sexta-feira, julho 29, 2011

Cobertor curto

Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

O governo Dilma anunciou novo pacote cambial para tentar conter a valorização do real. Será cobrado agora 1% de imposto sobre a diferença entre a posição vendida e a posição comprada em derivativos cambiais, quando o excedente for superior a US$ 10 milhões. O mercado ficou confuso com a distinção entre operações de “hedge” e especulação, uma vez que é difícil distingui-las. Além disso, no limite os agentes podem simplesmente transferir suas operações de câmbio para o exterior. As ações da BM&FBovespa despencaram já antecipando esta perda de receita.

Foram várias medidas até agora com o mesmo objetivo, mas todas surtiram efeito apenas de curto prazo. Compreende-se o desespero dos industriais com esta valorização da moeda nacional, o que torna os produtos importados mais competitivos. Mas o fenômeno de desvalorização do dólar é global, e alguns fatores importantes que colaboram com a enxurrada de dólares para o Brasil são estruturais. O governo está tentando enxugar gelo, atacando com medidas paliativas os sintomas, em vez de lidar com a raiz do problema.

Com taxas de juros praticamente nulas nos países desenvolvidos, e nossa Selic chegando perto de 13%, parece natural que o Brasil se torne foco de atração de capital especulativo. Mesmo levando em conta a alta inflação, o diferencial de juros reais é alto. A ata do Copom sinalizou ontem o término da elevação dos juros, mas ainda é muito cedo para decretar vitória sobre a inflação. E eis que, de forma resumida, desenha-se o cenário complicado: o mundo rico não tem juros e exporta capital, o Brasil é destino certo pela sua elevada taxa de juros, mas esta não pode ceder porque a inflação ameaça sair de controle; o real se valoriza, e os industriais começam a chiadeira; o governo vai fazendo uma colcha de retalhos com medidas pontuais para atender grupos de interesse.

O cerne da questão é a baixa competitividade da economia brasileira, por causa dos elevados impostos e encargos trabalhistas, burocracia asfixiante, infraestrutura capenga e baixa produtividade da mão-de-obra sem educação. Como o governo não ataca nenhum destes problemas com coragem, e ainda mantém gastos públicos altos, fica impossível reduzir os juros reais sem gerar inflação. O editorial do Estadão hoje resume bem a coisa: “O quadro só mudará quando o peso do combate à inflação for dividido entre a política monetária e a política fiscal. Isso ocorrerá quando o governo se dispuser de fato a conter seus gastos. Por enquanto, isso está fora da agenda”. O cobertor é curto.

3 comentários:

Blog para receber econoespaco disse...

A desindustrialização do Brasil é decorrente de exportarmos impostos exorbitantes, incompetência governamental, corrupção e impunidade, ensino medíocre e outros insumos do "Custo Brasil".

http://econoespaco.blogspot.com/2011/06/verdades-sobre-desindustrializacao-do.html

Angel disse...

E o governo ainda ataca aumentando as taxas nas operações de crédito no exterior (sobre quem vai fazer turismo no exterior)...

Só que gastar dólares no exterio nada mais é do que o escape da panela de pressão. Quanto mais cair o dólar, mais isto acontecerá. Querer impedir isto de acontecer só vai fazer a pressão da panela aumentar ainda mais, ou seja, o dólar cair ainda mais e a coisa se tornar pior ainda.

samuel disse...

Rodrigo, de todas as explicações colhidas pela VEJA em esplicação às altas taxas brasileiras, a que me pareceu mais lógica e que também pode ser demonstrada matematicamente é a do prof. Alex Schwartzman, que diz em resumo:
A Selic, taxa que influencia a maior fração do crédito no país, mas que tem, a bem da verdade, nenhum impacto sobre a outra parcela, também considerável, o chamado crédito direcionado, que engloba o BNDES além do crédito habitacional e rural que equivale a 35% dos empréstimos bancários no país.
A Selic afeta menos a demanda privada doméstica do que faria na ausência do crédito direcionado.
A convergência das taxas locais de juros para as internacionais só poderão ocorrer se: (a) o peso do direcionado voltar a cair significativamente; ou (b) as taxas de juros nesta modalidade de crédito se aproximar das taxas de juros de mercado
RODRIGO, ACHO AQUI UM CAMINHO A SER APROFUNDADO POR BONS ECONOMISTAS, O QUE VOS INCLUE
No Brasil temos um belo punhado de jabuticabas:
- TJLP & BNDES, o chamado Crédito Direcionado que engloba o BNDES além do crédito habitacional e rural que equivale a 35% dos empréstimos bancários no país.
- Quem sabe também uma questão cultural... o estado brasileiro sempre interferindo no livre mercado também nas taxas de juros e definindo privilegiados. Isto acumulado de baixa poupança devido aos incentivos da previdência e aos gastos públicos desenfreados.