quinta-feira, junho 27, 2013

Corrupção: entrevista para o MCC

Com o tema da corrupção em alta, após medida do Senado que a transforma em crime hediondo, segue uma rápida entrevista que concedi ao Movimento Contra Corrupção sobre o assunto.

Entrevistamos Rodrigo Constantino, economista e intelectual brasileiro. Neste diálogo, comentamos algumas perspectivas e propostas no que tange ao tema "corrupção", com ênfase na situação brasileira.
Não se trata de um "bate-papo", isto é, não pretendemos apenas interligar algumas temáticas. Ainda que de modo superficial, tencionamos aventar a opinião de intelectuais sobre diversos problemas advindos, de modo isento, imparcial e apartidário.

Prezado Rodrigo, como você define “corrupção”?

Corrupção, em sentido mais abrangente, seria tudo aquilo que envolve fraude, desvio de conduta ética, roubo. Mas, em um sentido mais específico, corrupção precisa envolver o setor público, ou seja, é o desvio de recursos públicos. Para haver corrupção, nesse sentido, é preciso ter o governo envolvido no processo. Se uma empresa privada engana seus acionistas minoritários e desvia recursos, isso é roubo, fraude, mas não seria corrupção sob esse ponto de vista.

Que tipo de modelo estatal tende a acentuar os índices de corrupção?

Sempre que o estado concentra poder e recursos em demasia, temos um convite à corrupção. O motivo é evidente: como o dinheiro é da "viúva", falta o olhar atento do dono para fazer valer o seu dinheiro. 
Dessa forma, acabamos com um mecanismo de incentivos perversos, onde burocratas e políticos decidem sobre bilhões de outras pessoas, sem a devida prestação de conta, sem o devido escrutínio. É tentador demais cobrar um "pedágio" para a alocação desses vastos recursos, desviá-los para fins eleitoreiros, políticos, partidários ou mesmo pessoais. Como o dinheiro não é de "ninguém", pois é de todos, o político toma decisões sem critério econômico racional, privilegiando seus próprios interesses. É da natureza humana, e quando temos impunidade, essa tendência é exponencial.
Qual a diferença entre corrupção pública e privada? Qual causa mais danos à sociedade? Como evitá-las?

Conforme dito acima, prefiro chamar de corrupção aquilo que envolve o setor público, adotando outro nome para roubos no setor privado. Sem dúvida a corrupção é mais nefasta, pois envolve grandes somas e o desvio do nosso dinheiro. Quando uma empresa é fraudulenta, isso prejudica aqueles que voluntariamente negociaram com ela, e terão que buscar na justiça reparação. 
Quando temos corrupção, cada um dos "contribuintes" (pagadores de impostos) perde, sem que tenha voluntariamente participado de qualquer transação com a empresa ou entidade. Se há corrupção envolvendo a Petrobras, todos pagam o preço, pois todos somos, teoricamente, proprietários dela. A melhor forma de evitar a corrupção é reduzindo e descentralizando o poder estatal e a quantidade de recursos que passa pelo setor público, assim como adotando severa punição para quem foi condenado por corrupção.
A corrupção ocorrente no Brasil é mais agravada que em outros países? Por que?

Temos bastante corrupção sim, em termos relativos, como a Transparência Internacional mostra em suas pesquisas. É subjetivo muitas vezes, pois fala de "corrupção percebida". Mas sabemos que a magnitude é assombrosa, e qualquer empresário tem plena consciência do problema. Os motivos ficam claros após as respostas acima: temos muito poder concentrado no estado, e um poder arbitrário. 
Como a burocracia cria dificuldades legais para vender facilidades ilegais depois, ou seja, corrupção, claro que esta vai explodir em um país como o nosso, onde é proibitivo ter grandes negócios ou mesmo pequenos com tudo regularizado. 
Fora isso, o peso do estado na economia faz com que muitos queiram mamar em suas tetas, e optam pela via ilegal, ou seja, "investem" mais em lobby e corrupção do que em seus próprios negócios. 
Claro, quando uma canetada estatal sela o destino de todo um setor, isso passa a fazer sentido econômico. Por fim, temos um problema grave e conhecido de impunidade. Isso é um convite ao crime. Os corruptos não são punidos, logo, têm pouco a perder e a temer.
Como a privatização pode auxiliar no combate à corrupção? Ela pode auxiliar a corrupção?

Justamente reduzindo a concentração de poder e recursos no estado. A privatização, ao colocar em sócios privados o controle das empresas, aumenta muito o grau de preocupação desses com o caixa da empresa. Logo, haverá bem menos desvios, na média. E, quando houver desvio, não será do nosso dinheiro, mas do dinheiro desses proprietários particulares.
A corrupção no governo atual é maior que em tempos passados? Por que?

Difícil responder com dados objetivos, mas eu diria que a sensação é maior sim. Até porque tivemos o mensalão, que foi o auge em termos de corrupção com fins políticos: um partido desviando recursos públicos para se perpetuar no poder. Como o maior beneficiado pelo esquema acabou sendo reeleito, isso deu uma espécie de "salvo-conduto" para os corruptos, e criou a sensação de que o crime compensa. Espera-se que com o julgamento pelo STF e com as punições, ainda aguardando pela execução penal, ajude a melhorar o quadro. O corrupto tem que saber que, se for pego, vai pagar por isso. E caro!

O que cada um, como cidadão, pode fazer para ajudar no combate à corrupção?

Em primeiro lugar, procurar agir sempre de acordo com as leis, mesmo que discorde de algumas delas. Para mudá-las, devemos usar os mecanismos legais e democráticos. A desobediência civil me parece defensável apenas em casos extremos. Isso implica em não subornar policiais, não dar propina para burocratas etc. Claro que, na prática, muitas vezes isso será impossível. 
É que as regras são tão absurdas que tornam a viabilidade de alguns negócios, especialmente das pequenas empresas, impossível. O burocrata e o fiscal gozam de tantas regras arbitrárias que podem transformar a vida do pequeno empresário em um inferno, e a propina pode ser um grito de desespero pela sobrevivência. Entendo isso. Mas sempre que for possível, o ideal é jogar dentro das regras do jogo, respeitando as leis. O império das leis é fundamental para o avanço da sociedade. 
Por fim, os cidadãos devem fazer sua parte no campo das ideias, explicando para pessoas menos instruídas as causas da corrupção, dando sua cota de contribuição para a divulgação desses valores liberais que poderiam combater essa praga que é a corrupção.

Um comentário:

  1. Rafael5:34 PM

    O problema da corrupção não está, a meu ver, na "natureza humana" ou no "estado concentrador de poder" (no estado extremamente burocratizado, aí sem dúvida!).

    Fosse assim, por que países com impostos altíssimos e forte presença do estado em serviços (Finlândia, Noruega etc.) são justamente os com menor índice de corrupção no mundo?

    Há por trás - e isso serve bem para explicar o Brasil - relações históricas, sociais e culturais que moldam o comportamento e a aceitação no que diz respeito à corrupção: cultura de desvalorização do trabalho desde Portugal pré-conquista (compare com a cultura de incentivo à produção material e intelectual inglesa, por exemplo, do mesmo período), potencializada pela modelo de colônia puramente de exploração e pelos 350 anos de escravidão, ausência de memória histórica que faça população se entender como um grupo coeso; ausência de escolarização que faça o indivíduo compreender-se como partícipe do funcionamento da ação, bem como de ter noção do alcance de seus pequenos atos, dentre outras razões.

    Nenhuma sociedade passa impune por esses fatores históricos. As práticas se reproduzem e chegam aos dias de hoje.

    (Ah, mas aí coisa de quem estuda humanas, então não serve pra explicar, né?)

    Enfim, acho que o exemplo dos países nórdicos faz um bom contraste e mostra que o estado inchado em si não é o problema.

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