Rodrigo
Constantino
O
professor da USP Vladimir Safatle, em sua coluna
da Folha, tentou expor uma suposta contradição ou hipocrisia dos liberais.
Ele aceitou uma importante premissa do pensamento liberal sobre o paternalismo
estatal, mas alegou que os próprios liberais ignoram tal premissa quando lhes
interessa. Diz o professor:
Os liberais gostam de criticar o Estado-providência por
ver nele o paradigma de um funcionamento institucional da vida social que
acomodaria os sujeitos a benefícios sem responsabilidades, desprovendo-os de
capacidade de empreendedorismo e deixando-os sem coragem para assumir riscos.
Tal como se fosse uma mãe superprotetora, tal Estado produziria apenas filhos
letárgicos e sempre chorando por amparo.
É fato que há algo de verdadeiro nessa crítica ao caráter
de "mãe má" próprio ao Estado-providência. Seu único problema é que
ela erra de alvo quando procura identificar quem são, afinal, os filhos em
questão.
Até
aqui, Safatle vai bem: concordamos que esmolas criam dependência e preguiça,
que privilégios geram acomodação e retiram responsabilidades, e que as pessoas
correm menos riscos quando podem contar com a mãozinha do papai estado (ou
mamãe, quando temos uma “presidenta”). Onde está o equívoco de Safatle então?
Ele
passa a ignorar todos esses efeitos nefastos no caso do paternalismo para os
mais pobres, e tenta expor que o verdadeiro problema é o paternalismo para
empresários. E pior! Afirma que isso é uma postura liberal. Vejamos:
Durante os últimos anos, o governo investiu mais de R$ 1
bilhão na reforma do estádio do Maracanã. Obra feita a toque de caixa devido ao
calendário da Copa do Mundo. Dias atrás, ficamos sabendo que um consórcio
composto pela Odebrecht e pelo onipresente empresário Eike Batista ganhou o
direito de administrar o estádio por (vejam só vocês) R$ 180 milhões pagáveis
em 30 anos. Ou seja, só em reformas o Estado, principalmente via BNDES, gastou
mais de R$ 1 bilhão para entregar a seus filhos, por menos de 20% do valor
investido, um complexo esportivo com o qual nem mesmo o mais néscio dos
administradores seria capaz de perder dinheiro.
Calma
lá, professor! Quem foi que lhe disse que essas medidas “desenvolvimentistas”,
adotadas pelo governo esquerdista do PT, são de cunho liberal? Nem aqui, nem na
China! Os liberais não defendem a “Bolsa Empresário” do BNDES, muito pelo
contrário: pedem o fim desses subsídios! Não cabe ao governo, tampouco, a
escolha dos “campeões nacionais”, como vem fazendo o governo intervencionista
de esquerda do PT.
Liberais,
até onde eu sei (chequei pela última vez agora mesmo), pregam o livre mercado,
não o dirigismo estatal e os privilégios de bancos públicos, que deveriam ser
privatizados ou abolidos. Por que Safatle ignora isso? É algo tão básico. Como
um professor pode desconhecer isso? Não leu Hayek, Mises, Milton Friedman,
Bastiat e tantos outros autores liberais? Safatle fecha seu artigo com essa
pérola:
Diante da generalização de ações dessa natureza, há de
perguntar se a crítica liberal clássica ao Estado-providência não é, no fundo,
uma cortina de fumaça que visa esconder quem são os verdadeiros protegidos. O
que demonstra como precisamos, na verdade, de uma crítica aos processos de
privatização branca do Estado brasileiro. Privatização feita à base de negócios
de mãe para filho.
O
professor, tentando acusar os liberais de contradição e hipocrisia, assim como
seletividade na crítica ao paternalismo, acaba se entregando: é ele quem é
contraditório, hipócrita e seletivo! Afinal, se entende que a privatização do
estado e os negócios de “mãe para filho” são coisas condenáveis, por que
condena apenas quando os beneficiados são empresários “amigos do rei”, e ainda
faz isso como se estivesse atacando o liberalismo? Desonestidade intelectual?
O
que precisamos é acabar com todos os
privilégios, mamatas, benesses. E isso só será possível quando adotarmos
efetivamente o liberalismo, não esse espantalho que Safatle cria para culpar os
liberais. Enquanto o governo concentrar esse poder todo, é natural que grandes
empresários invistam mais em lobby do que em produtividade. Somente o livre
mercado retira tal incentivo perverso. Assim como o fim do paternalismo retira
o incentivo perverso para os mais pobres.
Os
liberais, ao contrário de Safatle e de seu espantalho liberal, lutam pelo fim
dos privilégios do BNDES e das esmolas estatais que criam dependência nos mais
pobres. Somos pela isonomia, pela igualdade perante as leis, pelo livre
mercado. Não abraçamos princípios tão seletivos como faz o professor da USP.