sexta-feira, abril 28, 2006

O Terceiro Setor

Rodrigo Constantino

O governo de Rosinha, mulher do ex-governador e pré-candidato a presidente Garotinho, doou R$ 254 milhões para ONGs. O grosso, cerca de 90%, foi sem licitação alguma. Uma delas recebeu sozinha mais de cem milhões. As ONGs não explicam como prestaram serviços ao Estado para tamanho recebimento de recursos. Há claramente o uso de laranjas no esquema. Algumas dessas ONGs foram doadoras para a pré-campanha presidencial de Garotinho. Fica a suspeita, bastante provável, da existência de um esquema triangular de repasse de recursos do povo para alguns poucos políticos e aliados.

A Justiça de São Paulo autorizou a quebra do sigilo bancário e fiscal de duas ONGs com estreitas ligações com a ex-prefeita Marta Suplicy, do PT. O Ministério Público suspeita que houve triangulações para o desvio de pelo menos R$ 4 milhões da prefeitura durante a gestão da petista.

Dois estados distintos, dois partidos diferentes, mas o mesmo problema. Onde estaria a causa dele? O que transforma o terceiro setor em um antro de para-estatais, vivendo como parasitas dos recursos públicos transferidos por políticos poderosos através de critérios mais que suspeitos? Alguns gostariam de pensar que o problema está apenas no governante em si, e bastaria votar em alguém honesto para sanar o problema. Com tal mentalidade, elegeram Lula, cujo governo pariu o “mensalão”, esquema mais nefasto de corrupção já visto no país.

Está mais que na hora dos eleitores entenderem que o modelo está completamente errado. Concentrar poder e recursos demais em poucos governantes é o caminho certo para o aumento da corrupção. A principal causa dessa festa com o dinheiro do “contribuinte”, ao lado da impunidade, é a hipertrofia estatal. Há que se reduzir urgentemente o tamanho do Estado.

quarta-feira, abril 26, 2006

O Fator Exógeno

Rodrigo Constantino

Defensores do governo petista – e eles ainda existem – têm focado bastante em números da economia, comparando a era FHC com a era Lula. Creio que o foco míope na árvore os impede de enxergar a floresta. Na verdade, a melhora em alguns indicadores econômicos vem quase toda de fora. O país surfa na onda de liquidez e crescimento mundial. No governo Lula, temos coisas boas e coisas novas. Entretanto, as boas não são novas, e as novas não são boas. O que permitiu o aproveitamento do vento externo foi justamente o PT ter ignorado tudo que sempre pregou na macroeconomia. Sem ousar neste campo, esquecendo o que sempre defendeu, ao menos não prejudicou tanto as vantagens provenientes de fora.

A acusação mais injusta que fazem a FHC é a de “neoliberal”. Maldade com os liberais! FHC combateu a inflação, mas não através do corte abrupto de gastos públicos, receita liberal, mas sim com o aumento do endividamento estatal e da carga tributária. Mas justiça seja feita, seu governo enfrentou graves crises internacionais, como a da Ásia, Rússia, LTCM, Y2K, Argentina e Nasdaq. Que tal compararmos esse ambiente hostil com o contexto mundial em que Lula “governou”?

O mundo nunca passou por uma fase tão próspera assim. São várias as causas, como a entrada da China e Índia no mercado globalizado, liquidez abundante no Japão, revolução tecnológica etc. O resultado é um crescimento econômico mundial acima de 4% ao ano por vários anos seguidos, sem pressão inflacionária. Os países emergentes apresentam números ainda melhores, crescendo cerca de 6% por ano. O promissor BRIC, que junta Brasil, Rússia, Índia e China, vai ainda melhor, com o Brasil na lanterna. A China cresce perto de 10% ao ano. O Brasil tem que melhorar para ficar medíocre. Consegue ganhar do Haiti, e olhe lá! Mas ainda tem petista que comemora isso.

A balança comercial brasileira virou, apresentando elevado superávit. Novamente, nenhum mérito de Lula. Não foram as suas viagens para o Gabão ou Cuba que possibilitaram tal virada, mas sim a elevação dos preços das principais commodities que exportamos, como o minério-de-ferro. O CRB, índice de uma cesta de diferentes commidities, saiu de 200 pontos em 2002 para mais de 350 atualmente, uma alta de 75%. A China merece grande mérito por isso. O governo Lula, nenhum. Pelo contrário: seu governo contribuiu bastante para o aumento de invasões dos criminosos do MST, gerando instabilidade no agronegócio.

Falam da queda nos juros internacionais pagos pelo governo brasileiro também. Agora escutamos até petistas falando no tal “risco país”, antes tratado como um bicho estranho usado por engravatados de Wall Street para criticar as propostas heterodoxas do então candidato a presidente pelo PT. De fato, o risco país despencou. Os títulos do Brasil negociam perto de 220 pontos base acima dos títulos do governo americano. Uma beleza, ainda mais se comparado aos 2.000 pontos que atingimos em 2002. Na verdade, era mais para perto dos 1.000 pontos no final do governo FHC, mas o próprio risco Lula fez o risco disparar. Depois voltou a cair, quando viram que Lula não seria na verdade o Lula que sempre havia sido. E iniciou uma forte trajetória descendente. Mérito de Lula? Complicado defender tal tese quando vemos que o risco da Turquia, que também chegou aos 1.000 pontos em 2002, está hoje abaixo dos 200 pontos. A média dos mercados emergentes, que chegou a bater nos 900 pontos em 2002, está abaixo dos 180 pontos atualmente. O spread dos títulos de high yield, de empresas americanas mais arriscadas, desabaram de 1.100 pontos base em 2002 para perto de 300 pontos hoje. Enfim, se Lula é a causa da drástica redução do risco país, ele merece o lugar de santo, não de presidente. Afinal, trata-se de um milagre ele ter feito o risco do mundo inteiro cair tanto!

Poderíamos continuar ad nauseam aqui refutando cada falso argumento que os petistas usam para enaltecer o governo Lula. Isso para não falar do fator ética, totalmente ignorado mesmo com o “mensalão” comprovado. Como os petistas não têm mais como se agarrar nessa bandeira, totalmente esgarçada pelas traças do poder, partem para o “rouba mas faz”, focando nos avanços econômicos. Acontece que esses avanços, muito aquém do potencial, não são mérito algum desse governo. Suas causas podem ser encontradas em fatores exógenos.

Os petistas terão que martelar apenas no quesito economia nas próximas eleições. Seria útil que os eleitores tivessem, portanto, maior conhecimento sobre o que ocorreu de fato. A esperança dos petistas é a ignorância popular - além da compra de votos com o assistencialismo populista, claro. Os fatos jogam contra o PT, e por isso os petistas fogem tanto deles. Nosso presidente já está no mundo da lua, considerando a saúde brasileira perto da perfeição. Veremos nas eleições o quanto alienado encontra-se o povo brasileiro.

sábado, abril 22, 2006

A Destruição do Ego

Rodrigo Constantino


"Não se dê aos outros a ponto de não poder mais se dar a si mesmo." (Baltasar Gracián)


Não há nada mais valioso num indivíduo que o seu ego, seu "eu". A integridade humana exige uma mente independente, que utiliza a razão como instrumento epistemológico maior, e considera sua felicidade própria como o mais elevado objetivo a ser atingido. Negar seu ego é negar sua existência. Viver para os outros é ser um escravo. Abdicar da razão é viver como um animal irracional, reagindo por instinto. Enfim, é não ser homem!


Muitos tentam combater isso, seja por desejo de poder sobre os outros, seja por um patológico ódio ao homem, à vida e à liberdade. Existem diversas maneiras de destruir esse ego, esse individualismo que nasce com os homens. Estar ciente desses métodos utilizados por todos os inimigos do ego é crucial para o combate desta praga que é a anulação do indivíduo como um fim em si mesmo.


Uma das formas de destruir o indivíduo é fazê-lo sentir-se pequeno, incutir culpa nele, matar suas aspirações e sua integridade. Fazem isso pregando a abnegação, afirmando que o homem deve viver para o bem dos outros, não o seu próprio. Afirmam que o altruísmo é o ideal, ou seja, o sacrifício de seus próprios interesses em prol do "bem geral". Ninguém consegue chegar lá, viver desta forma. A natureza humana clama contra isso. O homem percebe ser incapaz de atender aquilo que aceitou como a mais nobre das virtudes, passando a sentir-se culpado. Ele se vê como um pecador, um inútil. Estando o ideal supremo acima de seu alcance, ele acaba desistindo de seus ideais, de suas aspirações. Seu valor pessoal entra em colapso. Sente-se obrigado a pregar como certo o que não consegue praticar. Sua honestidade, seu senso de integridade, desaparece. Isso faz com que o homem perca a confiança em si, sentindo-se inseguro, sujo. Torna-se assim uma presa fácil, pronto para obedecer aquele que preencher este vácuo.


Outra forma é acabar com a noção de valores do homem, matando sua capacidade de reconhecer a grandeza ou de alcançá-la. A mediocridade é colocada num altar, tudo que é "lugar-comum" passa a ser enaltecido, e desta maneira os templos estarão demolidos. Como no filme Os Incríveis, quando o filho com super poderes protesta que dizer que todos são especiais é o mesmo que dizer que ninguém o é. Acabando com a reverência, matam o heróico no homem.


Um outro mecanismo usado para o assassínio do ego é não deixar o homem ser feliz. Homens felizes não têm tempo nem interesse em servir. São livres. Por isso, os inimigos do ego não permitem a felicidade, não deixam os indivíduos terem o que querem. Fazem com que as pessoas sintam que os desejos pessoais são um mal, um pecado. As vítimas irão em busca de consolo, apoio, fuga. Os sistemas éticos estabelecidos ao longo de séculos pregam que o sacrifício está acima do prazer individual. A renúncia dos interesses particulares é colocada acima da busca individual da felicidade. A felicidade é atrelada à culpa. Jogar o primogênito no fogo é prova de amor a deus, é nobre. Deitar numa cama de pregos é nobre. Ir para um deserto, mortificar a carne, tudo que é sacrifício passa a ser visto como a meta da vida, o leitmotiv da existência humana. Porém, onde há sacrifício, existe sempre alguém recebendo as oferendas. Onde há servidão, existe um mestre. Por trás dessa pregação toda, enaltecendo o sacrifício humano, está um desejo de poder, de controlar os outros. Aceitar tais valores como nobres é o caminho da desgraça individual.


Como a razão é a maior arma contra tudo isso, claro que anular o seu valor passa a ser outro método utilizado pelos que querem destruir o ego. Assim, fazem com que a razão perca força entre os demais instrumentos cognitivos. Afirmam que ela é limitada, que há sempre algo acima dela. Que o importante não é pensar, mas "sentir". Que ninguém é dono da verdade, logo qualquer teoria é igualmente válida. As vítimas disso sequer notam que para concluírem que a razão não importa tanto, faz-se preciso usar dela.


No objetivo pérfido dessa gente, vale tudo. A meta é uma só: matar o indivíduo e chegar ao poder. A defesa é utilizar justamente a capacidade humana que tanto nos distingue dos demais animais: a razão. Somente ela pode salvar o ego, colocar o homem no seu devido lugar. Não como algo sacrificável para outros fins. Não como uma insignificante parte de um coletivismo qualquer. Não como apenas uma casca para uma outra vida imaginária. Mas como uma finalidade em si, com total direito da busca pela sua felicidade.

quarta-feira, abril 19, 2006

Os Parasitas e a Decadência Moral



Rodrigo Constantino

“Se alguns homens têm por direito os produtos do trabalho de outros, isso significa que esses outros estão desprovidos de direitos e condenados ao trabalho escravo.” (Ayn Rand)

Mataram a meritocracia. Assassinaram o individualismo. Vivemos em tempos de grave corrosão moral da sociedade. São anos e anos de pregação coletivista, colocando o vago “bem comum” acima das realizações individuais. A lavagem cerebral faz com que condenem o sucesso alheio, a obra de indivíduos realmente capazes, que possibilitam um mundo melhor para a humanidade. Os empresários, os inventores, os empreendedores - todos esses passam a ser vistos como “egoístas” gananciosos, enquanto políticos e burocratas posam de nobres altruístas. Sempre com o esforço alheio, claro. Vivemos uma completa inversão de valores.

Tamanha poluição moral faz com que os benefícios da trajetória política compensem, enquanto que os riscos da iniciativa privada acabam inibindo o espírito empreendedor. Tantos privilégios, tantas regalias pavimentam uma estrada podre, onde a via política é mais atraente que a via econômica, das trocas voluntárias no livre mercado. Os agentes do setor privado são transformados em escravos, hospedeiros que entregam quase metade do que ganham para o governo e ainda são reféns da poderosa burocracia. Ser parasita rende bons frutos aqui. Muitos passam a desejar o carimbo do poder, o controle sobre os que realmente produzem e criam riquezas.

Quais os exemplos de heróis da juventude? Seria um Michael Dell, sujeito que do nada construiu um império por ter oferecido valor aos seus consumidores? Seria Sam Walton, que veio da miséria para criar a maior varejista do mundo, que emprega mais de um milhão de pessoas? Ou seria Che Guevara, um guerrilheiro assassino que só fez destruir coisas em sua vida?

Quando penso nesse desvirtuamento total, me vem à cabeça a figura de um Lindberg Farias. Não é nada pessoal. Ele apenas representa um símbolo dessa completa decadência moral. A trajetória do atual prefeito de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, demonstra bem o que quero dizer. Cursou direito em Brasília e na PUC carioca, faculdade para poucos do ponto de vista financeiro. Não completou nenhum dos dois cursos. Diferente de Dell, entretanto, não saiu para empreender e criar algo de valor para os consumidores, mas sim para incitar greves e pregar bravatas. Foi presidente da UNE, movimento formado basicamente por estudantes baderneiros, muitos admiradores do regime assassino comunista. Virou líder popular ao comandar os ‘cara-pintadas’ no processo de impeachment de Collor. Depois foi eleito deputado federal, transitando entre partidos como o PCdoB, PSTU e PT. Algo que vai do sonho soviético até o “mensalão”. Finalmente, chegou à prefeitura de Nova Iguaçu pelo PT, recebendo um bom salário e desfrutando de todas as vantagens que os políticos costumam se auto-conceder. Vive no conforto, pregando contra o conforto dos outros.

Qual a mensagem que sua história passa para os mais jovens? Defronte a duas opções, entre trabalhar duro, estudar muito, assumir riscos e disputar vagas no mercado competitivo, ou pintar a cara, gritar chavões sensacionalistas, distribuir panfletos comunistas, incitar greves e jogar pedras em engravatados, os jovens acabam tendo como exemplo de sucesso o segundo caminho. A própria sociedade enaltece a figura do jovem político que luta pela “justiça social”, enquanto chama o empresário de explorador. Mesmo que no combate contra a “desigualdade” este político aumente ainda mais a desigualdade, com seus elevados salários extraídos na marra dos pagadores de impostos, enquanto que os empresários ganham apenas quando satisfazem seus consumidores. Brasília tem, de longe, a maior renda per capita do país. Graças ao combate dos políticos contra a desigualdade.

Essa depravação de valores se alastra para todos os setores. Em vez de trabalhar duro, tentar aprender novas técnicas e aumentar sua produtividade, o “lavrador” se associa ao criminoso MST, invade algumas terras produtivas, acaba com um laboratório de pesquisas e ainda recebe infindáveis verbas do próprio governo, que deveria prender tais bandidos. O crime compensa. A baderna rende frutos no país sem lei e deturpado moralmente.

As coisas começarão a melhorar quando as pessoas entenderem que o indivíduo é um fim em si, não algo sacrificável pelo “bem coletivo”. Quando aceitarem que indivíduos que criam riqueza no livre mercado merecem respeito e admiração, não o seqüestro de seus bens em nome da “igualdade”. Quando os heróis da juventude forem pessoas como Dell ou Sam Walton, não Che Guevara ou Lindberg Farias. Somente assim os indivíduos empreendedores estarão livres para criar riquezas, gerar prosperidade, sem o peso excessivo de tantos parasitas, cuja existência é possível pela enorme decadência moral da sociedade.

segunda-feira, abril 17, 2006

A Luta de Tiradentes



Rodrigo Constantino

"A punição que os bons sofrem, quando se recusam a agir, é viver sob o governo dos maus." (Platão)

No dia 21 de Abril é celebrado o feriado de Tiradentes. Joaquim José da Silva Xavier transformou-se em mártir devido ao seu enforcamento em 1792 por causa da sua participação na Inconfidência Mineira, movimento de independência inspirado na revolução americana de 1776. O atual momento brasileiro é oportuno para refletirmos sobre a lição de Tiradentes.

Entre as principais causas internas da tentativa separatista, está o declínio da produção de ouro em Minas Gerais. Estava cada vez mais penoso atender às exigências impostas pela coroa portuguesa, que para piorar a situação, aumentou os impostos através da chamada “derrama”. Tal como nos Estados Unidos, onde o aumento de impostos pela metrópole britânica foi insuportável e levou à posterior independência da colônia, a medida portuguesa incitou a revolta popular no Brasil. Tiradentes era um dos ícones deste grito pela liberdade de uma colônia cansada de ser explorada. Infelizmente, o desfecho aqui não foi similar ao americano.

A Inconfidência Mineira foi desmantelada antes mesmo de mostrar suas garras. Informantes delataram os planos dos rebeldes para o governo, levando à prisão alguns conspiradores. Tiradentes foi julgado e condenado à forca. Chegava ao fim a luta pela liberdade, que mal começara.

Em A Marcha da Insensatez, a historiadora Barbara Tuchman descreve inúmeros casos de abusos das autoridades, sedentas por mais poder, que levaram a conseqüências catastróficas. A reação popular por conta de aumento de impostos não é algo novo. Roboão, rei de Israel, sucedeu a seu pai Salomão em 930 a.C. As dez tribos do norte se relatavam descontentes com as pesadas taxações impostas já no tempo do rei Salomão. Roboão foi procurado por uma delegação que solicitou o abrandamento da ríspida servidão imposta, dizendo que, em troca, haveriam de servi-lo como súditos fiéis. Roboão não aceitou a proposta, endurecendo ainda mais com as tribos. Estava declarada a guerra. As lutas prolongadas enfraqueceram os dois Estados, encorajando regiões vassalas conquistadas por Davi a reconquistar sua independência, além de abrir caminho para a invasão dos egípcios. As tribos jamais se reunificaram, acabando sob o domínio dos assírios, em 722 a.C. A insensatez de um governante, alimentada pela ganância por mais extorsão, abriu uma cicatriz de 2.800 anos no povo judeu.

O feriado de Tiradentes poderia estimular uma reflexão maior por parte do povo brasileiro. A passividade de um povo aturdido com tanta falta de vergonha por parte dos donos do poder, que avançam cada vez mais com sua volúpia para cima das liberdades individuais, é inadmissível. Brasília concentra um poder hoje que faria a coroa portuguesa morrer de inveja. Decisões sobre os mínimos detalhes individuais são tomadas de forma centralizada. A corrupção é tremenda, alimentada pela hipertrofia estatal e pela impunidade. Os abusos dos políticos que controlam este Estado inchado transformam, na prática, cidadãos em súditos. Entretanto, tais escravos não só aceitam passivamente tamanha exploração, como votam em partidos que pregam o aumento deste indecente poder estatal. Tiradentes deve estar se revirando no túmulo, por ter seu nome associado a uma data de comemoração em um país que vai na contramão do que ele desejava.

Não custa lembrar que a tal “derrama” jogou os impostos para um quinto do ouro produzido. Atualmente, o governo toma na marra quase 40% de tudo que é produzido. Nem mesmo o dobro da carga, ainda por cima utilizada para o “mensalão” de Ali Babá e seus quarenta ladrões, gera revolta. Pelo contrário. O povo mantém em alta a aprovação do presidente responsável por este seqüestro dos bens privados.

Dizem que cada povo tem o governo que merece. Mas o povo é formado por muitos indivíduos. Alguns são vítimas dessa escolha popular. Tiradentes sem dúvida não merecia o governo que tinha, e lutou para mudá-lo. A pergunta então é: será que esse povo que coloca no poder um corrupto defensor de mais Estado merece celebrar um feriado em homenagem a Tiradentes? Aguardemos a resposta nas próximas eleições.

quinta-feira, abril 13, 2006

O Despertar Chinês



Rodrigo Constantino

A ideologia é uma máquina que trucida fatos quando estes incomodam. Por décadas, a China foi um país escravo do socialismo. Tudo que a “revolução cultural” de Mao conseguiu foi muita miséria, terror e escravidão. O “grande salto” era um pulo do precipício. Algo começava a mudar na era mais pragmática de Deng Xiaoping, onde a cor do gato importava menos que caçar o rato. Desde então, as reformas adotadas distanciaram um pouco a China da utopia comunista. Esta pequena aproximação do capitalismo já foi suficiente para uma enorme revolução, que trouxe mais riqueza para um povo tão sofrido.

Claro que a China ainda está longe de ser um ícone do capitalismo. A herança comunista ainda pesa muito sobre os ombros da população. A alocação de recursos ainda é bastante ineficiente por conta da influência política. A ausência de liberdade econômica tolhe muito a criatividade empresarial. Vários “abacaxis” ainda terão que ser digeridos ao longo do tempo, fruto do legado comunista. Mas o fato é que privatizações ocorreram, direitos de propriedade foram reconhecidos, investimentos estrangeiros foram bem recebidos, fronteiras comerciais foram abertas e o lucro deixou de ser o caminho para o inferno. As decisões passaram a ser delegadas aos governos locais, descentralizando o poder e estimulando a competição por investimentos. A participação estatal nos negócios caiu 13 pontos percentuais, para 33%, desde 1998. Bastaram estas mudanças de caráter liberal para lançar a China em uma nova trajetória.

Ainda falta um longo caminho a ser percorrido. A China conta com cerca de 20% da população mundial mas corresponde a apenas 3% do consumo global. Mas, na margem, profundas mudanças começam a ocorrer. Acordaram o gigante que hibernava no pesadelo comunista. A economia vem crescendo a taxas bastante elevadas, próximas de 10% ao ano. O dragão tem fome!

Alguns números demonstram bem o significado desse despertar chinês, ainda repleto de desafios pela frente. São algo como 300 mil milionários chineses atualmente, enquanto quase metade da população ainda trabalha na agricultura. O ganho anual médio na indústria chega a US$ 3.000 enquanto na agricultura corresponde a 10% desse valor. A parcela de manufaturados no total do PIB vem aumentando, hoje já em 32%. Do total mundial, a China já responde por quase 10% da produção de manufaturados, contra algo perto de 1% em 1950. A produção de veículos saiu de 2 milhões em 2000 para mais de 5 milhões em 2004. Boa parte desse avanço deve-se à entrada de multinacionais, “explorando” os trabalhadores chineses, pela ótica marxista. Os trabalhadores chineses agradecem tal “exploração”. Desde 2001, algo como 10 milhões de chineses foram contratados por empresas estrangeiras, que pagam salários maiores que a média local.

Uma pesquisa do Gallup mostrou recentemente o verdadeiro “grande salto” chinês. De 1994 para 2004, a proporção de casas com aparelho de TV colorida dobrou, para 82%. O total de casas com refrigerador saiu de 25% para 41% no mesmo período. Eram apenas 3% das casas com microondas em 1994, comparado a 18% em 2004. A quantidade de casas com telefone saltou de 10% para 63%. Em termos de computadores, o salto foi de 2% para 13%, ainda que o governo controle o conteúdo. O consumo chinês ainda é tímido. Mas os avanços têm sido fantásticos.

O investimento direto na China tem sido cerca de US$ 50 bilhões por ano. O superávit comercial ultrapassou os US$ 100 bilhões. Empresas como Nokia, Ericsson e Phillips já contam com 10% da receita provenientes da China. O país acumulou mais de US$ 1 trilhão em reservas internacionais, passando o Japão e atingindo o primeiro lugar no mundo. A China é o maior comprador na margem das principais commodities industriais. Antes do despertar chinês era viável simplesmente ignorar o mastodonte. Atualmente, todos precisam levar em conta o destino chinês em suas avaliações estratégicas. Jack Welch, ex-CEO da GE, fez questão de frisar isto em sua autobiografia. O mundo jamais será o mesmo após a tardia revolução industrial chinesa.

quarta-feira, abril 12, 2006

Falsa Dicotomia



Rodrigo Constantino

Muito se fala sobre um necessário trade-off entre inflação e desemprego. Uma das curvas mais famosas em economia é a de Phillips, que trata justamente desta relação: menos desemprego, mais inflação. Alban Phillips realizou um estudo empírico em 1958, cujos resultados logo foram abraçados pelos neo-keynesianos, felizes em argumentar que o governo poderia então controlar o nível de emprego com suas políticas. A princípio, Phillips tratava da relação entre aumento de salários e desemprego, mas as conclusões foram extrapoladas para a inflação e o desemprego. Esta mentalidade perdura até hoje, quando muitos economistas apresentam esta suposta dicotomia, exigindo uma escolha entre menos desemprego ou menos inflação. Mas será que tal relação é realmente válida?

Na década de 70, muitos países experimentaram uma estagflação, mistura de elevada inflação com elevado desemprego. Isso colocou a curva de Phillips em xeque. O nobel de Chicago, Milton Friedman, foi um dos que melhor explicou o fenômeno, lembrando que a inflação é basicamente um problema monetário, de excesso de circulação de moeda. Ele chamou a curva Phillips de uma ilusão. A escola austríaca também demonstrou, com sólido embasamento, que o desemprego era fruto de restrições criadas pelo próprio governo, não permitindo o livre funcionamento do mercado de trabalho. Murray Rothbard chegou a afirmar que a relação proposta pela curva Phillips era inversa, na verdade. Mas os adeptos de Keynes não desistiriam facilmente.

A curva foi adaptada, e o conceito de NAIRU (non-acelerating inflation rate of unemployment) foi criado, dando a entender que a partir de um certo nível de desemprego é que a inflação seria detonada. Tamanha é a influência do NAIRU que até mesmo o Fed, banco central americano, utiliza bastante seu conceito. Entretanto, a crença nesta teoria seria duramente abalada com os dados americanos, com cada vez menos desemprego sem correspondente aceleração da inflação. Para muitos, o nível do NAIRU seria em torno de 5,5% de desemprego. A taxa atual já está em 4,7% e nada da inflação explodir. Muitos economistas, perplexos, buscam novas explicações para o acontecimento “bizarro”.

Não pretendo me alongar no debate teórico sobre a relação entre inflação e desemprego. O tema é polêmico e há muita controvérsia ainda. Mas considero útil trazer o debate à tona, assim como dados empíricos recentes, já que não são poucos os economistas que condenam as rígidas metas de inflação no Brasil, como se um pouco mais de inflação fosse desejável para reduzirmos o desemprego. Erram o alvo. Os “desenvolvimentistas” são os principais proponentes desta dicotomia, a qual considero falsa. Podemos crescer de forma acelerada, reduzindo drasticamente o desemprego, sem que a inflação incomode. Afrouxar as metas de inflação não é o caminho. Reduzir os gastos públicos, aprovar reformas estruturais, atacar a burocracia e abrir mais o nosso comércio sim. Vários países seguiram esta trajetória e colheram os frutos, crescendo aceleradamente, sem inflação. Enquanto isso, outros mantiveram as armadilhas criadas pelo excesso de Estado e buscaram um crescimento calcado na maior tolerância com a inflação. O resultado foi infinitamente pior. Em alguns casos, catastrófico até.

Levantei dados de 40 países desde 1995 até 2004, usando a The Economist como fonte. A taxa média de desemprego no mundo neste período foi de 6,9%. A inflação média nos últimos 5 anos ficou em 3,8%. Não há praticamente correlação alguma entre a taxa média de desemprego e a inflação no período analisado. O Brasil apresentou desemprego médio de 8,3% para uma inflação de 8,7% desde 1999. Vários países tiveram taxas de desemprego menores, com inflação também menor. O Chile, nosso vizinho mais responsável, mostrou taxa média de desemprego de 7% para inflação média de apenas 2,7%. Tanto Inglaterra como Estados Unidos tiveram taxa de desemprego média de 6,2% enquanto a inflação permaneceu dentro do controle, perto de 2,5% ao ano. A Nova Zelândia, que realizou reformas liberais e reduziu o déficit público, apresentou desemprego de 6,1% durante o período, com inflação de apenas 2,4% ao ano. Tanto Taiwan como Cingapura praticamente não possuem desemprego, com taxas abaixo de 4%, ao mesmo tempo que a inflação média não chega a 1% por ano. Por outro lado, a Venezuela viveu com inflação bem maior, acima de 20% anual. Nem por isso foi capaz de levar sua taxa de desemprego média para baixo de 12%. Argentina e Rússia são outros casos de maior inflação com mais desemprego também.

Os exemplos são inúmeros. A relação entre a inflação e o desemprego é mais complexa do que parece. A curva de Phillips está longe de ser uma verdade irrefutável. Mais parece um mito. O NAIRU ainda necessita de mais fé que qualquer coisa para ser aceito. Os argumentos dos monetaristas balançam certas teorias convencionais. As teorias austríacas praticamente sepultam de vez as crenças dos keynesianos. E os dados empíricos recentes corroboram com a visão de que a dicotomia apresentada entre inflação e desemprego mais parece, na verdade, uma falsa dicotomia.

segunda-feira, abril 10, 2006

Habilidade de Resposta

Rodrigo Constantino

“Anytime we think the problem is out there, that thought is the problem; we empower what's out there to control us.” (Stephen Covey)

Um dos grandes divisores entre o grupo de indivíduos que cresce na vida e o grupo que apenas existe, como um animal instintivo, é a coragem de assumir erros. De um lado, aquelas pessoas virtuosas que admitem seus próprios defeitos, sempre na busca sincera pela excelência, para melhorar. Do outro, aqueles fracos que necessitam de bodes expiatórios o tempo todo, que culpam o mundo ao redor pelos seus males, que se colocam como vítimas. Uns são agentes ativos na vida, os outros são passivos diante de tudo. A distinção entre ambos os grupos é gritante.

As ações humanas, por mais influenciadas que possam ser por fatores exógenos, são sempre individuais. Indivíduos agem. A responsabilidade, portanto, deve ser individual. Lembro que responsabilidade vem de habilidade de resposta, fazendo responsável pelo ato aquele que o praticou. Eximir um indivíduo da responsabilidade de seu ato é o caminho certo da desgraça. Pessoas fracassadas costumam sempre depositar a culpa dos seus erros nos outros, de preferência algo bem vago como sociedade, miséria, deus etc. Essas pessoas seriam apenas marionetes, executando ações sem qualquer livre arbítrio. Autômatos guiados por uma força oculta qualquer. Compram assim a tranqüilidade de espírito, jogando para outros a culpa dos próprios erros. Jamais saem da completa mediocridade, no entanto.

Penso nessas coisas quando vejo que o julgamento da assassina dos próprios pais irá começar. A garota logo transfere para o ex-namorado a culpa do seu ato bárbaro. Usa a maconha como bode expiatório também. Ela não cometeu o frio e violento ato, segundo sua perspectiva. Foi “levada” a isso. E onde fica a responsabilidade individual?

Extrapolando essa característica para nações inteiras, vemos que os países miseráveis costumam sempre culpar bodes expiatórios externos pela sua desgraça. São sempre vítimas, transferindo a responsabilidade para outros agentes. A receita certa para se perpetuar a miséria.

O filósofo Schopenhauer já aconselhava nesse sentido: “Não devemos procurar desculpas, atenuar ou diminuir erros que foram manifestamente cometidos por nós, mas confessá-los e trazê-los, na sua grandeza, nitidamente diante dos olhos, a fim de poder tomar a decisão firme de evitá-los no futuro”. Um dos “pais fundadores” dos Estados Unidos, Benjamin Franklin, dizia que “os sábios aprendem com os erros dos outros e os ignorantes não aprendem nem com os próprios”. Esse foi um homem que buscou ser melhor a cada dia, sempre trazendo à tona seus próprios erros do passado, para com eles aprender.

O judeu Viktor Frankl, preso pelos nazistas, concluiu que “entre o estímulo e a resposta, o homem tem a liberdade de escolha”. Ele decidiu reagir da melhor forma possível diante daquela terrível situação. Não escolhemos tudo que se passa ao nosso redor, mas escolhemos como reagir a tais estímulos. E o nosso fracasso deve ser sempre uma lição. “Para os vencedores, os fracassos são uma inspiração; para os perdedores, o fracasso é uma derrota”, lembra Robert Kiyosaki. Uns ficam paralisados diante dos próprios erros, e logo partem para as tradicionais desculpas, jogando o problema para fora de si. Outros assumem a rédea da própria vida, entendendo que os erros devem ser enfrentados, assimilados e transformados em valiosas lições, para jamais serem repetidos.

Afinal, as ações são individuais. A habilidade de responder por elas também. Liberdade individual só pode andar junto com responsabilidade individual. Quem foge desta, se afasta daquela. Só é livre quem assume a responsabilidade pelos seus atos, sem a busca constante por culpados exógenos.

quinta-feira, abril 06, 2006

A Perfídia de Veríssimo



Rodrigo Constantino

O cronista Luís Fernando Veríssimo usa e abusa de seu espaço na mídia para propaganda ideológica, sempre defendendo o fracassado socialismo. Recentemente, chamou de "detalhe" a forma pela qual o governo conseguiu as informações sigilosas da conta do caseiro que denunciou o ex-ministro Palocci. Até à Abin foi pedida uma investigação ilegal do caseiro por Palocci.

Caro Veríssimo, não estamos em Cuba, ilha-presídio que o senhor parece admirar, de longe e do seu conforto. Vivemos num país com democracia e Estado de direito. A forma pela qual as informações foram obtidas não é um simples detalhe, mas algo da maior gravidade. Mostra bem a face autoritária desse governo que o senhor tanto defendeu. Tente evitar o proselitismo que lhe é tão característico.

Agora o colunista ataca novamente, com bastante retórica sensacionalista e zero de conteúdo lógico. Escreve em artigo que tanto a “direita” como a “esquerda” sentem saudades do século XIX. Os motivos da saudade esquerdista seriam os ideais revolucionários que iriam transformar o mundo, a crença da inevitabilidade histórica do socialismo. A nostalgia direitista viria dos tempos em que trabalhadores eram explorados, segundo a estranha ótica do autor. Ou seja, de um lado a saudade pelo sonho lindo, do outro a saudade da exploração. E Veríssimo ainda conclui que foi a pregação socialista que estragou a “perfeição” direitista, calcada nessa suposta exploração. Considero difícil achar algum outro texto com tanta baboseira e inversão em tão poucas palavras!

Veríssimo usa o recente caso francês, país cuja mentalidade elitista ele adora, mostrando a luta de alguns barulhentos jovens pela manutenção das conquistas trabalhistas. Diz que aqueles que propõem a flexibilização trabalhista hoje “babariam” com a realidade do velho século, com crianças e mulheres trabalhando até 15 horas por dia. Alguém precisa avisar ao “ilustre” colunista que antes da revolução industrial estas crianças e mulheres morriam como moscas, de inanição. Será que Veríssimo não sabe que esse trabalho era voluntário, posto que a alternativa era a fome? Será que alguém com a erudição de Veríssimo desconhece que foi o avanço da técnica nesta época que possibilitou que a população inglesa dobrasse de tamanho em menos de um século, enquanto havia permanecido estagnada por vários séculos? Será que o autor ignora que a situação da Polônia, por exemplo, era caótica nesta época, e que tudo que as mulheres e crianças polonesas gostariam naqueles duros anos era das oportunidades criadas na Inglaterra? Veríssimo tem que saber disso tudo. O que ele faz é manipular as informações, comparando a situação atual com aqueles complicados anos. Assim é fácil. Podemos até mesmo concluir que a situação no Haiti não é tão grave, comparada às condições de vida dos babilônicos sob Hamurabi. Fica faltando apenas honestidade intelectual nesta “análise”...

Fora isso, o que possibilitou uma grande melhora na qualidade de vida e condições de trabalho dos mais pobres não foi a “pregação socialista”, nem de perto. Basta ver que onde mais influência teve tal pregação, mais miséria o povo teve. Na verdade, o que garantiu um progresso acelerado para essa gente foi justamente a lógica capitalista, com avanços tecnológicos e competição entre empregadores. Os funcionários da Dell vivem melhor que os cubanos por esta razão, diferente do que Veríssimo tenta nos convencer. Onde a produtividade do trabalho é maior, os salários tendem a ser maiores. Onde o progresso capitalista é maior, as condições do trabalho tendem a ser melhores. E onde há maior competição entre empresas, com flexibilidade de contratos, as reais conquistas dos trabalhadores tendem a ser maiores.

Mas o autor finge não ver nada disso, que é bastante óbvio. Ele finge crer que são leis escritas, sem quaisquer ligações com a realidade do mercado, que garantem a vida mansa para os trabalhadores. As tais “conquistas” na marra, “protegendo” os trabalhadores contra o desemprego e tudo mais. Se fosse tão simples, bastaria colocar no papel salários milionários e garantia de emprego eterno. Até mesmo a felicidade plena poderia ser imposta por lei. Mas a realidade é chata para os românticos sonhadores. E a realidade é que quanto maior a flexibilidade das leis trabalhistas, melhor para os trabalhadores, principalmente os mais pobres. Afinal, a proteção na marra do emprego de alguns significa a exclusão de outros, que aceitariam trabalhar por menos. Não é por acaso que a taxa de desemprego francesa já é o dobro da americana, passando de 20% no segmento dos jovens, justamente os “protegidos” pela bela lei.

Desconfio muito que tanta inversão por parte de Veríssimo não seja apenas ignorância. Trata-se de alguém que escreve bem e leu bastante. Fico com outra opção. Afinal, são artigos e mais artigos onde o cronista sempre encontra um jeito de condenar o “neoliberalismo” e enaltecer o socialismo, nunca com sólidos argumentos, sempre apelando para uma retórica vazia. Na minha opinião, é mesmo pura perfídia.

quarta-feira, abril 05, 2006

A Sabedoria das Multidões



Rodrigo Constantino

“Collective decisions are most likely to be good ones when they’re made by people with diverse opinions reaching independent conclusions, relying primarily on their private information.” (James Surowiecki)

No livro The Wisdom of Crowds, James Surowiecki defende a tese de que as multidões desfrutam de mais sabedoria do que se imagina. Para um grupo de indivíduos apresentar tal sabedoria, entretanto, precisa preencher quatro condições: diversidade de opiniões, independência de julgamento, descentralização e agregação. Apesar de ser uma idéia contra-intuitiva a princípio, a suposta sabedoria das multidões não carece de lógica, além de mostrar evidências empíricas a seu favor.

O segredo é que os erros das estimativas individuais acabam se anulando em um grande número de opiniões. Mas para que isso ocorra, faz-se necessário satisfazer os requisitos acima. Caso contrário, não teremos erros aleatórios, mas sim um viés, onde as opiniões não são realmente independentes e individuais. Neste caso, estaríamos diante do que Gustave Le Bon dizia ao se referir à “psicologia das massas”, um grupo monolítico com pura emoção e nenhuma razão, adquirindo um senso de invencibilidade e irresponsabilidade incontroláveis. O autor reconhece que na maioria das coisas, média quer dizer apenas mediocridade. Mas no processo de tomada de decisão, freqüentemente pode significar excelência, quando satisfeitas as condições necessárias.

Surowiecki cita como exemplo a ferramenta de busca Google, cujo algoritmo baseia-se justamente na sabedoria das multidões, dando maior peso para as páginas mais visitadas na hora da pesquisa. A enciclopédia Wikipidia também seria baseada no princípio da sabedoria das multidões. Na verdade, o livre mercado é justamente isso, um processo onde as multidões, com suas escolhas individuais e independentes, selecionam as melhores alternativas de acordo com suas preferências. No começo do século XX, literalmente centenas de empresas disputavam para ver quem ofereceria a melhor alternativa para os consumidores em termos de automóveis. Havia uma gama enorme de variedades, inclusive com diferentes tecnologias. Poucas, entre essas centenas, sobreviveram. Eram as que melhor atendiam a demanda. As multidões de consumidores tinham decidido. O mesmo padrão se repete em diversas outras indústrias.

Para o melhor funcionamento deste processo, devemos ter a maior diversidade de alternativas possível, com novas idéias surgindo o tempo todo. Claro que, desta maneira, a maioria irá se tornar um fracasso. Mas as poucas vencedoras são as que farão a diferença. A habilidade de rápido reconhecimento e freio das idéias perdedoras é que torna o sistema eficiente.

A premissa adotada na teoria da sabedoria das massas é bastante atraente e sólida. Diz respeito ao conhecimento disperso, contido de forma totalmente pulverizada na sociedade. Nenhum ser ou pequeno grupo de pessoas poderia absorver todas as informações espalhadas entre milhões de indivíduos. O economista austríaco Hayek defende tal tese com perfeição, e sua influência não passa despercebida pelo autor do livro. Ela vai contra a visão platônica de um grupo de “sábios iluminados” que poderão escolher melhor pelo resto todo. A informação está totalmente dispersa, além das preferências serem subjetivas.

Um processo de livre escolha individual, em um ambiente de regras básicas e bem definidas, pode apresentar, portanto, resultados infinitamente melhores que aqueles oriundos de poucos “sábios”. Até mesmo na natureza, observando animais irracionais, vemos uma certa ordem espontânea surgir sem a figura do líder “iluminado”. Seria fazer muito pouco caso do homem, animal racional, supor que cada indivíduo é um completo mentecapto que necessita da direção traçada por um ser “clarividente”. Na livre interação entre indivíduos, respeitando-se as regras definidas previamente, há um claro incentivo à cooperação, assim como a confiança mútua passa a ser um valioso ativo. Preservando-se a diversidade, independência, descentralização e agrupamento cooperativo, não há porque acreditar que o resultado não será superior àquele obtido por um processo centralizado nas mãos de poucos “especialistas”. Há sabedoria nas multidões. E o livre mercado é o mecanismo de sua expressão.