domingo, julho 29, 2007

Os Proletários Cubanos



Rodrigo Constantino

“Tudo que é necessário para o triunfo do mal é que os homens bons nada façam.” (Edmund Burke)

O termo proletário vem do latim proletarius, que na Roma antiga designava o cidadão de posição socioeconômica inferior na sociedade. Enquanto o rico pagava um tributo ao Estado fixado em lei, o mais pobre ficava isento de impostos, sendo útil ao Estado apenas pelos filhos que procriava. Ou seja, pela sua prole, fornecendo assim indivíduos para uso em guerras ou para a cobiça patronal do Estado. Os socialistas fingem lutar pela liberdade do proletariado, mas no fundo, o socialismo é justamente uma fábrica deles. Cuba é um exemplo claro. A ilha caribenha é vista como propriedade particular de Fidel Castro, que aponta seu irmão como seu sucessor, como se fosse um monarca dono da nação. E o povo é tratado como propriedade do “El comandante”, sem liberdade até mesmo para ir e vir, a mais básica de todas.

A delegação cubana abandona o PAN antes do término, saindo às pressas sob rumores de que haveria uma deserção em massa. Uma cena deprimente, lamentável de assistir. Um povo obrigado a viver naquele presídio miserável. O “paraíso” socialista que precisa prender o próprio povo, ameaçar de morte os súditos para que não deixem a ilha em busca de liberdade, tal como o muro de Berlim fazia. Ainda assim, não é suficiente, pois há um impulso natural pela busca da liberdade na maioria dos homens. Muitos cubanos enfrentam os perigos de um paredón e os riscos de tubarões para tentar atravessar para a Flórida, em busca da liberdade. Desejam romper com os grilhões socialistas. Querem apenas uma oportunidade de ser feliz. Não agüentam mais tanta miséria e escravidão, resultado inexorável do socialismo.

Os atletas cubanos são parte especial do povo sofrido e miserável. Todo país socialista sempre investiu muito no esporte, como vitrine internacional do regime, como propaganda enganosa da situação interna. Governos opressores e ditatoriais, de forma geral, sempre foram assim. Grandes espetáculos para os outros verem, ícones megalomaníacos para ocultar a realidade caótica. A União Soviética tinha que competir com os Estados Unidos nas coisas visíveis ao mundo, e por isso tanto investimento nos esportes, enquanto o povo não tinha nem mesmo pão para comer. Um Sputnik no céu e prateleiras vazias na terra. Os que vibram com essa “conquista” nos esportes e na ciência ignoram que os recursos são escassos, e aquilo que não se vê é toda a miséria gerada para que o governo desvie recursos para estas áreas, em busca apenas de propaganda externa. Qualquer país pode mostrar resultados surpreendentes num setor se escravizar o povo e investir tudo nessa área, mas o preço pago será alto demais, como foi em todas as nações socialistas. Para Cuba ficar com a medalha de prata nos jogos pan-americanos, é preciso retirar recursos de setores básicos para o bem-estar da população, tudo em nome do marketing político. E ainda existem idiotas úteis que realmente caem neste golpe! Enquanto isso, os americanos levam o ouro sendo a nação mais rica do planeta, e com ampla liberdade individual. Que abismo entre o socialismo e o capitalismo!

Tudo em Cuba é patético. O mito da medicina cubana ainda é defendido por alguns, que ignoram a realidade dos fatos. Qual a grande contribuição cubana à medicina mundial, com a exceção talvez do caso do vitiligo? Alguém realmente consegue acreditar que o povo tem acesso à boa saúde e educação? Faltam os remédios mais básicos, as instalações são precárias, e as crianças são doutrinadas ideologicamente, tendo que escutar que o socialismo é uma maravilha enquanto enxergam uma realidade diametralmente oposta nas ruas. Um professor tem que sobreviver com pouco mais de US$ 10 mensais, sem liberdade alguma, enquanto repete que o socialismo é perfeito. A dissonância cognitiva é o único resultado possível. Cria-se uma tendência para a imoralidade, para a mentira e o auto-engano. A devastação moral é total, ao ser forçado a viver num país caótico tendo que repetir que tudo é fantástico.

Muitos “intelectuais” brasileiros ainda adoram Cuba – bem de longe, do conforto do capitalismo. Escolhem Paris para passar as férias, mas enaltecem os “avanços” cubanos. Não são obrigados a viver naquela prisão. Não passam de hipócritas! Culpam o embargo americano pela miséria em Cuba, ignorando que ao mesmo tempo condenam a globalização e chamam de “exploração” o comércio com os americanos. Tanto o embargo como a ALCA são igualmente condenados. A contradição lógica nunca foi empecilho para quem não tem honestidade intelectual.

Alguns preferem inclusive reclamar do “suborno” dos capitalistas alemães que pagaram mais e levaram os boxeadores cubanos para a Europa. Da próxima vez que alguém em São Paulo contratar um cearense pagando vinte vezes mais do que ele ganha lá, lembre-se que isso é “suborno”, segundo esses idólatras do fracasso, defensores do socialismo. Sem falar que o simples fato de não poder ir livremente para onde se deseja é algo que deveria enojar qualquer defensor da liberdade. O indivíduo é tratado como propriedade do governante, não como alguém livre. Mas isso é um detalhe bobo para a corja de bajuladores do ditador caribenho, chamado curiosamente de “presidente” por muitos na mídia nacional. Nosso próprio presidente veio a público comentar a morte do ex-ditador Pinochet, condenando as ditaduras enquanto é amigo do pior ditador que a região já teve. Melhor não tentar entender os conceitos morais dessa turma.

Se até mesmo os atletas, que são arma de propaganda comunista, querem fugir de Cuba, imaginem como vive o pobre povo! Não é preciso imaginar, na verdade. Temos muitos relatos de gente que não sofreu lavagem cerebral e esteve lá, visitando aquele inferno. Os relatos e as imagens são chocantes. E a mídia não pode livremente entrar e mostrar as cenas, pois isso seria “golpismo burguês”. O negócio é fechar os olhos do mundo para o que ocorre lá dentro, investir em alguns atletas e repetir mentiras até que se tornem “verdades” para os que não podem verificar, como ocorre com o mito da saúde cubana. E os “intelectuais” e artistas tentam de qualquer maneira convencer o nosso povo de que a experiência cubana é louvável. O povo não é tão idiota. Na hora de partir em busca de melhores oportunidades, não tem ninguém que escolhe Cuba. Nem mesmo os tais “intelectuais” e artistas! Todos tentam ir para os Estados Unidos mesmo.

Deu pena de ver os atletas cubanos tendo que retornar para a prisão antes do encerramento do evento esportivo. Quem compactua com isso, quem ainda consegue defender esse regime opressor e assassino, merece todo o desprezo do mundo. As pessoas íntegras não devem tolerar a intolerância e aceitar como uma simples “divergência de opinião” o apoio a algo tão nojento como o regime cubano. Chega de dois pesos e duas medidas! Devemos tratar os defensores do modelo cubano como tratamos os defensores do nacional-socialismo de Hitler. Quem faz diferente demonstra não se importar com os proletários cubanos, vítimas da opressão socialista. A ignorância apenas não pode mais justificar a defesa de algo tão bizarro como a ditadura cubana. Tem de existir um forte desvio de caráter mesmo! E pessoas honestas e íntegras não devem se misturar com pérfidos sem caráter. Diga-me com quem andas que te direi quem és. Pessoas de bem, defensoras da liberdade, não devem se misturar com gente que consegue defender alto tão podre como Fidel Castro. Cuba é um lixo, e todos que querem fugir de lá atestam isso. Mas lixo ainda pior é o hipócrita que insiste em defender aquilo de longe. O melhor castigo para essa escória seria ter que viver lá, como um simples proletário cubano. Iriam sentir na própria pele o que é viver num inferno socialista, que tanto defendem do conforto de suas casas. Chega de tanta hipocrisia!

sexta-feira, julho 27, 2007

Monopólio Esquerdista


Rodrigo Constantino

O apagão aéreo e a reação do governo diante da crise que se abateu sobre o país demonstram claramente que o setor público não tem condições de gerir este importante setor da economia. Não existem mecanismos adequados de incentivos para premiar os acertos e punir os erros. A politicagem toma conta do setor, culminando nos gestos obscenos de Marco Aurélio Garcia e seu auxiliar, comemorando a suposta responsabilidade da TAM em vez do governo. Cada órgão estatal joga a culpa para outro lugar, e as soluções não chegam. O governo, diante de um problema de gargalo na oferta, resolve simplesmente reduzi-la, fechando pistas e fazendo os consumidores buscarem refúgio nos ônibus. Seria como um empresário do ramo de bebidas, diante da dificuldade de atender a crescente demanda, preferir apenas não vender mais, incentivando os clientes a buscarem substitutos. Se existe fila, em vez de aumentar a produção, opta-se por mandar os consumidores embora.

A busca pelo lucro é a garantia de que os empresários farão o melhor possível para atender a demanda dos consumidores. Sim, isto inclui o quesito segurança também, pois a credibilidade de uma empresa é seu principal ativo no longo prazo. E, ao contrário do que o consenso diz, é o setor privado que tem incentivos para mirar no longo prazo, já que o capital é próprio e seu valor aumenta na medida em que os lucros futuros são maiores. Por isso a Wal-Mart não sai vendendo produtos podres buscando ganhos maiores de imediato, mas que a levaria à bancarrota com o tempo. Já o setor público foca no curto prazo, pois o mandato político é limitado e o governante é apenas um usuário dos ativos, não seu dono. Há um claro incentivo para que o governante foque somente no presente, deixando a conta da irresponsabilidade para outros governantes. Basta pensar na construção de uma ponte ou estrada. Se é uma empresa privada que irá construí-la e usufruir de seus ganhos, há um claro interesse em fazer algo de qualidade, maximizando a geração de caixa ao longo do tempo. Mas se é o governo quem fará a ponte, o governante tem interesse em fazê-la com o material mais barato possível, ficando com orçamento disponível para outras obras que conquistam votos. Se der problema no futuro, a ponte não é dele mesmo, e o ônus político será de outro governante qualquer.

Não é difícil compreender essa lógica capitalista. E menos difícil ainda é checar as evidências empíricas disso. No próprio setor aéreo, vários países privatizaram os seus aeroportos, mostrando uma eficiência muito maior depois, como sempre ocorre com privatizações. Mas no Brasil ainda é falar grego defender o óbvio em economia. Uma mentalidade atrasada condena o lucro e o setor privado, optando por um governo gestor de empresas, que será sempre mais ineficiente e corrupto. E o lamentável é que essa visão retrógrada não é exclusividade do PT. Vimos Alckmin fugir da defesa das privatizações enquanto candidato a presidente, ainda que os números das privatizações realizadas durante o governo FHC falem por si só. Nem mesmo os petistas gostariam de um retorno da Telebrás! E eis que agora, diante dessa crise no setor aéreo, o governador de São Paulo, José Serra, (de)formado pela Cepal, ataca a privatização também: "Privatizar a Infraero não vai resolver rigorosamente nada; pode dar um dinheirinho no início que vai se perder depois porque tem que remunerar os lucros". É triste constatar que existe praticamente um monopólio da mentalidade esquerdista em nossa política. E mais triste ainda é verificar que muitos ainda culpam o "neoliberalismo", mais distante do Brasil do que Plutão da Terra, pelos nossos males, culpa justamente da falta de liberdade econômica.

segunda-feira, julho 23, 2007

Democracia e Imigração


Rodrigo Constantino

"Nenhuma democracia pode sobreviver muito tempo à decadência moral de seu povo, pois a abdicação de autocontrole de sua parte é um convite à tirania." (Michael Novak)

A leitura de Democracy: The God That Failed, o polêmico livro de Hans-Hermann Hoppe, suscita inúmeros questionamentos interessantes, mesmo quando o leitor não concorda com todas as conclusões do autor, um grande descrente da democracia e defensor do anarco-capitalismo. Em um dos capítulos, Hoppe levanta a questão da democracia mundial, pedindo para o leitor imaginar como seria um governo mundial democraticamente eleito de acordo com o princípio de uma pessoa, um voto. Provavelmente, haveria algo como uma coalizão entre Índia e China, que por suas expressivas populações, venceriam facilmente. E o que este governo democraticamente eleito faria para agradar seus eleitores e ser reeleito? O governo iria, provavelmente, pregar uma distribuição de renda dos países mais ricos, como Estados Unidos e Japão, para esses países mais pobres e de numerosas populações.

A mesma idéia vale dentro de uma nação, e o governo democraticamente eleito tende a partir para o populismo, pregando tirar na marra a riqueza dos mais ricos e distribuí-la entre os mais pobres, em maior quantidade. Este risco não é novidade e, por causa dele, muitos pensadores antigos não demonstraram muito apreço pela idéia da democracia, vista aqui como a simples ditadura da maioria. Aristóteles já havia abordado o paradoxo em Política, ao perguntar: "Se, por serem superiores em número, aprouver aos pobres dividir os bens dos ricos, não será isso uma injustiça?". Os "pais fundadores" dos Estados Unidos tinham esse risco em mente, e por conta disso defenderam uma República constitucional, buscando ao máximo limitar o poder arbitrário das massas. O Bill of Rights tinha como objetivo justamente a proteção individual contra o próprio governo.

Uma democracia pura e simples, onde o voto da maioria decide tudo, acaba levando a este tipo de injustiça, onde a propriedade privada cede lugar à espoliação, ainda que legal. Evitar este perigo é uma tarefa muito complicada, ainda mais quando a democracia passa a ser vista por muitos como um fim em si, e não como um meio para a preservação do verdadeiro fim, a propriedade privada. Quanto maior for o território, mais complexa será a solução, pois o ambiente fica ainda mais propício para que espoliadores roubem suas vítimas desconhecidas. Em locais menores, onde os cidadãos se conhecem, este risco é mitigado. Eis um dos bons argumentos para a defesa do federalismo e do princípio da subsidiariedade, que tem por objetivo assegurar uma tomada de decisões o mais próxima possível dos cidadãos. Aquilo que pode ser feito pelo próprio indivíduo, assim deve ser feito. Em seguida, passa-se para o âmbito familiar, depois o bairro, município, estado e por fim governo federal, que cuidaria de muito pouca coisa, somente o básico geral.

Hoppe defende em seu livro o direito à secessão, como uma importante medida protetora da propriedade privada e inibidora da voracidade espoliadora do governo democraticamente eleito. Para ele, a secessão sempre envolve a quebra de populações maiores em menores, representando, portanto, um voto contra o princípio da democracia, da tirania da maioria. As relações domésticas hegemônicas são substituídas por relações estrangeiras contratuais, logo, mutuamente benéficas. Ao invés de uma integração forçada, ocorre uma separação voluntária. A secessão, segundo o autor, iria estimular um processo cooperativo de seleção e avanço cultural. Os pequenos territórios seriam mais dependentes das trocas externas, e teriam incentivos para manter uma economia aberta. Cingapura, Hong Kong, Suíça e Mônaco seriam exemplos mais próximos dessa realidade. Um governo sob a constante ameaça da possibilidade de uma secessão pacífica terá fortes incentivos para reduzir os impostos e a espoliação. Os cidadãos estariam livres para votar com os próprios pés, e isso dificultaria muito a centralização de poder, sempre prejudicial à liberdade individual.

Aqueles brasileiros que celebram o feriado de Tiradentes deveriam ter em mente que a Inconfidência Mineira era justamente um movimento separatista, inspirado na revolução americana de 1776. Com a "derrama", o aumento de impostos pela Coroa portuguesa, um quinto do ouro produzido deveria ser transferido para o governo, e isso gerou a revolta popular. Atualmente, quase o dobro desse montante é confiscado pelo governo central, mas o fato de tal espoliação ser democrática gera enorme passividade nos súditos, que acreditam na democracia como um governo "do povo para o povo". Ora, se fosse isso mesmo, para que seria preciso o governo como intermediário? Por que não devolver simplesmente o poder ao povo, a cada indivíduo?

Sendo a democracia a escolha da maioria, haverá uma tendência natural de um governo democrático migrar para o modelo de welfare state, tirando boa parte da propriedade privada dos indivíduos em nome do "bem público". Esta forma de governo logo levanta uma importante questão: a imigração. Se um governo vai taxar pesadamente os mais ricos em nome do "bem-estar geral" da nação, oferecendo então moradias, hospitais, escolas, espaços de lazer, seguro-desemprego, enfim, uma "vida digna gratuita" para todos, como evitar que inúmeros parasitas do mundo todo migrem para esta nação em busca dessa gama de serviços gratuitos? O welfare state acaba, naturalmente, incitando um sentimento de xenofobia em seu povo. Aqueles que já conseguiram, em nome do "bem comum" e através da democracia, extrair o máximo de riqueza produzida pelos indivíduos mais capazes, não desejam competição. Um grande fluxo migratório de parasitas e de vagabundos iria reduzir muito a qualidade dos serviços, pois a quantidade de hospedeiros seria mantida constante. Se todos os pobres do mundo pudessem migrar livremente para a Noruega, como ficaria a qualidade de vida desse pequeno e rico país? Nem mesmo todo aquele petróleo seria suficiente para salvar todos da completa miséria, mantendo-se o modelo atual de governo bem-feitor.

Não custa lembrar que os Estados Unidos foram criados à base da imigração, mas naquele tempo o governo ainda era mínimo e não oferecia todas as regalias típicas do welfare state. Assim, o país atraía, normalmente, os indivíduos com espírito empreendedor, individualistas que estavam em busca de trabalho duro e oportunidades para o próprio sustento. Eram pessoas que fugiam justamente de países com maior intervenção estatal, buscando a ampla liberdade individual oferecida lá. Os Estados Unidos, por sua maior garantia à propriedade privada, sempre foi o destino preferido do "brain drain" mundial, atraindo os melhores intelectos e empreendedores do mundo todo.

Os defensores incondicionais da democracia e da livre imigração enfrentam um paradoxo, já que este mundo idealizado por eles seria, muito provavelmente, a idealização da mediocridade. Não haveria incentivos para ser mais eficiente e produtivo, já que qualquer um menos eficiente e produtivo, no mundo todo, teria direito a uma fatia dessa produção através do voto, não de trocas voluntárias. Levando o princípio da democracia ao extremo, e assumindo a liberdade de imigração, teríamos o caso abordado no começo do artigo, de uma democracia mundial. O welfare state seria bancado na marra com o dinheiro dos americanos e japoneses, beneficiando os indianos e os chineses. Somente quem acha que o mais rico tem uma obrigação moral de trabalhar forçado como escravo para os mais pobres de todo o mundo, defenderia tal coisa. Um rico canadense, por exemplo, teria o dever legal de sustentar um pobre da Jamaica. Seria a tirania da maioria em escala planetária! Não há absolutamente nada de moral nisso, sem falar da destruição de riqueza que este modelo iria gerar. Afinal, o que gera riqueza mesmo não é a democracia, seja ela dentro de uma fronteira arbitrariamente definida ou no mundo todo. O que gera riqueza é o direito de propriedade privada, que corre muito perigo na democracia se mecanismos de defesa não forem adotados.

quinta-feira, julho 19, 2007

Novo Lada




Uma imagem pode valer mais que muitas palavras...

quarta-feira, julho 18, 2007

Tragédia Anunciada


Rodrigo Constantino

Em menos de um ano, mais uma tragédia de proporções assustadoras acontece no setor aéreo, a maior já registrada no país. Juntando o acidente da Gol com este da TAM, estamos falando de quase 400 mortos! Ainda é cedo para apontar com certeza os culpados, mas há evidências de que as pistas do Congonhas, sem as ranhuras necessárias para a melhor frenagem dos aviões, levaram o avião a derrapar. Na tentativa de arremeter, o piloto teria perdido o controle e batido no prédio da própria empresa, causando a explosão. São as especulações que parecem mais plausíveis no momento. Mesmo que tenha ocorrido falha humana, a tragédia possivelmente seria evitada se a pista do aeroporto fosse maior se mais segura.

Em primeiro lugar, gostaria de registrar minha profunda tristeza pelas vítimas e seus familiares e amigos. Eu tinha parentes que estavam prestes a aterrizar no mesmo aeroporto, e posso apenas imaginar o desespero dos que perderam familiares na catástrofe. A dor deve ser insuportável. Sei inclusive que o momento não parece o mais adequado para falar de política, mas por outro lado, entendo que justamente nesses momentos de maior angústia e revolta, devemos compreender as possíveis causas. Somente assim novos acidentes poderão ser evitados. Quando o choque das pessoas passar, muitos vão simplesmente ignorar o que pode estar por trás desse caos aéreo, que coloca tantas vidas em risco desnecessário. Mesmo que nesse caso específico fique comprovada a ausência de culpa da Infraero, o fato é que a estatal tem sido totalmente negligente e irresponsável. E isso é algo inadmissível, que tem solução relativamente simples.

Li muitos comentários de pessoas revoltadas com a postura do governo nessa crise, mas creio que a maioria foca no lugar errado. Sem dúvida este governo tem sido irresponsável em inúmeros aspectos, sem falar dos comentários mais que infelizes de certos membros. Trata-se de um desgoverno, na verdade. Mas o ponto principal é que o setor público não conta com os incentivos adequados para resolver estes tipos de problemas. O PT é mais incompetente, sem dúvida. Mas falta um mecanismo correto de punição pelos erros e prêmios para acertos no setor público em geral. Muita gente no Brasil ainda condena o fator lucro como motivador de empresas, ignorando completamente sua fundamental importância na eficiência dos serviços prestados. Se a Infraero fosse uma empresa privada, uma catástrofe desta magnitude poderia facilmente levá-la à bancarrota. Basta imaginar a pressão que todos fariam, inclusive o governo, sem falar das escolhas dos consumidores. Isso parece um incentivo bem razoável para que qualquer empresário ganancioso faça o máximo possível para evitar tais acidentes. O governo será invariavelmente um pior gestor, pois falta este tipo de incentivo. Basta verificar a espantosa melhoria de qualidade em todas as empresas privatizadas. Alguém lembra como era a Telebrás estatal? Não há porque ser diferente com aeroportos. Inclusive, vários foram privatizados mundo afora, e operam com eficiência infinitamente maior que os nossos estatais. A Infraero deve ser privatizada, ponto!

Falar em privatização agora pode parecer frieza de minha parte, mas é justamente o contrário. As vidas perdidas, provavelmente por uma negligência assassina da estatal, ao que tudo indica, não podem ser resgatadas. Aos familiares que ficam, resta lamentar profundamente e desejar que sejam capazes de superar tal tragédia. Uma mãe perdeu dois filhos adolescentes de uma vez! Mas podemos fazer algo quanto aos que ainda estão vivos. Podemos evitar novas desgraças como esta. Podemos salvar vidas no futuro. O meio de fazer isso é delegar ao setor privado a gestão do setor, pois este será sempre mais eficiente, por causa dos incentivos presentes. Quantas vidas não são perdidas todo ano em acidentes de trânsito, por exemplo, por causa de estradas em péssimo estado? As pessoas precisam acordar para o elo de ligação causal entre gestão pública e risco desnecessário de vida. As mãos do governo estão sim sujas de sangue inocente. Isso vale para as criminosas condições em nossas estradas, para a violência urbana e também para os acidentes aéreos. Esta enorme tragédia foi anunciada. O governo nada fez que pudesse reduzir as chances dela ocorrer. É hora de dar um basta! Estão brincando com muitas vidas. O povo não pode perder a capacidade de se indignar!

terça-feira, julho 17, 2007

Os Perigos da Democracia


Rodrigo Constantino

“A democracia consiste em escolher seus ditadores, depois que eles te disseram aquilo que você pensa que é o que deseja escutar.” (Alan Corenk)

Polêmico é a primeira palavra que vem à mente após a leitura de Democracy: The God That Failed, de Hans-Hermann Hoppe. O autor é um anarco-capitalista que defende a propriedade privada, mas questiona a necessidade de existência do Estado. No livro, ele faz uma intrigante comparação, tanto teórica como histórica, entre a monarquia hereditária e a democracia. Seu ponto de vista é econômico e parte de premissas axiomáticas sobre a ação humana e sua reação aos incentivos. Seu principal argumento é que, encarando o Estado como uma propriedade privada, a monarquia terá maiores incentivos para um planejamento de longo prazo e, portanto, preservação do capital, enquanto a democracia irá estimular o consumo imediato dos ativos, já que o governante é apenas um usuário temporário dos recursos. Ainda que o leitor não saia convencido de todos os argumentos de Hoppe – como foi o meu caso – o livro tem muita validade para alertar sobre muitos riscos de fato ignorados nas democracias, que podem colocar em xeque o que deveria ser a sua própria finalidade, isto é, a preservação da liberdade individual.

Antes, porém, é justo frisar que Hoppe, apesar de uma pintura mais favorável da monarquia em relação à democracia, não é um monarquista. Sua postura é que se deve existir um Estado, definido como uma agência que exerce um monopólio territorial compulsório de jurisdição e taxação, então seria econômica e eticamente mais favorável escolher uma monarquia em vez de uma democracia. Mas ele defende que uma “ordem natural” seria possível e preferível, através do “autogoverno” dos indivíduos. Em suas palavras, “a escolha entre monarquia e democracia envolve uma escolha entre duas ordens sociais defeituosas”. Hoppe destaca os estudos de Mises e Rothbard como suas grandes influências positivas, pela postura anti-estatizante e pró-livre mercado de ambos. Mas reconhece que os dois autores viam a transição da monarquia para a democracia como um progresso, diferente do seu caso, onde esta mudança é vista como um aumento de risco para a propriedade privada.

A violação dos direitos de propriedade pode ser de duas formas distintas: pode ocorrer através da atividade criminosa, ou pode ser por uma interferência governamental institucionalizada. O crime exerce uma influência sobre as preferências temporais semelhante a uma catástrofe natural. Ele reduz a oferta de bens presentes da vítima e, portanto, aumenta sua taxa de preferência temporal, fazendo com que o indivíduo passe a alocar mais recursos para o consumo presente e menos para a poupança. Basta pensar no exemplo de uma enchente, demandando recursos para a construção de diques que não seriam necessários na ausência do risco natural de catástrofe. Hoppe argumenta que este caso, por ser esporádico, força um ajuste único na taxa de preferência temporal, sem grandes impactos duradouros. Em compensação, a violação do governo, por ser vista como legítima e ser contínua, afeta permanentemente esta taxa de preferência, reduzindo estruturalmente a alocação de recursos para investimentos produtivos em capital e aumentando a necessidade de consumo corrente. O efeito econômico disso é perverso, pois o aumento futuro da produção depende do investimento em bens de capital, possível somente através da redução no consumo imediato.

A analogia que Hoppe faz é com uma criança que ainda não tem noção adequada de tempo e acaba optando por consumir tudo que pode de uma vez. O sinal claro de maturidade ao decorrer dos anos é compreender que só é possível consumir mais no futuro se sacrificar consumo presente. O mesmo vale para uma sociedade, e o sinal de decadência seria uma baixa propensão a poupar. Como a expropriação do governo gera justamente este efeito, ela é vista como incentivo à decadência, e quanto maior for esta expropriação, maior será também a decadência.

Todo governo irá usar seu monopólio de expropriação para seu próprio benefício, de forma a maximizar sua riqueza ou renda. Logo, deve ser esperado de todo governo uma tendência natural em direção ao próprio crescimento. Para Hoppe, um rei que fosse dono do seu governo territorial iria evitar uma taxação exagerada, pois isso iria reduzir o potencial de ganho futuro, reduzindo, por conseguinte, o valor presente de seu reino. Valeria o mesmo princípio de toda propriedade, onde o dono busca a maximização do seu valor presente. Por isso um dono de um automóvel cuida melhor do carro do que alguém que apenas aluga um. As pessoas tratam com mais cuidado daquilo que possuem como propriedade particular. Já na democracia, o governante tem todo o aparato a seu dispor, mas não possui nada disso para si. Ele controla somente o uso corrente dos recursos, e terá incentivos para maximizar os gastos presentes em vez da riqueza total. A moderação não seria uma vantagem para um governante eleito por um mandato temporário. Esperar seu altruísmo é ingênuo demais.

A ilustração que Hoppe dá entre a diferença fundamental do controle privado e público envolve a escravidão. Por mais abominável que seja a posse de escravos, o fato é que um escravo como propriedade privada ainda é algo menos perverso que escravos públicos. O dono de um escravo tem interesse em sua preservação e até mesmo capacidade produtiva, o que passa por alguns cuidados básicos de saúde, inclusive. Por contrapartida, um escravo público, como existiu na União Soviética, não recebe a mínima atenção. Como o governante não é dono de fato dos escravos, pouco importa se eles vivem ou morrem. Empiricamente falando, a escravidão comunista realmente levou infinitamente mais gente à morte que a escravidão privada de outros tempos. Claro que o ideal é condenar qualquer tipo de escravidão, algo absurdo por qualquer parâmetro ético ou moral, independente do que alguns relativistas possam achar. Mas não deixa de ser interessante analisar até mesmo a escravidão por esta ótica, mostrando que o descaso da propriedade pública é muito mais perigoso e perverso. O que é de “todos” não é de ninguém, e, portanto, ninguém cuida!

Seguindo esta linha de raciocínio, Hoppe continua argumentando e mostrando que a democracia estimula a irresponsabilidade do governante, tal como uma criança que não pensa no seu futuro ainda. O nível de endividamento, como não é responsabilidade do governante atual, tende a crescer bastante. As leis tendem a se tornar mais flexíveis e imprevisíveis, de acordo com as necessidades do momento. Uma mentalidade coletivista acaba predominando e ofuscando a responsabilidade individual. Os impostos acabam aumentando, assim como a emissão de moeda. A quantidade de funcionário público costuma explodir. A democracia acaba migrando para um welfare state, e a sensação de que todos participam do governo pode levar à complacência dos governados, no fundo explorados cada vez mais pelo governo. Após a teoria a priori, Hoppe mostra inúmeros dados históricos que realmente corroboram com sua tese, já que em todos os países que migraram de monarquia para democracia ocorreu um aumento estupendo do tamanho e interferência do governo na economia. Se antes a maioria dessas monarquias não arrecadava nem 10% da produção como impostos, hoje poucas democracias arrecadam menos de 30%. Se antes existiam poucas leis ditando a vida dos súditos, atualmente a legislação dessas democracias regula nos mínimos detalhes a vida privada. Se antes os reis tinham que manter um nível de endividamento confortável, pois eram os próprios responsáveis pelo débito, hoje os governos emitem trilhões em dívida pública e um bebê já nasce devendo uma fortuna. Se antes o padrão ouro era a regra, recentemente várias democracias viveram décadas de alta inflação por conta da emissão irresponsável de papel-moeda.

Nada disso, em minha opinião, justifica um retorno aos tempos de monarquias. Estou mais na linha de Mises e Rothbard, que viam como um progresso a transição para democracias. Porém, isso não nos impede de olhar com muita atenção para as críticas que Hoppe faz sobre a democracia. Encarar o modelo de voto da maioria como um deus é muito perigoso. O deus de fato falhou! Como disse Popper: “A diferença entre uma democracia e um despotismo é que, numa democracia, é possível livrar-se do governo sem derramamento de sangue; num despotismo, não”. Creio que Hoppe não diz muito sobre a possibilidade, nada descartável pela experiência histórica, desse déspota monarca não ser esclarecido ou racional, mas sim um lunático perigoso. Como Lord Acton disse, “o poder corrompe, e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Ou, citando novamente Popper, “não somos democratas porque a maioria sempre está certa, mas porque as instituições democráticas, se estão enraizadas em tradições democráticas, são de longe as menos nocivas que conhecemos”. A democracia parece mesmo o pior modelo que existe, excetuando-se todos os outros. Mas nada disso anula a importância das críticas de Hoppe. Jamais devemos esquecer que a democracia, como simples escolha da maioria, pode ser apenas a votação entre dois lobos e uma ovelha para o que jantar. Por isso acredito que o livro de Hoppe tem muita utilidade, lembrando que a democracia é um meio – bastante imperfeito, e não um fim em si. A fonte da civilização humana não é o governo, seja ele monárquico ou democrático, mas sim a propriedade privada, com a concomitante responsabilidade individual. O mais importante é buscar o esclarecimento dessa idéia, para que a democracia seja de fato o meio que levará a tal fim.

quinta-feira, julho 12, 2007

O Controle de Preços


Rodrigo Constantino

“O desejo de lucrar leva alguém a produzir coisas que os compradores querem e que não estão sendo produzidas excessivamente por outros vendedores.” (George Reisman)

Em 1979, com a crise do petróleo dominando os debates econômicos e o governo americano aumentando a interferência na economia através do controle de preços, George Reisman escreveu um livro sobre os efeitos destrutivos desse controle, chamado The Government Against the Economy. Em paralelo, o livro é uma excelente defesa do livre mercado, mostrando como o planejamento central é impossível na prática, sempre levando ao caos e totalitarismo. Reisman defende a teoria de que a inflação é um fenômeno monetário, causado pelo grande aumento na quantidade de moeda, sempre por culpa do governo. A estagflação que os Estados Unidos experimentaram na época em que o livro foi escrito era uma evidência disso, já que o governo tinha aumentado quase vinte vezes a quantidade de moeda desde o New Deal de 1933. Qualquer um que ainda acredita que a inflação é causada pela ganância de empresários e que a solução passa pelo controle de preços pelo governo deveria ler o livro com urgência.

O funcionamento do livre mercado passa pelo desejo dos empresários de lucrar e evitar perdas, o que leva a uma tendência de uniformização da taxa de lucratividade das indústrias, ajustada ao risco, já que os capitalistas buscam sempre mais retorno. Esse mecanismo força um ajuste dos erros cometidos, pela própria natureza auto-corretiva do mercado. Os consumidores, através de suas escolhas, podem alterar o padrão de seus gastos, forçando um deslocamento da produção para os bens mais demandados. Os empresários, então, são levados a agir praticamente como agentes dos consumidores, tendo que buscar satisfazê-los sempre. Para manter a lucratividade num ambiente competitivo, os empresários precisam, portanto, inovar continuamente, introduzindo métodos mais eficientes de produção. Temos então o progresso, com tendência de queda dos custos e aumento da produção. Não custa lembrar que os recursos naturais existentes no planeta são basicamente os mesmos hoje e milênios atrás, tendo mudado apenas o conhecimento humano de como melhor utilizá-los para a melhoria do bem-estar. Eis um resumo simplificado do livre mercado e seu funcionamento. E eis o que o controle de preços acaba destruindo.

Um preço funciona sempre para equalizar a quantidade demandada de um bem ou serviço com a oferta limitada desse bem. Segue disso que não pode existir demanda insuficiente, não atendida, no livre mercado, já que o preço iria subir até o nível em que desestimularia tal demanda. O instrumento de ajuste será sempre o preço no livre mercado. O preço de um quadro do Picasso afasta a maioria dos compradores potenciais. A habilidade de ultrapassar outros na oferta de um preço maior por um bem desejado não é uma prerrogativa exclusiva dos mais ricos, diferente do que muitos podem pensar. Por exemplo: uma família mais rica pode alugar um apartamento de quatro quartos, enquanto uma mais humilde aluga um de dois. O motivo da família mais rica não alugar um apartamento de cinco quartos está no fato de que a família mais humilde é capaz e está disposta a pagar mais pelo seu segundo quarto do que a família rica pode pagar pelo seu quinto quarto. A família mais humilde, no exemplo, é mais competitiva em termos marginais, nesse quarto extra. Reisman utiliza vários outros exemplos para mostrar como a livre formação de preços, através de uma espécie de leilão ininterrupto entre os consumidores, é a forma mais eficiente de alocação dos recursos na economia.

Desta forma, os preços dos bens e serviços numa oferta limitada serão determinados não apenas pelo julgamento de valor dos consumidores, mas pelo julgamento de valor em respeito às quantidades marginais desses bens e serviços. Falando do caso da escassez de petróleo, causada pelo embargo árabe, mas muito ampliada pelo controle de preços do governo americano, um motorista de caminhão teria interesse em pagar mais por um litro extra de combustível do que uma família rica que iria utilizar esse litro para algo supérfluo, como talvez aquecer uma piscina. Se o mercado pudesse funcionar livremente, o óleo iria automaticamente para aqueles que mais demandavam o bem, na margem. O preço oferecido pelos usos mais importantes iria ultrapassar aquele oferecido pelos usos supérfluos, e a redução na oferta acabaria afetando apenas os usos sem muita importância para a economia. Mas o controle de preços paralisa a ação racional dos agentes, impedindo que este tipo de leilão possa direcionar os produtos para os usos mais demandados pela própria sociedade, ou seja, os consumidores.

O que Reisman demonstra no livro é que o controle de preços falha terrivelmente no seu objetivo aparente, que seria beneficiar os mais pobres. O controle de preços aniquila completamente os incentivos de melhora dos produtos e maior eficiência nos custos. Um exemplo bastante citado pelo autor é o mercado de aluguel de apartamentos populares em Nova Iorque, onde o governo controlava os preços. Com o tempo, novas ofertas desapareceram, os proprietários não tinham incentivo algum para melhorar a qualidade dos imóveis, e um pesado custo recaiu sobre a classe média, já que o preço dos apartamentos que não estavam controlados disparou. Aqueles que condenam o motivo lucro o fazem ou por ignorância ou por uma mentalidade destrutiva, fruto da inveja. Os incentivos da busca do lucro e a competição livre operam para o constante aumento da eficiência. Mas pessoas ressentidas acabam considerando que os ricos já são “ricos o suficiente”, e passam a pregar controle de preços. Como diz Reisman, “nada poderia ser mais absurdo do que consumidores numa economia capitalista atacando a riqueza de seus fornecedores”, já que essa riqueza serve justamente a eles, que são os beneficiários dela. Bill Gates só ficou bilionário porque gerou algo de valor segundo as próprias escolhas livres dos consumidores. Aquele que aprecia o produto deveria agradecer seu criador e o fato de sua criatura ter lhe tornado rico. É isso que garante novas invenções e ganhos de produtividade que reduzem os custos.

Reisman trata ainda de inúmeros detalhes sobre os efeitos nefastos do controle de preços, principalmente sobre aqueles que deveriam ser os beneficiados. A destruição que o controle de preços causa não pode ser subestimada, pois ela afeta o mecanismo de incentivos adequados da livre economia. Além disso, o controle tende a se espalhar para outros setores como um câncer, já que o governo, diante de cada novo problema criado pelo controle, tem que ir expandindo esse controle sobre todos os outros bens da cadeia produtiva. O exemplo preferido pelo autor é o da União Soviética, que ainda existia na época em que o livro foi escrito. Apesar de muita informação ser mantida como segredo pelo regime comunista, o que chegava ao exterior já era espantoso o suficiente, e absolutamente previsível pela teoria austríaca, adotada por Reisman. Uma economia não consegue funcionar sem um livre mecanismo de formação de preços. Seria preciso um Deus onisciente para ter toda a informação relevante que está dispersa entre os bilhões de consumidores e que é exposta através dos preços.

No controle universal de preços, presente no socialismo, não há mais conexão alguma entre as preferências dos consumidores e os lucros e perdas dos empresários. O único resultado possível é o que ocorreu em todo país socialista: escassez generalizada e produtos terríveis. Prateleiras vazias, filas infindáveis e um Lada na garagem, quando muito! A lógica econômica explica os motivos, e o mesmo valeu para a URSS e para a Alemanha nacional-socialista. O governo começa controlando alguns itens importantes, e logo tem que expandir o controle para tudo, decidindo quem produz o que e em qual quantidade, além de para quem será vendido. O governo assume o controle sobre os meios de produção de facto, como foi o caso no nazismo e comunismo. Essa interferência na propriedade privada produz invariavelmente o caos, proibindo os empresários de utilizar o capital da forma mais lucrativa possível, ou seja, da maneira que melhor atenda a demanda dos consumidores. Ao abolir a liberdade econômica, o socialismo mata também a liberdade política. Socialismo, que seria o equivalente a um controle universal dos preços, significa o estabelecimento de uma ditadura totalitária. Não há como ser diferente, pela sua própria natureza. A única solução para o caos gerado pelo controle total de preços é a restauração do capitalismo liberal. Qualquer tipo de controle de preços através do governo deve ser duramente condenado por aqueles que defendem a liberdade.

terça-feira, julho 10, 2007

O Lápis


Rodrigo Constantino
"Se o indivíduo busca satisfazer seu próprio interesse num contexto de respeito à propriedade privada e às trocas efetuadas no mercado, estará fazendo o que a sociedade espera que ele faça." (Mises)

Uma das obras mais famosas do criador da Foundation for Economic Education (1946), Lenonard Read, é I, Pencil. Um trabalho curto, de linguagem simples, mas com uma mensagem brilhante. A obra ganhou maior visibilidade através da divulgação pelo Nobel em economia, Milton Friedman. Tentarei passar pelos principais pontos da obra, de forma simplificada.

Peguem um lápis simples, aquele ordinário pedaço de madeira, com uma grafite em uma ponta e uma borracha presa a um metal na outra extremidade. Utensílio comum, familiar a todos aqueles que sabem escrever e ler. Esse simples objeto, que ninguém parou para refletir sobre suas nuanças, contém mais informação do que se imagina. Sua estória é interessante, e ele contém mais mistério que muitos acontecimentos naturais, apesar de todos o tomarem como algo dado e pronto. O lápis simboliza uma "milagrosa" conquista da humanidade, justamente por ser tão complexo e simples ao mesmo tempo, sem falar da incrível utilidade.

Em primeiro lugar, será que o lápis é tão simples mesmo? Talvez seja espantoso, mas nenhum indivíduo da Terra sabe como fazer um lápis! Da mesma meneira que ninguém consegue avançar muito em sua árvore geneológica, seria impossível nomear e explicar todos os antecedentes do lápis. Sua família começa de fato numa árvore. Mas daí em diante, imagine todas as pessoas envolvidas nas infinitas habilidades de fabricação do aço e as máquinas necessárias para fazê-lo, nas minas de minério necessário para a grafite, em todos os mecanismos de extração, logística, residência para os trabalhadores etc. A lista seria infindável, pois estamos falando de todo o processo evolutivo da humanidade. O lápis é somente o produto final após um longo processo produtivo, envolvendo milhões de pessoas e séculos de progresso.

Agora ficou mais claro que ser humano algum é capaz de produzir sozinho um simples lápis. Na verdade, milhões de indivíduos tiveram participação em sua criação, sendo que ninguém sabia muito mais que outros no processo. Trata-se de um acúmulo de informações infinitas, onde ninguém sozinho foi capaz de influenciar muito mais em know-how que qualquer outro, se contemplado a totalidade do processo desde os primórdios.

E agora vem o mais importante: esses milhões de indivíduos envolvidos indiretamente e inconscientemente nesse processo não sabiam ex ante da criação final do lápis. Estavam apenas lutando para trocar seu pequeno conhecimento específico pelos bens e serviços que demandavam. A criação do lápis não havia sido planejada, ela simplesmente ocorreu! E por trás dessa bela criação estava nada mais que os desejos individuais de cada pessoa, mesmo que o produto final seja de uma utilidade incrível para a humanidade.

Há na criação do lápis uma total ausência de um master mind, um idealizador ou criador único que teria concebido sua idéia. Na verdade, o que "fabricou" o lápis foi uma "mão invisível", e isso o torna tão misterioso. Da mesma forma que ninguém pode fazer uma árvore, ninguém poderia fazer um lápis sem esta "milagrosa mão invisível". E o lápís não passa de uma combinação de milagres, sendo que a árvore, zinco, cobre, grafite e outras coisas naturais não são mais extraordinários que a configuração da criativa energia humana. Os esforços individualistas de cada agente acabam sendo uma grande criação coletiva da humanidade, que não precisou ser imposta por uma cúpula de sábios.

Uma vez cientes desse "milagre" que é a criação de um simples lápis, fica mais claro porque é tão importante salvarmos a liberdade individual. Precisamos deixar essa "mão invisível" atuar, sem grosseiras intervenções de um centro de poder, leia-se governo. Através dos interesses individuais de cada ser humano, que utilizará seu conhecimento limitado naturalmente, teremos automaticamente arrumado a humanidade num criativo e produtivo padrão em resposta às necessidades e demandas de cada um. Para isso é condição sine qua non a existência da fé em pessoas livres, não em um "messias" clarividente. O capitalismo liberal é a organização espontânea da sociedade, diferente da tentativa imposta de cima para baixo, do socialismo.

Quando o governo assume o monopólio de diversas atividades, as pessoas passam a assumir, sem questionamento, que essa tarefa seria impossível de ser realizada de forma livre pelos indivíduos. A razão é evidente: cada um reconhece que não seria capaz de realizar aquela tarefa sozinho. Mas nós já sabemos disso, e o que torna um processo factível não é seu conhecimento individual, mas sim o somatório de milhões de pequenos conhecimentos. Basta confiar nos indivíduos, e dar liberdade para eles. O resultado será muito mais eficiente.

Compare-se isso com o que aconteceu na antiga União Soviética. A Gosplan, um dos infinitos aparatos estatais do Partido Comunista, tinha a árdua tarefa de administrar o preço "justo" de milhares de ítens, incluindo diversas commodities. Eram inúmeros modelos econométricos super complicados, tentando prever a oferta e demanda ao mesmo tempo que fixando o preço. Isso é simplesmente impossível. Conseguiram fixar o preço artificialmente e limitar a oferta devido a falta de incentivo à produção, mas não terminaram com a demanda, natural do homem. O resultado foi uma escassez generalizada, levando a população ao desespero. Tudo isso por tentarem controlar um processo que deveria ser natural.

Todo tipo de planejamento rígido focando no futuro distante estará fadado ao insucesso, por basicamente dois motivos: 1) a natureza não é constante, mas está em pleno avanço e mutação; 2) nem mesmo se fosse possível juntar todo o conhecimento disponível hoje em um único indivíduo, ele seria capaz de antecipar tais mutações. Agora imaginem juntar apenas o conhecimento de umas dezenas de burocratas para definir o futuro de toda uma nação! O caminho correto para o progresso da humanidade pode ser encontrado na criação de um simples lápis: deixar que a "mão invisível" faça seu milagroso trabalho.

sábado, julho 07, 2007

Antiamericanismo: Doença Infantil


Rodrigo Constantino

“O objetivo do terceiro-mundismo é acusar e, se possível, destruir as sociedades desenvolvidas, não desenvolver as atrasadas.” (Jean-François Revel)

Está estampado na capa do jornal O Globo este sábado a foto de um dos 18 gerentes de imprensa do Comitê Olímpico dos Estados Unidos, Kevin Neuendorf, ao lado de uma mensagem que escreveu no quadro onde se lê “Welcome to the Congo!”. Depois, ao lado de um higienizador de ambientes, ele tentou se explicar, alegando que estava se referindo ao calor carioca. Não tardou a aparecer gente atacando os americanos, em geral, por preconceito. O sentimento de inferioridade nacional é tão grande, e o antiamericanismo tão irracional, que qualquer coisa é pretexto para condenar o “império” do norte.

Existem dois absurdos muito evidentes nessa postura de muitos brasileiros, que usam esse episódio para falar de “preconceito dos americanos”. Em primeiro lugar, fica claro o coletivismo tosco dessa gente, que usa o caso isolado de um sujeito para extrapolar para toda a nação a culpa. Ora, se um brasileiro qualquer falar algo sobre os Estados Unidos, isso jamais será sinônimo do que os brasileiros em geral pensam. Somente cupins, acostumados a “pensar” como uma colônia de insetos gregários, apelariam para tal generalização absurda. Em segundo lugar, esses brasileiros ignoram, ao acusar de preconceito esta comparação feita com o Congo, que estão sendo, eles mesmos, preconceituosos com os congoleses! Quer dizer que é humilhante comparar o Brasil ao Congo? Por quê? Por que seria xingamento isso? Os congoleses não podem se sentir ofendidos por serem comparados com o Brasil? Se o critério é o desenvolvimento, então seria ofensivo alguém chegar aos Estados Unidos e escrever “Welcome to Brazil”, certo? É triste ser para os Estados Unidos o que o Congo é para o Brasil...

Na verdade, como carioca, posso falar que outro dia mesmo estava comentando o calor do nosso “inverno”. Não, não sou daqueles que logo conclui que o aquecimento global é para valer, por culpa dos homens, e que o mundo vai acabar em breve se nada for feito. Esse alarmismo malthusiano, cheio de interesses obscuros por trás, não me convence, por vários motivos que não são tema desse artigo. Mas o fato é que nosso inverno é quente mesmo. Quando eu visitei Moscou na primavera, cheguei debaixo de neve, num frio insuportável. Se eu tivesse dito que aquilo parecia o Pólo Norte, seria acusado de preconceito? E se fosse preconceito, seria com Moscou ou com o Pólo Norte?

O presidente Lula, recentemente, fez um apelo para que os brasileiros não falassem mal do Brasil lá fora, e ainda afirmou que os suíços não faziam isso. Em primeiro lugar, é mentira. Muitos suíços criticam sua nação. Criticar é fundamental para quem deseja melhorar. Em segundo lugar, vamos combinar que há muito menos o que ser criticado na Suíça em relação ao Brasil. O presidente parece ser daqueles que acham que, se o fato for ignorado, o fato desaparece. Se um filho tem problemas com drogas, por exemplo, basta não comentar isso, fingir que está tudo normal, e tudo ficará normal. É a primazia da mente acima da primazia da realidade. Algo como as mensagens bobas de livros da auto-ajuda, onde basta repetir em frente ao espelho que somos perfeitos e assim seremos. Uma obesa pode repetir quantas vezes quiser que é linda e magra, mas se não fechar a boca e fizer exercícios, continuará obesa. Como seria fácil se a realidade pudesse ser transformada apenas com o desejo da mente!

No programa Manhattan Conection de algumas semanas atrás, Diogo Mainardi teve uma tirada muito espirituosa, quando Lucas Mendes lhe perguntou se o Brasil seria uma Suíça perto do Cazaquistão. Ele disse que o Brasil seria um Cazaquistão perto da Suíça! Encarar os fatos da realidade faz bem. Não é por acaso que os Estados Unidos são o que são. Lá a crítica é freqüente, ácida e muitas vezes até mentirosa, como nos “documentários” do aclamado Michael Moore, ídolo dos invejosos tupiniquins. Os Estados Unidos, com imprensa livre, estão sempre sob constante ataque dos próprios americanos, e isso força uma melhoria através da pressão popular. O já citado Michael Moore, que usa e abusa de manipulações em seus filmes, gosta muito de criticar os Estados Unidos e falar bem até mesmo de Cuba. Mas o fato é que ele pode fazer isso à vontade nos Estados Unidos, enquanto se fosse o contrário, já teria sido fuzilado no paredón cubano faz tempo. Fidel não gosta muito de ser criticado.

Os brasileiros que sofrem da doença infantil do antiamericanismo são tão caras-de-pau que costumam comparar nossa minúscula elite com todo o povo americano. Esquecem que a classe média americana é gigantesca, e a palavra medíocre vem de média. Sim, é verdade que o americano médio nem mesmo sabe a capital do Brasil. Mas, cáspita! Por acaso o brasileiro médio sabe a capital da Índia ou da China?! Até mesmo a capital dos Estados Unidos, país mais rico e importante do mundo, é desconhecida pela maior parte dos brasileiros. Por que então o americano médio deveria saber a capital de um país pouco relevante no comércio internacional como o Brasil? Que tal compararmos as taxas de analfabetismo, incluindo o funcional, tão comum por aqui, entre o povo americano e o povo brasileiro, em geral? Isso os antiamericanos não fazem...

Por fim, acusar os americanos de xenofobia e preconceito contra estrangeiros parece um tanto esquisito quando lembramos que lá residem pacificamente milhões de brasileiros, mexicanos, cubanos, porto-riquenhos, chineses, indianos, judeus, irlandeses etc. Os Estados Unidos foram criados na base da imigração. Nos últimos anos, receberam milhões de imigrantes novos, tendo que gerar postos de emprego para essa massa de gente que foge de seus países de origem em busca de melhores oportunidades. Ainda assim, está com uma taxa de desemprego de apenas 4,5% e economia crescendo mais que a nossa, mesmo partindo de uma base muito maior. Creio que isso é que deve incomodar mesmo essa turma antiamericana, que vive sonhando com o dia em que o “império” será destruído. Keep dreaming...

O ato do americano Kevin Neuendorf pode ser encarado como um ato infeliz, sem dúvida. Gente idiota existe no mundo todo, em especial no Brasil, onde ainda se idolatra o marxismo, por exemplo. Mas seria bom se os brasileiros conseguissem superar essa doença infantil que é o antiamericanismo, já beirando níveis patológicos por aqui. Afinal, a inveja é uma droga!

sexta-feira, julho 06, 2007

A Função dos Especuladores


Rodrigo Constantino

"Sem especulação não pode haver nenhuma atividade econômica alcançando além do presente imediato." (Ludwig von Mises)

Poucas são as profissões tão repudiadas pelo senso comum como a especulação de ativos. No entanto, o principal motivo para esse preconceito reside na falta de conhecimento acerca das funções que a especulação exerce no mercado. No livro The Government Against the Economy, George Reisman defende a livre economia, mostrando que é justamente a interferência do governo, especialmente através do controle de preços, que tanto mal gera para todos. Como não poderia faltar, há uma embasada defesa dos especuladores, explicando de forma didática o mecanismo de ajuste e equalização dos preços através da especulação.

Em primeiro lugar, podemos considerar os arbitradores de preços em termos geográficos, ou seja, aqueles indivíduos que buscam o lucro através de oportunidades que surgem pelo fato de o preço de um determinado produto estar elevado em um lugar e baixo em outro. Havendo livre mercado, essa diferença tende a desaparecer, restando somente o custo de transporte como diferencial de preços. Como Reisman coloca, "o preço do mesmo bem tende a ser uniforme pelo mundo todo exceto pelos custos de transporte entre os mercados". Isso é evidente demais para demandar maiores explicações. Ainda assim, este princípio econômico é amplamente ignorado, inclusive por muitos economistas.

Reisman escreveu seu livro em 1979, e a crise do petróleo era o tema do dia. Seu livro busca justamente demonstrar como a crise proveniente do embargo árabe poderia ser infinitamente menor caso o livre mercado fosse respeitado nos Estados Unidos. Mas a tentativa do governo de controlar preços foi, na verdade, o grande catalisador da crise. Para entender isso, não é preciso muito mais conhecimento do que o princípio econômico exposto acima. Com o aumento no preço causado pelo abrupto corte nas vendas do petróleo árabe, rapidamente haveria uma infinidade de arbitradores buscando obter lucros extraordinários onde o preço fosse maior. Com o mercado funcionando livremente, o mundo todo absorveria o choque, e apenas a diferença nos custos de transporte iria ditar a diferença nos preços finais. A analogia que Reisman usa é um recipiente de água com divisórias e vasos comunicantes. Quando água é retirada de uma parte do recipiente, o restante da água segue um curso natural, movendo-se de lugares com maior pressão para lugares com menor pressão. O impacto é diluído entre todas as divisórias do recipiente. Em vez de uma divisória absorver todo o impacto e ficar sem água, todas as divisórias perdem somente uma pequena parcela da água que tinham. O mesmo se aplica às commodities, com a oferta procurando lugares com maiores preços, num processo que vai equalizando os preços em todo o mundo. O embargo faria os preços em alguns lugares dentro dos Estados Unidos subirem, mas imediatamente haveria arbitragem, e o resultado final seria diluído pelo mundo todo, graças aos arbitradores em busca de lucro.

A mesma tendência de equalização se aplica no caso de preços no tempo. Eis onde surge o importante papel dos especuladores. A relação entre o preço presente e o preço futuro de uma commodity é que eles tendem a diferir não mais do que os custos de estocagem somados a uma taxa de lucro do capital que deve ser investido nessa estocagem. Os especuladores – lembrando que o verbo vem do latim e significa algo como "tentar enxergar o futuro com os dados presentes" – tentam antecipar os movimentos que vão ocorrer nos mercados. Agindo dessa forma, em busca de lucro, eles acabam diluindo as oscilações abruptas no tempo. A atividade dos especuladores serve então para transferir oferta de um período no qual ela é menos urgente, como indicado pelos preços menores, para um período no qual ela é mais necessária, como indicado pelos preços maiores. Como exemplo, pode-se pensar no petróleo novamente. Antecipando algum tipo de escassez futura, pelo motivo que for, os especuladores irão comprar petróleo no presente e estocá-lo. Isso irá forçar seu preço para cima no momento atual, incentivando uma menor demanda. Em compensação, esse petróleo estocado terá que ser consumido algum dia, e nesse momento os preços serão pressionados para baixo, estimulando a demanda. Nesse sentido, a especulação leva ao ponto ótimo de consumo para uma oferta limitada. É importante lembrar que toda empresa que decide sobre estoque de produção está especulando também, pelo mesmo princípio que o especulador. Consumidores que adiam ou antecipam as compras estão especulando também.

Mas pelo fato da especulação transmitir os preços maiores esperados no futuro para o presente, ela é denunciada como a causa desses maiores preços. Aqueles que assim o fazem estão ignorando que os estoques acumulados no presente como resultado da especulação terão que ser usados algum dia, e neste momento irão necessariamente agir de forma a reduzir os preços. Além disso, se os especuladores errarem em suas estimativas, eles mesmos são quem pagam o preço, pois compraram o produto e investiram em sua estocagem pagando preços maiores, sendo que deverão vender a preços mais baixos, arcando com o prejuízo. Se, por outro lado, acertaram na previsão, apenas anteciparam uma mudança na relação entre a oferta e a demanda, suavizando seu impacto nos preços no tempo.

Está certo que em alguns casos mais raros, a própria expectativa dos especuladores pode afetar o futuro, como numa profecia auto-realizável. É o que George Soros chamou de "reflexividade" dos mercados. Mas os pilares de uma economia precisam ser de areia para que os especuladores possam mudar assim os fundamentos. Era o caso da Inglaterra quando o próprio Soros ganhou rios de dinheiro especulando contra sua moeda, artificialmente manipulada pelo governo. Foi também o caso da crise asiática, novamente vítima de erros dos próprios governos locais. Muito mais comum é os especuladores apenas anteciparem os fatos, tentando trabalhar em cima dos fundamentos em si. São esses que realmente importam. Em uma economia livre e saudável, com indivíduos racionais interagindo, a especulação só tem a agregar, através dessa arbitragem de preços. Negar isso é o mesmo que dizer que remédios testados não são desejáveis, pois em alguns casos raros podem acarretar em piora do doente, que já estava mesmo com um pé na cova.

Em resumo, essa é a mais importante função dos especuladores: a arbitragem de preços tanto geograficamente como no tempo, garantindo maior liquidez para os mercados, o que leva a sua maior eficiência. Aqueles que culpam os especuladores por uma alta nos preços presentes estão ignorando um princípio básico de economia. Estão confundindo correlação com causalidade. Estão, em suma, condenando um termômetro por mostrar a febre do doente.

terça-feira, julho 03, 2007

Nascido em 4 de Julho


Rodrigo Constantino

"We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness." (Declaração da Independência Americana, 4 de Julho de 1776)

Dizem que errar é humano, mas insistir no erro é burrice. O que falar então de uma insistência ininterrupta, ano após ano, por mais de dois séculos? Hoje é o aniversário daquilo que foi um dos marcos mais importantes do mundo, a Declaração da Independência Americana. Ali estaria selada, em poucas palavras, a função básica do governo, afirmando categoricamente a soberania do povo sobre o Estado. Cada indivíduo seria livre na busca pela sua própria felicidade. As regras seriam iguais, não os resultados.

Infelizmente, o homem tem memória curta, e esquece-se das aulas básicas de seus grandes pensadores. A visão de curto prazo, aliada à mentalidade de se dar bem explorando os outros, faz com que uma multidão troque a liberdade por algum favor do governo. A ignorância, somada ao desejo de ganho fácil, faz com que a massa deposite sua esperança num messias salvador, delegando função paternalista ao Estado. A perfídia, com pitadas de romantismo utópico, faz com que uma elite formadora de opinião condene a meritocracia e pregue soluções coletivistas para os problemas do mundo, levando ao socialismo ineficiente e injusto.

O governo não está acima do povo, mas sim depende de seu consentimento para ser validado. E isso não quer dizer, de forma alguma, que uma maioria está livre para fazer o que bem entender. A democracia não deve levar a uma simples ditadura da maioria. Os direitos individuais deverão ser sempre respeitados, e era esse o foco da Declaração que fundou a República americana. Cada indivíduo deve ser livre para perseguir sua felicidade, sem invadir a liberdade do outro. Reparem que não há como um governo garantir a felicidade, mas apenas o direito de cada um buscar a sua, livre da coerção alheia. E notem também que nesse percurso, o direito de um não pode destruir o direito do outro. Essa valiosa lição é hoje amplamente ignorada, com governos prometendo cada vez mais, sem se importar que para dar algo a alguém, precisa antes tirar de outro.

Na sabedoria de homens como Benjamin Franklin e Thomas Jefferson, construíram-se os pilares que criariam a nação mais próspera do mundo. Não há superioridade racial, não há fatores genéticos, não há maiores recursos naturais, não há sorte. Foram os princípios adotados por estes homens que possibilitaram um meio amigável ao progresso humano. Foi a liberdade individual que estimulou o empreendedorismo e a inovação. Foi o conceito de troca voluntária, básico do capitalismo, que permitiu tamanho avanço. Os Estados Unidos são o que são hoje por mérito de um modelo eficiente, justo e adequado à natureza humana. Infelizmente, até os americanos vêm se afastando do conceito original que tanto os distanciaram do resto do mundo. O Leviatã estatal tem crescido por lá, alimentando-se das liberdades individuais tão valiosas.

O pequeno texto da Declaração de Independência deveria ser relido com maior freqüência, pois seus ensinamentos são constantemente esquecidos num mundo onde idéias coletivistas entram cada vez mais em moda. Trocam o objetivo conceito de justiça pelo abstrato termo "justiça social", como se coubesse aos burocratas do governo decidir como configurar a sociedade, escravizando seu povo para isso. Ofuscam a liberdade individual em nome da visão coletivista, como se existisse um "interesse nacional" ou "bem público" que justificasse o sacrifício dos indivíduos.

A esperança é a última que morre. Mesmo que distante do ideal de liberdade individual e de isonomia de tratamento, vários países adotaram a democracia ou ampliaram as liberdades individuais nas últimas décadas. Vamos continuar sonhando – e lutando – para que aquelas sábias palavras proferidas há mais de dois séculos tenham profundo impacto nos indivíduos. Hoje, dia 4 de Julho, o mundo todo deveria comemorar. Afinal, não se trata somente do aniversário de uma nação livre, mas sim da própria liberdade. Antes dos Estados Unidos, os países eram calcados em tradições coletivistas, sem este foco na liberdade individual. Como defensor da liberdade, fico muito feliz de ter nascido em 4 de Julho. Viva a liberdade!

domingo, julho 01, 2007

Inteligência e Liberdade


Rodrigo Constantino

“A virtude que distingue os homens numa sociedade livre, a essência da visão liberal da vida, é a busca da verdade.” (Frank H. Knight)

Em 1959, o professor Frank H. Night proferiu cinco palestras que se transformaram em livro no ano seguinte, sob o título Inteligência & Ação Democrática. Knight foi inegavelmente um dos pais da assim chamada “Escola de Chicago”, tendo presidido o Departamento de Economia da Universidade de Chicago por vários anos. Veremos a seguir alguns pontos abordados pelo economista.

Nas palestras, Knight enfatiza que pouco vale uma ordem nacional estruturada sobre a hipótese de um caráter altruísta do homem, já que uma boa dose de egoísmo faz parte de sua natureza. Ele tinha muito receio do poder arbitrário exercido com “boas intenções”. Ele se mostrava cético a respeito da contribuição da ciência à solução dos problemas fundamentais de uma sociedade livre. Ele diz: “O conhecimento científico confere poder, mas tem pouco a dizer sobre os fins para os quais esse poder deverá ser utilizado”. Respeitava o fato de que certos padrões comportamentais, assim como valores, foram sendo preferidos em detrimento de outros, devido à sua maior capacidade de assegurar a sobrevivência e o crescimento dos grupos que as adotaram. Tal como Hayek, Knight tinha respeito pelas tradições, sem apego irrestrito a elas, mas receoso de qualquer tipo de ação construtivista que buscasse moldar artificialmente a sociedade, ignorando essas heranças. Devemos aceitar as mudanças apenas quando existem fortes razões para acreditar que serão para melhor, que promoverão o progresso. “Apenas lenta e gradualmente os hábitos e costumes podem ser mudados sem que se destrua a ordem ou a liberdade, ou as duas”.

A ênfase de Knight no aspecto da educação do povo é total, mas para ele, o “desensinar” é uma tarefa principal da educação geral, no sentido tanto de superar preconceitos como de evitar julgamentos apressados. Faz-se necessário desenvolver a vontade de ser inteligente, ou seja, “objetivo e crítico”, conforme o autor explica. Em suas palavras, “o primeiro passo é tornar o povo em geral mais inclinado à crítica, menos romântico no seu julgamento acerca dos argumentos usados nos debates durante as campanhas políticas”. A primeira tarefa da inteligência, assim como a mais difícil, seria fazer as perguntas corretas. Para Knight, temos exemplos perenes de estupidez em matéria de idéias e políticas econômicas justamente por falta dessa postura mais crítica. Ele cita o protecionismo no comércio internacional e a inflação, ou seja, a “idéia e a política de se criar riqueza ou prosperidade por meio de dinheiro abundante e barato”, o que pode ser obtido com uma taxa artificialmente baixa de juro. O nacionalismo econômico seria outro caso de virulento preconceito, assim como os subsídios do governo americano no programa agrícola.

Um dos preconceitos mais condenados nas palestras trata da “incapacidade ou recusa de reconhecer que o livre intercâmbio é axiomaticamente vantajoso para ambas as partes, desde que elas tenham uma competência elementar para administrar seus próprios negócios”. A hipótese de que o governo é uma espécie de Deus benevolente costuma andar junto deste preconceito. Knight lembra que ocorreu uma inversão falaciosa do significado de liberalismo, sustentando que alguém não é livre a menos que tenha o poder de fazer qualquer coisa que deseje. “A liberdade é o oposto da coerção e não do determinismo”. A liberdade de que o empregado dispõe, por exemplo, é a de escolher entre empregadores alternativos. Se realmente existe a concorrência de mercado entre os empregadores, “qualquer tentativa de estabelecer uma relação de poder no sentido contrário comprometerá a produção, e beneficiará apenas os empregados através da violação do direito à liberdade dos consumidores, outros empregados, proprietários ou empresários em busca de ganhos legítimos – sem o que o pagamento de salários se torna impossível”.

Com relação ao monopólio, Knight entende que o público tem idéias grosseiramente exageradas, especialmente no caso dos monopólios empresariais. Ele considerava Adam Smith certo ao afirmar que se o governo se abstivesse de estimular monopólios, grande parte do problema se resolveria por si mesmo. “Os piores monopólios não estão no campo dos negócios”, ele explica. Os sindicatos trabalhistas seriam muito mais perigosos para a liberdade e o progresso: “A ameaça suprema ao bem-estar sócio-econômico e que constitui o maior obstáculo ao bom senso na política econômica é o poder arbitrário crescente das organizações sindicais”. Mas um enorme preconceito contra a atividade empresarial dificulta essa visão.

Knight rejeita utopias, preferindo focar nas soluções mais realistas e possíveis. Para ele, “o homem precisa, acima de tudo, aprender a sentir-se razoavelmente satisfeito com o possível”. É mais importante evitar as falsas soluções, os remédios piores do que os males a serem curados. Ele era um grande cético: “Os homens têm de ser conscientes do seu romantismo natural e céticos quanto aos remédios e, antes de tudo, céticos com relação a todos os diagnósticos”. Para ele, o esforço para a objetividade crítica é de origem recente e tem progredido frente a mais tenaz oposição, especialmente da parte dos guardiões da “verdade”, considerada como sagrada e imutável. Como exemplo, ele menciona os casos de Galileu e Darwin.

Sobre religião, Knight defende claramente a liberdade e a tolerância. Para ele, “a sociedade livre é inevitavelmente uma sociedade secular, pois os homens não vão chegar livremente a um acordo sobre a verdade sobrenatural”. Por isso, “os adeptos de qualquer religião têm que ser tolerantes com relação a outras preferências religiosas, a fim de que a paz e a ordem possam prevalecer”. Knight vai além, afirmando que “a religião se opõe ao progresso, da mesma forma que os homens não aceitarão ou adorarão um deus que mude as suas mentes e as suas leis”. Para ele, “numa sociedade livre não pode haver verdade sagrada, dogma ou assunto que não seja aberto para o questionamento e a mudança”. Sua definição de crença religiosa era “qualquer crença mantida como absoluta em bases morais, de forma que questioná-la constitui um mal”. Knight defende que na cultura liberal não há lugar para o dogmatismo e a intolerância, assim como “não há verdade que não seja suscetível de questionamento”. A revolução liberal que ocorreu, principalmente com a Renascença e o Iluminismo, seria um progresso em relação aos tempos da Idade Média, nesse sentido. A essência da revolução foi a substituição da conformidade e da obediência pela liberdade e o progresso.

Por fim, Knight conclui suas palestras atacando novamente o grande preconceito existente contra os empresários: “Um povo que pensa que o meio de beneficiar os trabalhadores é tratar os empregadores como seus inimigos, persegui-los e denegrir ao máximo o seu papel, não merece ter liberdade e não pode mantê-la para sempre”. De forma geral, a liberdade depende de mais inteligência por parte do povo. Como realizar isso é uma questão muito complexa, a qual Knight apenas esboça algumas respostas. Por isso é tão fundamental para a sociedade livre que os homens insistam na busca da verdade, evitando ao máximo os preconceitos e julgamentos apressados.