Janer Cristaldo
Quem acredita em tudo que lê, melhor não tivesse aprendido a ler, diz um provérbio oriental. Vou mais longe. Quem se nutre de best-sellers, nem devia ter aprendido a ler. Ainda há pouco, eu afirmava que fora da leitura não há salvação. Em meus dias de universidade, uma aluna me perguntava. Professor, é verdade que a leitura pode transformar a gente? Ora, é uma das poucas coisas que realmente transformam, eu diria. Pessoas, viagens, encontros, doenças, adversidades sempre mexem com nossas vidas. Mas a leitura continua sendo o método mais eficaz de mutação.
Mas há leituras e leituras. Uma coisa é ler Harry Potter e outra é ler Crime e Castigo. Conheço inclusive leitores contumazes – e os conheço de perto - que lêem talvez até mais do que eu leio, mas não fazem distinção alguma entre Rowling e Dostoievski. Crime e Castigo? Ah, sim a história daquele estudante que matou uma velhota? E estamos conversados. Como se fosse entrecho da novela das oito. As reflexões do russo sobre a vida e a morte, sobre o homem, Deus e a sociedade, escorrem como água entre os dedos. Ou seja, ler nem sempre é sinônimo de aquisição de cultura.
A revista Veja desta semana dá capa ao último best-seller tupiniquim, o padre Marcelo Rossi, com o título “O milagre da leitura”, enfocando Ágape, livro que já vendeu 7,5 milhões de exemplares. Em editorial, a revista saúda “os resultados auspiciosos do censo encomendado ao Upea pela Câmara Brasileira do Livro. Os dados mostram que, de 2009 para 2010, o número de exemplares impressos no Brasil bateu em quase 500 milhões, com um crescimento de 23%.”
Desse montante, 230 milhões pertencem ao que chamo de indústria textil – assim mesmo, sem acento, a indústria do texto. 144 milhões são comprados pelo governo e distribuídos gratuitamente às escolas, o que explica em boa parte a perenidade de autores que há muito estão mortos e bem mortos. E explica também a ojeriza dos jovens à leitura.
Muito bem. Mas que está lendo o brasileiro? Para começar, o tal de Ágape, do padre Marcelo Rossi. Ladeado por Zíbia Gasparetto, escritora espírita cujos livros são ditados por entidades de luz e já venderam 16 milhões de exemplares. Mais Jô Soares, que mistura o imperador D. Pedro II com Sarah Bernhardt e Sherlock Holmes, mais um violino Stradivarius. Mais outros ilustres nomes das letras pátrias, dos quais jamais ouvi falar: Thalita Rodrigues, crônica do cotidiano dos jovens; Ana Beatriz da Silva, série sobre as angústias da mente; Roberto Shinyashiki, o guru corporativo que fala sobre felicidade. Jô à parte, tudo auto-ajuda, esse gênero abominável da literatura, que vende falsas esperanças para os pobres de espírito.
Isso que Paulo Coelho não foi arrolado na reportagem, por não ter publicado título novo desde 2010. E sem falar em Gabriel Chalita, autor polímata que em seus 43 anos escreveu mais de 60 livros. Dos quais ninguém lembra título algum.
O Brasil está cheio de escritores que vendem milhões de livros e dos quais jamais ouvimos falar. Alguém conhece algum título – ou pelo menos ouviu falar – do padre Lauro Trevisan, de Santa Maria? Pois o homem – leio na Wikipédia – é autor de mais de 40 livros, todos eles best-sellers a nível internacional, com mais de dois milhões de exemplares vendidos. Em Portugal, as suas obras Apresse o Passo Que o Mundo Está a Mudar (2001), Como Usar o Seu Poder para Qualquer Coisa (2002),Conhece-te e Conhecerás o Teu Poder (2002), Regressão de Idade para a Libertação Total (2001) e Relax com Programação Positiva (2001) estão publicadas pela Editora Pergaminho. Os gaúchos têm uma celebridade em seus pagos e a desconhecem. Estes livros, você não os vê nem em livrarias. Exceto, é claro, na livraria que o padre administra em Santa Maria. São vendidos a partir de conferências e cursos de auto-ajuda.
Quem me acompanha, sabe de minha ojeriza aos best-sellers. Se um livro vendeu de repente um milhão de exemplares, este é um de meus critérios para não comprá-lo. Não existe tanta gente inteligente no mundo. Não existe um único best-seller em minha biblioteca. Aliás, quando saio atrás de um título, tenho de trotar entre uma livraria e outra, pois trata-se de livro geralmente pouco divulgado.
Os brasileiros estão lendo mais, diz Veja. Ora, de que adianta ler mais, quando o que se lê é isso? “O intelecto só precisa de uma faísca, mesmo que fraca, para acender o fogo da curiosidade e abrir uma clareira acolhedora que dará início ao interminável processo de enriquecimento do mundo interior. Qualquer livro pode ser essa faísca”. A frase soa a texto de auto-ajuda. Pelo jeito, o redator se deixou contaminar ao lidar com tanto lixo.
Paulo Coelho ou padre Marcelo, Zíbia ou Trevisan, Thalita ou Chalita não produzem faísca alguma, não acendem fogo algum nem abrem clareira alguma. Quem lê essa gente jamais vai chegar a Poe ou Pessoa, a Dostoievski ou Orwell, a Cervantes ou Nietzsche.
Não vejo vantagem alguma neste maior número de brasileiros que lêem, quando o que se lê é lixo.
17 comentários:
certíssimo, alias tudo que é considerado como extremamente popular como no caso "literatura em massa" deve-se tomar muito cuidado, caso estiver lendo um destes com toda certeza no radio ao lado estará tocando uma praga como "ai se eu te pego de Marcelo tello".
Tudo é relativo. Assim como o Teló é muito melhor que o funk carioca, é preferivel que a população leia esses livros de auto-ajuda (que são até benéficos, pois fazem os leitores terem uma saudável ambição) do que ler o lixo marxista que é produzido por essas bandas.
Este, sem dúvida, é o pior artigo já publicado neste blog.
Um dos motivos do povo brasileiro não gostar de ler é justamente o fato de intelectuais metidos, assim como esse autor, acharem que os jovens não possuem cultura alguma, e então simplesmente para “compensar” esta “constatação” empurram goela abaixo livros complexos e entediantes produzidos há mais de cem anos atrás para a esmagadora maioria da população. O resultado disso é que o brasileiro cria uma aversão natural ao hábito da leitura, e simplesmente passa a considera-la monótona. Tal atitude, Senhor Constantino, não difere muito da empregada pelos "Burocratas Clarividentes" que o sr. vive criticando por aqui.
É simplesmente ridícula a posição do autor ao criticar tão fortemente livros best-sellers, afinal excelentes livros e autores entraram para esta seleta lista, inclusive liberais, como: Ayn Rand, Friedrich Hayek e Milton Friedman.
Parodiando Rand, quem é Janer Cristaldo?
Grande Janer! realmente e infelizmente aqui no Brasil a leitura e o hábito de estudar são muito pouco estimulados. Tendo em vista que foi eleito e re-eleito um presidente analfabeto funcional.
Esse Jander Cristaldo é um que levou um pé na bunda do Olavo de Carvalho depois de ter escrito umas besteiras anti semitas no site dele
E outra coisa,Ana Beatriz da Silva é psiquiatra e escreve sobre psiquiatria, chamar ela de escritora de auto ajuda é coisa de analfabeto funcional.
Nao conheço esse desconhecido, mas deve ter fracassado na venda de livros ou alguma outra bobagem q produziu e a mamãe disse prá ele q livro bom vende pouco. Ainda q todos os exemplos por ele dados sejam ruins, é bom sinal q alguma coisa se lê nesse país semi -analfabeto. Ou o jander acha que está em Cambridge?? Talvez ache sim, com a Margareth no comando e todos lendo Sheakspeare...
Uma coincidência : li Crime e Castigo em janeiro e posso dizer que o livro é fantástico. A estória é simples mas é muito bem escrita. Eu recomendo. E sobre Harry Potter, a função é ambientar o adolescente com a leitura. Nisso eu vejo esse livro numa ótica positiva.
Péssimo artigo, um sujeito que diz que não tem nenhum best seller na biblioteca é apenas um pedante preconceituoso. Então pra este mané o Umberto Eco deve se comparar aos autores de auto ajuda que ele citou.
A Veja é uma boa revista, mas visa lucro, agora às vezes ela extrapola em capas "para vender revista".
Ler é melhor que não ler, discordo do autor. Concordo com ele, porém, quando reforça a distinção entre livros e livros.Ler Pessoa não é o mesmo que ler Chalita.
Texto perfeito. Não adianta nada ler por ler, é preciso ler algo que preste, algo que faça pensar, que esclareça.
Qual é a diferença entre uma criança começar a ler com livros básicos e um adulto, que nunca leu na vida, começar a ler com "Chick lits" tipo crepúsculo?
não vejo diferença, a não ser no tempo perdido pelo adulto, que, ao descobrir-se assim, lamentará amargamente o que perdeu.
Tenho esperança que o gosto pela leitura de ambos seja criado e que em pouco tempo, seja melhorado.
As palavras desse cara me lembram um personagem, não lembro o nome, da obra prima de Ayn Rand, A Revolta de Atlas, parece um daqueles intelectuais babacas que acham tudo o que é comercial ou capitalista é uma droga. Pois bem tirando as compras do governo, os outros compram porque querem, e meus parabéns para quem vende, sucesso no mercado editorial brasileiro é pra quem é bom, bom comerciante, o que pra mim é elogio maior do que ser apenas bom.
PS. A Revolta de Atlas é um best seller.
Ao meu ver, muito equivocado esse artigo.
O consumidor é soberano e ele que decide o que é bom para si e mais ninguém.
Leitura também tem o propósito de entreter, divertir, não apenas obter alta cultura. Mesmo auto-ajuda é importante, pois há pessoas que têm dificuldade para compreender o óbvio e, portanto, cumprem uma função.
O leitor é soberano para escolher o livro mais útil para ele naquele momento.
Adriano
"Ademar Couto" -
Ainda bem que meus pais me ensinaram a ler quando criança e todos sabem que há uma grande eficiência no ensino medio. Deve-se leia-se bons livros desde criança, bons clássicos infantis (Machado de Assis, Ziraldo, Saint-Exupéry, nunca me esqueço do espetáculo que era ler "As Artimanhas do Vaga-lume" ou o Pequeno principe, com toda a certeza se uma criança começar a ler o que presta logo em no futuro em sua adolescência não estará lendo "crepusculo". Isto é fato, isto é cultura.
Os comentários desse articulista se assemelham ao horror vivenciado pela antiga elite quando viu suas exclusivíssimas viagens de avião, na época em que iso era reservado a uma classe de privilegiados, ser desbotada pela multidão ensolarada de turistas. Talvez pelo trauma de ter lido na tenra idade "livros-cabeça" como "Crime e Castigo" ou "Guerra e Paz", hoje se acha no direito de atacar intelectualmente sem nenhuma modéstia que caberia a um "intelectual" desse quilate. A humildade deveria ser a primeira qualidade dos cultos, o que apenas prova que a soberba só ataca os fracos. Enquanto gerações de brasileiros no século XX tinham acesso restritíssimo a livros, hoje uma nova multidão de jovens começa a ler muito cedo, desenvolvendo com o tempo e com a paciência o espírito crítico de separar o joio do trigo. Detesto Paulo Coelho, Padre Marcelo Rossi ou Sidney Sheldon, mas o direito de que milhões o leiam e aprendam a gostar dessa arte através das suas produções só poderia ser questionado por alguém que leu sem nunca ter entendido o que lia.
Concordo com boa parte daquilo que o Rodrigo falou. Só faço uma ressalva em relação aos livros como Harry Potter que servem como introdutório para os adolescentes no mundo da leitura. Nos meus 12 e 13 anos lia a literatura infanto-juvenil da época e fui assim pegando gosto, aumentando a complexidade gradualmente e de forma natural.
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