Rodrigo Constantino
Após uma segunda-feira negra nos mercados financeiros, com quedas entre 5 a 7% nos principais mercados, o Federal Reserve, sob o comando de Ben Bernanke, resolveu surpreender os investidores e reduziu a taxa do fed funds em 75 pontos base, para 3,5% ao ano. Trata-se da última grande cartada do Fed, para tentar injetar liquidez e ânimo nos mercados e evitar o pior, a temida recessão. O Fed jogou a bóia da salvação, para muitos investidores desesperados se agarrarem e respirarem mais aliviados. Mas será que o Fed consegue mesmo salvar os mercados? Será que intervenções de cima, dos "sábios clarividentes", têm o poder de cura milagrosa, colocando finalmente no passado os ciclos de alta e baixa dos ativos? Acho pouco provável.
Na verdade, a analogia que gosto é com a situação de um bêbado. Aquele que consumiu álcool demais e está prestes a encarar uma dolorosa ressaca, necessária para equilibrar novamente seu organismo, pode sempre postergar um pouco esse incômodo ajuste, mas não sem um pesado custo. Mais algumas cervejas manterão o sujeito no estado de euforia, proveniente da bebedeira. Mas isso irá apenas agravar a ressaca necessária depois. No longo prazo, com muita injeção de álcool para fugir da ressaca, tudo que o indivíduo conseguirá será uma cirrose. Ainda não inventaram mecanismos para driblar certas leis da natureza. O "novo paradigma" nos remete às velhas utopias, onde a crença ingênua de um mundo eternamente maravilhoso, sem dor, parece possível. Os "cavalheiros" do Fed seriam os heróis que sempre estarão lá, para salvar os prejudicados através de uma milagrosa canetada.
Ainda usando a analogia da bebedeira, a medida do Fed seria como alguém entrando de surpresa no bar, onde vários bêbados começam a sentir as pontadas na cabeça, oferecendo mais uma rodada grátis para todos. Ninguém duvida que a reação inicial seria de completa euforia. Os bêbados iriam ao delírio. Mais álcool para manter a festa. Mais liquidez! Só que essa medida artificial não iria alterar a realidade dos fatos. Os keynesianos nunca foram capazes de compreender direito isso. Acham que um sujeito consegue se suspender puxando o seu próprio suspensório. Acreditam que basta um estímulo estatal para manter a economia em contínuo crescimento. Se assim fosse, não haveria mais miséria no mundo. Bastava o governo decretar seu fim, imprimindo moeda de papel. Sabemos que a inflação é o resultado disso.
A Escola Austríaca vem fazendo constantes alertas quanto a estes riscos oriundos do excesso de intervenção estatal na economia. O mercado, funcionando livremente, sempre terá excessos pontuais, que tendem a ser anulados por uma correção natural do processo. Quando o governo intervém, buscando criar uma euforia artificial, esses erros isolados se transformam em viés generalizado, causando as grandes bolhas especulativas. A própria crise das hipotecas americanas tem como uma das causas a manutenção das taxas de juros em patamares artificialmente baixos por tempo demais. Usando o mesmo mecanismo para salvar esta crise, o Fed está apenas postergando os ajustes necessários, transferindo a bolha para algum outro ativo, talvez commodities ou mercados emergentes.
Se os agentes do mercado entenderem que o banco central americano tem a mão frouxa, ou seja, é uma "pomba" em vez de um "gavião", que cuidaria basicamente do valor da moeda, isso pode ser perigoso para o valor do dólar a médio prazo. Os riscos não são nada desprezíveis. O principal mandato de um banco central deve ser a inflação. Se ele deixa isso um pouco de lado para focar mais no crescimento econômico de curto prazo, tentando injetar liquidez para evitar uma recessão, o resultado quase inevitável será a perda do valor da moeda com o tempo. Não há ninguém melhor do que Ludwig von Mises, o grande economista austríaco, para finalizar aqui o alerta quanto aos riscos dessa recente medida do Federal Reserve, numa tradução livre minha:
"Não há meio algum de se evitar o colapso final de uma expansão econômica gerada pela expansão do crédito. A alternativa é apenas se a crise deve chegar antes como o resultado de um abandono voluntário de mais expansão do crédito, ou depois como uma catástrofe final e total do sistema monetário envolvido."
Torço para que o pior possa ser evitado. Mas quando se trata de decisão de investimento, torcida não é o que interessa, e sim respeito aos fundamentos. Esperança não deve ter voz na decisão de alocação de recursos. Ainda é cedo para um diagnóstico apurado do que deve ocorrer na economia americana e seu impacto na economia mundial. A cartada do Fed é uma jogada arriscada. Se falhar, não restarão muitas alternativas interessantes. O momento parece adequado para uma observação imparcial mais de longe, focando na preservação de capital. Não creio que seja a hora de assumir grandes riscos e confiar que o pior da crise já passou, graças ao toque "divino" do Fed. Novos terremotos poderão ocorrer, e se for esse o caso, qual será a grande cartada do Fed? Reduzir ainda mais os juros, para os patamares japoneses? Falar em Japão numa hora dessas não parece boa coisa...
10 comentários:
Se continuar assim vc vai ser contratatado por um grande banco de investimentos ou por uma universidade de ponta para lecionar.
Sua explicação desafia qualquer catedrático pela simplicidade e clareza.
Parabéns!
Rodrigo,
A questão é saber em que intensidade está ocorrendo este artificialismo (sopomos que esteja ocorrendo). Isso nos daria a certeza do que está por vir.
Belo texto!
Rodrigo, uma off-topic, se me permite:
Não resisto a um fato estapafúrdio. Fui ao site www.dominiopublico.gov.br por curiosidade. Não há nada que preste por lá que não tenha em outros sites bem melhores, mas, ao clicar em Ciência Política, verifiquei que há 85 textos para baixar cujas origens editoriais são:
Marxists Internet Archive, 64; uma tal de CultVox, 9; outra tal de Phoenix-Library, 2; edições dos autores, 2 e da ONU, 8, assim divididos por autores:
León Trotsky 15 obras, Karl Marx 14, Lênin 12, Anton Pannekoek 8, Friedrich Engels 6, André Breton 3, Amadeu Bordiga 2, Rosa Luxemburgo 2, Mikhail Bakunin 2 e mais Antonio Gramsci, Che Guevara e etc. menos votados, com um cada.
Pois é, não sobrou nada para ler. Depois dizem que não há aparelhamento.
Senhor Rodrigo,
Acabei de ler um artigo seu sobre Niemeyer. Acredito piamente que você viverá 500 anos e jamais alcançará um milionésimo do reconhecimento à inteligência
de Niemeyer por todo mundo.
Com sinceridade, faz muitos anos que não lia um artigo com tanto amargura,com tanta acidez, com tanta inveja e com tanto ódio.
Com tantos traficantes, ladrões, assaltantes de cofres públicos, corruptos, chupins, analfabetos dando aula em universidades, etc, etc, etc....
E você escolheu para bater num homem de cem anos que vai
ser notícia daqui a mais cem ou duzentos anos.
E você... achando que fazendo média com alguns reacionários da extrema-direita... vai ser lembrado por muitos e muitos anos.
É muita inveja e despeito.
hahaha
Tem nego que adora puxar saco de comunista assassino. Desculpe a redundância.
*O post "Ultima cartada" está excelente.
"Com tantos traficantes, ladrões, assaltantes de cofres públicos, corruptos, chupins, analfabetos dando aula em universidades, etc, etc, etc....
E você escolheu para bater num homem de cem anos que vai
ser notícia daqui a mais cem ou duzentos anos."
Acontece que esse homem de 100 anos é aliado de genocidas, assassinos, corruptos e analfabetos que, muitas vezes, são aliados de traficantes.
"Não resisto a um fato estapafúrdio."
Cara, eu também não. Outro dia, acabei batendo de frente com um texto que dizia que, com a vitória do Sarkozy, a França ia voltar a ser mandada pelos EUA, como nos anos 60/70 e ia deixar de ter o boom econômico que teve nos anos 80/90 !
Eu quase morro de rir.
Sobre o assunto (até que enfim):
A analogia do bêbado é perfeita. Não tem outra melhor, principalmente se considerarmos que ressaca=recessão e cirrose=depressão.
O mais interessante, porém, é que o Lulla talvez seja capaz de entender como funciona o mercado financeiro.
Acham que um sujeito consegue se suspender puxando o seu próprio suspensório...
hauahauahauah
Rodrigo,
Esse artigo seu realmente é de tirar o chapéu. Didático. Deu um toque fantástico da importância do livre comércio e puxão de orelha nos Keynesianos por não ouvir os Austríacos.
Abraços,
Naza
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