quarta-feira, agosto 05, 2009

Ainda o Bolsa Família



Rodrigo Constantino

“Se pudermos impedir o governo de desperdiçar o trabalho do povo, sob o pretexto de cuidar dele, este será feliz.” (Thomas Jefferson)

O presidente Lula chamou de “imbecis” e “ignorantes” todos aqueles que criticam o programa Bolsa Família por acharem que ele pode incentivar a preguiça. Tendo eu me manifestado como sendo um desses “imbecis”, recebi prontamente aplausos de esquerdistas, que finalmente puderam concordar com algo que eu tenha escrito – ainda que apenas o título do artigo. Muitos consideram a esmola estatal uma questão de “direito” ou de “justiça”, e chegam a monopolizar os fins nobres, i.e., somente quem defende o meio estatal para combater a miséria, condena a miséria em si.

Nada mais falso, naturalmente. Mas como combater um programa tão popular – ou seria populista? – é uma tarefa politicamente incorreta, poucos parecem dispostos a fazê-lo, especialmente políticos da oposição e articulistas com receio da “opinião pública”. Não sendo eu nem um nem outro, pretendo apresentar a seguir mais argumentos criticando o programa, que deveria simplesmente ser abolido em prol, paradoxalmente, dos mais pobres.

Recapitulando o que já foi dito, a esmola estatal cria dependência, pois o cão não morde a mão que o alimenta. Além desse fator eleitoreiro, há o incentivo à informalidade ou mesmo ociosidade, já que o governo sustenta a pessoa por prazo indeterminado. Mais: os riscos de corrupção e desvios de verbas são enormes, sem falar do próprio custo do aparato burocrático. De cada real retirado dos pagadores de impostos, uma boa parte fica no caminho, para bancar os burocratas “altruístas”. Por fim, se o governo realmente quisesse ajudar os mais pobres, ele retiraria tantos obstáculos criados por ele mesmo para a criação de riqueza pela iniciativa privada, algo que não interessa aos parasitas no poder.

Nesse artigo, meu objetivo será acrescentar argumentos sobre a viabilidade da ajuda voluntária aos mais carentes, tornando o programa estatal desnecessário, quando não prejudicial. Antes, porém, faz-se necessário recordar que nem sequer faz sentido falar em solidariedade compulsória, aquilo que o programa de esmolas estatais de fato representa. Somente quando há um ato voluntário de caridade podemos falar em moralidade, pois não há nada muito nobre em ajudar um pobre sob a mira de uma arma, que é exatamente aquilo que o imposto do governo faz. Mas parece – e estou especulando aqui – que os esquerdistas não confiam na caridade espontânea dos indivíduos, talvez por projetarem o que são nos demais. Ocorre que no passado, antes do crescimento assustador do welfare state no mundo, isso era exatamente o que acontecia: a iniciativa privada, através das igrejas, de associações e de empresários filantrópicos, fornecia ajuda aos mais necessitados.

No entanto, havia o estigma de ser um “parasita” e viver da produção alheia, aos adeptos dos programas voluntários de ajuda. As pessoas sentiam vergonha pela sua situação de dependência, e por isso mesmo desejavam sair dela o quanto antes. A visão predominante era de que a ajuda deveria contribuir para que a pessoa rapidamente pudesse atingir sua independência novamente, se sustentando por conta própria. O objetivo sempre foi ajudar essas pessoas a sair do programa de ajuda, ao contrário da esmola estatal, que cria uma dependência permanente. Mesmo nos Estados Unidos a quantidade de beneficiados pelos programas estatais de auxílio cresceu de forma explosiva, ainda que a economia estivesse crescendo. Dois dos presidentes que mais expandiram tais programas, Roosevelt e Nixon, foram também os presidentes que mais avançaram sobre as liberdades individuais, o último inclusive chegando a renunciar por causa disso. Durante o período de 1952 e 1970, por exemplo, os beneficiados saltaram de 2 para 10 milhões, e a quantia média recebida mais que dobrou. Nada é tão permanente quanto um programa temporário de governo.

No século XIX, a agência privada Charity Organisation Society oferecia de forma voluntária ajuda aos mais necessitados. Entretanto, havia uma grande preocupação em manter uma ajuda realmente temporária, pois poucos podem contar com fundos “infinitos” como o governo, que tem o monopólio da força para arrecadar impostos. Portanto, a agência tinha que ser eficiente na ajuda, e também evitava aqueles pobres que não mereciam ajuda, pois não apresentavam nenhuma vontade de realmente sair daquela situação. A sociedade acreditava que dar ajuda sem investigar os problemas por trás da pobreza criava uma classe de cidadãos que sempre seriam dependentes dos outros. Ela seria formada, pelos padrões do presidente Lula, por “imbecis” e “ignorantes”.

A Igreja Mórmon é outro exemplo de solidariedade voluntária, pois opera um plano privado de ajuda a seus membros, sendo que o princípio de ajudar cada um a atingir a independência rapidamente também está presente. O trabalho produtivo é uma meta constante, mesmo que seja para fazer algum serviço na própria igreja até encontrar algo melhor. Seria impensável imaginar essas agências privadas comemorando o aumento de necessitados na lista de ajuda, como ocorre quando se trata do governo. Afinal, o governante, que usa o suor alheio, pode sempre posar de caridoso e alardear quanta gente pobre seu governo está ajudando, sem falar que cada um desses representa um eleitor a mais, no mínimo. Como fica claro, os incentivos são bem diferentes entre governo e iniciativa privada.

O conceito de que o trabalho produtivo garante a dignidade do ser humano está ficando ultrapassado após a revolução cultural disseminada pela esquerda. Em vez de enxergar a caridade como aquilo que ela é – uma ajuda, as pessoas têm visto tais esmolas como um “direito”, ignorando que tal “direito” exige como contrapartida, o dever de outro trabalhar para pagar a conta. O governo virou aquilo que Bastiat afirmava: a grande ficção através da qual todo mundo se esforça para viver à custa de todo mundo. Uma “vida digna” para todos, garantida pelo governo, eis o sonho atual. O governo promete aos pobres tirar dos “ricos” para distribuir em nome da “justiça social”, e promete aos “ricos” protegê-los dos pobres, que sem ajuda estatal seriam um bando de criminosos revoltados. Com esse discurso falacioso, o governo engana todo mundo, e concentra poder e recursos. Como no império romano, os governos atuais ainda dão pão e circo para as massas, sob o pretexto de ajudar os pobres. Triste é tanta gente ainda cair nesse velho conto do vigário – ou melhor, do político.

Mas de repente o imbecil sou mesmo eu, que insisto em apresentar argumentos racionais para reflexão, enquanto as massas de fato celebram o seu panis et circense, achando que o presidente Lula é o messias que veio para lhes salvar.

8 comentários:

ohomemdagravataflorida disse...

O governante precisa dos necessitados mais que os necessitados precisam do governante

Unknown disse...

Rodrigo,
Acho seu artigo e seus argumentos muito bons e como culturalmente sempre fui alienado em assuntos de política, economia e afins, seus artigos tem sido de grande valia p/ minha educação nesses assuntos.
Por questões de minha natureza pessoal sempre procurei conhecer mais e mais sobre assustos ligados a arte, música, filosofia, religião e espiritualidade.
Meus estudos e vivências nesses assunto me levaram a acreditar hoje que cada indivíduo é responsável pelo seu próprio bem estar. Que cada um possue a força e os instrumentos necessários denro de si mesmos para reconhecer e decidir aquilo que é melhor para si. E que o bem estar comum só pode ser alcançado quando a grande maioria da população estiver em condições de reconhecer isso e aplicar em suas vidas particulares.
Como diz o Dalai Lama, pessoas felizes tem a tendência a serem mais caridosas e menos egoístas, e pessoas infelizes, em grande nível de insatisfação pessoal tem a tendência a serem mais egoístas e destrutivas(com outros e consigo mesmas).
Então se é possível e necessário que exista ajuda mútua entre os indivíduos acredito que esta deve ser direcionada para a concientização dessa idéia. Os esforços devem ser direcionados a ajudar aqueles que não reconhecem esse poder em si mesmos a reconhecer suas forças, capacidades e auto-responsabilidade.
Nunca tinha me interessado por política e economia porque nunca consegui fazer um link de minhas crenças com oque lia, via e ouvia sobre o assunto.
Mas seus artigos me deixam muito feliz por reconhecer uma grande semelhança entre minhas crenças espirituais e filosóficas e a visão sobre políca e economia que você explana.
Por isso não concordo com o começo do último parágrafo de seu artigo. Acredito que seu trabalho tem grande importância na concientização e ajuda muito na tranformação das velhas crenças errônias que tanta miséria e sofrimento tem gerado aos seres humanos tanto nas relações sociais, como nas relações íntimas e pessoais.
Espero que tenha firmeza p/ continuar e cada vez mais sucesso nessa árdua tarefa de combater idéias tão arraigadas na maioria, e tão degradantes e p/ o ser humano.
Um abraço e obrigado.
Marcio.

Gian disse...

Concordo com a necessidade dos governos no Brasil diminuírem o custo fiscal sobre os trabalhadores e empresas, mas discordo de centrar esforços no Programa Bolsa-Família, pois, dentro das ações governamentais, esta é das menos piores.
Enquanto na maioria delas é oferecido um prato pronto para o "beneficiado", ao menos nestes programas de transferência de renda é ele quem decide a forma de utilizar os recursos.
Sendo um mal menor, deveria ser o último a sofrer ataques, embora faça parte da imensa máquina populista que este governo está formando às nossas custas.

Everardo disse...

Rodrigo, se não há uma única indicação no mundo dos economistas de que temos alternativas para o pleno emprego, como fugir de bolsas-famílias em todos os países do mundo, no futuro breve? Indique uma solução - que não seja a da seleção natural, a lei do mais forte (a livre competição), a sobrevivência do mais apto (a meritocracia)e outras alternativas que escondem a irresponsabilidade pela vida dos pobres do sistema.

Rodrigo Constantino disse...

Everardo, para ter pleno-emprego basta retirar o governo do mercado de trabalho, abolindo salário mínimo e demais encargos ou barreiras.

Sobre livre mercado ser uma "lei da selva" ou "lei do mais forte", fico impressionado com o fato de ainda ter gente que repete essa besteira. É lamentável mesmo.

Rodrigo

samuel disse...

"De cada real retirado dos pagadores de impostos, uma boa parte fica no caminho, para bancar os burocratas “altruístas”. "Foi assim que terminou o programa de "Leite do Sarney": O leite era distribuido gratuitamente aos pobres, isto é; os classificados com pobres. Só que chegou-se a conclusão que o leite fornecido custava ao estado R$ 5,00 quando na padaria custava R$ 1,00. É preciso saber quanto custa cada R$.1,00 entregue ao pobre. Isso não é demonstrado, está sendo ocultado...

Everardo disse...

O porgrama do leite, do Sarney, Samuel, nasceu viciado: foi concebido para atender aos grandes produtores de leite e não às crianças. O programa do leite materno e a licença gestante/ lactante enfrentaram barreiras horríveis por parte dos "altruistas" do sistema.

Adriel disse...

Rodrigo,
Minha esposa é Mormon. A igreja tem um fundo para financiamento de educação onde a igreja paga a vista todo o curso do membro da igreja e depois cobra juros irrisórios, menor mesmo que a inflação. A mensalidade chega a 15 reais antes de completar o curso e depois aumenta para cerca de 90. O calote é baixíssimo.

Além disto a igreja tem um programa que empresta/doa dinheiro aos membros que comprovadamente estiverem passando por dificuldades.

O programa de auxílio a não membros é o Mãos que Ajudam.