quarta-feira, março 16, 2011

Os bancos centrais e a alta no preço das commodities

Rodrigo Constantino, jornal Valor Econômico

Antes da catástrofe japonesa, o preço das principais commodities havia disparado, pressionando a inflação no mundo todo. O petróleo foi um caso especial, por conta das tensões crescentes no Oriente Médio. Os bancos centrais poderão cair na tentação de culpar apenas este “choque de oferta” pelo problema inflacionário. Se fizerem isso, continuarão “atrás da curva” por algum tempo, mantendo as taxas de juros abaixo do patamar necessário para conter a alta dos preços. Seria uma atitude extremamente arriscada.
É verdade que as revoltas na Líbia e outros países da região produziram um choque no preço do petróleo, mas esta não é a causa principal da inflação no mundo atualmente. A tendência do preço das commodities já era de alta desde meados do ano passado, quando ninguém sabia o que era “Revolução de Jasmim”. Para ser mais exato, o CRB, índice das principais commodities, iniciou rápida trajetória de alta na época em que o Fed sinalizou seu segundo “quantitative easing”. O quadro de incertezas no Oriente Médio apenas jogou mais lenha na fogueira inflacionária. Mas esta já havia sido acesa e estimulada antes.
A crise de 2008 trouxe à tona um modelo insustentável de crédito excessivo e gastos públicos explosivos. Após o estouro da bolha, os principais bancos centrais do mundo partiram para uma política monetária extremamente frouxa, na esperança de estimular novamente o crescimento econômico e reduzir o desemprego. Mas a alquimia está fadada ao fracasso. Não se produz riqueza verdadeira com a impressão de moeda de papel ou outras medidas heterodoxas de estímulo artificial. O que isso pode produzir é somente algum crescimento insustentável, postergando os ajustes necessários e criando novas bolhas. As commodities parecem ser a bola da vez.
Com governos gastadores que se recusam a realizar reformas estruturais mais sérias e bancos centrais que focam mais no crescimento do que na estabilidade geral de preços, o mundo se viu inundado por nova onda de liquidez. A lógica dessa escola econômica funciona mais ou menos assim: o banco central cria liquidez do nada, consegue inflar o preço dos ativos novamente, isso acaba estimulando o consumo, as empresas resolvem investir para atender a demanda, e o desemprego finalmente cai. Todos ficam felizes. Seria fantástico se funcionasse de forma tão simples. O Zimbábue aprendeu que pode custar muito caro brincar de alquimista.
Um dos resultados deste estímulo monetário foi justamente a tendência de alta das commodities. Com China, Índia e outros países emergentes crescendo de forma acelerada, bilhões de novos consumidores entraram nos mercados, disputando os produtos básicos, tais como alimentos. Uma vez que não há contrapartida adequada no lado dos investimentos, a demanda supera a oferta, e o preço sobe. Ben Bernanke e Trichet, respectivamente do Fed e BCE, podem até ficar espantados com o “choque de oferta” do petróleo e tirar o corpo fora em relação à inflação. Mas o fato é que esta é fruto de uma política deliberada, e não do acaso ou da revolta de jovens árabes.
Os banqueiros centrais se encontram num dilema agora. Se aumentarem rapidamente as taxas de juros para conter a pressão inflacionária, podem ameaçar a retomada do crescimento, que tem pilares frágeis e artificiais. Mas se permanecerem “atrás da curva”, na esperança de que tudo não passa de um problema pontual no Oriente Médio, estarão jogando gasolina na fogueira. Uma grande bolha poderá se formar, com efeitos catastróficos depois, quando seu estouro for inevitável. Os bancos centrais do mundo todo estão brincando com fogo.
Para os investidores, este é um cenário de extrema incerteza, pois o resultado depende muito da reação de poucas autoridades. Caso a opção seja pela negligência, então os ativos ligados às commodities podem seguir na tendência de alta por mais algum tempo. O ouro, que já está perto de seu patamar máximo histórico, poderá subir ainda mais. As ações, neste cenário, podem subir também, ao menos em termos nominais. Mas se a inflação sair mesmo do controle, e os bancos centrais tiverem que puxar rapidamente os juros, então até uma nova recessão mundial não pode ser descartada. Neste caso, quem tiver apostas em bolsa perderá.
A inflação está aí e é basicamente o resultado de estímulos monetários. Ignorar isso é como jogar roleta-russa. Os investidores devem ter isso em mente, e aumentar a cautela no momento. A desgraça que se abateu sobre o Japão produz novas incertezas, mas, a princípio, não altera o quadro geral.

2 comentários:

Anônimo disse...

Rodrigo, poderia me dizer onde posso comprar o seu livro "ECONOMIA DO INDIVIDUO - O LEGADO DA ESCOLA AUTRÍACA" ? Só encontrei na livraria travessa mas já esgotado. Obrigado

G.S

samuel disse...

Rodrigo, V é um ancoradouro seguro para seus leitores.
Depuis trois ans je vous ai trouvé constamment sur le chemin de l'honneur et de la gloire.
Ter palavras duras para o futuro dos investimentos, para quem precisa deles, é preciso ter honestidade.
Saudações pelo artigo.