Fonte: Telegraph |
Em artigo traduzido no GLOBO hoje, Joseph Stiglitz ataca as rodadas de negociação de livre comércio, pois elas seriam instrumentos de interesses corporativos contra os reais interesses dos cidadãos. Estes, segundo Stiglitz, são melhores atendidos por meio de subsídios estatais que colocam outros valores acima dos comerciais. Vejam esse trecho, volto depois:
O ponto mais geral, a que já se aludiu, é que os acordos de comércio colocam tipicamente os interesses comerciais à frente de outros valores – o direito a uma vida saudável e à proteção do ambiente, para nomear apenas dois. A França, por exemplo, exige uma “exceção cultural” nos acordos de comércio que lhe permita continuar a apoiar o seu cinema – o que beneficia todo o mundo. Este e outros valores mais amplos deveriam ser não-negociáveis.
Na verdade, a ironia é que os benefícios sociais de tais subsídios são enormes, mesmo que os custos sejam negligenciáveis. Alguém acredita realmente que um filme de arte Francês represente uma ameaça séria a uma grande produção cinematográfica para o verão de Hollywood? E no entanto a cobiça de Hollywood não conhece limites, e os negociadores comerciais da América não fazem prisioneiros. E é precisamente por isso que estas questões deveriam ser retiradas da mesa antes do início das negociações. De outro modo, haverá braços torcidos, e existe um risco real de que um acordo sacrifique valores básicos a interesses comerciais.
Se os negociadores criassem um regime genuíno de comércio livre que colocasse o interesse público em primeiro lugar, dando às opiniões de cidadãos vulgares pelo menos tanto peso como o dado às dos lobistas empresariais, eu poderia esperar que o acordo que deles emergisse iria fortalecer a economia e melhorar o bem-estar social. A realidade, contudo, é que temos um regime comercial controlado que coloca os interesses empresariais em primeiro lugar, e um processo de negociações que é antidemocrático e não-transparente.
A possibilidade de emergir das próximas conversações um acordo que sirva os interesses dos Americanos vulgares é baixa; as perspectivas para os cidadãos vulgares de outros países são ainda piores.
Não sei se o leitor compreendeu direito, mas eu tentarei explicar: o cinema francês, segundo Stiglitz, é um valor incrível para a humanidade; mas o público pagante não necessariamente concorda, pois, quando livre para escolher, acaba indo ver os enlatados de Hollywood. Logo, o governo francês precisa proteger seus produtores de cinema, para beneficiar o público, que, lembrando uma vez mais, prefere ver os filmes americanos. Entenderam?
A lógica de Stiglitz é a mesma de todo autoritário: o que eu considero melhor deve ser pago pelos outros, caso eles sejam ignorantes demais para entender a superioridade das minhas escolhas. Quem defende subsídios, protecionismo e barreiras comerciais, e não o faz pelo simples interesse de lucrar com a falta da concorrência, está partindo justamente desse tipo de premissa autoritária. Quer impor goela abaixo dos demais as suas preferências.
O problema é que cada um tem suas próprias escolhas, e quando há o instrumento à disposição, ele poderá ser capturado por qualquer grupo de interesse. No Brasil, vemos o estado subsidiando até mesmo funk! Será engraçado ver Stiglitz defender a importância disso para a "humanidade".
Você pode adorar filmes franceses, ou filmes iranianos. Pode detestar os filmes de Hollywood. Mas quem deve escolher é o indivíduo, o público votando com seu próprio bolso. Haverá nichos para gostos específicos, mais refinados até, se for o caso. Só não é correto obrigar o mais pobre a bancar o luxo do rico, forçar o "bruto" a pagar a conta do "intelectual". Isso é absurdo. Isso é autoritário. Isso é esquerda. Isso é Stiglitz!
PS: Alguns brasileiros usam o mesmo discurso, para garantir privilégios nacionalistas, como podemos ver aqui. E nesse artigo para a Folha, eu explico o risco de proselitismo ideológico quando o mecenas é o estado. Definitivamente, a livre escolha individual sem subsídios e protecionismo estatal é o melhor caminho.
Rodrigo,
ResponderExcluirComo responder àquele argumento, sempre levantado, da BBC inglesa. Convenhamos que a BBC presta um serviço público bem bacana.
Abs
Ontem vimos uma parlamentar comunista propor o subsídio público de ingressos em cinemas e shows para "jovens" de até 29 anos. E tem também a luta pelo fim do fator previdenciário, o que irá onerar muito os gastos públicos, além de estimular a aposentadoria precoce. Ou a maioria silenciosa aprende a protestar contra essas rapinagens e a lutar por aquilo que é do interesse geral, ou teremos as minorias ruidosas sempre encontrando novas formas de meter a mão nos recursos públicos, em detrimento da maioria.
ResponderExcluir"Se os negociadores criassem um regime genuíno de comércio livre que colocasse o interesse público em primeiro lugar, dando às opiniões de cidadãos vulgares pelo menos tanto peso como o dado às dos lobistas empresariais..."
ResponderExcluirFico me perguntando: será que ele percebeu que ele é o lobista do cinema francês?
Para quem não sabe foi esse sujeito que disse, em uma entrevista rápida ao O GLOBO, que o Brasil era muito exigente no combate a inflação.Dona Dilma deve ter lido e deu no que deu.
ResponderExcluirEu não sei quem é pior.Esse protecionista ou o Paul Krugman, que já chegou a afirmar que o terremoto no Japão poderia ser um bom negócio para a economia se tivesse provocado danos sérios.
Isso só mostra que o Nobel, em muitos casos, não significa nada.