Lobão *
Título Original: CARTA ABERTA AOS QUE PARTICIPARAM DA PLS129/12
Venho por meio desta carta aberta insistir em algumas
perguntas que ficaram órfãs de respostas durante o período de implementação
desse urgente, instigante e misterioso projeto de lei.
Perguntas que tiveram suas respostas negadas ou, simplesmente,
ignoradas por esse grupo como se o restante da classe não existisse e
que,ungidos por um direito divino, tomaram para si a sagrada incumbência de, num
golpe só, salvar o direito autoral no Brasil, mesmo que para isso pagassem o
alto custo de evitar o debate amplo com seus colegas tratando-nos de forma
desrespeitosa e truculenta, nos enfiando reformas profundas goela abaixo, designando
uma insólita interferência governamental no funcionamento das entidades
privadas de classe que administram os direitos autorais do país.
Gostaria muito de saber por que essa aventura assimétrica pela
nossa exclusão e irresponsável pela associação com o governo vem acontecer
justamente na hora em que a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação, vinculada
ao governo federal e responsável pela execução musical em várias TVs e rádios
públicas) está sendo posta no Judiciário pelo ECAD, pois não paga nem jamais
pagou os direitos autorais devidos? A cifra já ultrapassa 1 bilhão de reais.
Fiscalização? Todos queremos mais fiscalização e
transparência, mas como ter mais fiscalização e transparência com atitudes tão intrigantes?
Colegas à procura de esclarecimentos foram ao encalço da Ministra da Cultura, Marta
Suplicy, do PT e do Senador Randolfe Rodrigues, do PSOL, e eles não souberam dar
explicações mais detalhadas sobre a tal estatização.
Então a lógica seria essa: procurar o governo que nos é
devedor e instalá-lo no nosso galinheiro para “controlar” a arrecadação? Não
faz o menor sentido, principalmente sendo público e sabido termos um dos
governos mais corruptos da história.
Quer dizer que a partir desse projeto, o Ministério da
Cultura é que arbitrará as regras de gestão das associações, retirando dos
legítimos titulares o direito de definirem como deverão ser administradas as
associações que criaram? Isso é anticonstitucional!
A intervenção governamental em uma esfera privada fere a
Constituição Federal que reserva ao criador intelectual, às suas associações de
classe ou sindical, a exclusiva gestão e fiscalização do aproveitamento
econômico de suas criações.
E toda essa festa acontecendo no momento em que o governo
vem recebendo severas críticas populares, com manifestações de protesto de
todos os espectros e de todos os feitios, numa queda de popularidade sem
parâmetros na história brasileira. Num momento em que o governo, desesperadamente
tenta enxugar seus gastos astronômicos, aparece no Ministério do Planejamento
um organograma do novo órgão regulador, repleto de diretorias e com dezenas de
cargos comissionados!
E tem mais... A promulgação da lei e a instituição deste
critério causarão grande instabilidade no sistema de cobrança, podendo causar
imprevisíveis resultados nos rendimento dos autores.
Gostaria muito de saber o que significa algo como: “...a
cobrança será sempre proporcional ao grau de utilização das obras e fonogramas
pelos usuários no exercício de suas atividades”. Como será aferido? O usuário
vai executar primeiro e depois pedir autorização e pagar? Isso, pelo que tudo indica
só favorece as rádios, TVs, telefônicas, grupos da internet.
Não sou contra modificações no ECAD, mas esse projeto nos
congela como aconteceu com a famigerada OMB que não sai de cima desde 1960 (se
acabarem com ela os músicos perdem direitos adquiridos na lei federal).
E não é por coincidência cósmica que um dos autores da
PLS129 é Ronaldo Lemos, que trabalha na FGV, uma fundação que recebe rios de
dinheiro da União e que representa no Brasil o Creative Commons e muitos outros
grupos que não querem pagar nada.Todos esse grupos são muito ricos e muito
agressivos, daí esse confusão toda: Como
nossos ilustres colegas vão se aliar àqueles que não querem nos pagar? Podem
explicar?
Outro aspecto que não poderia deixar de nos intrigar é a
ausência do jabá (propina paga aos usuários, rádios e TVS para execução
massiva) nisso tudo: se existe esse ímpeto incontrolável de moralização da
arrecadação, por que cargas d’água isso não acontece na seara da execução?
Sim, pois se temos uma execução fraudulenta, com 99% delas
acontecendo sob a égide desse tenebroso JABÁ, como poderemos ter arrecadações
não fraudulentas?
Por que esse item fundamental foi excluído? Por que o então
Ministro da Cultura, Gilberto Gil, acabou por engavetar um projeto de lei anti jabá
que estava sendo redigido pelo deputado federal do PT (PE), Fernando Ferro, lá
pelos idos de 2003? Isso faz algum sentido?
E faz algum sentido um ex-ministro da Cultura assim que
deixa o ministério se beneficiar da Lei Roaunet para um projeto de um novo
disco? E continuar se beneficiando ao longo desses anos com outros tantos
estapafúrdios projetos assim como a maioria
esmagadora de seus colegas consagrados?
Conviver com essa realidade asquerosa é, no mínimo,
constrangedor. Não é interessante perceber que o núcleo desse grupo que
tomou a dianteira do PLS129/12 é justamente o mesmo que anda mamando na Lei
Roaunet? Paula Lavigne, Flora Gil, Gilberto Gil, Caetano Veloso entre muitos...
É curioso verificar um grupo constituído por artistas tão
chegados à Rede Globo, outra que está nos devendo milhões (o Roberto Carlos tem
seu programa anual, os outros, com execuções massivas em telenovelas e alguns
tantos, em negócios vários com a Globo Filmes), esteja com todo esse ímpeto de
nos doar prometeicamente a alforria dos direitos autorais, quando, ao mesmo
tempo, nos manda de forma imperiosa calar a boca sempre usando daquele cacoete
sórdido de ridicularização do meu discurso e atacando a reputação de quem quer
que venha causar algum tipo de obstáculo aos seus interesses pessoais.
E no episódio da numeração de CDs?
Recorri na época, de imediato, a Gil e Caetano por saber de
nossas diferenças e por isso mesmo os coloquei a par do processo todo, obtendo
a palavra dos dois em assinar o manifesto e caminharmos junto em benefício de
um projeto histórico da nossa classe, de anos de luta e na semana seguinte, sem
nenhum aviso, sem nenhum motivo aparente, os dois vão a público me defenestrar
me chamando de maluco e.... comunista! Caetano escreveu um artigo dizendo que
“não fazia parte daquela turma”. Lastimável. Isso não é atitude que se espera de um Homem.
Pois são essas mesmas figuras que protagonizam essa mais
recente patuscada, que adentraram o Congresso Nacional com seus asseclas, desavisados
e cupinchas, causaram frisson entre os senadores, conversaram a portas fechadas
com o ilustre Renan Calheiros, posaram para a posteridade e depois foram beijar
a mão de uma Dilma Rousseff que, incrédula e embevecida por receber apoio tão
improvável em hora tão difícil , declara mui oportunamente ter se espelhado naquelas
impolutas criaturas (no caso, Caetano Veloso e Roberto Carlos). Eles mereceram
ouvir isso.
Além desse compositor que escreve essa carta, gostaria de
deixar claro ao público em geral não se tratar de uma atitude isolada, solitária,
como alguns podem imaginar. Somos muitos, entre veteranos e iniciantes, famosos
e anônimos, todos profissionais da canção. Entre eles estão Aldir Blanc, Martinho
da Vila, Paulo Cezar Pinheiro,Toquinho, Dory Caymmi, Carlos Lyra, Ferreira
Gullar, Joyce, Beth Carvalho, Capinan, MPB4, Chico Cézar, Flora Purim, Airto
Moreira, Maurício Einhorn, Antonio Adolfo, entre tantos outros.
E para encerrar, gostaria de dar voz a um autor anônimo que
escreveu a sua contundente recomendação ao grupo:
Senhores artistas que participaram da campanha de
aprovação da PLS 129:
Sou um simples músico e compositor brasileiro, não sou famoso, não apareço na
tv e meu nome é apenas mais um entre milhares de outros que não fazem parte da
constelação de grandes nomes da música popular brasileira que, essa noite,
defenderam com tanto empenho a aprovação da PSL 129 no senado.
Quero lembrá-los, que os senhores tomaram uma decisão em nome de milhares de
pais de família, trabalhadores que dependem exclusivamente da atual,
insatisfatória ou não, arrecadação de seus direitos pelo ECAD. "Grandes
artístas" não significa, como tentaram usar, "Todos os
Artistas". Muita calma nessa hora ! Queremos mudanças. Mas também queremos
SEGURANÇA !
Quero que fique bem claro que serão reconhecidos, aplaudidos e seremos
eternamente agradecidos se realmente, essa luta de vocês refletirem em nossos
demonstrativos. Por outro lado, serão, também, igualmente responsáveis por
quaisquer prejuízos em nossos faturamentos e, consequentemente, em nossa já
difícil sobrevivência.
Hoje, no senado, foi difícil imaginar um representante legítimo da grande massa
de autores e músicos que compõe o ECAD. Ali, vi grandes estrelas, grandes nomes
da mídia, vi grandes ídolos. Não vi o compositor que perde noites em portas de
hotel e leva tapa de seguranças brutamontes em filas de camarins; carregando o
sonho debaixo do braço em forma de CD. Isso mesmo! Aquele CD com o nome e o
telefone do compositor escrito na capa que vocês vivem recebendo. Não vi, ali,
esse autor surrado sem visibilidade nos grandes meios de comunicação e que
mesmo assim insiste no sonho de fazer música. Caros amigos, vocês não levaram
para o plenário hoje, apenas suas convicções. Vocês levaram nossas famílias
junto com vocês. Se apoderaram da nossa tímida voz. Então, durmam com essa
responsabilidade, durmam com meus filhos, comam da minha comida e bebam da
minha água a partir de hoje. Espero e rezo para que tudo melhore. Mas, se
piorar, não verão o brilho de grandes estrelas como vocês. Mas sentirão na pele
uma tempestade de pequenos grãos de areia que somos nós.
Boa noite.
Assinado: O primeiro grão de areia.
Bem, todos nós estaremos de olhos bem abertos em todos
vocês...nós e a História.
* Artigo que o músico Lobão mandou com exclusividade para meu canal, como presente de aniversário por mim solicitado.
Bacana demais, parabéns Constantino!
ResponderExcluirParabéns Constantino! E parabéns Lobao, artigão!!!
ResponderExcluirExelente! Parabens!
ResponderExcluirParabéns Lobão, pessoas como voce, que não deixa perdermos a esperança no futuro.
ResponderExcluirAbços Rodrigo e parabéns a voce tambem sempre nos trazendo artigos excelentes como esse.
Van
E a imprensa, totalmente de joelhos, noticiou a patuscada como se fosse um "avanço".
ResponderExcluirO que aconteceu com o Lobão foi uma espetada sabendo que o pau mole do Caetano e seus amigos tiveram muito mais atitude de se manifestar pelo direito deles e dos músicos do que ele próprio, que se acha "o Supra representante do Rock brasileiro e dos oprimidos", sou músico profissional e roqueiro a 10 anos e ele nunca representou nada pro cenário independente, a não ser largar ele.
ResponderExcluirE pra quem não sabe esse cara falava mal da mídia e de gravadoras durante todos os anos 80 e hoje depende delas (e faz tudo pra continuar), falava mal de bandas brasilienses como Legião e depois estava com a cara de pau e sem vergonha fazendo tributo ao Renato Russo. Não duvido que daqui a 10 anos ele vai tá de conchavo com a Lei Rouanet e defendendo a bandeira do Ministério da Cultura.
Lobão é o Lula do Brasil.
Amigo não seja anônimo, mostre o nome com orgulho desse seu comentário no mínimo ridículo!
ExcluirÉ a primeira vez que comento nesses blogs e não vin esse local pra nome. Meu nome é Antônio Filho, não tenho conta no google e se eu tenho orgulho é problema meu. Aprende a argumentar pq chamar de ridículo uma coisa que é verdade, isso qualquer bunda mole faz.
ResponderExcluirLobão repete todos os argumentos dos que estão perdendo a mamata depois de décadas sem fiscalização.
ResponderExcluirEm primeiro lugar não há estatização do Direito Autoral. O ECAD tem o monopólio legal de arrecadar e distribuir direitos autorais de música no país. Como todo monopólio que lida com dinheiro de terceiros - usuários de música e autores - tem que ser fiscalizado pelo Estado. Está apenas sendo corrigida uma falha jurídica que foi criada no Governo Collor. Em sua ânsia de diminuir o tamanho do Estado, ele acabou com o MinC, que abrigava o CNDA, órgão estatal que exercia a função fiscalizatória e regulatória do ECAD. Por conta dessa "desatenção' a gestão coletiva ficou entregue aos dirigentes que se eternizaram, enriqueceram e criaram bônus para seus funcionários mesmo em ano de prejuízo. Os estatutos das Sociedades tornaram impossível as mudanças "por dentro" do sistema.
Portanto a tese de inconstucionalidade está mais que equivocada: o ECAD foi criado por lei - isso também é inconstitucional? - para intervir na forma de funcionamento das associações e só deixou de ser fiscalizado pelo Estado por uma canetada do nosso ex-presidente deposto.
Quanto ao diálogo, chega a ser ridículo. Em primeiro lugar, ninguém das diretorias das sociedades jamais quis dialogar com os autores. Éramos quase inimigos. Agora vêm reclamar de nós? Fui bloqueado pelo Ronaldo Bastos depois de convidá-lo várias vezes para conversar.
Além disso, a nova lei reflete muito do que foi a consulta pública do MinC na gestão Gilberto Gil. Foram todos conviadadod a participar. Eu mesmo fui inúmeras vezes a Brasília e participei de audi´ncias públicas e debates. Por que Lobão nunca se interessou em debater nesses mais de 4 anos? Ele deveria responder.
Agradecido,
Leonientlanu
tá com medo de perder a bocada e de sua máscara cair rapaz??? quem disse que artistas chicletes como você representam artistas populares de verdade? vai chorar no colo da xuxa e da regina casé! abs
ResponderExcluiresse texto é do gênio Bruno Caliman, o primeiro grão de areia
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