segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Insanos!

Rodrigo Constantino

“Mesmo o homem supersticioso tem direitos inalienáveis. Ele tem o direito de defender suas imbecilidades tanto quanto quiser. Mas certamente não tem direito de exigir que elas sejam tratadas como sagradas.” (H. L. Mencken)

Quais são os limites da liberdade de expressão? Ora, os que acham que a liberdade de expressão encontra seu limite em “ofensas” ou mesmo “blasfêmia”, não defendem liberdade de expressão, mas ditadura do politicamente correto. Os indivíduos estariam limitados a repetir o consenso. Isso não é liberdade. Liberdade de expressão pressupõe que iremos escutar coisas que não concordamos, que não gostamos, e sim, que até nos ofende.

As charges de Maomé impressas em um jornal dinamarquês alimentou um caloroso debate sobre a questão da liberdade de expressão. Infelizmente, os debates parecem gerar muito calor, e pouca luz. Alguns partem automaticamente para a condenação do jornal, como se fosse um tamanho absurdo o ato, que até justificaria a reação insana dos fanáticos, que depredaram embaixadas, jogaram bombas e mataram inocentes. Os desenhos podem até ser de mau gosto, o que é uma outra discussão. Mas apenas um demente pode achar que a reação é proporcional a ação.

Na verdade, isso mais parece um pretexto usado pelos lunáticos que pregam a Jihad. Eles querem acelerar um eventual choque de civilizações, e não ligam para a evidente hipocrisia dessa reação em cadeia agora. É um revival do episódio com o autor de Versos Satânicos, cujo assassinato foi incitado por aiatolá Kohmeini. E o mais lamentável de tudo isso é o fato de que até mesmo ocidentais apelam para o “relativismo cultural” para compreender e justificar tais barbaridades. Claro, o relativismo tem dois pesos e duas medidas, e serve apenas para um lado. O relativismo é relativo!

Não há justificativa plausível para tolerarmos a intolerância de alguns fundamentalistas religiosos. Como nos alerta Sir Karl Popper, “não devemos aceitar sem qualificação o princípio de tolerar os intolerantes senão corremos o risco de destruição de nós próprios e da própria atitude de tolerância”. Os fanáticos utilizam a liberdade e a democracia ocidentais como armas contra o próprio Ocidente. A reação violenta de alguns muçulmanos nos remete aos anos da Inquisição, onde a “blasfêmia” é motivo para a morte dos “hereges”. O objetivo dos seguidores radicais do Islã é claro, e está nos escritos: morte aos infiéis. O próprio profeta foi um guerreiro empedernido, e comandou quase 30 expedições militares, levando vários “infiéis” a morte.

A “lógica” dos defensores dos muçulmanos nesse triste episódio é incrível. Um líder do governo do Irã prega abertamente que o Holocausto não existiu, que Israel deve ser varrido do mapa, e declara que pretende investir na tecnologia nuclear ignorando a ONU, e isso é absolutamente aceitável. Se os Estados Unidos têm armas nucleares, por que o Irã não pode ter também? Eis o “argumento” deles. Mas quando um jornalista, de uma empresa privada, faz uns desenhos de Maomé, isso é o pior crime do mundo, e as atrocidades cometidas pelos malucos passam a ser culpa do próprio Ocidente. Simplesmente fantástico!

O autor do sucesso O Código Da Vinci, Dan Brown, escreveu um livro repleto de inverdades sobre o Vaticano. Entretanto, ninguém consideraria razoável que o Papa pedisse a pena de morte do autor, e que católicos saíssem jogando bombas em inocentes. O grau infinitamente mais civilizado com que o Ocidente reage às questões religiosas é prova da sua superioridade vis-à-vis o mundo islâmico, ainda fortemente tribalista e teocrático. Não cabe relativismos aqui. Estamos diante do atraso, presenciando uma tentativa de retrocesso à barbárie. Choca que alguns consumidores dos avanços ocidentais, tais como liberdade de expressão, Estado laico e democracia, tomem partido contra o próprio Ocidente, buscando escusas para os atos insanos desses fanáticos. Seria medo, ou pura hipocrisia?

Por fim, lembro do aviso de Gustave Le Bon: “Uma das características mais comuns das crenças é a intolerância. Quanto mais forte a crença, maior a intolerância. Homens dominados por uma convicção não são capazes de tolerar aqueles que não a aceitam”. Para o bem da Humanidade, espero que a suposta “blasfêmia” não seja mais considerada um crime, e que o direito de liberdade de expressão tenha mais valor que o fanatismo de alguns insanos.

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