sexta-feira, abril 20, 2007

A Liberdade de Escolha


Rodrigo Constantino

“A sociedade que colocar a igualdade – no sentido de igualdade de resultado – acima da liberdade irá acabar sem igualdade nem liberdade.” (Milton Friedman)

Após escrever Capitalism and Freedom, Milton Friedman fez uma série para a televisão chamada Free to Chose, que virou depois um livro com o mesmo nome. Ele trata o sistema político e o econômico de forma simétrica, ambos considerados mercados nos quais o resultado é determinado pela interação entre indivíduos buscando seus próprios interesses. O livro contou com a influência de nomes como James Buchanan, Gordon Tullock e Gary Becker. A televisão é mais dramática e apela às emoções, mas Friedman preferia justamente um instrumento mais eficaz para a persuasão verdadeira, que não pode ser obtida em uma noite, mas somente através de profunda reflexão, considerando-se vários argumentos. E o que não falta no livro são argumentos!

Logo no começo, Friedman afirma que o grande insight de Adam Smith foi perceber que ambas as partes se beneficiam numa troca, contanto que a cooperação seja estritamente voluntária. Caso contrário, simplesmente não há troca. Desta forma, um indivíduo buscando seu ganho próprio será guiado por uma “mão invisível” a promover um fim que não fazia parte de suas intenções. Em seguida, Friedman cita John Stuart Mill, em uma brilhante passagem onde o autor afirma que o “único propósito pelo qual a força pode ser corretamente usada sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra sua vontade, é prevenir mal aos outros”. A coerção não deve visar ao seu próprio bem, portanto. Nos aspectos que interessam somente a ele, sua independência deve ser absoluta. Juntando as coisas, Friedman conclui que a liberdade econômica é um requisito essencial para a liberdade política. Permitindo que os indivíduos cooperem uns com os outros sem coerção ou direção central, reduz-se a área sobre a qual o poder político é exercido. A combinação de poder econômico e político nas mesmas mãos, em contrapartida, é uma receita certa para a tirania.

Sobre a grande depressão do começo dos anos 1930, Milton Friedman fez uma análise muito diferente do consenso dos economistas, que gostam de culpar o livre mercado pela crise. Para ele, “a depressão foi produzida por um fracasso do governo em uma área – moeda – onde ele tinha exercido autoridade desde o começo da República”. Entretanto, a responsabilidade do governo na depressão não foi reconhecida, e a culpa recaiu sobre o capitalismo de livre mercado. Como um dos nefastos resultados dessa visão errônea, encontra-se a substituição da visão de que o governo deveria ter como papel central a garantia da liberdade individual, pela visão de que seu papel era servir como um pai responsável através da coerção e ajuda aos demais.

Segundo Friedman, não se conhece sociedade que tenha alcançado prosperidade e liberdade a menos que a troca voluntária tenha sido seu princípio organizacional dominante. A troca voluntária é “uma condição necessária tanto para prosperidade como liberdade”. Como já foi dito, se a troca entre duas partes é voluntária, ela não irá ocorrer a menos que ambos acreditem estar se beneficiando com ela. Muitas falácias econômicas derivam do esquecimento desta simples verdade. Há uma tendência a assumir que existe uma torta fixa, e que o ganho de uma parte tem que ser a perda da outra. Além disso, os preços, quando formados através dessas trocas voluntárias, exercem funções cruciais em organizar a atividade econômica. Eles transmitem informação, fornecem um incentivo para que os métodos mais eficientes de produção sejam adotados, e por fim determinam quanto cada um recebe do produto – a distribuição de renda. Qualquer coisa que interfira na livre formação de preço irá prejudicar a transmissão de informação acurada, levando a resultados ineficientes. E se os preços não podem livremente determinar a distribuição de renda, eles não podem ser utilizados para os demais propósitos corretamente. A única alternativa é o comando, alguma autoridade tendo que decidir quem produz o que e quanto é produzido. Sabe-se muito bem como esse modelo termina. Basta estudar o caso soviético.

O grande problema para o alcance e manutenção de uma sociedade livre é precisamente como assegurar que as forças coercitivas delegadas ao governo para preservar a liberdade fiquem limitadas a esta função, em vez de se tornarem uma ameaça à liberdade. Quando se demanda intervenção estatal para atacar as “falhas de mercado”, esse risco costuma ser ignorado. Esquece-se das falhas do próprio governo, e dos efeitos negativos que sua intervenção gera para terceiros. Por isso deveria ser desenvolvida a prática de se analisar tanto os benefícios como os custos da intervenção estatal. Normalmente, o foco fica restrito aos benefícios, principalmente os de curto prazo.

Como exemplo de intervenção indesejada, Friedman cita as restrições tarifárias impostas ao comércio internacional, sempre à custa dos consumidores. Tais tarifas são eufemisticamente chamadas de “proteção”, e os grupos de interesse que a demandam falam sempre no “bem geral”, na necessidade de preservar empregos e promover a segurança nacional. Como brinca Firedman, se tudo que importa é ter empregos, basta empregar pessoas para cavar buracos e depois fechá-los. O objetivo real deve ser por empregos produtivos, que irão significar mais bens e serviços para o consumo depois. A conclusão de Friedman é curta e objetiva, quando diz que a “proteção” realmente quer dizer “exploração do consumidor”.

Milton Friedman descarta o “argumento” de que o livre comércio só é vantajoso quando outros países também o praticam. Ele explica que competição no masoquismo não é uma política sensata para a economia internacional. Ainda que a reciprocidade na abertura comercial seja desejável, não é necessária, não anula o fato de que uma abertura unilateral também será vantajosa, ainda que menos. O autor lembra que o livre comércio costuma levar à paz, enquanto as guerras tarifárias podem acabar em guerras reais, já que o conflito, não a cooperação, passa a vigorar. Por fim, Friedman defende o câmbio totalmente livre também, lembrando que este é apenas outro preço que transmite relevantes informações ao mercado, não devendo sofrer, portanto, influência artificial do governo.

O livro segue com inúmeros argumentos sobre diferentes assuntos importantes, como saúde, educação, previdência, meio-ambiente, sindicatos, salário mínimo, inflação etc. Em todos esses temas, Milton Friedman oferece sólidos argumentos que forçam uma reflexão, sempre na linha da preservação da liberdade de escolha individual, limitando ao máximo o poder coercitivo do Estado. Ele lamenta, no final, que se tem ignorado uma verdade básica: que a grande ameaça para a liberdade é a concentração de poderes. Em um mundo onde o governo invade cada vez mais a esfera das escolhas privadas, essa lição é fundamental. Espera-se que as pessoas façam bom uso de sua liberdade de escolha, escolhendo ler com atenção o livro de Milton Friedman. O mundo seria um lugar melhor e mais livre.

3 comentários:

Anônimo disse...

Constantino,

"O mundo seria um lugar melhor e mais livre." Isto é o óbvio, porém, na cabeça dos "donos do mundo e dos povos" o mundo livre representa perda de poder. Simples, não?

Anônimo disse...

Muito oportuno o post, já que no anterior estávamos a discutir a "igualdade de oportunidades".

Mas tendo a concordar com o Mário. Uma vez que uma camada conquista uma fatia do poder, e acumula riquezas, dificilmente não promoverá leis e outros artifícios que mantenham o status quo.

Como evitar então que esse tipo de coisa aconteça?

Eduardo da Costa Silva disse...

Tive o prazer de ler esse livro no começo desse ano, o livro é bom, mas parece mais um manifesto liberal, pouca teoria e muito exemplo, não quero tirar o mérito do prêmio Nobel.