segunda-feira, dezembro 26, 2011

Segurança tem custo


Rodrigo Constantino, revista VOTO

Vivemos em uma época um tanto acovardada, em que muitos passaram a crer que é possível eliminar os riscos da vida delegando a responsabilidade ao governo. Com o auxílio das leis, vamos impor alimentos saudáveis, banir o tabaco da face da Terra, cortar a fritura e a gordura, produzir automóveis ultra-seguros e por aí vai. Tudo em nome de uma vida mais protegida e prolongada. Poucos se dão conta, porém, de que esta obsessão por mais segurança tem custos.

Vejamos o caso do automóvel. A paranóia para se evitar acidentes, sempre atacando os sintomas em vez das causas, já levou à criação de uma lei intolerante ao extremo com o consumo de álcool. O sujeito que sair para jantar com a mulher e beber uma taça de vinho estará cometendo um crime se pegar no volante depois. O custo indireto desta medida radical pode ser a redução do faturamento dos restaurantes, suborno para policiais, multa para o governo, ou mais gasto com táxi. Tudo por causa da maldita taça de vinho!

A intenção é boa: impedir que bêbados sem condição alguma peguem na direção dos carros, colocando a vida dos outros em evidente perigo. Mas o custo de exagerar na dose – não da bebida, mas da lei – pode ser muito alto. A dificuldade de se medir seu efeito indireto faz com que a maioria note somente os resultados diretos no curto prazo: a redução de acidentes. Mas se esta é a única meta, e se vamos ignorar seus custos, então banir de uma vez o uso do automóvel seria ainda mais eficiente para acabar com os acidentes.

Quando colocamos a situação desta forma, a maioria compreende que tal medida seria absurda, pois seu custo seria muito elevado. Mas estamos apenas discutindo uma questão de grau. A tal “Lei Seca” também impõe pesados custos, e estes devem ser levados em conta na hora de decidir a questão. O ponto principal é reconhecer que a segurança tem custos, e ela não deve, por si só, ser o único objetivo. Há outros valores em jogo, e devemos evitar o sensacionalismo daqueles que repetem que “salvar vidas não tem preço”. Tem sim, e ele pode ser bem elevado!

Os economistas aprendem logo cedo que os recursos são escassos, e que seu uso passa constantemente por uma concorrência entre diferentes alternativas. A segurança é mais um item que deve ser levado em conta, mas não o único. Ainda sobre automóveis, podemos pensar nos itens de segurança de um carro. Freios ABS, airbags, blindagem, tudo isso pode realmente oferecer mais segurança para o usuário. Mas nem por isso vamos assumir que são isentos de custo.

Quando o governo obriga os fabricantes a incluir esses itens nos modelos básicos, isso envolve preços maiores para os consumidores. Ignorar este efeito é fugir da realidade. Se todos os carros terão que oferecer airbags de fábrica, isso quer dizer que o custo será repassado para o preço final. Em outras palavras, o governo está decidindo pelo consumidor o que ele deve valorizar mais entre as alternativas concorrentes. Talvez o consumidor preferisse um sistema de som mais potente. Ou talvez ele achasse melhor economizar esta quantia e usá-la para outra finalidade qualquer.

Logo, sempre que o governo apela para a mensagem de maior segurança para impor medidas, deve-se ter em mente o que ele está fazendo de fato: escolhendo pelos consumidores. A premissa por trás desta mentalidade paternalista é que os próprios consumidores são incapazes de escolher por conta própria. Assume-se que o usuário não valoriza tanto sua própria segurança, e que ele assim deveria fazer. Trata-se de uma visão autoritária e depreciativa do indivíduo, tratado como mentecapto.

Viver é arriscado. É impossível, além de indesejável, eliminar todos os riscos. E, como os recursos são escassos e segurança tem custo, deve-se sempre encarar a busca por maior segurança como um “trade-off”, ou seja, algo é deixado de lado em troca dela. Quando observamos a coisa por este prisma realista, a questão que surge é a seguinte: quem deve escolher? Muitos pensam que cabe ao governo esta escolha. São os adeptos de uma crença autoritária e elitista, um tanto platônica até, de que os governantes são mais esclarecidos e devem impor suas preferências aos demais.

Outros aceitam que as escolhas devem ser do próprio indivíduo, que por sua vez deve assumir a responsabilidade por elas. Se viver é arriscado e se mais segurança significa menos de algum outro bem, então é o próprio indivíduo quem deve pesar os prós e contras e decidir, quando apenas a sua segurança está em jogo. É a postura dos liberais que, como Thomas Sowell, reconhecem que não há nada mais perigoso do que deixar algumas pessoas tomarem as decisões pelas quais outros terão que pagar pelos custos.

Como sabia Hayek, outro grande liberal, a liberdade concedida somente quando se sabe a priori que seus efeitos serão benéficos não é liberdade. Ser livre, afinal, significa ser livre para cometer grandes erros ou correr riscos mortais. Segurança custa caro, e quando imposta sacrifica o que há de mais valioso para o indivíduo: sua liberdade. Agradeço a preocupação dos demais, mas podem deixar que da minha segurança eu mesmo cuido!

12 comentários:

Adriel disse...

Pouca gente compra carro com airbag no brasil pq o próprio carro ja é algo extremamente caro... com o airbag então...

Fora o custo de manutenção e seguro do carro com airbag que também aumenta.

Se o governo acabasse com este protecionismo das montadoras e impostos estratosféricos para o consumo... as pessoas iriam naturalmente comprar carros seguros, sem o governo ter que obrigar.

Anônimo disse...

A pior segurança, a que mais distancia as pessoas da necessidade de liberdade, é a que consiste em o Estado "paizão" dar emprego, seguro desemprego, almoço "grátis", bolsas isso e aquilo, aposentadoria, benefício assistencial,etc.

A maioria abre mão da liberdade em função dessa segurança oferecida pelo "paizão" Estado.

Felipe disse...

Concordo com o texto, o certo é que cada um decida se quer ou não esses itens de segurança nos seus veículos.

O máximo que eu acho que o governo deveria fazer seria criar uma classificação para cada veículo, com base em seu nível de segurança atestado por uma organização internacional séria, tipo Latin NCAP, Euro NCAP ou outra similar.

Algo como uma etiqueta que trouxesse um número de estrelas correspondente ao nível de segurança do veículo. De 0 a 5 estrelas, por exemplo.

Daí, por exemplo, se algum cara quiser comprar um carro com 1 estrela, é problema dele. Ele foi avisado dos riscos e, se decidiu corrê-los, assim o fez conscientemente.

Não cabe ao governo dizer ao cara do exemplo acima que ele não pode comprar um carro de 1 estrela. Mas... querer que governos sejam racionais é utopia...

Por falar nesse assunto, mais uma do governo:

http://autoentusiastas.blogspot.com/2011/12/requiem-aeternum.html

Anônimo disse...

o perigo do nazismo para a imprensa brasileira. vale dar uma olhada
um abraço

http://www.youtube.com/watch?v=JFQVkiKskm4&feature=related

Anônimo disse...

Você comentou que é um perigo deixar algumas pessoas impor suas preferências aos outros. Mas acho que a situação é pior ainda. Um burocrata pode ter determinada preferência mas acha que tem o direito de impor outro comportamento aos outros. Aconteceu há algum tempo atrás que o burocrata que era responsável pela fiscalização da lei seca sofreu um acidente de carro em que estava embriagado e em alta velocidade. Vá se dormir com um barulho desses.

Rodrigo disse...

Rodrigo, concordo com o exposto. Acho também que a segurança tem um custo e este custo tem que ser contabilizado.
Mas tenho uma dúvida a respeito do assunto:
Digamos que o governo se desse conta de que dando algum estímulo ao uso de equipamentos de segurança em veículos haveria uma forte redução em gastos com saúde. Na sua opinião, qual seria o melhor estímulo? Força de lei? Benefícios tributários? Campanhas educativas?

Um grande abraço!

Felipe disse...

Sobre aquele link de ontem...

http://autoentusiastas.blogspot.com/2011/12/requiem-aeternum.html

Li um comentário com uma idéia bem interessante.

"... é simples acabar com essa indústria das multas, basta fazer com que as punições sejam apenas em pontos nas carteiras, sem que haja dinheiro envolvido.

Como se acaba com as moscas que sobrevoam um doce?

Espantando as moscas? Não. Elas voltarão logo em seguida.

Matando as moscas? Também não. Novas moscas surgirão em pouco tempo.

O correto é retirar o doce do lugar. Isso sim acaba definitivamente com o problema das moscas.

Punições com pontos nas carteiras, como é feito atualmente, já cumprem o papel "educativo" que o governo tanto gosta de usar como argumento.

Assim, sem dinheiro para ser roubado, a legislação de trânsito passaria em pouco tempo a ser uma coisa justa e honesta, voltada de fato para o bem da população, e não uma mina de ouro para a quadrilha do governo, como é hoje em dia."

blog do preto disse...

Rodrigo,
penso nas pessoas colocadas em risco pela atitude de pessoas alcoolizadas ao volante.
O uso do álcool e outras drogas que atuam no sistema nervoso central, deprimindo-o e/ou excitando-o, deve ser evitado por quem manipula máquinas em geral, veículos inclusive.
Vivemos tempos "primitivos" ainda, em que as pessoas buscam o "prazer, alegria, alívio de tensões..." através de substâncias que apenas momentaneamente criam uma falsa sensação de bem estar.
Chegará um tempo em que se estudará a nossa época, e os estudiosos comentarão da nossa ignorância "medieval"
Desejo-lhe um feliz ano novo.
Admiro muito seu trabalho. Obrigado.
José Oliveira

Anônimo disse...

Ótimo, desde q eu nao tenha de pagar pela saude de quem quer exercer sua liberdade de viver sem segurança!

Anônimo disse...

"Ótimo, desde q eu nao tenha de pagar pela saude de quem quer exercer sua liberdade de viver sem segurança!"

É sempre a mesma porcaria: desonerar a saúde...

Que tal alterar para: "Ótimo, desde q eu nao tenha de pagar pela saude de quem quer exercer sua liberdade de fumar!"

Ou para: "Ótimo, desde q eu nao tenha de pagar pela saude de quem quer exercer sua liberdade de viver sem exercícios físicos regulares!"

Por que diabos não acabam com a saúde pública duma vez então? Daí ninguém teria que pagar pela saúde de ninguém! Resolvido.

Cada vez mais me convenço de que esta é a melhor solução.

Paulo H. O.

Luiz Bonow disse...

Constantino,
o PT fez de fato isso de banir os carros durante a sua gestão no RS: a Estrada do Mar, projetada para levar veranistas de Porto Alegre ao litoral a 120Km/h, teve a sua velocidade baixada para 80: é um inferno dirigir em uma estrada perfeita, fora de temporada, a uma velocidade tão baixa. Realmente, isto é tirar o sofá da sala!
Saudações.

Anônimo disse...

Quando asegurança entra a liberdade sai pela pora do fundo