sexta-feira, agosto 01, 2008

Filhotes de Nostradamus



Rodrigo Constantino

“Você não pode ver o futuro através de um espelho retrovisor.” (Peter Lynch)

O mercado financeiro felizmente tem atraído muita gente nova, principalmente os mais jovens. Isso é muito positivo para o desenvolvimento do mercado de capitais no país, ajudando a derrubar o mito de que bolsa de valores é como um cassino. Nada mais falso. É justamente através deste veículo que empresas podem obter financiamento para crescer ou mesmo nascer, como vimos no incrível caso da OGX, do empresário Eike Batista, que levantou bilhões antes mesmo de iniciar as operações. Até os especuladores mais focados no curto prazo exercem importante função, ao explorarem as oportunidades de arbitragem, contribuindo para reduzir as ineficiências eventuais do mercado. Eles garantem maior liquidez e servem para a busca de hedge por parte de várias empresas. Logo, o crescimento do número de investidores, incluindo pessoas físicas, é algo que deve ser comemorado. O perigo é o oportunismo de alguns filhotes de Nostradamus.

Como muitos jovens chegam sedentos ao mercado, ainda com o sonho de rápido enriquecimento, oportunistas de plantão exploram essa demanda, oferecendo soluções “mágicas”. Passam a idéia de que descobriram os segredos da alquimia, e conquistam leigos despreparados. Essas vítimas nem param para pensar que se esses traders realmente tivessem descoberto o caminho do sucesso, estariam mega-milionários, em vez de precisar vender programas, cursos, livros ou palestras sobre o tema, cobrando migalhas dos seus clientes. Falta um pingo de ceticismo nesses jovens, ofuscados com o sonho de ganhar milhões em pouco tempo, sem muito esforço. Eles escutam uma ou outra história de sucesso, ignoram a quantidade infinitamente maior de fracassos, e partem para o “jogo” de forma absurdamente superficial. Normalmente usam instrumentos técnicos, como análise gráfica, embalados com complexa matemática, como se o futuro fosse previsível com base no passado. Os nomes bonitos, como a teoria dos fractais, e os modelos econométricos complicados, encantam os jovens. Eles tentam transportar os conhecimentos da ciência natural para a ciência humana, como se o comportamento dos indivíduos fosse previsível da mesma forma que a lei da gravidade.

Como disse Max Gunther, autor de Os Axiomas de Zurique, o “caos não é perigoso até ele começar a parecer ordenado”. O mesmo autor lembra que o comportamento humano não pode ser previsto de forma acurada. O risco se encontra à nossa frente, não no passado. Aquilo que não sabemos pode ser fatal. O passado raramente revela quando algo radical ocorrerá no futuro. Vários especuladores profissionais, com décadas de experiência nos mercados, descobriram na prática essas verdades constatadas por alguns pensadores também, entre eles o prêmio Nobel Hayek. As estatísticas, por mais complexas que sejam, tratam de eventos passados. Elas não podem descrever precisamente eventos não ocorridos ainda. Levar os planos rígidos de longo prazo muito a sério, como se o futuro estivesse sob controle, pode ser uma das formas mais prováveis de encontrar o fracasso. A necessidade de crença em um futuro conhecido e amplamente previsível deve ser tratada num divã, mas é extremamente arriscada no mercado financeiro.

Raros são os investidores que conseguem superar a performance média do mercado de forma sustentável. Milhares de fundos e especuladores, com vários profissionais experientes e dedicados, tentam diariamente gerar um retorno acima da média. Poucos conseguem. O cemitério está repleto de evidências silenciosas sobre a dificuldade de superar os índices de benchmark. O survival bias, a mania da mente humana em focar apenas nos casos de sucesso, cria a impressão de que é mais fácil vencer do que é na realidade. O mercado exige muita humildade. Quem adota uma postura arrogante, de que pode sistematicamente antecipar os eventos e obter um retorno extraordinário por longo período, costuma receber uma dura lição do mercado. Claro que alguns vão conseguir. Mas a maioria vai nadar, nadar, e depois morrer na praia. Ficar milionário especulando de casa não é nada fácil, tampouco provável. Possível até é, sem dúvida. Assim como é possível ganhar na mega-sena. Mas contar com isso para pagar as contas é uma aventura que beira à irresponsabilidade.

Um investidor-filósofo que tem muito a ensinar para essa turma jovem, que acredita no poder de previsão dos modelos vendidos pela internet, é Nassim Taleb, autor de Fooled by Randomness e The Black Swan. Eu recomendo fortemente ambas as leituras. Taleb lembra que não importa a freqüência com que algo funciona, se o fracasso, quando chega, tem um custo insuportável. Ele lembra ainda que não faz sentido algum procurar padrões estatísticos que estão disponíveis para qualquer um com uma conta em corretora, pois uma vez detectado, o padrão logo perde a relevância. Séries aleatórias, para piorar, sempre apresentam algum padrão detectável. Os especuladores podem achar que estão com a resposta para o futuro nas mãos, através da descoberta de algum padrão que vem funcionando bem, apenas para descobrir depois que o “padrão” deixou de funcionar. O mundo é bem mais complexo do que alguns gostariam. Modelos matemáticos que olham pelos ombros não podem adivinhar o que seres humanos irão fazer no futuro.

Espero ter deixado claro que o mercado financeiro exerce um papel fundamental para o desenvolvimento econômico de uma sociedade, mas que não deve ser encarado como uma roleta, tampouco como um meio fácil de ficar rico rapidamente. Ele pode entregar recompensas maravilhosas para muitos investidores e especuladores, mas pode também apresentar uma fatura elevada para muitos, especialmente os arrogantes que juram ter o poder de prever o futuro com precisão. Eles não têm. Ninguém tem! Muito menos alguém que precisa vender livros e modelos por valores irrisórios. Por que alguém que tem em mãos um modelo capaz de torná-lo multimilionário iria vendê-lo pela bagatela de cinco mil reais? Um pouco mais de ceticismo faria muito bem a esses jovens, vítimas fáceis dos filhotes modernos de Nostradamus, que não passam de embusteiros. Além disso, fica o apelo por mais humildade também, já que competir no mercado financeiro é tarefa árdua, com milhões de pessoas extremamente inteligentes e esforçadas tentando vencer no mundo todo. Como dizia meu antigo chefe, um respeitado especulador brasileiro, “pato novo não mergulha fundo”.

23 comentários:

Anônimo disse...

A bolsa não é um casino, mas a grande maioria que aposta ali age como se estivesse num casino, conciente ou inconcientemente.

E sim, a bolsa é um caos. Impossível prever qualquer coisa hoje em dia, a não ser é claro que vc seja amigo do presidente da empresa.

Recomendo meu blog sobre isso:
http://blogs.mentaframework.org/posts/list/19.page

Anônimo disse...

E para terminar: Só quem já foi para Las Vegas algumas vezes pode entender que o ser humano não está atrás da lógica, está atrás da emoção e do lucro fácil. Sabe que é improvável, bastante improvável mas continua jogando na mega-sena e lotando Vegas.

Las Vegas é a cidade que mais cresce nos Estados Unidos a muitos anos. É um formigueiro de gente gastante bilhões em troca de uma emoçãozinha.

No Brasil como não temos cassino, a emoção é rodar a roleta da bolsa. É ridículo...

Nietzche já dizia: O homem só gosta de duas coisas: perigo e jogo. Por isso que gosta da mulher que é o jogo mais perigoso.

Anônimo disse...

Se colocarmos um monte de macaquinhos operando nas plataformas de investimento, um deles vai obter retornos muito acima da média. Esses concursos para investidores não provam nada.

E a cilada que esses investidores jovens caem é a mesma daqueles supostos sábios que tem 'fórmulas mágicas' para aumentar as chances na loteria.

Ótimo artigo Rodrigo. Sei que é pedir demais mas gostaria de ver mais artigos seus sobre finanças, além de política e economia.

Uma febre que tem se espalhado muito no Brasil é a dos investidores de curto-prazo em IPO's. Isso tem um aspecto muito bom que você citou, mas também tem o 'overshoot' daqueles que acham que toda IPO 'vai bombar' depois do seu lançamento. Que depois de quebrar a cara não venham culpar o mercado.

A atração das pessoas comuns por esquemas financeiros é tão comum que há aquele livro, que você deve conhecer, 'Extraordinary Popular Delusions and the Madness of Crowds', que data de 1841.

Os esquemas se reciclam e voltam em uma aparência mais sofisticada. Enquando os mais educados caem em esquemas nos mercados financeiros, os mais simples caem em bolhas, pirâmides e esquemas de Ponzi. Vale a pena ler a história desse último.

E o pior também é que há os picaretas com PhD na mão, até de boa fé, que tentam botar o comportamento humano em uma curva e criam instrumentos como os de securitização de débito, sobre hipóteses falsas de que os eventos são independentes, até que chega a hora do caos.

Anônimo disse...

Bom,eu uso análise tecnica porque muita gente acredita nela,e um método é tão bom quanto o número de pessoas que acredita nele.


Se muitas pessoas acharem que a chuva leva uma alta na bolsa é bom comprar quando chover.

Usamos um método simplesmente para não irmos na pura sorte,como se fosse de fato um jogo na Mega Sena.Precisamos de um método para nos basear.Se não bastaria fechar os olhos e escolher um ativo pra investir.

Agora,prever o futuro,é óbvio que é impossível.

Anônimo disse...

Um livro que trata do problema de investimento em bolsa e congêneres é: "Salve-Se Quem Puder: Uma História de Especulação Financeira"de Edward Chancellor. Nesse livro o autor, que foi estrategista do banco Lazard Brothers, mostra como o comportamento dos especuladores ocorre (quase da mesma forma) ao longo da história. Só para citar o caso analisado inicialmete, em 1636 a mania das tulipas tomou conta da Holanda: os bulbos dessas flores trocavam de posse rapidamente e podiam valer mais do que dez casas na cidade. Depois vieram empresas de inventores malucos, com promessas de lucros mirabolantes e por aí vai... Leitura recomendável antes de se entrar na bolsa...

jjj disse...

O comentário me parece ter um viés um tanto obscurantista. Obviamente os acontecimentos (econômicos)futuros não são totalmente previsíveis, mas também não são uma incógnita total. As modernas teorias na área das finanças conseguem mensurar estatistica e numericamente (Markowitz e Sharpe)os graus de risco e tornar parcialmente previsiveis as perdas e os ganhos futuros nos mercados de capitais bem organizados.

jjj disse...

Completando o post anterior, gostaria de deixar a dica de leitura "Desafio aos Deuses - A fascinante história do risco" de Peter Bernstein.

Fênix Felipe disse...

http://br.youtube.com/watch?v=CLBKqTzPXKE

Anônimo disse...

Já brinquei de especular em um simulador e doeu bastante a queda...

Cheguei a ficar no topo, com mais de 40% de valorização mensal, depois veio a queda...

Recomendo o simulador a quem interessar, para ver como funciona e especular "sem medo":

http://folhainvest.folha.com.br/


[]'s

Anônimo disse...

Olá Rodrigo.

Desculpe-me se se esse comentário não tem ligação com o texto em questão.

Poderia divulgar o seguinte abaixo assinado contra a nova lei da internet:

http://www.petitiononline.com/veto2008/petition.html

Essa lei é uma grave ameaça a nossa liberdade de comunicação. Qual é a sua opinião a respeito?

Em um momento em que o controle estatal sobre a internet na China está em evidência devido às Olimpíadas, deveríamos discutir mais sobre como queremos que seja a nossa internet. Sobre quais liberdades estão sendo ameaçadas pelo nova lei da internet em tramitação no congresso.

Obrigado.

Tandor disse...

Uma coisa que nunca entendi, foi estas duas afirmações estarem sempre juntas quando se fala de mercado de valores:
- A bolsa não é um cassino.
- A bolsa é imprevisível.

Afinal, a bolsa de valores é o que ?

Rodrigo Constantino disse...

Maurício, não é a bolsa que é imprevisível, é o FUTURO! E isso faz da vida um cassino?

É cada um...

Anônimo disse...

Muito bem dito Rodrigo...
Para consistentemente ter um edge no mercado financeiro é necessario ter alguma informação ou insight que o mercado não tenha visto. Em empresas altamente liquidas e analisadas, a probabilidade de isto acontecer é muito baixa, especialmente para o investidor pequeno e sem recursos profissionais como o trader do homebroker.

Acredito que a unica maneira de ganhar consistentemente do mercado ano após ano é se voce tiver algum nicho, digamos micro-empresas de pouca liquidez e pouca analise, em que voce é um dos unicos "profissionais" que analisam os ativos da empresa e aplicam a metodologia de valuation para quantificar seu valor corretamente. Assim é possivel alguem com relativamente pouca experiencia técnica (sem saber teorias muito complexas) nem ter fluxo de informacao muito avacancado como um terminal bloomberg, conseguir vencer wallstreet. É necessário encontrar lugares onde ainda não foram amplamente explorados pelos profissionais, para o pequeno investidor de pouco capital, que pensa a longo prazo e nao precisa se preocupa muito com liquidez.

Anônimo disse...

Imprevisível na bolsa só o curtíssimo prazo. Neste prazo, os modelos probabilísticos podem dar as probabilidades (mas é claro não o cenário que ocorrerá).

Quem ganha ou perde no curto-prazo é o próprio Trader. É igual ao Poker, você recebe uma mão e pode escolher o que quer fazer, o quanto vai apostar, etc. Se não tiver paciência, disciplina, controle de riscos e controle emocional não será um bom jogador.

A médio-prazo a bolsa segue o fluxo de liquidez, que é função da política monetária global e das condições econômicas e geo-políticas gerais. É claro, pontuada por episódios irracionais.

Mas para entender e sistematizar (leia-se processar) todas estas informações de forma a maximizar suas chances , é necessário um estudo árduo de muitos anos, além de experiência teórica-prática, humildade e disciplina.

Este trabalho árduo muito poucos estão dispostos a fazer, diria que 1 em 100.

Aí a garotada vê ou ouve falar de um cara muito preparado se dando bem, mas não vê os anos de árdua preparação e bagagem que o cara tem nas costas. Acha que é fácil, e 99% quebram a cara. É assim também nos esportes, vemos um cara executando com facilidade uma manobra e pensamos "isso eu sei fazer".

Uns poucos que seguem o caminho das pedras, acabam ganhando muito mais do que perdendo.

Anônimo disse...

Só uma perguntinha...vc se descreve como "gestor de recursos".

Poderia disponibilizar seu histórico de performance ?

Só para garantir que esse não é um artigo viesado e ressentido.

Anônimo disse...

Eu nunca investi na bolsa, mas a impressão que eu tenho é que o melhor que o pequeno investidor pode fazer é investir em empresas que ele conhece com propriedade e enxerga nelas potencial.

Como eu conheço alguma coisa de informática, por exemplo, sei que empresas como a ATI tendem a se valorizar, pois sei que tal empresa está fazendo produtos mais competitivos que a nVidia atualmente. Como eu conheço automóveis, sei que as ações da Hyundai tendem a se valorizar. E por aí vai.

Posso estar enganado, ( se estiver, me corrijam) mas acho que essa é a melhor forma.

Outra dica (essa eu ouvi de um especialista): ações de empresas do setor alimentício, por exemplo, são bastante seguras.

Tandor disse...

Maurício, não é a bolsa que é imprevisível, é o FUTURO! E isso faz da vida um cassino?

É cada um...



Ué, que seja então, o futuro da bolsa é imprevisível. Qual a iferença ?


De qualquer maneira, já tenho notado que você deve odiar estatística Baeysiana, estou certo ?

Tandor disse...

E em teoria, a vida é um cassino sim, a menos que você não acredite em cisnes negros...

Rodrigo Constantino disse...

O fato de o futuro ser imprevisível não faz da vida um grande cassino. Não vivemos por aí jogando roleta, mas sim construindo pilares, valores, já que temos o livre-arbítrio de como reagir aos acontecimentos em nossas vidas.

A sorte sempre fará parte da vida. Mas como reagimos e nos preparamos para as coisas faz toda a diferença!

Tandor disse...

Maurício, não é a bolsa que é imprevisível, é o FUTURO! E isso faz da vida um cassino?

É cada um...


A tá, a bolsa de valores funciona em um universo aparte ...

André Barros Leal disse...

Neste livro citado, Os Axiomas de Zurique, o autor fez a mais brilhante definição do investimento na bolsa de valores. A sua definição: Imagine estar andando numa ladeira acima, porém no escuro. Imagine que em algum ponto desta ladeira está um precipício. Lembrando que está tudo escuro e o investidor não tem como ver muito a frente do seu próximo passo, resta saber quando ele deve parar.

Ignorando este sábio ensinamento, um amigo meu investiu pesado na NASDAQ os ganhos da venda de sua empresa de internet. Viu com emoção o meio milhão de dolares inicial se transformar em 800.000 em poucos meses. Não satisfeito com isso, achou que se mantivesse os investimentos por mais tempo, os 800 mil se tornariam 1.200.000, final da história, ele saiu de lá com pouco mais de 10% do capital inicial.

Quando falei com ele, eu disse: "então, voce gastou 750.000 dolares em menos de um ano e não comprou nada?". após a resposta afirmativa eu disse: seria bem mais interessante ter torrado esse dinhiro todo por aqui em mulheres e festas, assim voce se tornava uma lenda pelo menos.

Tandor disse...

Cade o "C" nessa hora ?

Anônimo disse...

Açoes
recomendo compra de açoes de empresas da Venezuela,Bolivia,equador e nicaragua.