segunda-feira, maio 02, 2011

Real ajuda Brasil a alcançar países ricos em altos preços

John Lyons | The Wall Street

O Brasil aspira há gerações entrar para o clube dos países ricos. Em uma medida, já chegou lá: São Paulo e cidades como o Rio estão agora entre os lugares mais caros do mundo.

O grande motivo é que o real subiu cerca de 40% em relação ao dólar em dois anos. Acrescente a isso uma inflação anual de 6,4% e os paulistanos estão de repente pagando até R$ 24, o equivalente a US$ 15, para ir ao cinema - mais do que os nova-iorquinos.

É fato que, com salários em reais, os brasileiros estão de maneira geral isolados das variações cambiais que encarecem as coisas no país em dólar, já que seus salários também aumentam em relação à moeda americana. Mas eles também começam a sentir a mordida da inflação que decorre da economia aquecida.

É uma virada notável em relação a dez anos atrás, quando terrenos, aluguel e mão de obra eram baratos em dólares e deixavam o país atraente para investidores aventureiros - e um paraíso ensolarado para os turistas com orçamentos apertados. Um frenesi de investimento mundial para o Brasil e outras economias emergentes está mudando isso ao fazer o real subir à estratosfera.

Depois de chegar a R$ 1,57 por dólar na semana passada, o real está perto de um recorde em três anos e, de acordo com o Goldman Sachs, é provavelmente a moeda mais supervalorizada do mundo.

Isso tem implicações perigosas para a economia - e serve de alerta para outros mercados emergentes. Ao se tornar mais caro em dólares, o Brasil perde a vantagem competitiva que uma divisa fraca proporciona na economia mundial. Colunistas brasileiros queixam-se com regularidade de uma "desindustrialização" que pode decorrer de uma moeda forte que torne a indústria local pouco competitiva.

A JBS SA, maior produtora de carne do mundo, informa estar exportando menos do Brasil porque muitos clientes internacionais não conseguem mais arcar com o custo. Enquanto isso, as exportações dos frigoríficos da JBS nos Estados Unidos estão aumentando.

O problema é que o Brasil está ficando tão caro quanto os países ricos antes que possa realmente competir com eles. Em dólares, os trabalhadores brasileiros começam a ganhar salários de mundo desenvolvido, embora a produtividade seja menor. Para as empresas estrangeiras, muitas vezes custa tanto, ou mais, fazer negócios no Brasil do que nos EUA, embora as empresas brasileiras tenham a desvantagem de estradas ruins e portos ruins, apagões, criminalidade elevada e impostos mais altos.

Os altos preços proporcionam um contraste gritante com a pobreza que continua comum no Brasil, com milhões ainda vivendo em precárias favelas ou subúrbios. A renda deles está ficando atrás dos saltos nos custos de transporte e alimentação, diz Marcelo Neri, um economista da Fundação Getúlio Vargas.

Já os políticos brasileiros não se deixam ficar atrás da alta dos preços. Em dezembro, o Congresso se deu um aumento de 62%, fazendo com que o salário dos parlamentares chegasse a R$ 26.700, o que dá, por ano, o equivalente a US$ 210.000, em comparação com US$ 174.000 dos deputados e senadores americanos.

Há exemplos de sobra dos altos custos brasileiros. O custo de contratação de executivos para organizar os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio, é maior do que para os jogos de 2012, em Londres, informa a Odgers Berndtson, a firma que fez a contratação para ambos. O aluguel de escritórios no Rio está mais caro agora em dólares do que no centro de Manhattan, segundo a imobiliária Cushman & Wakefield.

Há que se dizer que algumas coisas sempre foram incrivelmente caras na economia em boa parte fechada, bastante tributada do Brasil. Um Honda Civic básico custa cerca de US$ 21.400 nos Estados Unidos. No Brasil, os preços começam no equivalente a US$ 39.000.

A tendência talvez seja mais evidente para os viajantes que chegam ao Brasil com dólares no bolso. Viajantes de negócios estrangeiros queixam-se entre si das caipirinhas que custam até R$ 29, ou US$ 18, no bar MyNY do Itaim-Bibi e não conseguem acreditar que uma noite no hotel Renaissance da Marriott em São Paulo pode custar 50% mais do que no mesmo hotel em Manhattan.

"Não me lembro de preços assim em todos os meus 40 anos cobrindo o Brasil, e quando vivi lá", diz o economista John Welch, que cresceu no país e visita São Paulo com frequência como economista do Macquarie Bank.

Para Welch, uma questão importante é se parte dos preços mais altos do Brasil reflete bolhas de ativos. Uma preocupação é que uma moeda supervalorizada possa provocar bolhas imobiliárias, diz, o que cria imprevisibilidade na economia.

Os preços dos apartamentos em Ipanema dobraram em reais desde 2008, diz Sérgio Freire, presidente da Brasil Brokers, uma das maiores corretoras imobiliárias do país. Os preços subiram 50% só nos últimos 12 meses nos bairros próximos dos locais em que estão sendo construídas as instalações para a Olimpíada de 2016, diz.

"Os terrenos ficaram muito caros porque tudo está sendo comprado, há um choque no custo da construção e ao mesmo tempo há compradores com mais renda", diz Freire.

Lidar com a alta dos preços se tornou um dilema delicado para a presidente Dilma Rousseff.

O Brasil precisa de altas taxas de juros para segurar a inflação. Mas a elevação dos juros pode tornar o real ainda mais supervalorizado ao atrair mais dinheiro estrangeiro. O Banco Central elevou os juros para 12% ao ano este mês, o terceiro aumento este ano, depois que a inflação chegou ao nível mais alto desde 2008. A previsão é de que haverá mais altas de juros.

O real está se valorizando por bons motivos, de maneira geral. A economia brasileira cresceu 7,5% no ano passado, atraindo enormes montantes de investimento estrangeiro. Mas o Brasil também está na ponta receptora de investimentos especulativos que partem de países ricos como os EUA, onde os juros são baixos, para tirar proveito dos juros brasileiros, que estão entre os mais altos do mundo. Isso força o real a subir ainda mais.

Cerca de US$ 35 bilhões em capital estrangeiro entraram no Brasil nos primeiros três meses de 2011, mais do que no ano passado inteiro.

O Brasil não está sozinho. Uma enxurrada de investimento do mundo desenvolvido está valorizando as moedas de vários mercados emergentes, o que torna as economias de países como Coreia do Sul e Chile mais caras.

Por outro lado, o real forte está até produzindo um novo jet set brasileiro que gastou US$ 2 bilhões nos primeiros dois meses do ano - um aumento de 33% em relação a 2010 - em cidades estrangeiras cujas moedas são mais fracas, como Buenos Aires ou Miami.

Ao mesmo tempo, as diárias de US$ 400 dos hotéis butique nas ruas de paralelepípedo de Salvador estão afugentando a clientela majoritariamente europeia, dizem donos de hotel.

"Acho que eles estão indo para a Ásia", disse o gerente de um hotel boutique praticamente vazio no Pelourinho.

Comentário: Se o Brasil já é uma bolha, não sei dizer. Mas que há muita espuma, isso há! Temos uma das moedas mais caras do mundo, o setor imobiliário cresce de forma preocupante, os gargalos de sempre começam a cobrar seu preço. A inflação passa de 6% ao ano, e o governo continua gastando muito, estimulando o crédito (que ainda cresce a 20% ao ano), e mantendo um Banco Central sem independência e "atrás da curva" (juros abaixo do necessário). O governo está brincando com fogo. Eis a analogia que faço: somos um Gurgel numa estrada cheia de buracos, a 150 km/h, com o carro trepidando e parafusos começando a soltar, e uma mulher no volante que não vê problema em acelerar mais o carro sem as devidas condições de segurança. Quais as chances de dar algo errado?

6 comentários:

Anônimo disse...

Se não explicar logo que a "mulher no volante" é a Dilma, as feministas vão cair matando no blog. Hehehe

João disse...

Não entendi esse trecho: "cidades estrangeiras cujas moedas são mais fracas, como Buenos Aires ou Miami". Quer dizer que, além de falar espanhol, Miami trocou o dólar pelo peso???

No mais, o artigo é muito bem. Reflete com equlíbrio e precisão em que o Brasil avançou: custo. Só faltou dizer que a avalvanca são eventos que devem se tornar fracassos fragorosos para a economia do (povo do) país: a Copa e os Jogos Olímpicos, que saírão mais caros por conta dos atrasos e cujo possível legado pode ser visto na matéria de hoje dO Globo sobre as rachaduras no asfalto da Vila do Pan.

Agora, que bar é esse onde uma caipirinha custa R$ 29??? A única vantagem é que não dá para ficar bêbado por falta de dinheiro para bancar o porre hehe

Anônimo disse...

Quer dizer que agora os países são empresas que competem entre si? Abraçou a lógica mercantilista de mercado internacional? Quer dizer que o câmbio valorizado é ruim ? Importações são ruins também? Rodrigo virou keynesiano e não percebi?!

Unknown disse...

Rodrigo, seu artigo é muito bom mas, discordando de você, acredito que existem outros meios (dentro das circunstâncias, mais eficazes) de controlar a inflação sem mexer bruscamente na SELIC.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
samuel disse...

Rodrigo, V está moderado neste artigo. 7,5% de crescimento em 2010 não recompõem o mesmo nível de PIB de 2009. 5% sobre 100 é 105. Agora 7,5% sobre 80 (2010 partiu de um PIB lá embaixo) é 86. A economia ainda não recuperou 2008. A desindustrialização é um fato (Zé Alencar que o diga - ele enviou a produção de todas as suas empresas para China). O modelo deixado por Fernando Henrique e adotado pelo PT está no limite da exaustão: Impostos na casa dos 38% Juros internos absolutamente ridículos (o banco me avisou em meu c/c que os juros para o limite passou de 173% para 177%)
ISSO NÃO MERECE UM ARTIGO MAIS RETUMBANTE DE SUA PARTE?