terça-feira, abril 05, 2011

Modelo equivocado

Rodrigo Constantino, O GLOBO

A economia brasileira não está no rumo certo para um crescimento sustentável. A inflação acelerou, os gargalos de infraestrutura e mão de obra impedem um avanço mais sólido e o país corre o risco de viver um novo voo de galinha. As principais causas desta situação estão ligadas ao excessivo peso do governo na economia.
Falta poupança doméstica para investimentos produtivos, e falta maior descentralização na alocação dos recursos. Com reduzido nível de investimentos, e com o governo centralizando o crédito por meio de bancos estatais, há o risco de a economia sair dos trilhos num futuro próximo.
Uma nação só consegue crescer de forma sustentável investindo em bens de capital e educação. Para tanto, faz-se necessário aumentar a poupança, ou seja, deixar de consumir parte da produção atual. Com a fome insaciável do governo por recursos, resta pouco para o setor privado poupar. Como agravante, o governo usa em gastos correntes sua arrecadação de quase 40% do PIB, sobrando muito pouco para investimento.
Restam duas alternativas para suprir a falta de poupança doméstica: pegar poupança externa emprestada ou usar poupança forçada doméstica, por meio de uma política inflacionária. Ambas apresentam grandes riscos. A Era JK foi marcada pelo acelerado crescimento, apenas para descambar na inflação galopante em seguida. O “milagre econômico” do regime militar plantou as sementes da “década perdida” posterior.
Não existe almoço grátis. Um povo, assim como um indivíduo, pode até viver algum tempo dependendo de recursos alheios, mas somente se estes forem canalizados de forma eficiente para investimentos produtivos. A conta precisa ser paga depois, com juros. Tomar dinheiro emprestado para consumo corrente, ou então para investir em projetos ineficientes, é um caminho fadado ao fracasso.
Os excessos da Era PT ainda não cobraram a fatura graças ao cenário internacional. Com o forte crescimento chinês puxando o preço das commodities, e com taxas de juros praticamente nulas nos países ricos, os recursos migraram para países emergentes, como o Brasil. Mas até quando este quadro vai durar? Ficamos dependentes dos ventos externos, pois o governo não fez as reformas estruturais e não reduziu efetivamente seus gastos, para permitir maior investimento.
Para piorar a situação, o governo expandiu de forma assustadora o crédito público. O BNDES praticamente triplicou seus ativos em apenas três anos! Seus desembolsos subsidiados são destinados a poucas e grandes empresas, e o governo ainda acredita que esta expansão creditícia não é inflacionária. Esse modelo já foi testado no passado, em inúmeros países, e sempre fracassou. O governo não tem capacidade para alocar de forma eficiente os recursos, sem falar dos riscos de uso de critérios políticos na decisão.
Não satisfeito, o governo aumentou a ingerência sobre a iniciativa privada também. O caso assombroso da pressão estatal pela demissão do presidente da Vale comprova isso. O aporte de capital da Caixa Econômica no falido Banco Panamericano demonstra outro episódio preocupante do modelo atual de gestão. Os governantes parecem realmente acreditar que os recursos são infindáveis e que eles possuem capacidade clarividente para selecionar as empresas “vencedoras” na economia.
A história, contudo, mostra que esta visão é totalmente equivocada. Hayek chamou de “arrogância fatal” esta mania que alguns têm de acreditar no planejamento central. O “capitalismo de estado” nunca foi capaz de entregar bons resultados ao longo do tempo, sem falar dos riscos para as liberdades individuais sob este modelo. Infelizmente, os principais membros do governo parecem crer justamente nesta receita furada.
A ausência de uma oposição organizada que aponte estas falhas e apresente modelos alternativos é um fator muito preocupante. Parece que todos estão anestesiados com a bonança momentânea, tentando pegar carona nos números ainda favoráveis da economia. Falta uma liderança com visão de maior alcance. O modelo atual está se esgotando, e suas ineficiências logo virão à tona. A inflação já é um sinal disso. E, ainda que seja cedo para chamar de bolha, o rápido aumento do crédito cobrará seu preço.
O alerta, feito pelos economistas Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart, merece atenção: ‎"Como se demonstrou reiteradamente ao longo do tempo, os governos dos países emergentes tendem a considerar os surtos favoráveis como tendências duradouras, o que, por seu turno, atiça uma farra de gastos e de empréstimos públicos, que termina em lágrimas".

4 comentários:

Anônimo disse...

E agora!?

FMI: Consenso de Washington é passado

(AFP) – Há 15 horas

WASHINGTON — Depois da crise financeira de 2008, que devastou a economia mundial, o Estado deve exercer um papel maior e controlar os excessos do mercado, segundo o discurso do diretor-gerente do fundo, feito na Universidade George Washington, na capital americana.

"O Consenso de Washington tinha uma série de lemas básicos: regras simples para a política monetária e fiscal, que previam garantir a estabilidade, a desregulação e a privatização, liberalizando o crescimento e a prosperidade, e os mercados financeiros canalizariam os recursos para as áreas mais produtivas", explicou Strauss-Kahn.

"Tudo isso caiu com a crise. O 'Consenso de Washington' já é passado", completou.


Diante da imposição de países emergentes como novos motores do crescimento mundial, esse consenso deve ser superado, mediante uma nova política econômica com ênfase na coesão social e no multilateralismo, explicou.

O Consenso de Washington, propagado durante os anos 1980 e 1990 por FMI e Banco Mundial, foi apontado como responsável pela crise em países como Argentina ou em países em transição no Leste Europeu.

"Ao designar um novo marco macroeconômico para um novo mundo, o pêndulo oscilará - ao menos um pouco - do mercado para o Estado, e do relativamente simples para o relativamente mais complexo", completou Strauss-Kahn.

"Claramente, a política monetária deve ir além da estabilidade de preços, e velar pela estabilidade financeira", propôs Strauss-Kahn.

Isso não deve ser feito mediante a utilização da taxa de juros, mas com outros instrumentos, como liquidez, explicou.

É necessário um imposto sobre as atividades financeiras para forçar esse setor a assumir parte dos custos sociais de sua atividade inerentemente arriscada.

"Não me entendam mal: a globalização trouxe resultados positivos, e tirou centenas de milhões de pessoas da pobreza", explicou.

"Mas a crise e suas consequências alteraram fundamentalmente nossa percepção", advertiu.

"Precisamos de uma nova forma de globalização, uma globalização com um rosto mais humano", acrescentou.

Os países ricos e emergentes devem continuar com sua cooperação no G20 para assegurar que os interesses nacionais sejam superados, pediu Strauss-Kahn.

O chefe do fundo endossou também as previsões de crescimento econômico mundial para 2011, anunciadas pelo órgão em janeiro.

"Prevemos algo em torno de 4,5% este ano", afirmou.

http://www.google.com/hostednews/afp/article/ALeqM5j5mp3vI6ZnXwdrnzJhIDx...

rodrigo disse...

Vôo de galinha, ou fogo de palha...

Rodolfo Lotti disse...

Cheguei em casa hoje e minha mãe havia deixado na minha mesa de estudos sua reportagem Titulada "Modelo equivocado". Fiquei animado, porque sempre quis passar essa mensagem para todos aqui em casa que são admiradores do nosso atual governo PT. Faço economia no IBMEC, mas como ainda estou estudando é difícil passar o que sei adiante de forma a convencer as pessoas, com a sua reportagem curta e bem explicada acho que consigo iniciar bem uma argumentação. Parabéns pela reportagem.
Rodolfo Lotti.

Gilvan Badke disse...

Ótimo artigo. Claro e objetivo. A herança do lulismo será uma crise inflacionária e um déficit público sem precedentes.