Rodrigo
Constantino, revista VOTO
Um excelente
livro novo é A Capitalism for the People,
de Luigi Zingales, da Universidade de Chicago. Seu livro anterior, Salvando o Capitalismo dos Capitalistas,
escrito em parceria com Rugharam Rajan, também é muito bom. O tema é
basicamente o mesmo: o perigo do capitalismo de compadres.
Nascido na
Itália, Zingales foi para os Estados Unidos quando jovem em busca de um
ambiente mais livre, com maiores oportunidades individuais com base no mérito.
Como ele próprio reconhece, o ambiente italiano era hostil a qualquer um que
ousasse caminhar com as próprias pernas contando apenas com o talento, pois a
rede de contatos pessoais era muito mais importante para definir o sucesso. A
Itália é mesmo o Brasil da Europa.
Zingales
encontrou essa “terra da liberdade” na América, e prosperou. Só que, de uns
tempos para cá, ele tem visto os Estados Unidos se parecerem cada vez mais com
a Itália da qual ele fugiu. O livre mercado tem sido capturado pelo interesse
de grandes negócios, afetando o equilíbrio na democracia.
O povo está com
raiva, principalmente após a crise de 2008 e os constantes pacotes de resgates.
Sem saber exatamente diagnosticar as causas dos problemas, a população condena
o capitalismo como um todo, em vez de sua versão deturpada. Foi para alertar
sobre esses riscos que Zingales escreveu o livro.
Um capitalismo
que permite que as pessoas fiquem ricas por meio de conexões políticas, não
pelo sucesso no mercado, é um capitalismo que parece injusto e corrupto para
muita gente. A crença de que o trabalho árduo será recompensado é parte
essencial da cultura americana, e foi essa atitude que reduziu as pressões
anticapitalistas nos Estados Unidos ao longo do tempo. Ela está agora ameaçada.
A maioria dos
americanos acredita no poder dos mercados, mas está perturbada com a influência
das grandes empresas no sistema. Na área financeira isso é ainda mais
verdadeiro. Os lobistas de Wall Street exercem enorme poder sobre o banco
central. Movimentos populistas ganham força com demandas de redistribuição de
renda por meio do governo, o que coloca o livre mercado ainda mais em xeque.
O grande valor
do mercado está na competição. Quando o governo cria subsídios, barreiras,
privilégios, o mercado se transforma em algo completamente diferente. Isso não
quer dizer que não exista um papel regulador para o estado. Zingales reconhece
os riscos do excesso de regulação, mas ele acha que é importante ter regras
claras impostas pelo governo que protejam a concorrência.
Sem uma proteção
legal eficiente, sem garantias aos acionistas, com pouca informação aos
clientes, os empresários mais inescrupulosos ganham, não os mais eficientes.
Zingales deposita muita importância nas instituições, nas regras do jogo.
Quando essas podem ser distorcidas de forma arbitrária, os vencedores não são
os melhores jogadores, mas os mais corruptos.
Basta pensar nos
oligarcas russos, em Silvio Berlusconi na Itália, no Carlos Slim no México, em
Eike Batista no Brasil. Todos eles são muito próximos de seus respectivos
governos. Suas fortunas vêm de setores sob forte intervenção estatal.
Compare-se a isso o falecido Steve Jobs da Apple, Bill Gates da Microsoft ou os
donos da Google, e a diferença salta aos olhos. Infelizmente, até nos Estados
Unidos a via política tem ganhado cada vez mais peso relativo.
Uma vez que o
sistema econômico é construído para favorecer as relações políticas em vez da
eficiência, fica extremamente complicado reformá-lo, pois os grupos de
interesse passam a acumular poder demais e criam barreiras às mudanças.
Defender o livre
mercado não é o mesmo que defender os negócios. Quando os defensores do
capitalismo passam a ser confundidos com os defensores desses grandes
empresários ligados ao estado, então a imagem do capitalismo sai totalmente
manchada. O povo acaba nutrindo ódio ao capitalismo, quando deveria condenar o
“capitalismo de compadres”.
Para o
capitalismo sobreviver, as pessoas devem aceitar resultados desiguais. Mas
quando os resultados passam a ser extremamente desiguais, e devido ao poder dos
lobistas, então a maioria passa a rejeitar o modelo.
Essa é a idéia
central do livro. O autor desenvolve com riqueza de detalhes os pontos, e
apresenta dados interessantes. O objetivo deve ser resgatar a idéia de uma
livre competição, com poder descentralizado, com o mecanismo de pesos e
contrapesos funcionando. A hipertrofia do setor financeiro representa uma
grande ameaça a isso.
O “capitalismo
de compadres” só pode ser derrotado com apoio popular. Virar as costas para a
democracia não resolve o problema. É preciso mostrar que a revolta é legítima,
mas o alvo está mal calibrado. A culpa não é do capitalismo, mas de sua
degeneração. É preciso resgatar a confiança no sistema, com regras simples e
igualmente válidas para todos.
É preciso ainda recuperar
o “capital cívico”, os valores éticos que rejeitam a idéia de que o importante
é vencer, custe o que custar. Como vencer
faz toda diferença do mundo. Atletas que ganham sob efeito de doping sofrem
rejeição popular. É preciso exercer o mesmo tipo de pressão social contra
negócios que vencem graças aos favores estatais.
Muito bom o artigo. Infelizmente, não temos um minarquismo em nenhum local, desde 1913 nos EUA. O estado se tratando de trocas voluntárias, só deve evitar fraudes e garantir o cumprimento dos contratos. Só podemos usar sociedades próximas ao modelo minarquista.
ResponderExcluirRodrigo,
ResponderExcluirVoce já leu a notícia no jornal O GLOBO de que a presidente Dilma desistiu de privatizar o aeroporto do Galeao e o aeroporto de Confins?
Parece que a pressao dos sindicatos dos funcionários públicos da INFRAEROSSAURO foi determinate nessa decisao!!!
O raciocínio do autor é semelhante ao meu (servidor público liberal)
ResponderExcluirLembram?
CAPITALISMO LIBERAL, SIM; EMPRESARIADO PRIVADO, NÃO.
Um ranço que depõe contra muitos liberais e o liberalismo, inclusive aqui neste blog, é a defesa do liberalismo econômico feita sob uma ótica empresarial, como se empresariado privado fosse o melhor porta-voz do liberalismo, quando não o é.
A única justificativa para o liberalismo econômico (não falo aqui do político stricto sensu) é a maior eficiência do seu sistema produtivo, gerada pelo desenvolvimento científico e tecnológico que somente a livre concorrência é capaz de proporcionar, aliado ao barateamento dos produtos e serviços, que beneficia o consumidor, ou seja, a sociedade em geral.
Ora, o empresariado privado é apenas um instrumento disso e não a sua essência. O empresário privado, pela própria lógica do seu interesse, não é liberal ou antiliberal. Ele é uma coisa ou outra conforme sua posição no mercado. Quando ainda quer espaço, mostra-se liberal; quando conquista o espaço almejado, quer reserva de mercado. Isto não o faz culpado, é verdade, mas o torna um ser não confiável. Ele tão só defende seu interesse econômico de momento e não é o porta-voz de qualquer teoria econômica que seja. É da lógica da sua posição social.
Assim, creio que já é chegada a hora de os liberais serem mais realistas e passarem a ver o empresário como esse ser mutante e não confiável que ele é. Para o consumidor (empresário ou não, pois todos somos consumidores), este sim, a razão última do liberalismo, o lucro é um meio e não um fim em si mesmo.
O discurso liberal deve ser consumerista e não empresarial.
'EMPRESARIADO PRIVADO NÃO'
ResponderExcluirora mas isso é uma bobagem imensa, se os empresários não forem privados vai ser o quê?Governo empresario? Piada.
O que esse parasita público não tem capacidade pra entender é que o artigo condena ALGUNS empresários, mas não a instituição de todos
Rodrigo, desculpa por perguntar numa postagem sem relação, mas tem alguma previsão para uma nova edição de "o poder das idéias" ou a disponibilização dele no IMB? Tá esgotado em todas as livrarias (e não tá disponível na biblioteca do IMB).
ResponderExcluirAguardo sua resposta
Eduardo Távora
O empresariado brasileiro quer enganar o consumidor e receber auxílios do estado. Ô, raça!!!
ResponderExcluir"A culpa não é do capitalismo, mas de sua degeneração. É preciso resgatar a confiança no sistema, com regras simples e igualmente válidas para todos."
ResponderExcluirMas a "essência" do capitalismo não é o egoísmo ?? Por qual razão um empresário que recebe inúmeras subvenções estatais deveria abdicar disso em nome de um "capital cívico", em nome da "democracia" (palavras tão vagas quanto "bem comum")??
Em síntese: o capitalismo não parece tender a uma "degeneração", em virtude do hiper-individualismo (pois no fundo, tudo parece se resumir ao "salve-se quem puder")?
Afinal, caímos na velha dúvida de quem veio primeiro: o capitalismo ou a corrupção...?? (a minha pergunta não é retórica, estou apenas colocando um ponto de vista)
Meu Jesus Cristinho, dê-me forças!!
ResponderExcluirRealmente a incapacidade de interpretação de texto neste país é colossal!!
No meu escrito CAPITALISMO LIBERAL, SIM; EMPRESARIADO PRIVADO, NÃO, apenas e tão-somente quero dizer que a defesa do liberalismo econômico deve focar o interesse do consumidor, ou seja, de todos os cidadãos, de ter acesso a produtos e serviços de melhor qualidade e com menores preços. Isto porque, como o artigo do italiano deixa claro, o empresariado nem sempre está alinhado ao liberalismo e ao respeito aos direitos dos destinatários dos seus produtos e serviços, motivo pelo qual o regime de liberdade econômica não deve ser com ele identificado, como costuma acontecer. Só isto.
Muita gente associa o liberalismo ao empresariado e por tal razão o abomina. O empresário, sobretudo no Brasil, é visto, e nem sempre injustamente, como um indivíduo ganancioso e inescrupuloso que não pensa no bem da sociedade em que vive. É claro que nem todo empresário tem esse perfil, mas há os que o têm.
Será preciso que eu desenhe para me fazer entender?
Servidor público liberal