sexta-feira, setembro 14, 2007

O Trabalho na Dinamarca


Rodrigo Constantino

Em reportagem no jornal Valor de hoje (14/09/2007), com o título Dinamarca é exemplo de flexibilidade trabalhista, consta trechos muito interessantes de alguns sindicalistas dinamarqueses. O presidente da central sindical da Dinamarca, Hans Jensen, afirma: "O trabalho deve ser feito onde pode ser realizado de modo mais barato, respeitando-se as condições sociais". E o sindicalista prossegue: "Não nos opomos a que empregos migrem para outros países".

O desemprego vem caindo na Dinamarca após reformas claramente liberais. Conforme expresso na matéria, "o país flexibilizou normas trabalhistas, reduzindo garantias no emprego, para tornar o mercado de trabalho mais dinâmico, capaz de gerar empregos necessários". Hans Peter Slente, diretor de mercados da Dansk Industri (DI), a confederação das indústrias dinamarquesa, garante que "na Dinamarca, demitir é fácil e barato". O país não tem leis que regulam a jornada de trabalho, os salários nem as demissões. Tudo é definido na negociação coletiva. Foi aprovada ainda uma reforma que elevou a idade mínima de aposentadoria para 65 anos. Os sindicatos apoiaram as reformas. A última greve geral ocorreu em 1998, há quase 10 anos. Segundo Slente, os dinamarqueses são mais positivos que os demais países europeus em relação à globalização. "A globalização pode ser positiva em todo o mundo", afirma Jensen, da central sindical.

Não deixa de ser triste ler essas coisas e lembrar que muitos esquerdistas brasileiros usam o modelo escandinavo como exemplo de sucesso do socialismo. Como fica claro para qualquer um que realmente estuda os casos econômicos desses países, eles são ricos a despeito do tamanho do governo, não por causa dele. Há uma liberdade econômica na Escandinávia que faria qualquer esquerdista brasileiro bradar contra o "neoliberalismo", caso tivessem conhecimento de fato da realidade local. A esquerda brasileira consegue tachar até o PSDB de "ultra-liberal", e alguns já "acusam" o PT do mesmo "pecado". No entanto, todas as reformas necessárias para aproximar o modelo brasileiro do escandinavo são claramente liberais. Perto do Brasil, a Dinamarca é "ultra-liberal".

Marcelo, um oficial do reino da Dinamarca na mais famosa peça de Shakespeare, afirma que "há algo de podre no Estado da Dinamarca". De fato, o país poderia estar numa situação muito melhor com menos impostos, por exemplo. Mas se a Dinamarca tem algo podre, o Brasil já está em estado de putrefação!

9 comentários:

Anônimo disse...

"Mas se a Dinamarca tem algo podre, o Brasil já está em estado de putrefação! "


quiá, quiá, quiá, magnífico!!!


não é a toa que tem tanta informalidade no Brasil. Com umas leis idiotas q se inventam, se vc quiser abrir um negócio tem q ir enrolando e tocando no informal mesmo

acho q o grande problema do país não é só o ranço esquerdista, mas a burocracia, que a minha mãe leigamente pronuncia "burrocracia"

Atenção: ela fala errado, ela pensa que se a palavra é essa mesmo, mas no fundo ela está absolutamente certa

Anônimo disse...

corrigindo a frase anterior:

Atenção: ela fala errado, ela pensa que a pronúncia da palavra é essa mesmo, mas no fundo ela está absolutamente certa

Anônimo disse...

"Foi aprovada ainda uma reforma que elevou a idade mínima de aposentadoria para 65 anos"

Como funciona a previdência lá?

Anônimo disse...

Isso é o que na Europa se chama de Flexisegurança. Se por um lado existe a flexibilização trabalhista, por outro o indivíduo conta com um sistema de apoio generoso (Segurança Social) baseado em subsídio de desemprego (o que chamamos de seguro desemprego) elevado e permanente até novo emprego e sólidas infraestruturas sociais.

O sistema dinamarquês de flexisegurança combina o dinamismo de uma economia de mercado liberal com uma segurança que passa pelo serviço público universal e com uma distribuição equitativa de rendimentos, típica dos Estados-Providência escandinavos.

Jeová disse...

Rodrigo, sabe dizer mais países onde não existe salário mínimo ?

Não acho legal esse negócio dos sindicatos negociarem os preços. Acho que sindicatos não deveriam existir, mas não devem ser proibidos.

Também não concordo com coisas como seguro desemprego. Acho que cada um deve fazer o seu seguro privado, se quiser. Vale ressaltar que o Brasil e a Dinamarca são países culturalmente bem diferentes.

A rede de proteção social faz os brasileiros passarem o dia dormindo e comendo, só na folga. Na Dinamarca, a mesma rede não teria o mesmo efeito. Há nos países escandinavos uma cultura de valorização do trabalho bastante forte.

Intervencionismo, em 99,999% dos casos, é ruim. Mas o Brasil extrapola, pois os brasileiros conseguem corromper o próprio intervencionismo.

Veja o cinema:

Na França, o governo financia o cinema. Mas, se o sujeito deu prejuízo no último filme, não recebe não.

No Brasil, o cara dá prejuízo e recebe uma verba ainda maior.

Anônimo disse...

Dinamarca, um exemplo de liberdade na legislação trabalhista?Como nos moldes das prescrições da Escola Austríaca?Friedrich Von Hayek sobre esse assunto já disse que “o poder sindical é essencialmente o poder de privar alguém de trabalhar aos salários que estaria disposto a aceitar”.Mas a questão é que a existência de desemprego involuntário não pode ser atribuída à existência de sindicatos.Trabalhadores involuntariamente desempregados - descontentes com os resultado das negociações coletivas- se desfiliariam dos sindicatos e fariam acordos individuais ao salário real de equilíbrio; se não o fazem, é por vontade própria, e portanto tal desemprego não seria involuntário, mas sim voluntário. Se houver desemprego involuntário, o mercado de trabalho ainda não estará em equilíbrio, já que ainda haveria descontentes com o resultado.Simples assim.

Mas o que mostra que ele realmente está enganado é o baixo desemprego nos países com negociação salarial mais centralizada.Eu li recentemente o livro de Jeffrey Sachs e Felipe Larrain chamado “Macroeconomia-Edição Atualizada e Revisada” que diz que há dados que mostram que desemprego é baixo nos países com negociações salariais muito centralizadas ou muito descentralizadas.Esse é justamente o caso de alguns escandinavos.Veja, por exemplo, o caso da Suécia.Lá o índice de sindicalização é altíssimo (95%), mas existe um sindicato “nacional” que negocia diretamente com o sindicato dos empregadores.E eles tendem internalizar os efeitos macroeconômicos de suas ações, sempre tentando manter o nível de salário real compatível com o pleno emprego. O desemprego da Suécia em 2006 foi de apenas 5,6% ( http://www.indexmundi.com/pt/suecia/taxa_de_desemprego.html ).

A centralização permite os salários, mas por outro lado à barganha coletiva existente no processo de negociação sindical altamente centralizado deixa o salário real maior que num nível que ocorreria em sua ausência. Ou seja, é mais difícil cortar salário nominal lá.Esse é exatamente o caso da Dinamarca, já que lá também existe um “sindicato nacional” pelo que li na Wikipédia.

Por outro lado, nos EUA (cujo sucesso no mercado de trabalho é alardeado), os contratos salariais são mais distribuídos no tempo (devido ao baixo nível de sindicalização e a descentralização das negociações salariais), também há uma certa dificuldade em se cortar os salários nominais. Além da existência do salário mínimo, contratos de trabalho duram três anos.Isso quer dizer que se depois de um período de bonança, os produtores americanos esperarem produzir corte significativo nos salários nominais a fim de não ter que demitir, eles simplesmente não conseguirão.A cada mês, aproximadamente 1/36 dos contratos serão revisados.

O salário nominal é uma função direta do parâmetro que capta a influência dos fatores institucionais que afetam positivamente o poder de barganha dos trabalhadores nas negociações salariais (como seguro-desemprego, FGTS, nível de sindicalização, etc.).Se eles não existissem, os trabalhadores estariam dispostos a aceitar salários nominais ainda mais baixos para não ficar desempregado.O simples fato de muitos países estarem livres de regulamentação sobre os salários não implica que não existam mecanismos institucionais que intervenham na formação dos salários nominais.

Como, então fica a defesa da flexibilização das leis trabalhistas?Se tal flexibilidade implicar em cortes de salários nominais em retrações cíclicas, então é perigosa.Corte nos salários nominais pode redistribuir renda dos trabalhadores para os capitalistas; como estes, tem uma propensão menor a consumir, o consumo cai, reduzindo, e não aumentando, a demanda, renda real e emprego.A flexibilidade de salários como fator de estabilização do nível de emprego é explicado na economia neoclássica através do “efeito Keynes” e “efeito Pigou” numa análise econométrica sofisticada -os detalhes eu vou poupar ao leitor aqui.O que importa é saber que num contexto onde há tendência para se “negociar para baixo” (uma estagnação ou aumento da competição, por exemplo) nada garante, a priori, que os efeitos desestabilizadores superem os efeitos estabilizadores.Se o salário nominal preservado e corte no salário médio for apenas no nível real (por exemplo, a inflação aumenta dois pontos percentuais de um ano a outro, enquanto o salário nominal médio tem aumento de 0%), então o efeito na demanda agregada seria relativamente insignificante.Sim, neste sentido, flexibilização de salários pode ajudar na estabilização da economia.Uma redução no crescimento dos salários nominais não é desestabilizador assim como o corte no salário real mantido o nível de salário nominal, daí o fato de muitas flexibilizações trabalhistas terem sido bem sucedidas.

Vamos a outro exemplo.Hong Kong.Dizem que tal país asiático tem uma legislação trabalhista muito liberal* (ausência de salário mínimo, inclusive) e uma estagnação econômica levou o desemprego a estratosféricos 8,7% da força-de-trabalho em julho de 2003 (http://www.ccil-c.com/ea060.asp ), depois de um período de recuperação econômica “soft” que o país experimentou depois da crise asiática da década de 90.Sete meses depois, uma rápida recuperação econômica levou o desemprego a 7,2% (a um patamar 0,4 percentuais menor do que agosto de 2002: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/020926_chinahongkongcrise.shtml ) , ainda muito acima da taxa natural de desemprego de lá.Que seria no máximo uns 4% da força-de-trabalho, como no patamar atual http://noticias.uol.com.br/economia/ultnot/2007/06/30/ult1767u96651.jhtm ).Eu suspeito que isso tem algo haver com a idéia que apontei aqui.

Na Suécia, a taxa de desemprego de 5,6% não chega a ser tão alta.Porque o desemprego voluntário é maior nos países com extensos períodos de cobertura de seguro-desemprego.Não tenho dados da Suécia, mas a Dinamarca oferece quatro anos de cobertura de seguro- desemprego (http://diplo.uol.com.br/2005-07,a1131), além de ter um alto índice de sindicalização.Conseqüência: mais contribuição para a rigidez salarial nominal.Mas a vantagem maior deste tipo de legislação de seguro-desemprego não está no salário, mas sim na liberdade individual que ela garante.O seguro-desemprego permite aos que trabalham recusarem ofertas de trabalhos ruins, de modo a procurarem empregos que melhor se adequem as suas necessidades.Outra coisa, não existe privação maior da liberdade individual que a incapacidade dos que não conseguem auferir renda fora do mercado de trabalho não conseguir auferir renda. É isso que o desemprego involuntário faz.Se há um período de desemprego involuntário que superior a cobertura oferecida aos desempregados, como o que ocorreu em Hong Kong no início dos anos 2000...E se existisse uma legislação de seguro-desemprego com cobertura mais extensa, será que teria sido pior para os habitantes que trabalham nesta região administrativa da China?

*P.S.: Refiro-me ao que Rodrigo Constantino já disse:
“Não existe salário mínimo para os trabalhadores locais [de Hong Kong], e o mercado costuma ser livre para acordos entre patrões e empregados.”
http://geografiaconservadora.blogspot.com/2005/11/hong-kong.html

Mas ainda pintou algumas dúvidas.Ótimo, essa “livre negociação” incluiu a possibilidade de revisar os contratos de trabalho (mais especificamente, o nível de salários) a qualquer momento?O nível de sindicalização é baixo e/ ou a negociação salarial é excessivamente descentralizada?Se a resposta for sim a essas duas perguntas, acho que descobri o que pode explicar o surto de desemprego involuntário em Hong Kong há alguns tempos atrás.Esse motivo que pensei se soma ao que li na reportagem da BBC que postei.Muitos recusaram até benefícios-desemprego por causa da cultura local achar que pedir ajuda ao governo é um sinal de preguiça e de incapacidade.

Anônimo disse...

Bem, pelo que vi tem gente aqui que não gosta dos sindicatos (como o augusto), mas será que a dessindicalização é tão boa como alguns dizem?Veja, por exemplo, o caso do Reino Unido durante a década de 80, sob comando da “pró-crescimento” Margareth Thatcher:
Dados macroeconômicos dos 25% trabalhadores menos qualificados do Reino Unido (em termos de escolaridade) apresentaram a seguinte evolução do final da década de 70 até o início a década de 90:

Crescimento do salário real:- 14%
Taxa de desemprego: passou de 3,1% para 5,3%

BLANCHARD, O. (2001). “Macroeconomia, 2ª edição”.Editora Campus.p.479
Bem, outra questão interessante é a inexistência de salário mínimo na Dinamarca.Alguns economistas (como o americano Walter Block, da Universidade da Columbia: http://clipping.planejamento.gov.br/Noticias.asp?NOTCod=235054) alegam que o salário mínimo geraria distorções no mercado de trabalho e que ele elevaria artificialmente o valor da mão-de-obra, reduzindo o nível de emprego dos mais fracos, como jovens e trabalhadores menos qualificados.Mas as evidências empíricas são equívocas, como mostram dois estudos independentes aplicados à economia americana (Sachs e Larrain, 2000. Macroeconomia-Edição Atualizada e Revisada. Editora Pearson, p.533).Entre 1981 e 1989, o salário mínimo caiu ano após ano nos EUA sem que houvesse efeito sobre o desemprego de adolescentes (grupo onde o salário mínimo elevado forçaria, em tese, a remuneração ficar à acima do nível de equilíbrio que iguala oferta e demanda por emprego).Outro estudo sugere que um aumento no salário mínimo teve impacto negativo no desemprego para adolescentes e pouco ou nenhum impacto para outros grupos da força de trabalho.Se a Dinamarca aboliu tal salário mínimo recentemente, eu seria muito cético com relação à contribuição dessa medida para a redução do desemprego.

Renato Laguna disse...

Esses números assustadores estão desafiando minha ideologia!

Google ao rrresgate!
"50 Years of Research on The Minimum Wage"
http://www.house.gov/jec/cost-gov/regs/minimum/50years.htm

Ufa, me sinto bem melhor agora.

Mas obrigado "Huxley", por nos lembrar que pelo menos alguns economistas questionam a posição tradicional de que o salário mínimo só dá problema.
Senão alguém poderia pensar que o consenso contra o salário mínimo é absoluto. Até a teoria da relatividade tem seus dissidentes, e é assim que deve ser.

Jeová disse...

Estatísticas são estatísticas...

Com o fim do salário mínimo em determinado Estado, tende a haver uma maior oferta de emprego em regiões mais pobres, de mão-de-obra mais barata. Uma empresa que pagava X em uma região rica, agora pagará X/2 em uma região mais pobre. Essa empresa, portanto, fará produtos a um menor custo, sendo possível cobrar um menor preço, tornando tais produtos bem mais acessíveis.

Na hora de avaliar a subida real do salário do trabalhador, as inovações tecnológicas e a maior capacidade de compra acabam não sendo devidamente contempladas.