segunda-feira, dezembro 26, 2011

Saudades de Deus

LUIZ FELIPE PONDÉ, Folha de SP

Tem coisa mais monótona do que discutir sobre a existência ou não de Deus? Ninguém crê em Deus "por razões lógicas". Isso é papo furado. Ninguém "decide" ter fé.
Tentar provar que Deus existe porque ele seria "uma necessidade da razão" me parece um engodo.
Primeiro porque a razão é risível em suas necessidades, como diria o cético Michel de Montaigne (século 16). A pergunta pela origem de tudo que existe (como numa espécie de aristotelismo aguado) não prova nada. Temos inúmeras necessidades que não são autoevidentes -por exemplo, que o bem deva vencer ao final das coisas.
Muitas vezes o mal vence e pronto. Quase sempre. Por outro lado, é interessante se pensar de onde veio a matéria que explodiu um dia e o lugar onde ela explodiu.
Mas isso nada prova acerca do Deus ocidental. O princípio pode ser uma mecânica estúpida.
Aliás, o chamado "argument from evil" (argumento a partir do mal) do ateísmo é famoso. Autores grandes como Dostoiévski e Kafka, entre outros, já o frequentaram de forma brilhante.
O argumento basicamente é o seguinte: se Deus é bom, por que o mundo é mau? Alguns já chegaram a supor que Deus seria mesmo mau, como o próprio Kafka.
Duas questões são importantes apontar nesse debate, uma com relação aos crentes, outra aos ateus.
Primeiro os crentes. Uma falácia comum por parte dos crentes é supor que seria impossível você ser uma pessoa razoavelmente moral sem alguma forma de religião. A história prova que ateus e crentes dividem o mesmo lote de miséria moral. Pouco importa ser ou não crente.
Pessoalmente, acho que o acaso decide: o temperamento (o acaso de você ter nascido "assim ou assado") é quase sempre o juiz do comportamento humano e não "valores" religiosos ou éticos seculares (não religiosos).
Portanto, a tentativa de afirmar que, se você é ateu você necessariamente não é "bom", é pura falácia. Tampouco penso que uma religião faça falta para todas as pessoas. Muita gente vive sem crise sem acreditar em coisa nenhuma "do outro mundo". Isso não significa que ela seja sempre feliz (tampouco os religiosos o são), a (in)felicidade depende de inúmeros fatores.
E mais: "crer ou não crer" não é algo que você escolhe, "acontece". Grandes teólogos como Santo Agostinho, Lutero e Calvino diziam que a "fé é uma graça" (simplificando a coisa), alguns receberam o dom e outros não (portanto, ela "acontece", como eu dizia acima, não é você quem escolhe ter ou não). Acho essa ideia bem mais elegante do que esse papo furado acerca das necessidades racionais, sociais, morais ou psíquicas da crença.
Quanto aos ateus, acho risível a ideia de que o ateísmo seja uma "conquista" da razão ou de alguma forma de rigor moral ou "coragem cosmológica".
Nada disso, como já disse antes, e repito, até golfinhos conseguem ser ateus em sua maravilhosa vida aquática. Fiquei ateu quando tinha oito anos.
O ateísmo me parece, entre todas as hipóteses sobre o universo, a mais fácil, simples, rápida e quase "fast food theory" (teoria fast food).
Não precisamos nos esforçar muito para perceber que podemos talvez um dia descobrir a causa "natural" do universo, ou acabarmos como espécie antes de descobrir qualquer coisa. E "who cares" se sumirmos um dia?
E mais: é quase evidente que somos uma raça abandonada na face da Terra e a indiferença dos elementos naturais para conosco (sejam eles externos ou internos ao nosso corpo) salta aos olhos.
E mais: a possibilidade de estarmos sozinhos é sempre mais fácil do que acompanhados por um ser maravilhoso, dono do universo e que sabe cada fio do cabelo que você tem na cabeça.
Não há nenhuma evidencia definitiva de que Deus ou que qualquer outra entidade divina exista. O ônus da prova é de quem crê. Além do fato de que os japoneses, caras bem inteligentes, não creem em Jesus na maioria das vezes.
Acho Deus uma hipótese acerca da origem das coisas mais elegante do que a dos golfinhos. Mas, por outro lado, a ideia de que um dia o pó tomou consciência de si mesmo e constatou sua dolorosa solidão cósmica é bela como uma ópera.

17 comentários:

Anônimo disse...

O texto já começa mal. O "ser" é uma evidência: só faz perguntas aquele que existe. Mas este nem sempre existiu, tampouco seus antecedentes. Logo, é necessário um ser que lhe tenha dado a existência. Como ensina São Tomás de Aquino, "Deus é aquele que é"; por isso, ele sempre existiu, e deu existência a tudo. É evidente perceber que se não houvesse um ser que dá a existência a tudo e existe por si mesmo, nada que um dia não foi poderia ter sido: no primeiro animal de cada espécie, ou no primeiro organismo que lhe deu origem (como acreditam os evolucionistas), havia um elemento chamado "vida" que logicamente não tinha fundamento nele mesmo, caso contrário tal ser jamais morreria - ele se daria a vida a si mesmo continuamente. Um único ser - pela evolução ou não, não sabemos - deu origem a toda forma de vida, e esse ser tem que existir eternamente. Ele não só deu origem a tudo (com exceção do mal, que não é uma substância), mas existir é a sua própria natureza, e tudo o que existe, existe neste ser. Por isso, ele não está fora, mas abrange e transcende a nossa realidade - "Nele existimos, nos movemos e somos" (At 17, 28).

Assim, Deus existe, e isso é uma faculdade da razão, como corretamente ensina a Igreja Católica.

Vince Felice disse...

Acho que o autor se confundiu !
A fé não é Graça !
Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem.
Hebreus 11:1

GRAÇA NO PAÍS DAS MARAVILHAS disse...

IDÉIA MUITO PERIGOSA

O ATEÍSMO SUSTENTA TODAS AS IDEOLOGIAS POLÍTICAS MAIS NEFASTAS ; SUBSTITUI DEUS PELO ESTADO , OU PELO TIRANO TIPO O COREANO GENOCIDA KIM ETC

QUE DEUS- IDEAL, META- SEJA LOUVADO

Anônimo disse...

Quem não crê em Deus, vai crer no quê? No vazio?

Bem, leia o excerto abaixo e reflita:

"Simplesmente olhe para a existência e sua abundância. Qual a necessidade de tantas flores no mundo? Apenas rosas bastariam.
Mas a existência é farta – milhões e milhões de flores, milhões e milhões de pássaros, milhões de animais – tudo em abundância. Qual a necessidade de milhões de sistemas solares, cada um com milhões de estrelas? Parece que não há nenhuma necessidade, exceto que a abundância é da própria natureza da existência; esta riqueza é o próprio coração dela; que a existência não acredita em pobreza." OSHO

Ou seja, a existência não acredita no vazio!

P.S.: Deus e religião são duas coisas completamente diferentes! Religião tira a sua liberdade, Deus é a sua liberdade!

P.S. 2: Abundância não é o mesmo que divisão por partes iguais.
É só olhar para o mundo, uns lugares foram mais favorecidos que outros! A diferença faz parte do processo! Mas a indiferença não!

Atenciosamente,
BRMGIBB

Anônimo disse...

Nossa, quanta bobagem os acima disseram...

Thiago Lorenzi disse...

É só falar de Deus que os parceiros que comentam derrapam na curva e se perdem nos argumentos.. Impressionante!

Anônimo disse...

vamos começar novamente a ler o texto.
...
LUIZ FELIPE PONDÉ, Folha de SP

Tem coisa mais monótona do que discutir sobre a existência ou não de Deus?

um grande abraço para os senhores.

Anônimo disse...

"O ATEÍSMO SUSTENTA TODAS AS IDEOLOGIAS POLÍTICAS MAIS NEFASTAS ; SUBSTITUI DEUS PELO ESTADO , OU PELO TIRANO TIPO O COREANO GENOCIDA KIM ETC"

Nananinanão.Ateísmo/Agnosticismo não tem nada a ver com ideologia política e tampouco defende a substituição do homem pelo Estado.

Ateísmo é, antes de tudo, uma forma de compreender o mundo livre de qualquer dogma.O ateísmo nem pode ser chamado de religião, já que esta significa "religar com algo divino" (Bastante diferente do que um ateu/agnóstico acredita).

As pessoas acreditam que todo ateu é assim porque muitos comunistas/socialistas eram ateus.Mas uma coisa não tem nada a ver com a outra.
Caso contrário teriamos que admitir o mesmo para o cristianismo, já que a Teologia da Libertação é explicitamente de esquerda e o ditador Hugo Chávez vive falando que seu governo tem como objetivo implantar o "socialismo cristão".
O mesmo podemos falar para o atual governo iraniano que é socialista e islamista.

Não podemos nem falar que os antigos estados socialistas eram ateus (assim como os atuais), já que todos praticavam o culto à personalidade (basta ver a tradução do hino da antiga URSS e notar que Lenin é visto como um Deus que criou aquele país).
Isso vai completamente contra o ateísmo, já que é uma forma de dogma e até mesmo religião.

O Ateu não defende um Estado ateu mas sim um Estado laico (muito diferente dos socialistas e dos bushistas, que querem impor dogmas ao Estado).

Anônimo disse...

Depois de tanta bobagem crente, enfim um comentário interessante! (Anônimo das 4:12 AM)

gustavosauer disse...

Pondé, mais uma vez, comete vários equívocos em sua psicanálise. Há um monte de convertido por aí que diz que se converteu após uma ponderação racional. (se eles foram honestos ou não em sua empreitada intelectual é outra coisa)

Se não estiver equivocado, Olavo de Carvalho é um exemplo de convertido pela razão.

William Lane Craig é outro que prega pelo mundo a idéia que a filosofia prova a existência de deus.

samuel disse...

Comentários baseados em Stephen Hawkings "http://www.ouniversonumacascadenoz.com.br/"
Que foi oferecido como presente de natal pelo History Channel: ANTES DO BIG BANG NÃO HAVIA TEMPO E NÃO HAVENDO TEMPO NÃO HOUVE DEUS. NÃO HOUVE ATO E CONSEQÜÊNCIA.
We are alone brothers. Enjoy life, this marvelous gift of unpredictable events.

Augusto Cezar disse...

"O ônus da prova é de quem crê"

Erro primário. O ônus da prova é de quem **alega**.

Quem crê na existência de Deus não tem nada para provar; quem alega existência, bem como quem alega inexistência sim, de modo que, se optarem por não comprovar, aquilo não passará de uma alegação.

A crença depende da falta de comprovação extensiva para existir, do contrário, deixa de ser crença. Daí o ridículo de se dizer que o ônus da prova é de quem crê.

Neo-ateístas tem repetido à exaustão que quem tem de provar a existência de algo/alguém são os crentes, ficando eles mesmo isentos de provar inexistência sob o argumento de que não pode provar uma negativa, que tem até filósofo falando besteira...

Anônimo disse...

'ANTES DO BIG BANG NÃO HAVIA TEMPO E NÃO HAVENDO TEMPO NÃO HOUVE DEUS'

evidências recentes desacreditam o big bang.

blog do preto disse...

A questão essencial: de onde surgiu a matéria?
José Oliveira

samuel disse...

O big bang ou qq outra teoria do início, houve de um ponto de infinita pequenez e infinito peso. Antes não existia tempo. É a lógica humana derrubando a crença.

Diego disse...

A questão mais essencial ainda: é necessário que a matéria tenha "surgido" de algum lugar?

Será que não é possível que a matéria-energia seja a Essência da realidade, a partir da qual se manifestam todas as infinitas possibilidades do ser? Não é possível que o Eterno Infinito "Criador" não seja na verdade o Eterno Auto-Transformador, o Ser que contém em si a infinita linha sucessória das causas e efeitos?

Minha resposta à primeira pergunta é "não é necessário no sentido estritamente causal; mas é necessário um princípio sutil metacausal". Às duas últimas perguntas, ela é "não é possível". Porém, devo lamentar o fato de que a maioria dos cristãos (incluindo os que postaram aqui) substituem a autoconsciência pelo fetichismo dogmático como ponto de partida para seus "raciocínios", desviam o foco das questões realmente fundamentais (por exemplo, pressupondo ridiculamente que a matéria "tem" que ser causalmente oriunda de algum lugar externo a ela - para malandramente abrir espaço para um deus pressuposto - frequentemente, e segundo a fedorenta metafísica de botequim em que a fé de tantos bebe todas - no insustentável dualismo entre matéria e espírito entendidos como Substâncias distintas, e não a primeira como mera manifestação do segundo, que existe como princípio sutil - como mandaria a boa mística). Assim, denigrem sua própria crença mais do que os ateus poderiam fazer; podem apostar: com fiéis assim, daqui a poucas décadas teremos uma maioria agnóstica também no nosso tão devoto país. Em breve Dilmão não vai ter mais que dar nó nos seus braços tentando simular o sinal-da-cruz.

Parabéns, Pondé, pelo excelente artigo. Obrigado, Rodrigo Constantino, por publicá-lo; ateus como você merecem grande respeito.

Bessa disse...

Fico intrigado como o autor do texto considera risível a opinião de alguns ateus de que seu ateísmo é como que uma conquista enquanto afirma que a crença é um estado de graça.

Em muitos casos a experiência mostra que a crença é um acidente cultural, que pode sim dar lugar a formas de pensamento baseadas em raciocínio lógico. Por acaso a "graça" do saber teológico simplesmente deixa de existir quando um crente começa conflitar suas crenças com o conhecimento empírico proporcionado pela ciência? Acho que não.