mas sim "porque há tantos subprimes na maior economia do mundo".

    Vamos ser realistas, a riqueza do primeiro mundo veio da indústria. Claro, é a indústria é que gera riqueza real, bens reais, a Europa e EUA construiram sua riqueza porque se industrializaram primeiro e tinham um parque industrial inigualável.

    Mas o que já foi uma economia altamente produtiva virou uma bagunça financeira em que a maioria da população quer ganhar dinheiro na bolsa sem ter que produzir de fato alguma coisa. OS EUA se desindustrializaram radicalmente, viraram uma "economia de serviços", o know how de como produzir riqueza real está sendo transferiado para os países asiáticos, estes sim estão fortalecendo suas economias.

    Por que isso aconteceu? Como já dizia o ditado: "Homem rico, filho nobre, neto pobre." O atual jovem típico americano quer fazer qualquer coisa menos trabalhar no setor produtivo. Por que trabalhar na indústria, que é penoso, difícil, perigoso e complicado, se pode-se sonhar em trabalhar no cinema, moda, night's, rock n' roll ou bolsa de valores? Deixa o trabalho sujo para os países emergentes.

    Decadência de nações poderosas não é nenhuma novidade na história. Aconteceu no Egito, na Babilônia, na Pérsia, no Império Romano e agora está acontecendo nos EUA e Europa. Sempre pelo mesmo motivo, ao ficar rica, a população fica mimada e mal acustumada.

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  5. Anônimo7:28 AM

    E o Brasil está indo pelo mesmo caminho sem nunca ter sido rico.

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