Idéias de um livre pensador sem medo da polêmica ou da patrulha dos "politicamente corretos".
quarta-feira, agosto 30, 2006
Conversa com Gabeira
Rodrigo Constantino
“A população já descobriu que o PT é igual aos outros que ele denunciava.” (Fernando Gabeira)
Estive em uma pequena reunião informal com o deputado Fernando Gabeira, onde pude fazer perguntas diretas sobre diversos assuntos. Em um resumo geral, ficou a imagem otimista de que seres humanos podem evoluir com o tempo. Gabeira ainda defende muitas idéias que eu condeno, colocando demasiada fé na capacidade estatal de consertar problemas – muitas vezes criados pelo próprio Estado. Mas comparado ao Gabeira que sonhava o sonho comunista e que chegou a participar do seqüestro do embaixador americano, adotando a máxima de que os fins justificam os meios, o atual é infinitamente melhor, mais amadurecido e realista.
Gabeira tem sido uma voz firme na oposição a este governo de quadrilheiros, e lutado como pode contra o corporativismo do Congresso. Saiu do PT com forte desgosto pela incompetência, antes mesmo dos escândalos infindáveis de corrupção. Reconhece que há poder demais concentrado em Brasília, e que a divisão entre esquerdistas e direitistas não é mais a crucial, e sim a que separa os republicanos dos patrimonialistas. De um lado, os que pretendem fazer algo pelo bem público, e do outro os que entram na política para aumentar o patrimônio pessoal. Gabeira entende ainda que o poder corrompe, e que a ocasião ajuda a fazer o ladrão. Afirma que confia diretamente em cerca de 10% dos congressistas, mas que vários outros não necessariamente praticariam atos ilícitos, fossem as oportunidades para tanto reduzidas. E isso passa pela redução do dinheiro que trafega pelas mãos dos políticos, assim como o poder.
O deputado defendeu que os governos não mais tenham o direito de alterar boa parte do quadro de burocratas, colocando “companheiros” nos cargos importantes por critérios políticos e prejudicando o funcionamento da máquina, que deveria ser mais independente. Em vários aspectos, Gabeira agora espelha-se no modelo americano. Deixou os dogmas ideológicos de lado e partiu para o bom senso. Até mesmo na questão ambiental – bandeira antiga – entende que há pouca compreensão por parte do governo das necessidades de se levar em conta os investimentos produtivos, muitas vezes engavetados por critérios absurdos, colocando o crescimento econômico em risco. Gabeira entende que a competitividade das empresas brasileiras precisa melhorar urgentemente, posto que a globalização pode fazer muito bem para o país, caso bem explorada. Lembrou a metáfora do leão e do antílope, onde o leão precisa correr mais rápido que o antílope mais lento, enquanto que o antílope precisa correr mais rápido que o leão mais rápido. Não importa se você é leão ou antílope, o importante é acordar e começar a correr! Duro é fazer isso com uma bola de chumbo amarrada num pé – os impostos extorsivos, e outra no outro pé – a burocracia asfixiante.
Não foram poupadas críticas ao PT no bate-papo, tampouco aos membros da esquerda retrógrada, ainda adeptos do comunismo. Gabeira condenou veementemente a postura do governo sobre a questão de Cuba, por exemplo. Quando perguntado sobre ideologias, evitou um rótulo, mas acabou por se considerar um capitalista. Sobre a citação na epígrafe acima, não faz justiça ao que foi dito por Gabeira na conversa informal. Ele parece compreender que o PT, na verdade, não fez “mais do mesmo”, e sim algo bem pior, uma verdadeira tentativa de tomar o controle de toda a máquina estatal. O “mensalão”, por si só motivo suficiente para um impeachment, é apenas a ponta do iceberg. A quadrilha, nas palavras do procurador da República, tinha objetivos muito mais amplos que a compra de deputados.
O petit comité reunido para escutar as idéias de Gabeira foi útil para eu verificar, uma vez mais, que nem tudo está perdido. O jovem Gabeira representava tudo que eu combatia, e o novo Gabeira tem idéias bem mais sensatas e racionais. Não foi suficiente para a conquista do meu voto, é verdade. Ainda tenho muitas divergências em relação ao papel que Gabeira atribui ao Estado na construção de um país mais livre e justo. Mas como já disse, perto do que ele defendia no passado, atualmente estaria inclinado a considerar Gabeira quase um aliado liberal. Quem sabe com mais alguns anos – e novas decepções com o Estado – ele não chega lá!
Perigosa Segregação
Rodrigo Constantino
A existência de uma classe média é fundamental para evitar que democracia vire sinônimo de ditadura das massas. Nos países desenvolvidos, a formação de uma grande classe média tem impedido com razoável sucesso que governantes abusem do poder de forma grotesca, diferente do caso de uma Venezuela, onde um povo segregado entre os muito ricos e os muito pobres acaba vítima do populismo autoritário de um Hugo Chávez da vida.
Em Política, Aristóteles levantou diversos riscos da democracia, e percebeu também que esses riscos seriam mitigados em uma sociedade com grande classe mediana, sem muita desigualdade, e mais educada. Ele lembrou que “em toda parte onde uns têm demais e outros nada, segue-se necessariamente que haja ou democracia exacerbada, ou violenta oligarquia, ou então tirania, pelo excesso de uma ou de outra”. Portanto, os riscos da democracia são ainda maiores nas sociedades muito desiguais, posto que a massa fica ainda mais suscetível à manipulação dos demagogos, que concentram poder quase ditatorial.
Infelizmente, o Brasil parece estar caminhando rapidamente para este cenário. Com uma carga tributária beirando os 40% do PIB e uma burocracia asfixiante, é a classe média que paga o grosso da conta, pois não dispõe de mecanismos para fuga. Os muito pobres nada têm para entregar, e os muito ricos acabam locupletando-se com os políticos poderosos. O modelo estatal hipertrofiado tem segregado o povo brasileiro, praticamente condenando a classe média à extinção. Trata-se de um perigoso quadro, favorável para radicais revolucionários, tais como o MST. Para reverter essa perigosa segregação, só mesmo reduzindo drasticamente o maior concentrador injusto de renda: o Estado. Caso contrário, o pouco que restou da classe média poderá sentir saudades até de Lula um dia, quando Pedro Stédile lograr a tomada do poder...
A existência de uma classe média é fundamental para evitar que democracia vire sinônimo de ditadura das massas. Nos países desenvolvidos, a formação de uma grande classe média tem impedido com razoável sucesso que governantes abusem do poder de forma grotesca, diferente do caso de uma Venezuela, onde um povo segregado entre os muito ricos e os muito pobres acaba vítima do populismo autoritário de um Hugo Chávez da vida.
Em Política, Aristóteles levantou diversos riscos da democracia, e percebeu também que esses riscos seriam mitigados em uma sociedade com grande classe mediana, sem muita desigualdade, e mais educada. Ele lembrou que “em toda parte onde uns têm demais e outros nada, segue-se necessariamente que haja ou democracia exacerbada, ou violenta oligarquia, ou então tirania, pelo excesso de uma ou de outra”. Portanto, os riscos da democracia são ainda maiores nas sociedades muito desiguais, posto que a massa fica ainda mais suscetível à manipulação dos demagogos, que concentram poder quase ditatorial.
Infelizmente, o Brasil parece estar caminhando rapidamente para este cenário. Com uma carga tributária beirando os 40% do PIB e uma burocracia asfixiante, é a classe média que paga o grosso da conta, pois não dispõe de mecanismos para fuga. Os muito pobres nada têm para entregar, e os muito ricos acabam locupletando-se com os políticos poderosos. O modelo estatal hipertrofiado tem segregado o povo brasileiro, praticamente condenando a classe média à extinção. Trata-se de um perigoso quadro, favorável para radicais revolucionários, tais como o MST. Para reverter essa perigosa segregação, só mesmo reduzindo drasticamente o maior concentrador injusto de renda: o Estado. Caso contrário, o pouco que restou da classe média poderá sentir saudades até de Lula um dia, quando Pedro Stédile lograr a tomada do poder...
segunda-feira, agosto 28, 2006
Triste Época
Rodrigo Constantino
“Muitos valores vieram a parecer antiquados: falar a verdade, manter a palavra. Os bons parecem pertencer aos velhos bons tempos, embora sejam sempre queridos. Se é que ainda há alguns, são raros, e nunca são imitados. Que triste época esta, quando a virtude é rara e a maldade está no cotidiano.”
Tal comentário poderia tranqüilamente ter sido obra de qualquer brasileiro mais atento dos nossos dias. Afinal, a ética foi jogada no lixo, a impunidade anda solta e mentir virou mania nacional. Vivendo nos tempos do “mensalão”, das sanguessugas, do presidente que repete que não sabia de nada enquanto seus principais aliados envolvem-se em escândalos onde ele próprio é o grande beneficiado, não dá para deixar de compartilhar do sentimento do autor que lamenta a triste época, quando a virtude é rara – mais rara que diamante.
Mas o autor do comentário não vive em nossos dias, tampouco no Brasil. Trata-se de Baltasar Gracián, jesuíta espanhol que escreveu A Arte da Prudência em 1647. Neste mesmo livro, Gracián cunhou uma célebre frase que parece ter sido criada ad hoc para os eleitores de Lula: “A esperança é uma grande falsária da verdade”. Quem lembra da propaganda eleitoral de Lula nas eleições passadas, administrada por Duda Mendonça, sabe muito bem disso. “A esperança venceu o medo”, repetia a propaganda enganosa. Nisso que dá abolir o medo, fundamental na vida, para que busquemos mais informações na hora das decisões importantes. Sem medo, podemos pular pela janela e se espatifar no chão. Ou votar no Lula – o que dá praticamente no mesmo.
Mas vamos deixar o pessimismo de lado e focar no aspecto bom da coisa: se em 1647 já era normal este tipo de lamentação, é sinal que sobrevivemos, mesmo com os Lulas da vida. A virtude pode ser rara, ainda mais quando alguém como Lula, mesmo depois de todos os escândalos, lidera as pesquisas e apresenta boas chances de ser reeleito ainda no primeiro turno. Mas ela não é nula! E isso faz toda a diferença do mundo.
Os virtuosos conseguem sobreviver mesmo no meio dos pérfidos, e no final do dia, carregam o mundo nas costas. Parasitas e sanguessugas pegam carona e regozijam-se, como sempre. São maléficos para a saúde da sociedade como um todo, mas não são letais. Os hospedeiros, aqueles que criam a riqueza que será explorada por tais parasitas e sanguessugas, suportam o fardo. O mundo poderia ser infinitamente melhor sem tais exploradores, com certeza. Mas ele não vai acabar por conta dessa gente, por mais que se esforcem para tanto. A vida continua, com ou sem Lula no governo. Muito melhor sem, claro. Mas não vamos esquecer que a época é triste para os virtuosos...
domingo, agosto 27, 2006
Bingo!
Rodrigo Constantino
O destaque na capa do jornal O Globo deste domingo era sobre os bingos, em chamada que falava sobre o faturamento bilionário do setor obtido com liminares e possível pela tolerância policial. Desde 2003, quando a Justiça federal do Rio determinou o fechamento de todas as casas no estado, o mercado, em vez de diminuir, aumentou. São hoje 47 bingos no estado, segundo a reportagem do jornal. E a vista grossa da polícia permitiria que a exploração dos bingos seja um negócio bastante rentável.
O cerco contra os bingos fechou quando o braço direito de José Dirceu, então todo-poderoso ministro de Lula, foi flagrado numa fita acertando propina com um bicheiro ligado aos bingos. Homem de extrema confiança de Dirceu, inclusive com fortes laços pessoais devido a uma ligação de 12 anos, Waldomiro Diniz foi pego numa gravação de vídeo cobrando propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Waldomiro era subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, e pelas evidências apresentadas extorquia dinheiro dos contraventores para engordar o caixa do partido. O esquema contava com a estrutura dos bingos. O PT se mobilizou para evitar a “CPI dos Bingos”, e, em vez de estimular o avanço das investigações, decidiu simplesmente fechar as casas de jogo, que geram vários empregos. A postura do governo Lula foi a do marido traído que, ao flagrar a esposa com outro no sofá da sala, resolve jogar fora o sofá.
O “argumento” de que há muita corrupção associada aos bingos, incluindo lavagem de dinheiro, e que por isso eles devem ser vetados, é totalmente absurdo. Por essa “lógica”, teríamos que acabar com a polícia e fechar o mercado financeiro. A fiscalização deve conter os abusos, mas estes não devem tolher o uso. O presidente da Federação Brasileira de Bingos, Carlos Eduardo Canto, estima que o setor poderia gerar R$ 2,6 bilhões em impostos por ano, e que os 500 bingos de todo o país estão dispostos a ser fiscalizados. Ele disse algo muito ignorado atualmente por várias pessoas: “Todo setor que fica na clandestinidade acaba caindo nas mãos de bandidos; os empresários sérios acabam desistindo do negócio”. O próprio governo está lançando na ilegalidade um setor que poderia estar gerando mais empregos e recolhendo tributos aos cofres públicos.
O caso do jogo do bicho é exemplar nesse ponto. O jogo recebeu esse nome quando foi lançado, em julho de 1892, por João Batista Vieira Drummond, o barão de Drummond, dono de uma chácara com um pequeno jardim zoológico localizado em Vila Isabel, Rio de Janeiro. Antes do bicho, havia outros jogos semelhantes no Brasil, como os jogos das flores, das frutas e dos pássaros. Manuel Zevada, um mexicano e influente banqueiro do jogo das flores, propôs ao barão a criação de uma réplica de tal jogo, mas no caso usando bichos. O objetivo era conseguir recursos para manter os animais e toda a estrutura do zoológico. Os visitantes eram estimulados a participar de sorteios. Cada bilhete trazia o desenho de um bicho. Tratava-se claramente de um empreendimento criativo. Mas o governo, ao que parece, não gosta de competição, e condenou os “banqueiros do bicho” à ilegalidade, ainda que o próprio governo ofereça loterias. O convite ao crime foi feito pelo próprio governo.
Na mesma linha, temos o exemplo do ramo de cervejas. Em Chicago, durante a Lei Seca, tivemos o famoso Al Capone, um criminoso que se meteu em diversos negócios ilegais, uma vez que seu contrabando de bebidas proibidas já tinha aberto o caminho para o resto. O governo havia decidido, através de uma lei, que a demanda existente da população por bebidas com álcool não mais poderia ser atendida pelo livre mercado. Ocorre que papel e caneta nunca foram capazes de alterar as leis da natureza, e a demanda continuou existindo. Alguém iria atendê-la, e este foi Al Capone. O governo o transformou num criminoso, foi o verdadeiro responsável pelo surgimento de alguém como ele. Tanto que quando o governo voltou atrás, tivemos o nascimento de grandes e importantes empresas, como a Coors, cuja família controladora pode freqüentar os mais nobres clubes.
O outro “argumento” contra a legalização dos jogos é tão absurdo quanto o primeiro. Falam que um povo ignorante e miserável será levado ao entorpecimento da jogatina, arriscando o pouco que ganham na sorte grande. Mas ora, o próprio governo vende sonhos desse tipo, através de suas loterias! Além disso, teríamos que acabar por decreto com a Igreja Universal também, que explora justamente essa fraqueza humana que busca consolo rápido para as calamidades. Apesar da tentação dessa medida, sabemos que ela não faz sentido algum, e representa um autoritarismo digno de um ditador.
Quem somos nós para decidir o que cada indivíduo fará da sua própria vida? Que direito tem a maioria, ou o Estado, de intervir numa decisão pessoal que diz respeito somente ao indivíduo? Liberdade pressupõe responsabilidade. Não podemos defender o direito de voto – infelizmente um dever no Brasil – e logo depois considerar os cidadãos como mentecaptos, incapazes de decidir sozinhos o rumo de suas vidas. Não faz sentido algum. É uma enorme contradição pregar o sufrágio universal da democracia ao mesmo tempo que o paternalismo estatal. E um Estado que proíbe o jogo porque os pobres cidadãos seriam vítimas de uma irresistível tentação é extremamente paternalista. Cidadãos não são súditos, tampouco filhos do governante do momento. Ao contrário, o governante é empregado do povo, e não tem o direito de jogar na ilegalidade um setor que atende uma demanda que afeta somente o indivíduo em si.
Acertou quem entendeu que o grande culpado pela situação criminosa no setor de jogos, incluindo o bingo e o bicho, é o próprio governo. Bingo!
sexta-feira, agosto 25, 2006
Casas de Espuma
Rodrigo Constantino
“Paradoxical as it may seem, the starting point for crises and depressions may be found in abundance rather than in scarcity, whether of money or capital.” (Burton)
O setor de casas nos Estados Unidos ganhou maior destaque na mídia internacional recentemente, com indicadores que podem estar apontando para o estouro da “bolha” imobiliária – ou “espuma”, como disse Greenspan. O setor, que tem sido considerado a locomotiva da economia global, puxando o crescimento dos países emergentes, pode estar cansando. Quais os efeitos dessa possível virada ninguém sabe ao certo. Melhor, entretanto, estar prevenido para tempos mais complicados a frente.
Do lado mais pessimista, abrigando vários analistas, o economista-chefe do Morgan Stanley, Stephen Roach, tem sido um dos que mais alardeia uma reação mais drástica por conta da queda no setor de casas dos EUA. Ele lembra que o preço das casas americanas atingiu um pico de 27 anos em 2005, e ainda estava subindo 20% no primeiro trimestre deste ano em 53 áreas metropolitanas pelo país. O estoque de casas não vendidas tem aumentado consideravelmente, subindo 40% em 12 meses terminados em julho para casas existentes e 22% para novas casas. Os preços médios ainda têm se mostrado resilientes, no entanto. Mas Stephen Roach acredita ser apenas uma questão de tempo para que desabem.
Os investidores já acusam o golpe, e 15 empresas de construção nos Estados Unidos perderam, no total, US$ 27 bilhões de valor de mercado desde o começo do ano, uma queda de 34%. Desde o pico, as ações dessas empresas caíram, na média, 44%. Segundo Roach, o setor de construção tem sido responsável por 0,5 ponto percentual ao ano no crescimento do PIB americano, e deverá subtrair algo como um ponto percentual nos próximos anos. Fora isso, há o efeito riqueza que a alta nos preços das casas gera. Pelos dados do Federal Reserve, o mercado de hipotecas sacou mais de US$ 700 bilhões no primeiro semestre de 2006, em termos anualizados. Trata-se de um enorme estímulo ao consumo. Roach estima que esse efeito riqueza tem sido responsável por mais 0,5 ponto percentual de crescimento econômico, devendo retornar para zero agora, ou mesmo cair no território negativo.
Em resumo, a economia americana, que vem crescendo 3,2% ao ano nos últimos 3 anos, poderá migrar para uma taxa mais próxima de 1% de crescimento, o que não chega a ser uma recessão, mas poderá causar um bom estrago nos mercados financeiros. O impacto nas demais economias poderá ser grande também, posto que os americanos são responsáveis por 70% do déficit comercial no mundo, ou seja, os consumidores americanos são os grandes compradores dos produtos exportados por todos os países. Nem todos compartilham dessa visão mais negativa, por diversas razões. O Goldman Sachs, por exemplo, considera que a dinâmica interna da Ásia irá permitir que a região atravesse razoavelmente ilesa esta correção americana. Outros analistas não chegam a ser tão pessimistas nem mesmo no que diz respeito ao setor de casas nos Estados Unidos, considerando que a “espuma” é mais localizada em certas regiões, e que a queda nos preços será bem gradual, sem maiores estragos para a economia.
A bolha imobiliária americana – se é que ela de fato existe – irá mesmo estourar em breve? Caso isso ocorra, qual será o verdadeiro impacto no resto do mundo? São perguntas de um trilhão de dólares, e ninguém sabe ao certo as respostas. O que sabemos, até agora, é que este tem sido um importante setor para o crescimento global, que por sua vez está em patamares bastante elevados. Os países emergentes, como o Brasil, têm surfado uma enorme onda favorável por conta disso. Os indicadores macroeconômicos melhoraram, o preço das commodities subiram, as exportações deslancharam. Será que esse cenário benigno irá perdurar por muito mais tempo? Parte dessa resposta depende justamente do setor de casas nos Estados Unidos. Afinal, os pilares são sólidos ou tratam-se apenas de casas de espuma? Façam suas apostas – e apertem os cintos!
quarta-feira, agosto 23, 2006
Simbiose Artística
Rodrigo Constantino
“Eu me sinto eufórico com os resultados do governo Lula; costumo dizer que estou indignado com os indignados.” (Wagner Tiso)
O presidente do “mensalão” participou nessa segunda-feira de um encontro com artistas na casa do ministro Gilberto Gil, em São Conrado. O apoio de boa parte da classe artística ao presidente Lula parece incondicional – ao menos no que diz respeito aos aspectos éticos. Provavelmente, tamanho apoio, mesmo depois de tantos escândalos, está condicionado somente às polpudas verbas que o governo vive despejando para esses artistas. O cão não costuma morder a mão que o alimenta...
O compositor Wagner Tiso reclamou que ninguém falou do caixa dois da reeleição do Fernando Henrique. Disse não estar preocupado com esses “detalhes” éticos, mas sim com o jogo do poder. Justificou ainda as alianças espúrias do PT, que englobam até mesmo José Sarney e Jader Barbalho. Não obstante o fato de que o PT de Lula não praticou “apenas” caixa dois, mas sim foi o arquiteto do mais nefasto esquema de corrupção visto no Brasil, parece que a mentalidade do artista é do tipo que divide os ladrões entre os que “me roubam” e os que “roubam para mim”. Até então, qualquer vestígio de corrupção era motivo para execrar os governantes – com razão. Mas de repente, quando o candidato deles chegou lá, a balança que julga passou a ter dois pesos, e duas medidas. Lula pode roubar à vontade. Os artistas não condenam. Basta soltar a verba para a “cultura nacional”.
O ator Paulo Betti afirmou que “política não existe sem mãos sujas”. Parece que quando a oposição suja as mãos, é a podridão da “direita reacionária”, mas quando é o Lula “deles”, uma luva impermeável evita que qualquer sujeira grude nas mãos. Não tem problema para os artistas que a grana para a “cultura” venha suja de bosta – contanto que não deixe de vir. Enquanto a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal forem os grandes financiadores dos artistas, Lula pode declarar amor ao ditador Fidel Castro que não tem problema algum. Pelo contrário: mais um filme enaltecendo alguma figura pitoresca como Che Guevara será produzido, enquanto a crítica irá “descer a lenha” no filme de Andy Garcia, que mostra um pouco da realidade cubana. Viva Olga! Afinal, a espiã da KGB lutava pela nossa “democracia”, a mesma que vem “elegendo” Fidel Castro por 47 anos seguidos...
O ator Zé de Abreu merece o troféu de mais patético da noite. Fez um brinde aos “Zés”, incluindo o Zé Dirceu e Zé Genoíno. Lula, ao ser questionado sobre a possível inconveniência do brinde, rebateu que não tinha problema, pois não devemos abandonar os amigos. Fica claro então que, quando Lula diz que foi traído, não trata-se dos que montaram o esquema de corrupção, mas sim dos que denunciaram o esquema. Esse é o presidente que será reeleito, ao que tudo indica, pelo povo brasileiro. Com a ajuda da classe artística, evidentemente.
Zeca Pagodinho teria dito que Lula tem a “palavra do povão”, e que é seu fã por ele falar a língua do povo. Lula, por sua vez, teria prometido ir tomar uma cachaça em Xerém depois das eleições com o cantor. Falar a língua do povo não qualifica ninguém para presidir uma nação complexa como o Brasil. Talvez ambos devessem ficar então apenas bebendo cachaça – e falando no dialeto que desejarem. Mas governar um país é coisa mais séria que isso!
A grande ausência da noite foi Chico Buarque, aquele que admira Cuba à distância, de sua milionária casa. Lula conta com o apoio de muitos “intelectuais” também, como a doutora Marilena Chauí. Os motivos são semelhantes: quando não é por ideologia dogmática, fruto de intensa lavagem cerebral na juventude, é apenas pela simbiose entre ambos, “intelectuais” dependentes da mão estatal e governantes que controlam o Estado. Entre a massa de apoio, encontramos muitos inocentes úteis, os que seguem cegamente o líder por motivos ideológicos. São como o burro na Revolução dos Bichos, de Orwell. Mas os artistas e intelectuais não. Eles sabem mais um pouco. Eles estão mais para os porcos da revolução. Seus motivadores são mesquinhos mesmo. Fazem qualquer coisa para manter o poder e as verbas estatais. Até mesmo tolerar o mais corrupto governo das últimas décadas!
Diferente de Wagner Tiso, e dispensando qualquer verba estatal para poder manter tanto minha liberdade como consciência, ainda fico indignado com os que se dizem indignados com os indignados. Uma quadrilha foi montada, e os artistas aplaudem. Figuras assim mancham o próprio conceito de arte!
terça-feira, agosto 22, 2006
Cachorro de Palha
Rodrigo Constantino
“Os humanos pensam que são seres livres, conscientes, quando na verdade são animais enganados.” (John Gray)
Em Cachorros de Palha, o professor da London School of Economics, John Gray, causa bastante polêmica ao afirmar que a técnica evolui, mas a ética humana não. Ele diz que a ciência pode ter aumentado o poder humano, mas também permitiu que o homem causasse maior destruição. O conhecimento, segundo o autor, não nos torna livres, e sim “nos deixa como sempre fomos, vítimas de todo tipo de loucura”. John Gray diz que trata-se de uma heresia moderna a crença de que o objetivo da vida é a ação, lembrando que para Platão, por exemplo, a contemplação era a mais elevada forma de atividade humana. O objetivo não era mudar o mundo, mas enxergá-lo corretamente. Apesar de podermos pescar uma ou outra mensagem interessante no livro, ele está repleto de contradições. Veremos algumas delas.
Para começo de conversa, há um tom bastante crítico sobre o conhecimento humano no decorrer do livro. Mas curiosamente, somente o conhecimento adquirido pelo autor possibilitou que a obra fosse concluída. Para condenarmos a razão, precisamos utilizá-la. E sobre o objetivo da vida ser apenas a contemplação, o autor precisa então nos explicar porque partiu para a ação de escrever um livro, já que sequer pretende tentar mudar o mundo. Isso para não entrar na seara de quanta coisa o homem teria deixado para trás se ainda estivesse apenas contemplando a natureza, desde Platão. De fato, o maior conhecimento humano não necessariamente altera a sua natureza, tampouco garante o fim das atrocidades cometidas por homens. Essa mensagem é boa no livro, principalmente quando lembramos que os genocídios cometidos pelos comunistas em pleno século XX foram supostamente calcados na razão humana. Mas a solução não é a ignorância. Pelo contrário, o próprio conhecimento humano já havia mostrado que as experiências comunistas seriam um completo fracasso. Mesmo com altos e baixos, me parece errado negar uma certa evolução não apenas no nosso conhecimento, mas no que isso representou de mudanças éticas, da barbárie para a civilização.
John Gray parte para uma visão bastante pessimista e escatológica no livro, defendendo as teses de Malthus e afirmando que o século XX poderá ser visto como um tempo de paz no futuro. Ele diz: “Se existe alguma coisa certa sobre este século, é esta: o poder conferido à ‘humanidade’ pelas novas tecnologias será usado para cometer crimes atrozes contra ela”. Cita, então, os gulags comunistas como prova do tamanho do estrago causado graças aos avanços tecnológicos. E conclui que “o progresso técnico deixa apenas um problema a resolver: a fraqueza moral da natureza humana”, problema que ele considera insolúvel. Jamais compartilhei de uma visão romântica do ser humano, como um “bom selvagem” corrompido pela sociedade, que é formada por homens mesmo. Mas também não creio que o progresso e o conhecimento não possam ir “controlando” melhor certas paixões perigosas. Se por um lado ainda corremos o risco que vem dos fanáticos muçulmanos, por outro lado uma boa parcela da humanidade está tendo cada vez mais acesso aos valores ocidentais ligados à liberdade individual. Ainda que justificado, um ataque militar que causa perdas de civis inocentes gera uma revolta enorme, forçando uma moderação por parte do governo em questão devido à pressão popular. Como ignorar um avanço nesse campo quando lembramos que, no passado, populações inteiras eram dizimadas nas guerras, as mulheres eram estupradas e as crianças mortas propositadamente? O Islã fanático com sua jihad ainda representa esse atraso, sem dúvida. Mas não podemos generalizar, tampouco ignorar o avanço relativo de outras civilizações.
A consciência humana e o livre-arbítrio também são questionados pelo autor, que dá uma grande ênfase ao poder da percepção subliminar. Sem dúvida, muito do que conhecemos não está disponível no nível da consciência, e usamos mecanismos automáticos diariamente para nossa sobrevivência. John Gray chega a afirmar que “temos acesso consciente a cerca de um milionésimo da informação que usamos diariamente para sobreviver”, concluindo que “não podemos ser os autores de nossos atos”. Mas o fato de boa parte do que conhecemos estar ocultado nas sombras da nossa mente não anula o enorme poder daquela parte a qual tomamos consciência e processamos à luz da razão. Entre o estímulo e a resposta, o homem tem a liberdade de escolha, ainda que tal liberdade sofra o impacto de forças ocultas. Ou será que o livro todo de John Gray foi escrito por acaso, sem reflexão alguma e independente de sua consciência?
Em um capítulo sobre moral, John Gray abraça com vontade o relativismo exacerbado, chegando a falar que “as idéias de justiça são tão eternas quanto os chapéus da moda”. Está certo que nosso conhecimento sobre a justiça muda com o tempo, preferencialmente evoluindo. O que ontem era visto como justo – a escravidão, por exemplo – hoje pode ser visto corretamente como injusto. Isso não torna a moral algo totalmente relativo e flexível. Os dez mandamentos do Monte Sinai ainda hoje seriam vistos como corretos, e matar um inocente do nada sempre será um ato injusto, não importa a época. Mas John Gray vai ainda mais longe: “Não é apenas que a vida boa tenha muito pouco a ver com a ‘moralidade’; ela somente floresce por causa da ‘imoralidade’”. Gray gosta do modus vivendi taoísta, onde a vida boa significa viver sem esforço, de acordo com nossas naturezas. “Os animais selvagens sabem como viver; não precisam pensar nem escolher”. Entretanto, com todas as angústias que nosso conhecimento pode gerar, eu jamais aceitaria trocar de posição com uma hiena. Será que John Gray trocaria? Até mesmo para refletir sobre isso, é preciso usar a razão, aquele instrumento que justamente nos afasta tanto de uma simples hiena.
Existem algumas partes do livro com as quais concordo. Busquei focar meu texto naquelas onde discordo, por considerar que tais contradições retiram muito o valor que o livro poderia ter. Sempre que alguém vem atacar violentamente o poder da razão humana, usando para tanto a própria razão humana, já fico desconfiado. À certa altura, John Gray diz que “os humanos nos quais a consciência é altamente desenvolvida não têm como evitar se transformarem em atores”. Faço uma última pergunta então: a consciência do próprio John Gray é pouco desenvolvida ou seu livro todo não passa de uma atuação?
“Os humanos pensam que são seres livres, conscientes, quando na verdade são animais enganados.” (John Gray)
Em Cachorros de Palha, o professor da London School of Economics, John Gray, causa bastante polêmica ao afirmar que a técnica evolui, mas a ética humana não. Ele diz que a ciência pode ter aumentado o poder humano, mas também permitiu que o homem causasse maior destruição. O conhecimento, segundo o autor, não nos torna livres, e sim “nos deixa como sempre fomos, vítimas de todo tipo de loucura”. John Gray diz que trata-se de uma heresia moderna a crença de que o objetivo da vida é a ação, lembrando que para Platão, por exemplo, a contemplação era a mais elevada forma de atividade humana. O objetivo não era mudar o mundo, mas enxergá-lo corretamente. Apesar de podermos pescar uma ou outra mensagem interessante no livro, ele está repleto de contradições. Veremos algumas delas.
Para começo de conversa, há um tom bastante crítico sobre o conhecimento humano no decorrer do livro. Mas curiosamente, somente o conhecimento adquirido pelo autor possibilitou que a obra fosse concluída. Para condenarmos a razão, precisamos utilizá-la. E sobre o objetivo da vida ser apenas a contemplação, o autor precisa então nos explicar porque partiu para a ação de escrever um livro, já que sequer pretende tentar mudar o mundo. Isso para não entrar na seara de quanta coisa o homem teria deixado para trás se ainda estivesse apenas contemplando a natureza, desde Platão. De fato, o maior conhecimento humano não necessariamente altera a sua natureza, tampouco garante o fim das atrocidades cometidas por homens. Essa mensagem é boa no livro, principalmente quando lembramos que os genocídios cometidos pelos comunistas em pleno século XX foram supostamente calcados na razão humana. Mas a solução não é a ignorância. Pelo contrário, o próprio conhecimento humano já havia mostrado que as experiências comunistas seriam um completo fracasso. Mesmo com altos e baixos, me parece errado negar uma certa evolução não apenas no nosso conhecimento, mas no que isso representou de mudanças éticas, da barbárie para a civilização.
John Gray parte para uma visão bastante pessimista e escatológica no livro, defendendo as teses de Malthus e afirmando que o século XX poderá ser visto como um tempo de paz no futuro. Ele diz: “Se existe alguma coisa certa sobre este século, é esta: o poder conferido à ‘humanidade’ pelas novas tecnologias será usado para cometer crimes atrozes contra ela”. Cita, então, os gulags comunistas como prova do tamanho do estrago causado graças aos avanços tecnológicos. E conclui que “o progresso técnico deixa apenas um problema a resolver: a fraqueza moral da natureza humana”, problema que ele considera insolúvel. Jamais compartilhei de uma visão romântica do ser humano, como um “bom selvagem” corrompido pela sociedade, que é formada por homens mesmo. Mas também não creio que o progresso e o conhecimento não possam ir “controlando” melhor certas paixões perigosas. Se por um lado ainda corremos o risco que vem dos fanáticos muçulmanos, por outro lado uma boa parcela da humanidade está tendo cada vez mais acesso aos valores ocidentais ligados à liberdade individual. Ainda que justificado, um ataque militar que causa perdas de civis inocentes gera uma revolta enorme, forçando uma moderação por parte do governo em questão devido à pressão popular. Como ignorar um avanço nesse campo quando lembramos que, no passado, populações inteiras eram dizimadas nas guerras, as mulheres eram estupradas e as crianças mortas propositadamente? O Islã fanático com sua jihad ainda representa esse atraso, sem dúvida. Mas não podemos generalizar, tampouco ignorar o avanço relativo de outras civilizações.
A consciência humana e o livre-arbítrio também são questionados pelo autor, que dá uma grande ênfase ao poder da percepção subliminar. Sem dúvida, muito do que conhecemos não está disponível no nível da consciência, e usamos mecanismos automáticos diariamente para nossa sobrevivência. John Gray chega a afirmar que “temos acesso consciente a cerca de um milionésimo da informação que usamos diariamente para sobreviver”, concluindo que “não podemos ser os autores de nossos atos”. Mas o fato de boa parte do que conhecemos estar ocultado nas sombras da nossa mente não anula o enorme poder daquela parte a qual tomamos consciência e processamos à luz da razão. Entre o estímulo e a resposta, o homem tem a liberdade de escolha, ainda que tal liberdade sofra o impacto de forças ocultas. Ou será que o livro todo de John Gray foi escrito por acaso, sem reflexão alguma e independente de sua consciência?
Em um capítulo sobre moral, John Gray abraça com vontade o relativismo exacerbado, chegando a falar que “as idéias de justiça são tão eternas quanto os chapéus da moda”. Está certo que nosso conhecimento sobre a justiça muda com o tempo, preferencialmente evoluindo. O que ontem era visto como justo – a escravidão, por exemplo – hoje pode ser visto corretamente como injusto. Isso não torna a moral algo totalmente relativo e flexível. Os dez mandamentos do Monte Sinai ainda hoje seriam vistos como corretos, e matar um inocente do nada sempre será um ato injusto, não importa a época. Mas John Gray vai ainda mais longe: “Não é apenas que a vida boa tenha muito pouco a ver com a ‘moralidade’; ela somente floresce por causa da ‘imoralidade’”. Gray gosta do modus vivendi taoísta, onde a vida boa significa viver sem esforço, de acordo com nossas naturezas. “Os animais selvagens sabem como viver; não precisam pensar nem escolher”. Entretanto, com todas as angústias que nosso conhecimento pode gerar, eu jamais aceitaria trocar de posição com uma hiena. Será que John Gray trocaria? Até mesmo para refletir sobre isso, é preciso usar a razão, aquele instrumento que justamente nos afasta tanto de uma simples hiena.
Existem algumas partes do livro com as quais concordo. Busquei focar meu texto naquelas onde discordo, por considerar que tais contradições retiram muito o valor que o livro poderia ter. Sempre que alguém vem atacar violentamente o poder da razão humana, usando para tanto a própria razão humana, já fico desconfiado. À certa altura, John Gray diz que “os humanos nos quais a consciência é altamente desenvolvida não têm como evitar se transformarem em atores”. Faço uma última pergunta então: a consciência do próprio John Gray é pouco desenvolvida ou seu livro todo não passa de uma atuação?
segunda-feira, agosto 21, 2006
Não Somos Racistas
Rodrigo Constantino
O racismo, até então inexistente como uma característica predominante da nação brasileira, que sempre teve orgulho de sua miscigenação, pode estar florescendo por aqui. A mentalidade maniqueísta que divide o povo entre brancos e pretos está por trás desse lamentável fato. Eis a tese defendida com sólidos argumentos pelo jornalista Ali Kamel em seu recente livro Não Somos Racistas, uma leitura fundamental para quem pretende compreender melhor os rumos que o país está tomando na questão racial.
Ali Kamel deposita uma boa parcela de culpa no governo FHC, que teria avançado nessa remodelagem de uma nação bicolor, onde brancos oprimiriam negros. Tal mentalidade estaria totalmente de acordo com o defendido pelo sociólogo Fernando Henrique Cardoso nos anos 1950. No governo FHC foi criado o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra, o que já denota este racismo que divide tudo em brancos e negros. Eram os primeiros passos do que viria a se transformar no regime de cotas durante a gestão de Lula, que tem até um Ministério da Igualdade Racial. As sementes que poderão germinar no até então inexistente ódio racial brasileiro foram plantadas por FHC, e bastante regadas por Lula.
O país já possui leis que previnem contra o preconceito racial, e a própria Constituição prega a isonomia das leis. Ali Kamel diz: “Num país em que no pós-Abolição jamais existiram barreiras institucionais contra a ascensão social do negro, num país em que os acessos a empregos públicos e a vagas em instituições de ensino público são assegurados apenas pelo mérito, num país em que 19 milhões de brancos são pobres e enfrentam as mesmas agruras dos negros pobres, instituir políticas de preferência racial, em vez de garantir educação de qualidade para todos os pobres e dar a eles a oportunidade para que superem a pobreza de acordo com os seus méritos, é se arriscar a pôr o Brasil na rota de um pesadelo: a eclosão entre nós do ódio racial, coisa que, até aqui, não conhecíamos”.
Em seguida, Ali Kamel dá continuidade à sua argumentação, lembrando que o conceito de raça sequer existe geneticamente: “Definitivamente, não existem genes exclusivos de uma determinada cor”. O próprio conceito de raça em si deve ser superado, e indivíduos devem ser julgados por outros critérios que não a cor da pele, algo totalmente irrelevante em relação ao caráter e capacidade intelectual. Não existem raças superiores ou inferiores, e abraçar tal crença é mergulhar na irracionalidade.
Dando prosseguimento aos argumentos, Ali Kamel mostra como as estatísticas têm sido mal interpretadas ou até mesmo manipuladas. O grosso da população brasileira se considera pardo, um termo vago que abrange várias tonalidades de cor. As estatísticas apresentadas para “provar” um suposto racismo como causa da miséria dos negros têm utilizado todos os pardos como negros, enquanto estes representam uma pequena minoria do total. Fora isso, há uma enorme confusão entre correlação e causalidade, onde passam a considerar como causa da pobreza a cor da pele, sendo que observando mais a fundo os números, fica claro que a pobreza não faz distinção de cor. O Pelé não é vítima de preconceito racial, assim como vários outros negros ricos. Já brancos pobres costumam ser vítimas de preconceitos. Ali Kamel diz existir um “classismo” no Brasil, onde a pobreza em si gera preconceito, mas não a cor da pele. Casos isolados sempre vão existir em qualquer lugar, mas claramente o racismo não é uma marca da nossa nação, tampouco o motivo da existência de tantos pardos e negros na pobreza. Se assim fosse, os brancos seriam oprimidos pelos amarelos, já que estes ganham o dobro do salário daqueles, na média. O racismo, na verdade, não explica a discrepância de renda. Um negro, um pardo e um branco com a mesma qualificação costumam receber o mesmo nível de salário.
Um outro livro fundamental para quem pretende conhecer mais a fundo a questão das cotas raciais é Ação Afirmativa ao Redor do Mundo, de Thomas Sowell. O próprio Ali Kamel usa em seu livro os estudos empíricos do professor negro e PhD. pela Universidade de Chicago. O trabalho de Thomas Sowell é esclarecedor sobre as conseqüências nefastas do regime de cotas. O que era para ser temporário passa a ser permanente e costuma abrigar novas minorias, pois políticos não acabam com privilégios estabelecidos. Onde não havia ódio racial este passa a existir, inclusive com casos de guerra civil, como em Sri Lanka. Apenas os mais afortunados entre a minoria privilegiada se beneficiam das cotas. Em resumo, a ação afirmativa falha em todos os sentidos. Ali Kamel conclui: “Errar, ignorando toda a experiência internacional sobre o assunto, é caminhar conscientemente para o desastre. No futuro, se se repetir aqui o que aconteceu lá fora, não haverá desculpas”.
PS: Para quem acha que o alarde é exagerado e o racismo, mesmo com todo o barulho na defesa de privilégios, ainda está longe de ser nossa realidade, pode fazer um simples exercício: imaginar qual seria a reação dos defensores de cotas e de todas as vítimas do “politicamente correto” caso um grupo de música fosse lançado com o nome “Raça Branca”.
sábado, agosto 19, 2006
O Legado de Walt Disney
Rodrigo Constantino
"We are not trying to entertain the critics; I'll take my chances with the public.” (Walt Disney)
Filho de um fazendeiro pobre, Walt Disney começou a trabalhar muito cedo. Gostava de desenhar, e costumava antropomorfizar os animais. Tinha o espírito empreendedor americano em altíssimo grau, e com 20 anos já tinha sua própria empresa, que falira – o que não o impediu de tentar novamente. A história de Walt Disney mistura-se com o desenvolvimento da indústria de entretenimento americana. Seus valores pessoais, tais como o individualismo e a importância da família, revelaram-se ingredientes fundamentais para o sucesso da nação mais rica do planeta.
Disney chegou na Califórnia em 1923, levando apenas US$ 40 no bolso. Ele teve muita dificuldade para encontrar trabalho na indústria cinematográfica, chegando a ter que pegar dinheiro emprestado até mesmo para comer. Mas tratava-se da terra das oportunidades, e de um indivíduo persistente e batalhador. Com a ajuda do irmão e de uns poucos assistentes, e com parcos recursos no bolso, seus trabalhos foram conquistando espaço pouco a pouco, e agradando o público. Disney respeitava o que era demandado pela audiência, um princípio básico que muitos, ainda hoje, ignoram, achando que as preferências podem e devem ser criadas na marra, de cima para baixo. Disney teve que se adaptar e mudar sua maneira de fazer desenhos. Chegou também a afirmar que competiu sua vida inteira, não sabendo como se sairia sem ela. Novamente, mais um conceito básico do capitalismo liberal, tanto ignorado pelos que condenam a competição, não reconhecendo que é ela que possibilita o progresso constante e a satisfação dos consumidores.
O grande divisor de águas na carreira de Disney foi sua famosa criação, o Mickey Mouse. No auge de sua popularidade, em 1933, o camundongo recebeu 800 mil cartas de fãs, um recorde jamais alcançado. Observou-se que o Mickey era uma espécie de auto-retrato de Disney, e este, de fato, chegou a afirmar que o Mickey Mouse era um símbolo de independência. Em seguida ao sucesso de Mickey, para adicionar som às animações – algo que Disney considerava fundamental para o avanço da indústria – foi gasto todo o dinheiro que os irmãos Disney tinham juntado até então, e tiveram ainda que vender o carro do pai. O primeiro desenho de Mickey com som sincronizado foi exibido no início de 1928. O desenho animado sonoro havia sido inventado, um exemplo fantástico de criatividade, além do nascimento de uma nova forma de arte. O mundo não seria mais o mesmo.
Walt Disney colocava a excelência antes de qualquer outra consideração e o estúdio gerava poucos lucros, apesar do sucesso retumbante, já que eram automaticamente reinvestidos no negócio – em novas tecnologias e na contratação dos melhores artistas. Além dos desenhos, Disney concebeu a idéia de um parque, desenvolvido em torno de um tema. A primeira Disneylândia foi inaugurada em 1955, na Califórnia. Fora isso tudo, o próprio Walt Disney treinou pessoalmente mais de mil artistas.
Como no meio artístico a ideologia comunista sempre fez mais vítimas, a empresa de Disney não ficou imune a tal pressão. Entretanto, ele recusou-se de forma obstinada a permitir que sua empresa promovesse o coletivismo ou os valores socialistas. A tensão surgiu, culminando numa greve em 1940 cujo objetivo era forçar Disney a fazer desenhos com propaganda pró-comunista ou fechar o estúdio. Por sorte dos espectadores em particular e do mundo em geral, os comunistas não tiveram sucesso. Mas o resultado disso foi o lamentável fato de escritores de esquerda tentarem demonizar a figura de Walt Disney, tanto em vida como postumamente. Mas como o próprio disse na frase da epígrafe acima, não eram os críticos o alvo para entretenimento da Disney, e sim o público. Este agradece!
Atualmente, a Disney segue sua trajetória de sucesso, com vendas anuais perto dos US$ 30 bilhões e empregando milhares de funcionários, além de levar a fantasia para milhões de lares no mundo. A obra teve começo pelas mãos de um empreendedor individualista, que encontrou um ambiente de razoável liberdade para poder lutar pelos seus ideais. Disney e América, uma combinação fantástica entre criatividade e liberdade. Eis o legado de Walt Disney.
terça-feira, agosto 15, 2006
Risco País
Rodrigo Constantino
“Sobreviver nos mercados financeiros às vezes significa bater em rápida retirada.” (George Soros)
Curiosamente, os petistas passaram a demonstrar bastante interesse no tal “risco país”, antes considerado como instrumento de “especuladores gananciosos” para prejudicar os interesses nacionais. Claro, o risco país está em níveis historicamente baixos, e os petistas, sempre com seus dois pesos e duas medidas, tentam usá-lo como “prova” das benfeitorias de Lula. Mas isso faz algum sentido? Me pergunto se os petistas têm alguma idéia do que vem a ser o risco país...
O JP Morgan criou o EMBI, um índice que calcula o retorno dos bonds de diversos países emergentes. A taxa é medida em spread sobre os títulos do governo americano. Essa taxa pode ser considerada como uma aproximação da percepção de risco dos investidores estrangeiros em relação aos países emergentes. Mas na verdade, diz respeito somente aos títulos do governo, onde o retorno depende basicamente da capacidade deste de pagamento do seu endividamento externo. Se a dívida externa de um governo é pequena, provavelmente ele pagará taxas civilizadas aos detentores de seus bonds. Logo, o fato do risco país de determinada nação ser maior que o de outra, não quer dizer, necessariamente, que o país em si está em melhor situação. O risco país do Brasil já superou o da Nigéria, e ninguém seria louco de afirmar que somos um país pior que a Nigéria, por mais que os próprios petistas, no governo, esforcem-se para tanto.
No começo de 2002, nosso risco país bateu os 700 pontos base acima dos títulos americanos. Estava em declínio após várias crises que tanto afetaram os mercados emergentes, como a da Ásia em 1997, a da Rússia em 1998 e o estouro da bolha de tecnologia em 2000. Porém, foi ficando claro que o então candidato Lula seria o próximo presidente do Brasil, e levando-se em conta todo seu histórico de pregações radicais – incluindo o calote da dívida externa – o risco país explodiu. No final de setembro, chegou a encostar nos 2.500 pontos base acima dos títulos americanos. Vários investidores, não sem razão, temiam um governo Lula. Não era apenas a Regina Duarte que tinha medo. Qualquer um que conhecesse o currículo de idéias defendidas por Lula, suas amizades e participação no Foro de SP tinha motivos de sobra para desconfiar. Na dúvida, a preservação de capital fala mais alto, e ocorre um “flight to quality”, quando os investidores buscam um porto seguro para seus investimentos, mesmo que sacrificando retorno imediato. Assim, o risco país dispara e não é suficiente para estancar a sangria de capital.
Desde então, o risco país do Brasil vem sistematicamente caindo. Atualmente, perto dos 200 pontos base, está na sua baixa histórica. Seria mérito do Lula? Quem tenta atribuir isso ao presidente do “mensalão” ou age de má-fé ou ignora os fatos. Na verdade, o risco país de todos os países emergentes vem caindo drasticamente desde então. O mundo encontra-se num cenário altamente favorável aos emergentes, com preços de commodities em alta, o fator China impulsionando as economias, a inflação contida pelas pressões deflacionárias do capitalismo global e um excesso de liquidez nos mercados. Assim, o risco país médio dos países emergentes, excluindo a Argentina em default, saiu de 900 pontos base em 2002 para baixo de 180 pontos hoje. A tendência de queda é mundial, e o Brasil ainda tem um risco país acima da média dos demais emergentes. Se a queda no Brasil foi mais acentuada, isto deve-se ao fato de que tiraram o “bode” da sala, que era o próprio Lula histórico.
Justiça seja feita, algum mérito o governo Lula teve. Foi o de não seguir aquilo que era pregado pelo PT no passado! Manter a política macroeconômica do governo anterior foi uma das poucas medidas acertadas neste governo. O Banco Central, com equipe predominantemente formada durante a gestão de FHC, e gozando de razoável autonomia, foi capaz de aproveitar o vento benigno de fora para reduzir nossa dívida externa e aumentar as reservas cambiais. Como o risco país, medido pelo EMBI, trata apenas dessa capacidade de pagamento do endividamento externo, é claro que tinha que despencar. Não foi um fato isolado do Brasil. O endividamento externo dos emergentes, como um todo, desabou, o que explica justamente a queda generalizada do risco país. Se fosse mérito de Lula, o homem deveria tentar o cargo de Deus, não de presidente do Brasil.
Em recente relatório, o Morgan Stanley reconhece essa drástica redução do risco externo dos países emergentes, concluindo que a atenção dos investidores deverá voltar-se para os fatores internos, tais como carga tributária, burocracia e flexibilidade trabalhista. Nestes quesitos, o Brasil perde feio da concorrência. Os países do Leste Europeu têm feito o dever de casa. Alguns adotaram impostos flat, com taxa única para todos, e reduziram a burocracia. No Brasil, a carga tributária, perto de 40% do PIB, é uma das maiores do mundo. A burocracia é asfixiante. As “conquistas” trabalhistas dobram os custos de contratação, jogando milhões para a informalidade. A dívida pública chega a um trilhão de reais!
Em resumo, quando saímos da fantasia do risco país, que mede apenas a capacidade de arcar com os títulos externos, para colocar uma lupa na situação interna, não resta muito o que comemorar. E Lula não fez uma reforma estrutural sequer que melhorasse a perspectiva futura do país. Mas quem liga para isso? Os petistas agora comemoram: o risco país bateu 208 pontos, seja lá o que isso quer dizer. Mais quatro anos de “mensalão”, de autoritarismo estatal, de falta de reformas básicas, de populismo irresponsável, de crescimento dos gastos públicos...
segunda-feira, agosto 14, 2006
Os Filhos de Lula
Rodrigo Constantino
“Hay que endurecer pero sin perder la ternura jamás.” (Ernesto “che” Guevara)
O presidente/candidato Luís Inácio Lula da Silva endureceu o discurso no fim de semana, em Fortaleza. Lula, que gosta de monólogos e vai fugir dos debates eleitorais, criticou “as elites” e o que chamou de “direita raivosa”. Todo populista que almeja ser como Chávez ou Fidel culpa sempre essa tal de “zelite” pelos males da nação. Curiosamente, elite mesmo são os “intelectuais” ricos que adoram Lula, como Verissimo e Chico Buarque, ou então os privilegiados funcionários públicos e sindicalistas, que também gostam muito do molusco. Já quanto a essa tal de “direita raivosa”, seria interessante que o apedeuta explicasse quem exatamente representa a direita no país, posto que o cenário político é caracterizado por um monopólio esquerdista. Será que o presidente considera direita o PMDB fisiológico do seu camarada José Sarney?
Lula voltou a criticar a imunidade parlamentar. O Congresso é mesmo formado por 300 picaretas, como Lula apontou no passado. Os mesmos picaretas que estavam envolvidos no esquema do “mensalão”, arquitetado pelos aliados de maior confiança do presidente Lula, que foi o maior beneficiado dele. Mas o que Lula parece desejar, no fundo, é um mecanismo de perseguição política com o uso da máquina estatal. A forte amizade e respeito que Lula e seu PT nutrem pelo ditador cubano não é fruto do apreço por charutos. A afinidade ideológica, selada no Foro de São Paulo desde 1990, explica muito melhor os laços de profunda amizade.
Lula disse que é desagradável o fato de que “qualquer cidadão que tome cachaça e caia na calçada pode levantar e abrir um processo contra o presidente da República”. Estranho o aparente preconceito contra o consumo da aguardente, vindo de quem veio. Mas deixando isso de lado, o presidente erra o ponto. Qualquer cidadão deve sim ser livre para processar o presidente. O presidente da República é um empregado do povo. Não é este que deve temer o governante, mas o governante que deve temer o povo. O jornalista estrangeiro que andou falando do gosto do presidente pela mesma cachaça sofreu na pele o ranço autoritário de Lula, que quis expulsá-lo do país. O uso do aparato estatal para amedrontar o cidadão comum, como foi feito no caso do caseiro que denunciou o então ministro Palocci, é coisa de quem admira Cuba mesmo, onde o Exército tem um país, ao invés de ser um país que tem um Exército.
Mas o que mais me indignou mesmo não foi nada disso. Pode acusar as “elites”, que no fundo estão com Lula mesmo. Pode acusar a “direita raivosa”, que existe apenas na mitologia canhota. Pode até perseguir cidadãos com a máquina estatal. Mas não venha me chamar de filho! Lula disse: “Tenho 186 milhões de filhos e preciso cuidar deles com carinho e amor”. Caro presidente, tenho pai, e ele não se parece nada com o senhor! Ao que parece, Lula tenta usurpar o posto de “pai dos pobres” de Getúlio Vargas. Não será preciso muito esforço: o populismo irresponsável do presidente de fato vai parir muitos pobres, principalmente se o benigno cenário externo mudar. Esse paternalismo estatal é patético. O governo não é pai de ninguém, tampouco deve administrar o Estado com “carinho e amor”, mas sim com competência e honestidade, características que passaram bem longe da gestão de Lula.
Pelo que anda circulando na internet, até mesmo as meretrizes se manifestaram para alertar que Lula, ao contrário do que muitos dizem, não é filho de nenhuma delas. Senhor presidente, paternidade é coisa séria! O senhor não tem 186 milhões de filhos. Na verdade, seu filho mesmo é aquele que recebeu R$ 5 milhões da Telemar, lembra? Aquele que saiu do nada e fez fortuna de forma mais que suspeita, enquanto o senhor, com raiva, o defendeu e disse não admitir que envolvessem seu filho naquela “sujeira”, que na verdade tratava-se apenas do levantamento de fatos de corrupção ligados ao seu governo. Outro filho seu é aquele que levou amigos para o Palácio do Planalto, numa excursão bancada pelo dinheiro extraído na marra dos pagadores de impostos, em claro ato de desrespeito ao povo. Esses são seus filhos, presidente. Eu não! Exijo já um exame de DNA, para que fique comprovado que o senhor não é meu pai. Presidente, me “inclua fora” dessa lista de filhos que o senhor diz ter. Prefiro até ser órfão!
sábado, agosto 12, 2006
O Dedo de Deus
Rodrigo Constantino
“A religião é vista pelas pessoas comuns como verdadeira, pelos inteligentes como falsa, e pelos governantes como útil.” (Sêneca)
Em comício no Rio de Janeiro com o candidato Marcelo Crivella, da Igreja Universal, o presidente Lula apelou até para Deus em busca de votos. O apedeuta disse que “quando Deus criou o mundo, botou o dedo no Rio e falou: vai ser a cidade mais bonita do mundo”. Deixando de lado o fato de que existem várias outras cidades tão belas quanto o Rio no mundo, mas sem seus infindáveis problemas de miséria e violência, o realmente chocante veio sem seguida, quando o presidente disse: “Para o Rio compensar a genialidade de Deus é preciso escolher alguém que tenha compromisso com Deus”. Pronto. Apelo à autoridade divina. Quem sente-se privilegiado por viver na cidade maravilhosa – fugindo das balas perdidas – tem obrigação moral de atribuir isso a Deus e, ainda por cima, expressar tal gratidão votando em Crivella. Agradeço ser ateu nessas horas. Graças a Deus!
A separação entre Igreja e Estado é uma das mais importantes conquistas da civilização. Basta ver o atraso das nações muçulmanas, onde as teocracias exploram a fé dogmática de seus cidadãos de toda forma possível, gerando apenas escravidão e miséria. Como disse Humboldt, “a moralidade humana, até mesmo a mais elevada e substancial, não é de modo algum dependente da religião, ou necessariamente vinculada a ela”. O mesmo Humboldt disse que “a religião é inteiramente subjetiva e depende exclusivamente da concepção única que cada um tem dela”. Concordo totalmente. Fé divina é algo subjetivo, da esfera privada de cada um. Usar isso para obter votos, misturar religião com governo, é mesmo coisa de quem gosta de explorar os outros em busca de poder. Algo tão antigo quanto a humanidade, é verdade, mas que nem por isso deixa de ser lamentável.
Um dos “pais fundadores” dos Estados Unidos, Benjamin Franklin, disse que “o jeito de ver pela fé é fechar os olhos da razão”. A quem interessa apelar para Deus na hora da eleição? Justamente aquele que sabe que, através de argumentos sólidos e racionais, não vai muito longe. A Igreja Universal tem sido mestre na arte de conquistar seguidores à base da emoção, explorando o desespero alheio em benefício próprio. Enquanto isso for limitado ao indivíduo, tudo bem. Posso lamentar o fato de ver alguém pobre sendo claramente ludibriado por oportunistas como o Bispo Macedo e ainda deixando o dízimo, ganho com seu suor, para essa gente. Mas é uma troca voluntária, não muito diferente do coitado que gasta com bebidas para afogar suas mágoas. E dificilmente a razão terá forças de enfrentar tal paixão, pois como alertou Carl Sagan, “não é possível convencer um crente de coisa alguma, pois suas crenças não se baseiam em evidências, baseiam-se numa profunda necessidade de acreditar”. O problema, para mim, fica grave quando esses seguidores fanáticos votam unicamente utilizando o critério religioso, que Lula tentou explorar. Nesse caso, a minha vida é também afetada.
O Rio é, de fato, uma cidade maravilhosa. Se é obra divina ou não, deixo para o foro íntimo de cada leitor. Não temos como saber. Mas sabemos de uma coisa: os estragos que o Rio vem sofrendo são obras bastante humanas! Com anos de desgovernos, com figuras pitorescas como Brizola ou o casal Garotinho sendo eleitos, não seria razoável esperar algo diferente. O Rio foi tomado pela esquerda “caviar”, pelos comunistas do Bracarense, e também pelos crentes da Igreja Universal. Entre a seita marxista, que oferece o paraíso terrestre, e a Igreja Universal, que vende consolo eterno, não sobra muito espaço para debates centrados em argumentos racionais. Como Thomas Paine reconheceu, “debater com uma pessoa que renunciou o uso da razão é como administrar remédio em um morto”. Ou então, na mesma linha, o que Jonathan Swift concluiu: “É inútil tentar fazer um homem abandonar pelo raciocínio uma coisa que não adquiriu pela razão”. Por que eu ainda tento então? Deve ser masoquismo mesmo. Paciência. Que venham os petistas e crentes, inocentes úteis que alçam ao poder oportunistas da pior espécie! Ficarei tranqüilo no isolamento dos que não abdicaram da razão ainda...
sexta-feira, agosto 11, 2006
Cinismo Profissional
Rodrigo Constantino
“Ninguém pode usar uma máscara por muito tempo: o fingimento retorna rápido à sua própria natureza.” (Sêneca)
Esqueçam Tom Hanks. Esqueçam Anthony Hopkins. Esqueçam Jack Nicholson. Esqueçam até mesmo Kevin Spacey. Quando o assunto é representar um papel, não existe ninguém como Lula. Nosso presidente é um grande ator. Não estamos falando de amadores, mas de profissionais. Sêneca não teve a oportunidade, no seu tempo, de conhecer alguém como nosso apedeuta. Caso contrário, não teria cunhado a frase na epígrafe. O presidente usa sua máscara por tantos anos que seu rosto verdadeiro já se confunde com ela, ambos tornando-se um só, uma verdadeira cara-de-pau. A entrevista para o Jornal Nacional ontem apenas confirmou isso.
Quando perguntado sobre todos os seus antigos aliados próximos, envolvidos em escândalos e acusados pelo isento procurador-geral da República de formação de quadrilha, o presidente Lula tentou novamente se esquivar, como se não soubesse de nada. A lula virou um peixe linguado, ensaboado e escorregadio. Ainda puxou uma analogia medonha, afirmando que “há famílias com problemas dentro de casa e a família não sabe”. Bem, senhor presidente, para o exemplo que o senhor deu fazer algum sentido, seria o caso de imaginarmos um pai cujos 3 filhos, o irmão e os sobrinhos fossem todos bandidos. Afinal, não estamos falando de aliados distantes do senhor, mas sim de todos aqueles que construíram sua história ao seu lado. Seria possível um pai desses ter sido tão cego a ponto de não enxergar o crime bem debaixo do seu nariz? Talvez, com muito pouca probabilidade. Mas nesse caso, esse pai não deveria administrar sequer uma carroça de pipoca!
Vamos imaginar uma empresa onde toda a diretoria estivesse envolvida num escândalo de corrupção, e que essa diretoria tivesse sido toda apontada pelo presidente, tratando-se ainda de antigos camaradas dele. Alguém ainda teria coragem de confiar num presidente desses? Alguém acha que os acionistas dessa empresa dariam mais um mandato para um sujeito desses? Claro que não! Então, devemos questionar porque o presidente Lula acha que os acionistas da nação Brasil deveriam estender seu mandato. Concorda, presidente?
Lula, um ator que sem dúvida merece o Oscar, disse ainda que seu governo está investigando como nenhum outro fez, e por isso tantos casos de corrupção têm emergido do pântano. Mas presidente, as acusações que envolvem vários aliados seus do PT não vieram do próprio governo, e sim da mídia ou do Roberto Jefferson. A postura do seu governo, pelo contrário, foi tentar barrar ou atrapalhar certas investigações. E vários acusados não só não foram punidos pelo Partidão, como pretendem se candidatar novamente agora. Não é estranho isso, presidente? Aliás, o senhor novamente negou-se a responder quem são os supostos traidores. Seriam os que traíram a pátria, desviando recursos, ou os que traíram o PT, entregando o esquema?
O presidente Lula, nervoso mas mantendo sua capacidade fantástica de atuação, disse que demitiu os ministros poderosos acusados de corrupção ou abuso de poder. Mas antes, havia sido dito que tanto Dirceu como Palocci teriam pedido demissão. E Lula, na verdade, teria aceito tais pedidos somente quando não dava mais para negar as acusações, ainda por cima chamando Palocci de “mais que irmão” na sua despedida. Mas para atores é assim mesmo: vale até tentar assumir a imagem de quem puniu aliados enquanto que, de fato, tentou salvá-los até os 45 do segundo tempo.
O candidato Lula mostrou-se tenso durante a entrevista, que diferente dos demais candidatos, foi realizada no seu território em vez dos estúdios da Rede Globo. Não é por nada. O presidente não é idiota. Ele sabe que tenta defender o indefensável, contando apenas com a ignorância de boa parte do povo, ou então com os interesses imediatos dos oportunistas que abanam o rabo e ganham um osso de prêmio. Para defender o presidente Lula e seu PT, atualmente, só mesmo ignorando os fatos ou passando por cima deles por interesses pérfidos. Lula sabe disso, e tenta acelerar a liberação de verbas para agradar os cães famintos ou divulgar o crescimento econômico – que ocorre a despeito dele – para enganar os ignorantes. Mas não obstante a evidente tensão estampada no rosto do presidente, sua atuação não deixou a desejar. Afinal, qualquer um com um pingo de consciência e sem os talentos de um Kevin Spacey, já teria surtado diante da situação vergonhosa a qual se encontra Lula. Se cuida, Tom Hanks...
quinta-feira, agosto 10, 2006
Escatologia de Botequim
Rodrigo Constantino
“Um otimista vê uma oportunidade em cada calamidade; um pessimista vê uma calamidade em cada oportunidade.” (Winston Churchill)
Todos conhecem a história de Joãozinho e o leão. O garoto alertava que havia um leão em seu quintal, gritando por socorro para sua mãe. Esta aparecia desesperada, ofegante, mas nada de leão no quintal. Os falsos pedidos de socorro repetiram-se tanto que, no momento em que havia um leão de verdade ameaçando o pequeno João, sua mãe não mais acreditou, e o garoto foi engolido pela fera. A confiança, após tantos alertas infundados, foi perdida. Em muitos aspectos, os eternos “profetas do apocalipse” são como Joãozinho.
Ambientalismo é um negócio – um lucrativo negócio. Disseminar o pânico entre os leigos rende bons frutos aos participantes deste negócio. Atualmente, a bola da vez é o aquecimento global. Não pretendo questionar se tal aquecimento representa mesmo ou não um grave risco para a humanidade. Pretendo somente levantar alguns pontos para maior reflexão. Na década de 1970, que não faz tanto tempo assim, o grande alerta dos especialistas no ramo era quanto ao esfriamento global. Várias revistas científicas bradavam sobre os sérios riscos da Terra estar esfriando, colocando a vida do homem em perigo. Isto, por si só, deveria aumentar o grau de ceticismo das pessoas em relação aos especialistas de hoje, que chegam ao limite de culpar a flatulência das vacas ou os desodorantes humanos pela “iminente” destruição do globo. Tamanho é o pânico incutido, que um dono de um carro utilitário se sente praticamente um assassino!
Fatores ideológicos entram na mistura e reforçam as acusações ao capitalismo como grande culpado pelo fim do mundo. O Katrina intensificou ainda mais o tom crítico dos anti-capitalistas. Mas isso faz algum sentido? Na China, que nunca foi capitalista, algo como 900 mil pessoas morreram na enchente do rio Amarelo em 1887. Em 1931, a grande inundação do rio Yang-tse-kiang causou a morte de cerca de 3 milhões de pessoas. Enchentes mataram também cerca de um milhão de pessoas entre 1938 e 1939. Na própria América, temos que o maior número de vítimas fatais devido a um furacão foi registrado em 1900, com mais de oito mil mortos. Em 1928, outro furacão matou quase duas mil pessoas. Em termos de força, o pior furacão se deu em 1935, seguido pelo Camille, em 1969. Nesta época, o principal medo ainda era o esfriamento global. Hoje, ninguém sequer questiona a causa do Katrina: o aquecimento global. Será mesmo?
Desastres naturais sempre acompanharam a humanidade. No entanto, a capacidade do homem em inovar, criar mecanismos de proteção e usar as calamidades como novas oportunidades parece infindável. Hayek alertava que nossa liberdade fica ameaçada em vários campos devido ao fato de estarmos dispostos a delegar a decisão ao “expert” de forma muito pouco crítica, sendo que ele mesmo sabe apenas poucos aspectos do problema. Hayek foi um grande defensor do conhecimento disperso entre milhões de indivíduos. Ninguém, por mais sábio que seja, pode acumular algo perto da sabedoria contida e pulverizada entre todos os indivíduos. Seus estudos têm sido bastante relevantes para reduzir a crença no governante “iluminado”, que saberia o que é melhor para todos. E a liberdade individual é a ferramenta indispensável para que esse conhecimento pulverizado transforme-se em criatividade e inovação.
Pior que desastres naturais, são os desastres humanos. As experiências socialistas do século XX foram catastróficas, levando milhões para a cova. Para nos limitarmos ao fator ambiental, basta lembrarmos de Chernobyl. Isso sim deveria preocupar mais os amantes e defensores da humanidade. Mas paradoxalmente, diversos ambientalistas de hoje são justamente adeptos da ideologia socialista. São anti-capitalistas por patologia, ignorando que a condição das usinas nucleares da Coréia do Norte, onde o capitalismo nunca chegou nem perto, representa uma real ameaça. Condenam o capitalismo pelos problemas ambientais, esquecendo que as nações socialistas, em termos relativos, poluem infinitamente mais.
Os profetas do apocalipse pregam ainda o fim dos recursos disponíveis na natureza. Os recursos naturais podem ser escassos, mas a forma como utilizamo-nos não. Os ganhos de produtividade ao longo dos tempos é prova disso. As transições da vela para a luz elétrica, para a energia nuclear, mostram como os homens criam riqueza utilizando cada vez menos recursos para produzir mais. E neste trajeto, sempre existiram pessimistas de plantão, pregando que a população iria crescer mais rápido que os recursos, levando todos à fome, ou que o esgotamento dos insumos seria o fim do capitalismo. Os alertas de Malthus não parecem tão infundados assim no curto prazo, quando vemos que, de fato, várias guerras pela busca mais rápida de recursos, principalmente o petróleo, têm sido a regra, não a exceção. Mas quando lembramos que a população no mundo, que estava abaixo de 2 bilhões de habitantes poucos séculos atrás, hoje passa dos 6 bilhões, temos que colocar as teorias de Malthus em xeque, no mínimo. Não devemos subestimar a criatividade humana. E de fato, onde a fome ainda é um problema, é justamente onde tal criatividade não tem espaço, em regimes autoritários, sem muita liberdade individual. As nações que abraçaram o capitalismo liberal dificilmente sofrem deste mal que assola, por exemplo, todos os países socialistas ou mais próximos do socialismo. Quando a Índia resolveu dar um tempo na sua experiência socialista e adotou reformas mais liberais, viveu sua “revolução verde”, tirando milhões da fome.
Edwin Drake fez a primeira perfuração bem sucedida na Pensilvânia em 1859, achando petróleo. Poucos anos depois, já existiam especialistas alertando que a capacidade do “ouro negro” estava chegando perto do fim. Cá estamos, em 2006, e os mesmos alertas se repetem. Não sei quantas décadas a mais o petróleo tem de vida. Mas sei de uma coisa: disso o animal homem não perece! Acredito em nossa capacidade para pegar uma calamidade e transformá-la em oportunidade. Não compactuo com a escatologia de botequim, que gera satisfação ideológica aos que odeiam a humanidade – e bons lucros para alguns ambientalistas. Para mim, depois de tanta evidência de que “especialistas” erram feio – principalmente quando estão prevendo o iminente fim do mundo e pedindo mais recursos para evitá-lo – tenho razão suficiente para desconfiar de suas previsões. São como o Joãozinho. Dos últimos dez leões perigosos, eles previram uns mil.
PS: Um risco muito mais grave para a humanidade que o ambiental, na minha opinião, é o choque de civilizações. A jihad que muitos muçulmanos desejam levar adiante, para exterminar do mapa todos os “infiéis”, ou seja, todos os que não são muçulmanos, me parece um risco infinitamente maior que o uso de carros utilitários. Curiosamente, vários indivíduos que condenam o capitalismo por ameaçar a vida do homem na Terra são os mesmos que consideram o fanatismo muçulmano apenas uma “diferença cultural”, pedindo tolerância com aqueles que não nos toleram. Com defensores da humanidade como esses, quem precisa de inimigos?
quarta-feira, agosto 09, 2006
O Petróleo e a Inflação
Rodrigo Constantino
Com o preço do barril de petróleo chegando perto de US$ 80, as lembranças dos tempos de estagflação vividos durante os choques na década de 70 voltam a assombrar os investidores. A crença é de que a alta no preço do “ouro negro”, importante insumo para toda a cadeia produtiva, gera um efeito dominó, pressionando todos os outros preços, além de reduzir a atividade econômica. A combinação explosiva teria como resultado, portanto, o pior dos mundos, com inflação acelerando e crescimento desabando. A própria ata do Fed incita tal medo, ao afirmar que “elevados níveis de utilização de recursos e dos preços de energia e outras commodities têm o potencial de sustentar pressões inflacionárias”. Mas será que faz mesmo sentido econômico isso?
O petróleo é, de fato, mais uma commodity, como o níquel, cobre, alumínio ou aço. E com certeza ele é utilizado como matéria-prima básica para diversos setores industriais, além do consumo final para transporte e energia. Mas por que um aumento no seu preço, causado, por exemplo, por um choque de oferta, iria gerar inflação? Vamos supor que um oleoduto gigante se rompa, causando uma interrupção importante no fornecimento de petróleo. Qual seria o efeito disso? Ora, ceteris paribus, a alta no preço do petróleo teria que ser compensada pela queda em algum outro preço, causada pela redução na demanda, fruto da substituição na alocação de recursos, ou então levaria a uma redução na demanda pelo petróleo mesmo, forçando novamente os preços para baixo. Com uma quantidade fixa de moeda na economia, a elevação dos preços de um produto é compensada pela queda dos preços de outros produtos ou pela queda na demanda do próprio produto. Ocorre uma mudança nos preços relativos, mas não uma alta generalizada de preços, i.e., inflação.
Para que isso fique mais claro, basta pensarmos em termos micro, no orçamento de um indivíduo. Caso a gasolina que ele consome suba de preço, ele terá basicamente duas opções: reduzir seu consumo de gasolina; ou deixar de consumir algum outro produto para manter o mesmo consumo de gasolina. Se a primeira opção é tomada, haverá uma queda da demanda por gasolina, pressionando novamente para baixo seu preço, após a alta causada pelo choque de oferta. Se a segunda opção é escolhida, algum outro produto terá queda na demanda, tendo os preços pressionados para baixo.
Portanto, a alta nos preços de algum produto específico, qualquer que seja, não é, por si só, inflacionária. A inflação é sempre um fenômeno monetário. O que está por trás então da percepção de que uma alta no preço do petróleo gera inflação? Na verdade, o esquecimento do termo ceteris paribus. O problema é que os governos dificilmente aceitam um ajuste necessário na demanda de um produto importante quando seu preço sobe por conta de um choque de oferta. A queda na atividade é bastante impopular. Tentando evitar uma ressaca natural, o governo oferece mais álcool para o bêbado. Ele monetiza a economia, injetando mais moeda no sistema, buscando assim evitar uma queda na atividade. Com mais moeda em circulação, há uma ilusão momentânea de aumento na demanda. Porém, trata-se apenas de uma ilusão mesmo. Com o tempo, o único resultado é um aumento generalizado no nível dos preços, sem a contrapartida na atividade econômica. Afinal, não ocorreu aumento algum de produtividade que levasse a um crescimento maior da produção. A demanda estava crescendo apenas na aparência, graças ao estímulo artificial do governo.
Espero ter deixado claro que o aumento isolado do preço de um produto qualquer, por mais relevante que ele seja para a economia, não é gerador de inflação. O que causa a inflação é a monetização exercida pelo governo, que aumenta a quantidade de moeda em circulação para evitar a queda da atividade. Além disso, devemos ter em mente que o petróleo já não tem mais a mesma importância que tinha no passado. As economias dos países desenvolvidos são bem mais concentradas em serviços atualmente. A participação do petróleo na economia global vem despencando nas últimas décadas. Eis mais um fator que deveria acalmar os mais desesperados com o aumento no preço do barril de petróleo.
Na verdade, o grande problema que vejo nesta escalada do preço do petróleo é de outra natureza. Grande parte da oferta de petróleo está concentrada em poucas ditaduras no Oriente Médio, ou em estatais sujeitas aos caprichos de políticos poderosos em outros países. Os principais produtores são Arábia Saudita, Irã, Rússia, Venezuela, Nigéria, enfim, países onde o livre mercado não funciona direito e o setor público domina a cena. Ora, sabemos que a alocação de recursos será sempre mais eficiente se realizada pelo setor privado, que busca as melhores alternativas disponíveis de investimento. O mesmo não acontece no setor público, ainda mais quando temos ditaduras ou quase-ditaduras. A fortuna arrecadada pela venda do “ouro negro” vai parar em palácios luxuosos, financiamento de grupos terroristas islâmicos, compra de caças e fuzis russos para oprimir o próprio povo etc. Ou seja, a alta no petróleo acaba funcionando como um imposto, transferindo riqueza do setor privado para o setor público. E este costuma sempre gastar mal o dinheiro arrecadado, sem levar em conta custos de oportunidade ou retornos esperados. Assim, a alta do petróleo tem transferido bilhões de dólares para figuras pitorescas como Chávez ou Ahmadinejad. Não dá para esperar nada de bom vindo dessa turma...
terça-feira, agosto 08, 2006
O Mito Sueco
Rodrigo Constantino
“O melhor lugar para achar uma mão que ajude é no final do seu braço.” (Provérbio Sueco)
Muitos são os que utilizam o relativo sucesso escandinavo para defender o modelo do Estado de bem-estar social. Estas pessoas argumentam que elevados impostos e um extenso welfare state é benéfico para a economia e a população, ignorando a relação causal entre as coisas. Na verdade, os países com pesado welfare state ficaram ricos a despeito deste modelo, não por causa dele. Se replicarmos tal modelo na África miserável de hoje, teremos apenas mais miséria. O economista Stefan Karlsson, que trabalha na Suécia, escreveu para o Mises.org um artigo chamado “The Sweden Myth”, visando a derrubar certas falácias sobre o modelo escandinavo. Veremos os principais pontos do autor.
Até a segunda metade do século XIX, a Suécia era bem pobre. Mas reformas de livre mercado adotadas nos anos 1860 permitiram que o país se beneficiasse da crescente revolução industrial. A economia rapidamente se industrializou durante os séculos XIX e XX, vendo aumentar bastante o número de empreendedores e inventores. Surgiram empresas como a Volvo, Saab e Ericsson. Além disso, um fator que muito contribuiu para a prosperidade sueca foi o seu afastamento de ambas as guerras mundiais, que destroçaram a Europa. Desde 1809, a Suécia não participa de guerra alguma. Juntando tudo isso, a Suécia teve o maior crescimento de renda per capita do mundo entre 1870 e 1950, tornando-se uma das nações mais ricas do globo.
Porém, as sementes de grandes problemas já haviam sido plantadas em 1932, quando os social-democratas subiram ao poder por conta da Grande Depressão. A expansão do governo na economia foi assustadora, mas vindo de uma base bem pequena. Os gastos estatais eram inferiores a 10% do PIB. Mesmo nos anos 1950, a Suécia ainda tinha uma das economias mais livres do mundo, e os gastos estatais eram menores que o dos americanos. Mas entre 1950 e 1975, os gastos subiram de 20% para 50% do PIB. As mudanças tornaram o país menos competitivo em termos globais, e a moeda, o krona, acabou sendo desvalorizada. A inflação começou uma escalada contínua. A insatisfação era grande, e uma coalizão de centro-direita chegou ao poder em 1976, quebrando 44 anos de gestão ininterrupta dos social-democratas. Entretanto, os partidos de centro-direita não estavam dispostos a levar adiante reformas liberais mais radicais. Quando privilégios são concedidos, dificilmente um governante enfrenta sua retirada impopular. A inflação continuava incomodando e a moeda foi novamente desvalorizada.
Em 1986, o mais pragmático Ingvar Carlsson tornou-se Primeiro Ministro, e implementou várias reformas de livre mercado. Aboliu os controles de moeda e reduziu impostos. Como quase todo remédio, o impacto imediato foi amargo. No começo dos anos 1990, a economia estava em queda, enfrentando certos ajustes necessários por anos de irresponsabilidade do governo. A crise do petróleo causada pela invasão ao Iraque agravou a situação. Somando tudo, a economia sueca estava em recessão no começo da década de 1990, com o emprego caindo mais de 10% e o déficit fiscal subindo para mais de 10% do PIB. Em termos de renda, a Suécia ficou perto da vigésima posição no mundo, uma queda que jamais foi recuperada.
Novas reformas foram adotadas, privatizações foram feitas e vários setores foram desregulamentados. O déficit fiscal foi eliminado. Estas reformas liberais permitiram uma certa recuperação da economia sueca. O Banco Central sueco, Riksbank, adotou uma meta inflacionária de 2% ao ano. Ainda assim, a renda per capita da Suécia, perto de US$ 30 mil, está bem aquém da americana, perto de US$ 40 mil. A renda de Cingapura, que não contava com o acúmulo de riqueza da Suécia nem com seus recursos naturais, já colou na sueca, graças ao modelo de ampla liberdade econômica.
Até mesmo em uma nação que já era rica e com apenas 9 milhões de habitantes, o peso do welfare state tem sido duro de carregar. Os incentivos – e indivíduos reagem a incentivos – não encontram-se no lugar adequado. Quando o “papai” Estado oferece tudo “grátis”, há menos incentivos para o trabalho e o sustento por conta própria. A epígrafe no começo do artigo mostra que nem sempre os suecos ignoraram esta obviedade.
Usar a Suécia como ícone de sucesso do modelo de welfare state é, como vimos, uma falácia. Na verdade, a Suécia enriqueceu por conta do Liberalismo, e o inchaço estatal plantou as sementes do fracasso. Reformas liberais têm sido implementadas para reduzir o estrago causado pelo tamanho do Estado. A Suécia desfruta de boa qualidade de vida a despeito do welfare state, não por causa dele.
E o mais lamentável de tudo é que, pela ótica brasileira, a Suécia seria considerada “ultra-liberal”. O índice de liberdade econômica do Heritage coloca a Suécia em 19º lugar no ranking, enquanto o Brasil está em 81º lugar. Para o Brasil chegar ao modelo sueco, teria que adotar inúmeras reformas liberais. Infelizmente, aqui muitos ainda consideram até mesmo o PSDB como um partido liberal. Ou seja, não só não foi o welfare state que gerou o relativo sucesso sueco, como estamos muito longe até mesmo desse modelo, tachado injustamente por aqui de “neoliberal”.
segunda-feira, agosto 07, 2006
O Ditador Amigo
Rodrigo Constantino
“A coisa mais rara de se encontrar é o fato de existir quem alie a razão ao entusiasmo.” (Voltaire)
Recebi algumas entusiasmadas críticas – na verdade, agressões chulas – por conta de um artigo onde desejava a morte do ditador cubano, Fidel Castro. Espanta a quantidade de pessoas que ainda defende o regime assassino em Cuba. Não são analfabetos que ignoram por completo as informações disponíveis sobre a realidade da ilha caribenha, mas sim gente com acesso à internet e tudo mais que o capitalismo pode nos propiciar – e portanto ausentes em Cuba. São ignorantes voluntários, que se negam a enxergar os fatos. A paixão deles na defesa do indefensável denota total ausência de vestígio racional naquilo que chamamos de cérebro. Defensores de Fidel Castro não merecem o rótulo de homo sapiens – no máximo homo erectus, mas com receio de estar ofendendo nossos antepassados.
Como não existe um único argumento lógico na defesa do el comandante -– atualmente mais para el coma andante – seus defensores forçam um “argumento” utilitarista: a melhora nas condições de vida do povo cubano. Ainda que fosse verdade – e nada mais longe da verdade que isso – tal melhora jamais justificaria um regime ditatorial, opressor, violento e assassino, responsável por dezenas de milhares de mortes, assim como o maior êxodo já visto, com boa parcela da população – a que conseguiu fugir no meio de tubarões – morando em Miami, para fugir do “paraíso” cubano. Por falar em paraíso, o que desejo para Fidel após sua morte é que ele viva num lugar justamente como Cuba – só que como um simples cidadão, sem seus poderes políticos. É um bom castigo.
Mas voltando ao “argumento” utilitarista, resta perguntar porque o defensor de Fidel é, ao mesmo tempo, um grande combatente de Pinochet. Comparemos alguns números. Fidel assumiu o comando de Cuba enquanto esta era a quarta economia da América Latina. Está certo que isso não era grande coisa, já que a região toda era muito pobre – o que pouco mudou. Mas o fato é que Fidel conseguiu piorar – e muito – a situação. A economia cubana está na lanterna hoje, depois do vigésimo lugar na região, mesmo com bilhões de dólares de ajuda anual da União Soviética. O Chile, ao contrário, é o país mais sólido da vizinhança, e tem crescido 6% ao ano. A renda per capita chilena saiu de US$ 1.800 em 1973 para US$ 4.700 em 1996; a mortalidade infantil caiu de 66 por cada mil nascimentos em 1973 para 13 em 1996; o acesso à água potável subiu de 67% para 98% da população; e a expectativa de vida foi de 64 anos para 73 anos. Nada mal. Quando levamos em conta que morreram no Chile de Pinochet cerca de 3 mil pessoas, sendo que praticamente metade das mortes ocorreu no primeiro ano da ditadura, durante uma guerra civil com os comunistas revolucionários, fica irresistível questionar qual o critério que os defensores de Fidel utilizam para absolvê-lo enquanto condenam Pinochet. Seria o tamanho da barba? Seria a capacidade de longos discursos retóricos? Seria a quantidade de filhos? Sem dois pesos e duas medidas, os socialistas não agüentam viver um segundo sequer.
Em 1988, Pinochet realizou um referendo popular onde o candidato da junta, ligado a ele, venceu com 44% dos votos – mais do que Allende havia obtido em 1973. Ainda assim, Pinochet respeitou a Constituição, que afirmava serem necessários mais de 50% dos votos, e anunciou sua saída do governo. Fidel Castro continua comandando com mão de ferro a ilha-presídio por desastrosos 47 anos. Ao ficar doente, o que fez o camarada de Lula? Passou o poder ao irmão, como se a ilha fosse sua propriedade privada. Lula ainda fala em respeitar a vontade do povo cubano. Que povo está tendo a liberdade de exercer sua preferência? O povo cubano não tem direito a ter vontades. Deve apenas seguir como autômato o mando do ditador, adorado por nossos “intelectuais” ricos e governantes – invejosos do tamanho do poder de Fidel.
Os utilitaristas mentirosos, que bradam aos ventos as “melhorias” de Cuba durante a ditadura de Fidel, precisam explicar o fato de que em 1959, antes da revolução castrista, Cuba e Porto Rico tinham uma renda per capta similar, ao passo que hoje o último tem quase dez vezes mais renda que o primeiro. Não foi necessário trucidar oponentes políticos, acabar com a liberdade do povo nem criar um paredon para isso.
Como alguém ainda consegue defender um assassino como Fidel Castro? Albert Einstein disse que duas coisas eram infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas ele não estava certo sobre o universo! De fato, quando vemos a reação apaixonada dos defensores de Fidel quando apenas mostramos alguns fatos, ou chamamos um ditador de... “ditador”, fica evidente que Einstein tinha razão nesse ponto. A estupidez humana parece mesmo infindável. Espero que a vida de Fidel Castro, pelo menos, não seja. E que, de preferência, ele sofra bastante antes de morrer, pelo tanto que infligiu de sofrimento ao povo cubano.
Que o diabo lhe carregue, Fidel. Isso, claro, se o capeta não tiver medo de ser substituído por você no comando do inferno. Afinal, seu currículo mostra grande experiência na gestão deste ramo...
quinta-feira, agosto 03, 2006
A Derrocada da Rodada de Doha
Rodrigo Constantino
Quanto mais indivíduos e empresas participando do livre comércio, melhor. Cada um pode focar em sua vantagem comparativa e obter, através de trocas voluntárias, muito mais do que iria obter por conta própria. A globalização enriquece, enquanto o fechamento das fronteiras prejudica os consumidores. Basta observar países como Taiwan, Cingapura e Hong Kong e compará-los a países como Cuba e Coréia do Norte. Com este fato em mente, não há como deixar de lamentar o fracasso das negociações em Doha.
Vale antes um caveat: o ideal do livre comércio não passa por dezenas de burocratas de um lado negociando documentos com milhares de páginas com burocratas do outro lado. Por si só, isso já representa muita intervenção estatal no que deveria ser o livre comércio entre empresas do mundo todo. Afinal, falar em comércio entre países já é uma espécie de ranço nacionalista, posto que o comércio se dá mesmo entre empresas de diferentes países.
Feita esta observação, podemos retornar à realidade do mundo existente, onde minimizar as barreiras erguidas pelo Estado é o objetivo principal. A abertura comercial é sempre vantajosa para os consumidores, mesmo que seja unilateral. Basta pensar no sol, que “trabalha” de graça, enquanto todos podem importar seu serviço sem custo algum. Os fabricantes de velas ou lampiões podem não gostar dessa competição “desleal”, mas seria ilógico falar que ela prejudica os consumidores, o que seria equivalente a dizer que criar um imposto para o uso da luz solar seria benéfico para eles. Logo, um produto mais barato vindo de fora é sempre algo desejável do ponto de vista do consumidor de um país – e todos são consumidores.
Historicamente, as cidades situadas na beira dos rios, onde era mais fácil importar produtos do exterior, prosperaram bem mais que as localizadas em regiões montanhosas, mais “protegidas” da competição externa. É uma herança maldita do mercantilismo considerar a importação algo ruim e a exportação algo bom. Como reconhece a revista The Economist, “os benefícios do livre comércio vêm mais das importações que das exportações”. As importações de bens mais baratos deixam os consumidores com mais dinheiro sobrando e, através da competição, aumentam a produtividade doméstica. A retórica de que abrir o mercado doméstico é uma “concessão” aos países que querem exportar mais não faz sentido econômico. Pode ser útil na disputa por maior abertura geral, mas é uma alegação falsa, já que abrir a economia doméstica é sempre uma vantagem para o próprio país. Na verdade, aqueles que se colocam contra tal abertura são membros da oligarquia local, que usam o poder sobre o governo para evitar maior concorrência, prejudicando os consumidores. Defender maior protecionismo comercial é defender tais oligarquias, em detrimento do resto do povo.
O fracasso das negociações em Doha representa um passo atrás na maior liberalização comercial que o mundo vem experimentando. O retrocesso é preocupante, e não existe apenas um culpado. Os representantes da Índia e do Brasil fizeram pouco caso da rodada, e mostraram-se inflexíveis quanto à demanda por maior abertura para bens industrializados. São países que ainda protegem demais os produtores locais. O Banco Mundial reporta que a média ponderada das tarifas brasileiras chega a 8%, contra apenas 1,8% dos Estados Unidos ou zero para Hong Kong. Um computador coreano, insumo básico para várias empresas, custa quase o dobro no Brasil se comparado aos EUA. Não vamos esquecer que a Lei da Informática não tem tanto tempo assim, criando uma absurda reserva de mercado e condenando os consumidores brasileiros ao atraso tecnológico. Os países emergentes ainda têm um longo caminho a percorrer por uma maior abertura comercial.
Por outro lado, os países mais ricos também foram inflexíveis quando o tema era agricultura. Os diplomatas americanos desejavam um grande negócio ou então negócio algum. Ficaram com a última opção. Susan Schwab, a representante americana, decidiu que a União Européia e os emergentes não estavam oferecendo liberalização suficiente para justificar os grandes cortes propostos nos subsídios agrícolas americanos. Os europeus, que são os que mais praticam subsídio agrícola, não estavam dispostos a enfrentar o forte lobby doméstico, com figuras como Bovè, que paradoxalmente é bem recebido pela esquerda brasileira, ainda que seja o ícone desse protecionismo que tanto nos prejudica. Em 2005, a União Européia transferiu em subsídios agrícolas US$ 134 bilhões, contra US$ 43 bilhões dos Estados Unidos. Os pagadores de impostos sustentam poucos e poderosos agricultores, prejudicando ainda os produtores dos países emergentes.
Enfim, as negociações fracassaram, as oligarquias de cada um desses países saíram ganhando e os consumidores do mundo todo pagaram a conta. Como a economia global está crescendo muito, a derrocada em Doha pode ser tolerada. Caso a economia global entre em recessão, o protecionismo tende a aumentar, prejudicando ainda mais os países e aumentando os riscos de guerras e crises econômicas. Barreiras comerciais devem sempre ser encaradas como maléficas ao desenvolvimento das nações. Se o grande acordo em Doha falhou, a solução deve ser a busca de acordos bilaterais. O governo Bush já assinou 14 acordos de livre comércio e está negociando outros 11. Enquanto isso, o Brasil se volta para o natimorto Mercosul, que agora abriga a Venezuela e Cuba também, com claro uso geopolítico. A Alca continua sendo fortemente atacada por membros do governo Lula, por fatores ideológicos apenas. Este é o caminho da desgraça! A Rodada de Doha pode ter fracassado. Mas o país não precisa fracassar junto. Basta entender que qualquer redução das barreiras comerciais é desejável, e que as oligarquias locais devem ser enfrentadas. Tanto os pagadores de impostos como os consumidores brasileiros agradecem.
Quanto mais indivíduos e empresas participando do livre comércio, melhor. Cada um pode focar em sua vantagem comparativa e obter, através de trocas voluntárias, muito mais do que iria obter por conta própria. A globalização enriquece, enquanto o fechamento das fronteiras prejudica os consumidores. Basta observar países como Taiwan, Cingapura e Hong Kong e compará-los a países como Cuba e Coréia do Norte. Com este fato em mente, não há como deixar de lamentar o fracasso das negociações em Doha.
Vale antes um caveat: o ideal do livre comércio não passa por dezenas de burocratas de um lado negociando documentos com milhares de páginas com burocratas do outro lado. Por si só, isso já representa muita intervenção estatal no que deveria ser o livre comércio entre empresas do mundo todo. Afinal, falar em comércio entre países já é uma espécie de ranço nacionalista, posto que o comércio se dá mesmo entre empresas de diferentes países.
Feita esta observação, podemos retornar à realidade do mundo existente, onde minimizar as barreiras erguidas pelo Estado é o objetivo principal. A abertura comercial é sempre vantajosa para os consumidores, mesmo que seja unilateral. Basta pensar no sol, que “trabalha” de graça, enquanto todos podem importar seu serviço sem custo algum. Os fabricantes de velas ou lampiões podem não gostar dessa competição “desleal”, mas seria ilógico falar que ela prejudica os consumidores, o que seria equivalente a dizer que criar um imposto para o uso da luz solar seria benéfico para eles. Logo, um produto mais barato vindo de fora é sempre algo desejável do ponto de vista do consumidor de um país – e todos são consumidores.
Historicamente, as cidades situadas na beira dos rios, onde era mais fácil importar produtos do exterior, prosperaram bem mais que as localizadas em regiões montanhosas, mais “protegidas” da competição externa. É uma herança maldita do mercantilismo considerar a importação algo ruim e a exportação algo bom. Como reconhece a revista The Economist, “os benefícios do livre comércio vêm mais das importações que das exportações”. As importações de bens mais baratos deixam os consumidores com mais dinheiro sobrando e, através da competição, aumentam a produtividade doméstica. A retórica de que abrir o mercado doméstico é uma “concessão” aos países que querem exportar mais não faz sentido econômico. Pode ser útil na disputa por maior abertura geral, mas é uma alegação falsa, já que abrir a economia doméstica é sempre uma vantagem para o próprio país. Na verdade, aqueles que se colocam contra tal abertura são membros da oligarquia local, que usam o poder sobre o governo para evitar maior concorrência, prejudicando os consumidores. Defender maior protecionismo comercial é defender tais oligarquias, em detrimento do resto do povo.
O fracasso das negociações em Doha representa um passo atrás na maior liberalização comercial que o mundo vem experimentando. O retrocesso é preocupante, e não existe apenas um culpado. Os representantes da Índia e do Brasil fizeram pouco caso da rodada, e mostraram-se inflexíveis quanto à demanda por maior abertura para bens industrializados. São países que ainda protegem demais os produtores locais. O Banco Mundial reporta que a média ponderada das tarifas brasileiras chega a 8%, contra apenas 1,8% dos Estados Unidos ou zero para Hong Kong. Um computador coreano, insumo básico para várias empresas, custa quase o dobro no Brasil se comparado aos EUA. Não vamos esquecer que a Lei da Informática não tem tanto tempo assim, criando uma absurda reserva de mercado e condenando os consumidores brasileiros ao atraso tecnológico. Os países emergentes ainda têm um longo caminho a percorrer por uma maior abertura comercial.
Por outro lado, os países mais ricos também foram inflexíveis quando o tema era agricultura. Os diplomatas americanos desejavam um grande negócio ou então negócio algum. Ficaram com a última opção. Susan Schwab, a representante americana, decidiu que a União Européia e os emergentes não estavam oferecendo liberalização suficiente para justificar os grandes cortes propostos nos subsídios agrícolas americanos. Os europeus, que são os que mais praticam subsídio agrícola, não estavam dispostos a enfrentar o forte lobby doméstico, com figuras como Bovè, que paradoxalmente é bem recebido pela esquerda brasileira, ainda que seja o ícone desse protecionismo que tanto nos prejudica. Em 2005, a União Européia transferiu em subsídios agrícolas US$ 134 bilhões, contra US$ 43 bilhões dos Estados Unidos. Os pagadores de impostos sustentam poucos e poderosos agricultores, prejudicando ainda os produtores dos países emergentes.
Enfim, as negociações fracassaram, as oligarquias de cada um desses países saíram ganhando e os consumidores do mundo todo pagaram a conta. Como a economia global está crescendo muito, a derrocada em Doha pode ser tolerada. Caso a economia global entre em recessão, o protecionismo tende a aumentar, prejudicando ainda mais os países e aumentando os riscos de guerras e crises econômicas. Barreiras comerciais devem sempre ser encaradas como maléficas ao desenvolvimento das nações. Se o grande acordo em Doha falhou, a solução deve ser a busca de acordos bilaterais. O governo Bush já assinou 14 acordos de livre comércio e está negociando outros 11. Enquanto isso, o Brasil se volta para o natimorto Mercosul, que agora abriga a Venezuela e Cuba também, com claro uso geopolítico. A Alca continua sendo fortemente atacada por membros do governo Lula, por fatores ideológicos apenas. Este é o caminho da desgraça! A Rodada de Doha pode ter fracassado. Mas o país não precisa fracassar junto. Basta entender que qualquer redução das barreiras comerciais é desejável, e que as oligarquias locais devem ser enfrentadas. Tanto os pagadores de impostos como os consumidores brasileiros agradecem.
quarta-feira, agosto 02, 2006
Já Vai Tarde... Se For!
Rodrigo Constantino
Já coloquei uma champanhe no gelo. Uma Veuve Clicquot. A notícia merece tamanha celebração. Fidel Castro está internado, possivelmente beirando à morte. Antes que os “humanistas” critiquem o fato de se comemorar uma morte, de qualquer ser humano que seja, pergunto: quem não ficaria feliz com a notícia da morte de um Hitler? Certas pessoas não são humanas, mas sim monstros disfarçados em carcaça humana. Como nunca segui a ditadura do politicamente correto – tampouco respeitei a ditadura cubana, como tantos “artistas” e “intelectuais” brasileiros – pretendo sim beber em homenagem ao tão esperado falecimento do ditador cubano. Milhões de cubanos exilados em Miami estarão compartilhando deste momento feliz, assim como vários cubanos em Cuba mesmo, só que calados, com medo do que vem depois. A morte de Fidel deveria ser celebrada por qualquer um que defende a liberdade.
O que mais espanta no assunto Cuba é a ainda existência de tanta gente que defende o regime comunista imposto na ilha-presídio, depois de tudo que ele fez aos cubanos. Um misto de extrema ignorância com pura má-fé explica isso. A ideologia é uma máquina de trucidar fatos. Até hoje alguns jornalistas recusam-se a chamar Fidel do que ele é: um ditador. Referem-se a Fulgêncio Batista como ditador, mas chamam o barbudo assassino de presidente. Seria ele o presidente mais popular do mundo e da história, eleito com 100% dos votos por mais de 40 anos seguidos!
Não há absolutamente nada a se comemorar com o regime comunista em Cuba. Tudo piorou! A economia cubana, que era a quarta da região antes de Fidel, atualmente é a décima-quinta. Nessa trajetória, milhares foram mortos, a liberdade de expressão foi totalmente suprimida, oponentes políticos foram presos, boa parte da população, impedida de sair, tentou fugir no meio de tubarões, a miséria explodiu. Enfim, para ser um completo fracasso, teria que melhorar muito. E isso com bilhões de dólares enviados por ano pela União Soviética. Não foram suficientes. Um professor é obrigado a sobreviver com uns 10 dólares mensais, e ainda é forçado a repetir que o socialismo é o máximo! A lavagem cerebral, típica de regimes comunistas, é bastante atuante, inclusive em crianças. O “neoliberalismo” é o inimigo fictício, que justifica tanto terror e miséria por tantos anos. O embargo americano é usado também como bode expiatório para os males da ilha – que são infindáveis. Curiosamente, os comunistas repetem que praticar comércio com os americanos é ser explorado. Estão doidos para serem explorados agora!
No Brasil haverá uma certa comoção quando Fidel morrer de vez – e como vaso ruim demora para quebrar! Afinal, nosso presidente é camarada do ditador cubano, que recebeu de braços abertos e treinou em artes guerrilheiras o braço direito de Lula, José Dirceu, ex-ministro todo-poderoso do governo. Embaixadores e ministros do governo não cansam de elogiar o ditador cubano. Intelectuais, de suas confortáveis mansões, também elogiam o ditador. Até mesmo alguns “padres” vivem enaltecendo o regime assassino da ilha do Caribe. Não resta dúvida que as pessoas honestas desse país terão um misto de sentimentos: felicidade com a morte de Fidel e nojo com a reação de determinadas figuras brasileiras.
Mas não importa. Tomamos um Engov e seguimos em frente. Pelo menos o mundo terá um ditador assassino a menos, e Cuba terá a possibilidade de respirar um ar mais livre. Fico triste nessas horas por não crer em inferno, pois gostaria de imaginar Fidel por lá na eternidade. Fidel já vai tarde... se for mesmo! E estamos torcendo muito por isso...
PS: O filme do cubano Andy Garcia sobre Cuba, no qual estrela Dustin Hoffman, praticamente passou despercebido pela nossa mídia, e está no ar somente no Unibanco Arteplex, aqui no Rio. Enquanto isso, filmes que fazem propaganda pró-comunista, como Olga ou Diários da Motocicleta, são divulgados aos quatro ventos, aplaudidos de pé pelos nossos "intelectuais". Preciso de mais um Engov...
terça-feira, agosto 01, 2006
O Canto da Sereia
Rodrigo Constantino
Na mitologia grega, habitavam uma ilha do Mediterrâneo diversas sereias, cujos cantos atraíam os navegantes de forma irresistível. Ao aproximarem-se da ilha, seus barcos batiam nos recifes e naufragavam. As sereias, em seguida, devoravam suas vítimas. O herói homérico de Odisséia, Ulisses, desenvolveu uma solução simples porém eficaz: ordenou que sua tripulação tampasse os ouvidos com cera e amarrassem-no ao mastro, não podendo soltá-lo de forma alguma, ainda que ele gritasse para tanto. Sobreviveram. A idéia de Ulisses partiu do reconhecimento de sua própria fraqueza. Ele sabia que no impulso do momento, qualquer reflexão mais sóbria ponderando o longo prazo seria inócua. Sua racionalidade foi capaz de pesar isso antes na balança das preferências temporais, e isso salvou sua tripulação do fatal canto da sereia.
Heloísa Helena não é uma sereia. Nem de perto! E sua voz estridente está longe de parecer um canto divino e irresistível. Ao menos àqueles cuja audição funciona bem. Mas por algum motivo bizarro, seu canto ainda conquista milhões de seguidores hipnotizados, encantados com promessas messiânicas. Suas vítimas são as mesmas que outrora caíram no canto do sapo, que era bastante similar – se não idêntico – ao da “sereia”. Muitos dos que aderiram ao canto do sapo estão indignados hoje. Conseguiram sobreviver, é verdade. Mas viram que aquela melodia bela não passava de um embuste, uma trapaça para que os aliados do sapo pudessem devorar suas presas inocentes.
A história pode nunca se repetir, mas com freqüência rima. Troca-se sapo por sereia, mas o canto permanecesse o mesmo: promessas sedutoras pelo foco no curtíssimo prazo, sem responsabilidade alguma com o futuro. Os juros serão reduzidos num passe de mágica, milhões de empregos serão criados pelo Estado, a miséria irá sumir num piscar de olhos, a economia irá crescer por “vontade política” e a corrupção vai desaparecer com maior fiscalização estatal. Tudo isso, claro, com menores impostos. O governo será o motor da economia, e o desenvolvimento da nação se dará por decreto estatal. Debater os meios, em vez dos fins, não interessa. Explicar logicamente como isso tudo é possível, não vem ao caso. Falar das experiências alheias, nem pensar! É tudo uma questão de fé ideológica. Um “novo mundo” será possível. Basta aproximar o barco da ilha paradisíaca habitada por lindas sereias...
Para quem ainda não perdeu o juízo, tanto o canto do sapo como o canto da sereia não passam de uma música chata, uma cacofonia de sons sem sentido. Tais indivíduos irão votar de forma consciente no candidato que mais aproximaria o país do modelo das nações desenvolvidas, com maior liberdade econômica e menos intervenção estatal. Irão votar naquele candidato que realmente prega algumas reformas estruturais importantes. Está certo que não existe o candidato ideal para tal modelo. Os liberais não são representados nas eleições faz tempo por aqui. Mas temos o “menos pior”, aquele que, pelo menos, deixa de aproximar mais e mais o barco da ilha das sereias. Para os outros, que ainda acham irresistível o canto da sereia, que consideram a tentação das promessas fantasiosas mais forte que a razão, sugiro que façam como Ulisses. Tampem os ouvidos e amarrem as mãos nos mastros! Troquem o número da senadora de 50 para 45 mentalmente, desde já, e digitem-no na urna eletrônica em outubro. Seus filhos irão agradecer...
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