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terça-feira, maio 21, 2013

O espantalho de Safatle


Rodrigo Constantino

O professor da USP Vladimir Safatle, em sua coluna da Folha, tentou expor uma suposta contradição ou hipocrisia dos liberais. Ele aceitou uma importante premissa do pensamento liberal sobre o paternalismo estatal, mas alegou que os próprios liberais ignoram tal premissa quando lhes interessa. Diz o professor:

Os liberais gostam de criticar o Estado-providência por ver nele o paradigma de um funcionamento institucional da vida social que acomodaria os sujeitos a benefícios sem responsabilidades, desprovendo-os de capacidade de empreendedorismo e deixando-os sem coragem para assumir riscos. Tal como se fosse uma mãe superprotetora, tal Estado produziria apenas filhos letárgicos e sempre chorando por amparo.

É fato que há algo de verdadeiro nessa crítica ao caráter de "mãe má" próprio ao Estado-providência. Seu único problema é que ela erra de alvo quando procura identificar quem são, afinal, os filhos em questão.

Até aqui, Safatle vai bem: concordamos que esmolas criam dependência e preguiça, que privilégios geram acomodação e retiram responsabilidades, e que as pessoas correm menos riscos quando podem contar com a mãozinha do papai estado (ou mamãe, quando temos uma “presidenta”). Onde está o equívoco de Safatle então?

Ele passa a ignorar todos esses efeitos nefastos no caso do paternalismo para os mais pobres, e tenta expor que o verdadeiro problema é o paternalismo para empresários. E pior! Afirma que isso é uma postura liberal. Vejamos:

Durante os últimos anos, o governo investiu mais de R$ 1 bilhão na reforma do estádio do Maracanã. Obra feita a toque de caixa devido ao calendário da Copa do Mundo. Dias atrás, ficamos sabendo que um consórcio composto pela Odebrecht e pelo onipresente empresário Eike Batista ganhou o direito de administrar o estádio por (vejam só vocês) R$ 180 milhões pagáveis em 30 anos. Ou seja, só em reformas o Estado, principalmente via BNDES, gastou mais de R$ 1 bilhão para entregar a seus filhos, por menos de 20% do valor investido, um complexo esportivo com o qual nem mesmo o mais néscio dos administradores seria capaz de perder dinheiro.

Calma lá, professor! Quem foi que lhe disse que essas medidas “desenvolvimentistas”, adotadas pelo governo esquerdista do PT, são de cunho liberal? Nem aqui, nem na China! Os liberais não defendem a “Bolsa Empresário” do BNDES, muito pelo contrário: pedem o fim desses subsídios! Não cabe ao governo, tampouco, a escolha dos “campeões nacionais”, como vem fazendo o governo intervencionista de esquerda do PT.

Liberais, até onde eu sei (chequei pela última vez agora mesmo), pregam o livre mercado, não o dirigismo estatal e os privilégios de bancos públicos, que deveriam ser privatizados ou abolidos. Por que Safatle ignora isso? É algo tão básico. Como um professor pode desconhecer isso? Não leu Hayek, Mises, Milton Friedman, Bastiat e tantos outros autores liberais? Safatle fecha seu artigo com essa pérola:

Diante da generalização de ações dessa natureza, há de perguntar se a crítica liberal clássica ao Estado-providência não é, no fundo, uma cortina de fumaça que visa esconder quem são os verdadeiros protegidos. O que demonstra como precisamos, na verdade, de uma crítica aos processos de privatização branca do Estado brasileiro. Privatização feita à base de negócios de mãe para filho.

O professor, tentando acusar os liberais de contradição e hipocrisia, assim como seletividade na crítica ao paternalismo, acaba se entregando: é ele quem é contraditório, hipócrita e seletivo! Afinal, se entende que a privatização do estado e os negócios de “mãe para filho” são coisas condenáveis, por que condena apenas quando os beneficiados são empresários “amigos do rei”, e ainda faz isso como se estivesse atacando o liberalismo? Desonestidade intelectual?

O que precisamos é acabar com todos os privilégios, mamatas, benesses. E isso só será possível quando adotarmos efetivamente o liberalismo, não esse espantalho que Safatle cria para culpar os liberais. Enquanto o governo concentrar esse poder todo, é natural que grandes empresários invistam mais em lobby do que em produtividade. Somente o livre mercado retira tal incentivo perverso. Assim como o fim do paternalismo retira o incentivo perverso para os mais pobres.

Os liberais, ao contrário de Safatle e de seu espantalho liberal, lutam pelo fim dos privilégios do BNDES e das esmolas estatais que criam dependência nos mais pobres. Somos pela isonomia, pela igualdade perante as leis, pelo livre mercado. Não abraçamos princípios tão seletivos como faz o professor da USP.

sábado, junho 23, 2012

Arcaicas, ideias de Safatle deveriam estar em um museu

João Pereira Coutinho, Folha de SP

Vladimir Safatle deveria estar num museu. Digo isso com todo o respeito.

Lendo "A Esquerda que Não Teme Dizer Seu Nome", lembrei de imediato a peça "O Percevejo", de Maiakóvski, história de um antigo bolchevique, Prissípkin, que, depois de um acidente, acorda para o mundo futuro vindo diretamente de um passado irreconhecível.

Safatle é uma espécie de Prissípkin intelectual: o século 20 pode ter sido o grande cemitério de cada uma das suas ideias coletivistas. Mas Safatle, como o anti-herói de Maiakóvski, esteve mergulhado numa tina de água gelada em hibernação ideológica. Não viu nada, não aprendeu nada. E não esqueceu nada.

Ser de esquerda é, para Safatle, estar com aqueles que mais sofrem. É o primeiro clichê. Mas depois vêm outros: a defesa radical do igualitarismo é um valor inegociável para os camaradas.

Infelizmente, ele não explica em que consiste esse igualitarismo, para além das piedades habituais sobre a importância de redistribuir riqueza. Nenhuma palavra sobre a necessidade de a criar.

Criar? Para Safatle, o mundo divide-se em ricos e pobres; os ricos roubam os pobres; a função do Estado é roubar os ricos. "The end".

Igualitarismo é parte da história. Mas a esquerda que não teme dizer seu nome também é, para Vladimir Safatle, "indiferente às diferenças". Não sei se isso significa que o autor, com apreciável coragem intelectual, se opõe às cotas raciais instituídas por universidades brasileiras.

Sei apenas que, para Safatle, cultivar as diferenças (e, por arrastamento, demonizar o outro) é vício judaico-cristão, praticado pela Europa branca e xenófoba.

Curiosamente, não passa pela cabeça do filósofo que esse "culto da diferença" é também prerrogativa de comunidades imigrantes, leia-se "muçulmanas", que habitam a Europa, mas repudiam os seus valores multiculturais e resistem a integrar-se.

SOBERANIA POPULAR

De resto, as melhores páginas deste curto ensaio estão na apaixonada defesa do conceito arcaico de "soberania popular".

Na minha inocência, eu julgava que esta herança rousseauniana, uma metáfora para a total rendição do indivíduo aos ditames da comunidade, tinha ficado enterrada com as "democracias populares" do século 20.

Ilusão minha: as utopias revolucionárias da última centúria foram apenas uma ideia que não deu certo, diz Vladimir Safatle.

E acrescenta: "quantas vezes uma ideia precisa fracassar para poder se realizar?".

Não é fácil ler a pergunta e imaginar os 100 milhões de seres humanos (estimativa conservadora) que o comunismo destruiu nas suas "experiências" de criação do "homem novo".

E volto a Maiakósvki, porque são dele as palavras que abrem o livro de Safatle: "Melhor morrer de vodca que de tédio". Admito que sim.

Mas alguém deveria informar Safatle de que não foi a vodca (nem o tédio) que matou o seu herói. Ironicamente, foi o clima de repressão e intolerância do regime soviético que o conduziu à aniquilação pessoal.