Carta da MP Advisors
"Falar mal do
governo é tão bom que não deveria ser privilégio só da oposição"
Milton Campos, governador de Minas
Gerais entre 1946 e 1950.
O
governador mineiro, se vivo fosse, estaria frustrado em ver que sua frase não
faz muito sentido nos dias atuais. Afinal, mal existe uma oposição, e aqueles que se intitulam “oposição”, pelo
visto, não gostam de falar mal do governo. Já que a oposição não faz o que
tem que fazer, os bolsistas do andar de baixo (bolsa família) também não e tão
pouco os bolsitas do andar de cima (bolsa BNDES). Sobra para nós, os “sem bolsa”, essa deliciosa tarefa. Vamos a ela.
O objetivo desta carta é sair um
pouco da análise de curto prazo da política econômica e dos mercados e olhar um
pouco mais atentamente para outros direcionamentos do governo, que, no momento,
não impactam o seu bolso, mas no futuro irão afetar a sua vida e a de seus
filhos também.
Vamos
começar pelo conceito de meritocracia,
algo bem simples como: conquista-se
coisas na vida de acordo com seu esforço e mérito. Aquele que usa os finais de semana para
estudar tende a conseguir as melhores vagas nas universidades (e depois no
mercado de trabalho) do que aquele que fica fiscalizando a natureza na praia,
certo? Não mais. Desde a criação de um
programa eleitoreiro de compra de votos, o bolsa família (sem a famosa porta de
saída), passando pelo sistema de cotas e terminando no balcão dos amigos do
BNDES, o que vemos é um sistema perverso
que não estimula mais o esforço próprio e a busca pela superação.
O
atual sistema de incentivos estimula o "coitadismo", a troca de votos por migalhas e, no caso do
empresariado, de que mais valem bons contatos em Brasília do que a equação de
cérebro afiado mais trabalho duro. Tudo aponta para uma sociedade onde a tônica
é a "servidão voluntária"
ao estado babá. De onde se pode esperar crescimento de longo prazo advindo de uma
sociedade de zumbis? De onde virá a inovação?
Analisando
o sistema de cotas, sancionado pela presidente Dilma Rousseff, que reserva 50%
das vagas nas universidades públicas para alunos que cursaram todo o ensino
médio em escolas públicas. Desse total, a metade será voltada para estudantes
com renda familiar de até um salário e meio por pessoa. A outra metade para
alunos negros, pardos e índios de acordo com a proporção dessas populações em
cada estado, segundo o IBGE.
Há
aí uma meia verdade que se transforma numa falácia. Que os alunos vindos das escolas públicas são
precariamente formados, isto é um fato; porém não é correto correlacionar este
fato à baixa renda. Afinal, pelo ensino
público ser tão fraco academicamente é que as famílias de renda um pouco melhor
buscam as escolas particulares. Basta o
governo prover um serviço educacional digno, que haverá alunos de todas as
classes sociais nas escolas públicas. O
atual governo, em vez de endereçar o problema, ataca de forma populista as suas
consequências. O resultado é que os
cotistas se formarão em bem mais tempo do que os outros alunos, se é que se
formarão.
O input
do sistema educacional está dado, mas alguém já parou para pensar no output deste monstrengo? Deve
haver um aumento na evasão de alunos,
um menor número de formandos e uma qualidade deteriorada dos novos
profissionais. Se juntarmos essa
previsão com a informação de uma taxa de desemprego bem perto do que chamamos
de pleno emprego, podemos projetar uma economia de baixa produtividade e custo
alto. Em resumo, uma economia com competitividade
ainda pior do que temos hoje.
Outro
conceito a ser abordado é a estabilidade
de regras. Começando pela mais tenra
idade, sabemos que a criança criada com regras estáveis dentro de casa crescerá
de maneira mais saudável do que a criança em cuja casa os pais mudam a regra do
jogo toda hora. A criança do lar
instável tenderá a ficar mais insegura e, no futuro, repetirá o comportamento
de seus pais. O mesmo se aplica a
economia.
Vamos
ver o exemplo da fabricante coreana Kia Motors, que se instalou no Brasil
trazendo uma proposta de alta qualidade com preço acessível. Rapidamente, chegou a 80 mil unidades
vendidas, com uma boa rede de concessionárias e já caminhava para 100 mil
carros vendidos por ano quando o governo, atendendo ao pleito dos simbióticos
sindicalistas e montadoras, instalou um imposto de 30% sobre o automóvel
importado. Da noite para o dia, o que
acontece com o investimento de centenas de empresários e com a vida de milhares
de funcionários que saíram de suas atividades anteriores para seguirem o
Projeto Kia? Esse é o exemplo dos
coreanos, mas poderia ter sido outro qualquer.
Com o atual governo, quem é o
louco de alocar tempo e dinheiro no Brasil?
Somente se for muito bem conectado com Brasília, tiver uma ligação
direta com o BNDES (quem sabe um apreço pela letra "X"). Mesmo com tudo isso, não há garantia de
lucratividade.
A
estabilidade de regras é crucial quando entendemos que governo não gera crescimento (a despeito do que até alguns
vencedores de prêmio Nobel acreditam), ele apenas redireciona os recursos de A para
B. No Brasil, além disso, entre A e B há o pit
stop em C. Quem gera o crescimento
são as entidades privadas. Se elas não
tem regras estáveis de onde virá o estímulo ao crescimento?
O
mais dramático de tudo, é que nossa infraestrutura está bem apertada e sucateada
frente ao tamanho que chegamos. O governo demorou a reconhecer que o estado
não pode e nem consegue construir o que necessitamos, mesmo assim ele quer
ditar o quanto podem ganhar os operadores. Diga-se de passagem, bem pouco
frente aos riscos. O resultado disso é
que teremos investidores de segunda classe interessados. A concessão das
estradas em 2007, e seu resultado pífio, demonstram bem isso. A dos aeroportos
vai pelo mesmo caminho e o trem bala tem
tudo para ser a "transamazônica" dos petistas.
É
claro que ainda estamos em situação bem melhor do que estivemos na década de
80, porém nos preocupa ver que os pequenos assassinatos institucionais vão aos
poucos erodindo as conquistas e reformas dos anos 90 e nos levando de volta
para o passado. Tudo isso em nome de um esquerdismo anacrônico, autoritário e
de resultados pífios pelo mundo. Afinal o que é a economia senão a
psicologia aplicada à sistemas de incentivos corretos? Para nossa tristeza, os sistemas de incentivo
corretos estão sendo destruídos diuturnamente.
6 comentários:
"O resultado é que os cotistas se formarão em bem mais tempo do que os outros alunos, se é que se formarão. "
muito pior do que isso: os cotistas atrasarão toda a turma, o ritmo das aulas será freado, pois a metade da turma não vai acompanhar a outra metade. Resultado: nivelamento por baixo
"ainda estamos em situação bem melhor do que estivemos na década de 80"
nada que o PT não possa reverter!
Seu artigo 'capitalismo sem doping' foi retirado do globo? Tá dando 'página não encontrada' Olha só http://oglobo.globo.com/opiniao/capitalismo-sem-doping-6575580
excelente artigo Constantino, parabéns !
Vou me ater aqui exclusivamente à questão das cotas, 'repisando' observações para me contrapor às suas observações (que também são 'repisadas' no debate geral):
1 - seu argumento ignora a evidente desigualdade de oportunidades entre os jovens estudantes, evocando uma igualdade de direito que não é de fato; não é só por méritos que alguém passa num vestibular de uma universidade pública, mas também (e primordialmente) por ter recebido educação que o deixa em vantagem suficiente quanto a outros candidatos.
2 - quanto a estudos/estatísticas para suportar argumento contra ou a favor, cabe observar as experiências favoráveis, por exemplo, nos EUA (e não adianta mencionar o Sowell como se fosse o único estudioso da questão) e dados, em experiências no Brasil, demonstrando que o desempenho dos cotistas, em geral, não fica a dever em relação aos não-cotistas (sendo que há também medidas para apoiá-los, como bolsas para que consigam pagar a passagem e necessidades afins- pelo menos na UERJ, aqui no Rio).
3 - o argumento de que o ideal é melhorar a qualidade do ensino básico público (evidentemente! Quem se diz contra?) se opõe às próprias cotas é criar uma falsa dualidade: 'ou o ensino passa a ser bom ou cria-se cotas'; uma coisa não exclui a outra.
4 - especialmente quanto às cotas 'raciais', ressalto à sua defesa pelo viés político mesmo, simbólico, de educação da sociedade em ver o negro/pardo/caboclo onde comodamente nos habituamos a ver apenas brancos/orientais. Não 'paga' escravidão ou genocídio de indígenas; lembra à sociedade que o espaço da faculdade também é para eles, combate a visão segregadora já internalizada na famosa 'cor padrão' das abordagens policiais. E isto se aplica, respeitadas as diferenças, a cotas para minorias em geral, como por exemplo até a cota para mulheres candidatas nos partidos.
Quando será que vão parar de achar que é fácil conseguir vaga por cota? Sou cotista na Ufscar no curso de economia e tive que ralar muito para conseguir entrar. Na verdade, é mais difícil conseguir vaga por cota do que em faculdades particulares para o mesmo curso, mesmo se for nas melhores como PUC e Mackenzie. Então se o cotista não está preparado, o que dizer dos universitários da PUC e Mack?
"De todas as ficções com as quais o sistema capitalista se legitima, a mais hipócrita delas é a da igualdade de oportunidades. A meritocracia é uma ficção que só se realizaria se não houvesse heranças. No mundo real, ninguém começa a vida do zero; somos herdeiros não só do patrimônio, mas da cultura e da rede de relacionamentos de nossos pais. Alguns já nascem na pole position, com os melhores carros; outros se digladiam na última fila de largada em calhambeques não muito competitivos.
Quem é o melhor? O piloto que vence a corrida largando na pole position e com o melhor carro ou aquele que largou em último e chega com seu calhambeque em segundo lugar? Quem tem mais mérito?"
texto extraído de:http://tuliovianna.org/2011/01/18/cotas-da-igualdade/
Concorda com isso, Rodrigo? Qual seria a posição do liberalismo em face da questão da "herança"? (uns já nascem milionários, com infinitas oportunidades de se tornarem ainda mais ricos, e outros dependem de um esforço sobre-humano para subir um pouco na vida)
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