Rodrigo Constantino, O GLOBO
O
Japão está em crise há décadas. A Europa está em grave crise. Os Estados Unidos
cada vez se parecem mais com a Europa. Não seria exagero falar em uma grande
crise das democracias modernas. O que pode explicar tal fenômeno?
A
esquerda vai apontar para os bodes expiatórios de sempre: o capitalismo, o
liberalismo, o individualismo. E a esquerda vai errar o alvo, como sempre. Foi
o capitalismo liberal com foco no indivíduo que tirou milhões da miséria e
permitiu uma vida mais confortável a essa multidão. Quem está mais longe desse
sistema, está em situação muito pior.
O
que explica as crises atuais então? Claro que um fenômeno complexo tem mais de
uma causa. Mas eu arriscaria uma resposta por meio de um antigo provérbio
conhecido: avô rico, filho nobre, neto pobre. Isso quer dizer, basicamente, que
o próprio sucesso planta as sementes do fracasso, só que de outra geração.
Somos
os herdeiros de uma geração mimada, que colheu os frutos do árduo trabalho de
seus pais, acostumados com vidas mais duras, com guerras, com diversas
restrições. Essa geração, principalmente na década de 1960 e 70, pensou que
bastava demandar, e todos os seus desejos seriam atendidos, sabe-se lá por
quem.
Acostumados
com o conforto ocidental, essas pessoas passaram a crer que a opulência era o
estado natural da humanidade, e não a miséria. Em vez de pesquisar as causas da
riqueza das nações, como fez Adam Smith, eles acharam que bastava distribuir
direitos e jogar a conta para o governo.
O
Estado se tornou, nas palavras de Bastiat, “a grande ficção pela qual todos
tentam viver à custa de todos”. O conceito de escassez foi ignorado, e muitos
passaram a acreditar na ilusão de que basta um decreto estatal para se obter
crescimento e progresso. Vários olharam para esse deus da modernidade em busca
de milagres.
Foi
assim que a impressão de moeda por bancos centrais passou a ser confundida com
criação de riqueza. Ou que gastos públicos passaram a ser sinônimo de estímulo
ao PIB, colocando o termo “austeridade” na lista dos inimigos mortais. O
crédito sem lastro para consumo passou a ser visto como altamente desejável, e
a poupança individual como algo prejudicial ao crescimento econômico.
Toda
uma geração acreditou que era possível ter e comer o bolo ao mesmo tempo,
esquecendo o alerta de Milton Friedman, de que não existe almoço grátis.
Esmolas estatais foram distribuídas a vários grupos organizados, privilégios
foram criados para várias “minorias” e o endividamento público explodiu.
O Estado de
bem-estar social criou uma bomba relógio, mas ninguém quer pagar a fatura.
Acredita-se que é possível jogá-la indefinidamente para frente. Os banqueiros
centrais vão criar mais moeda ainda, os governos vão gastar mais e assumir
novas dívidas, as famílias vão manter o patamar de consumo e tomar mais
crédito, e todos serão felizes. E ai de quem alertar que isso não é possível:
será um ultraconservador reacionário e radical.
A postura
infantil se alastrou para outras áreas além da econômica. Os adultos agem como
adolescentes e delegam ao governo a função de cuidar de seus filhos e de si
próprios. O paternalismo estatal assume que indivíduos não são responsáveis,
mas sim mentecaptos indefesos que necessitam de tutela.
Intelectuais
de esquerda conseguiram convencer inúmeras pessoas de que elas não são
responsáveis por suas vidas, e sim marionetes sob o controle de forças maiores
e determinísticas. Roubou alguém? É vítima da sociedade desigual. É vagabundo?
Culpa do sistema. Matou uma pessoa? A arma é a culpada, e a solução é desarmar
os inocentes.
Notem que o
mundo atual exime de responsabilidade o indivíduo de quase todas as atrocidades
por ele cometidas. Sob a ditadura velada do politicamente correto, ninguém mais
pode dar nome aos bois e colocar os pingos nos is. Os eufemismos são a regra, e
a linguagem perdeu seu sentido. O criminoso vagabundo é a vítima, e sua vítima
é o verdadeiro culpado: quem mandou ter mais bens?
Portanto,
engana-se quem pensa que para sair dessa crise precisamos de mais do mesmo:
mais crédito, mais dívida pública, mais gastos de governo, mais impostos sobre
os ricos e mais impressão de moeda. Não! A receita proposta por Obama e
companhia é o caminho da desgraça. Ela representa estender artificialmente a
“dolce vita” dos filhos nobres (e mimados), como se o dia do pagamento nunca
fosse chegar. Ele chega, inexoravelmente.
Os netos
pobres seremos nós, ou nossos filhos, se essa trajetória não mudar logo. A
crise não é apenas econômica; ela é moral.
- excelente texto, sintetiza muito bem a realidade da crise e descontrole da sociedade.se puder autorizar eu gostaria de divulgar seu texto no meu blog - com os devidos creditos de sua autoria.
ResponderExcluirNão é que Obama desconheça a solução correta, mas é que ela é muito custosa politicamente. É mais fácil dar um jeitinho e jogar a conta (com adição de juros) na geração seguinte. Até lá ele não vai estar mais por aí mesmo... Pensamento de curto-prazo, sempre. Parece até que está importando a filosofia de algum país mais ao sul...
ResponderExcluirPerfeito!
ResponderExcluirCaro Constantino. Excelente texto, sem dúvida, e sintetiza, de forma planetária, a situação financeira do establishment. Apenas tomo a liberdade de comentar que, com relação aos EUA, sua crítica à proposta de Obama para o segundo mandato à frente da Casa Branca deixou no leitor um vazio que pode ser interpretado como um elogio à plataforma republicana, cuja emenda é ainda pior do que o soneto. Não nos esqueçamos da herança pesada e perdulária que ele herdou de oito anos de governo Bush e duas guerras externas.
ResponderExcluirBobagem. Irlanda, Espanha e Islândia eram cultuados como exemplos do capitalismo liberal. Vc mesmo num artigo fez diversos elogios à Irlanda. Depois que quebrou, aí deixou de ser o "tigre celta" ? Que tinha uma das menores cargas tributárias do mundo ?
ResponderExcluirExcelente texto! Claro e preciso, disse tudo sobre o que realmente nos conduziu a esse ponto. Entenda quem quiser!
ResponderExcluirE os filhos e netos apesar de estarem pobres e já terem se transformado em sem fábricas ou sem industrias e falidos, ainda continuam chefiando os cartéis legalizados das associações de classes patronais que continuam fazendo lobbies junto ao governo para que proteja os sem méritos e nem competências. E alguns que se diziam capitalistas na hora de privatizar os lucros já estão pedindo penico e até se associando à petralhada almejando cargos eletivos inclusive para governador em 2014. Até já aprendeu a mentir mais que a presidente, dizendo na telinha que conseguiu reduzir em 20% o custo da energia elétrica. Somos confiáveis? Jamais, pois por aqui nem o próprio STF faz valer as regras da lei e o próprio governo é um grande criador de insegurança jurídica. Quem é louco de investir em quem não é confiavel?
ResponderExcluirO problema é que o mundo caminha a passos largos no caminho da servidão. É patético chamar esse sistema que predomina na maior parte do mundo de capitalismo. Estamos vivendo a era do fascismo democrático.
ResponderExcluirE o Brasil está neste barco furado...né presidenta.
ResponderExcluirConcordo com as " facilidades" destruindo as conquistas do passado. Sou engenheiro e vejo os jovens ricos em conhecimentos rápidos e prontos; poucos vão em busca de soluções e verificações práticas porém de esforço, eles querem mandar e controlar papéis...
ResponderExcluirParabéns pelo texto!
Gostei!
ResponderExcluirhttp://www.estadao.com.br/noticias/nacional,procurador-decide-pedir-investigacao-de-acusacoes-de-valerio-contra-lula-,982004,0.htm
ResponderExcluirBom artigo, isso ai mesmo...... "avô rico, filho nobre, neto pobre" Meu pai me repete essa frase a vida inteira... Nada mais verdadeira, conheço algumas familias com essa "trajetoria"...
ResponderExcluirPerfeito!!
ResponderExcluirPERFEITO!!!
ResponderExcluirSimples assim, "Somos uma geração do meio da história" Tayler Durden.
ResponderExcluirRodrigo Constantino sempre LONGE da realidade do povo. O discurso nunca alcança a parcela social que fará o país mudar: O POVÃO. Os discursos sempre vêm validar o ponto de vista de gente que já está nervosa e é instruída (e tem algum conhecimento d autores liberais). Passar as idéias à prática exige um modo mais direto de ataque à ineficiência. E não qo povo é burro, mas o povo não tem paciência p "teorias". Propor ações de forma mais OBJETIVA ajudaria a ser aceito por quem importa. Falar contra Estado... "neto pobre".. e não oq... é muito metafísico. É vago. O discurso não mudou.. nem mudará. É uma pena.
ResponderExcluirExcelente artigo! Vai no X da questão. O problema de fato é moral! A verdadeira e única revolução de que a sociedade precisa neste momento é a recolução da vergonha na cara!
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