Rodrigo Constantino, O GLOBO
Tudo que um governante mais deseja é uma desculpa para aumentar gastos. Quando ela vem embalada por uma teoria econômica, melhor ainda. Eis o que explica a popularidade do "desenvolvimentismo". Ninguém gosta de austeridade quando está no poder.
A economia brasileira ficou estagnada no terceiro trimestre, e deve crescer menos de 3% este ano (o ministro Guido Mantega previa 5,5%). Falta ao país uma dinâmica sustentável de crescimento. Mas, como o governo não faz reformas estruturais que permitiriam um vôo de águia, resta retomar os estímulos artificiais e produzir novo vôo de galinha.
Os "desenvolvimentistas" apontam apenas em uma direção. Nunca se lembram do termo "anticíclico" na era da bonança. É raro ver um deles pregando redução de gastos públicos ou aumento de juros durante os momentos de rápido crescimento e risco inflacionário. Nestas horas eles somem. Quando a economia ameaça esfriar, eles voltam demandando estímulos. O foco é sempre no curto prazo. Como disse o grande guru deles, "no longo prazo estaremos mortos". Esquecem que hoje é o longo prazo de alguns anos atrás.
O governo Dilma já anunciou novos pacotes de estímulos e mais aporte de capital nos bancos públicos. Onde foram parar aqueles "cortes" prometidos de R$50 bilhões nos gastos públicos? E a redução dos empréstimos do BNDES? A "Bolsa-Empresário", ao contrário, vai receber mais recursos! O problema é que cada novo estímulo produz mais inflação que crescimento. O resultado pode ser a conhecida estagflação.
O governo brasileiro parece mirar no modelo chinês, mas ignora diferenças cruciais. A China pratica a maior arbitragem de mão de obra da história, mergulhando tardiamente em sua revolução industrial, com um exército de chineses dispostos a trabalhar 18 horas diárias por salários pífios. O investimento passa de 40% do PIB, mais que o dobro do Brasil.
Mesmo assim, há claros sinais de esgotamento do modelo chinês. A inflação incomoda e houve péssima alocação de capital, pois as decisões são políticas, com desrespeito ao livre mercado. O governo realizou um gigantesco programa de estímulo após a crise de 2008, mas a conta chegou. Será inviável continuar crescendo 10% ao ano. A desaceleração chinesa vai gerar impactos negativos em nossa economia, dependente da exportação de recursos naturais.
O modelo mais parecido com o nosso pode ser, na verdade, o argentino, com acelerada inflação, controle estatal crescente e perda gradual de competitividade. O governo populista de Kirchner tenta quebrar o termômetro em vez de consertar os rumos da economia. O IBGE de lá, que calcula a inflação, foi politizado e perdeu totalmente sua credibilidade. Ainda não estamos nesse estágio. Mas quem garante que o governo, no desespero de salvar o crescimento imediato a qualquer custo, não vai seguir esta trilha? O risco claramente existe.
A conta das políticas "desenvolvimentistas" vai chegar cedo ou tarde, com juros. Enfrentar a dura realidade não será tarefa fácil. O crescimento sustentável depende de investimentos em capital físico e humano, além de um ambiente favorável aos negócios. Tudo aquilo que nos falta. O governo brasileiro expande o crédito público, reduz os juros na marra, sobe o salário mínimo por decreto, arrecada imposto demais, e gasta muito mal. Trata-se claramente de um modelo insustentável, com foco demasiado no curto prazo.
A economia brasileira ganhou na loteria chinesa e está gastando por conta, hipotecando seu futuro. Parece uma cigarra irresponsável, acreditando que o verão será eterno. Mas o inverno inexoravelmente chegará. O governo não tem como impedir este fato com mais estímulos. Isso pode apenas postergar um pouco o encontro com a realidade. Em contrapartida, aumentará o sofrimento futuro também. Não existe almoço grátis.
O "desenvolvimentismo" nunca conseguiu produzir prosperidade de forma sustentável. Ele ignora as verdadeiras causas da riqueza das nações. Ao focar somente no curto prazo, e ao depositar uma fé ingênua na capacidade do governo de atuar como locomotiva da economia, a cartilha "desenvolvimentista" estará sempre fadada ao fracasso. Não será diferente desta vez.
O Brasil pode estar na moda. Mas moda passa. Melhor aproveitar enquanto a festa continua, pois depois virá a ressaca e não vai adiantar culpar o "mercado" (vide a Europa). As sementes da próxima crise foram plantadas pelo próprio governo. Mas quem liga? O show precisa continuar. Afinal, vem eleição aí...
17 comentários:
Bom artigo, Rodrigo! A moda hoje é dizer que o Brasil já chegou lá. Sabemos que isso é mentira.
Simples, claro e direto.
Por que é tão difícil assim de eles entenderem?
Adoro seus artigos. Parabéns por este? Concordo completamente... E sobre a frase do Guru que diz que no ruturo estaremos todos mortos, como se vê, é verdade, pois do tempo dele, muitos já morreram... Mas e seus filhos e netos!? Num mundo onde se fala de sustentavilidade disro e daquilo, a tal inda verde e outras besteiras ganham brilho, mas na questão sustentabilidade econômica ninguém parece prestar atenção!
Rodrigo adorei seu blog vou ler sempre. O seu artigo é muito bom, parabéns. 1' li o seu artigo da grecia e n parei mais.
Uma das coisas mais importantes para garantir o crescimento sustentável do Brasil é acelerar a execução do PAC. Esse ano o PAC emPACou pra valer. O governo focou em restos a pagar e realizou muito pouco do PAC. Dos 40 bi do orçamento da união para o PAC, apenas 5 bi foram gastos. São investimentos importantissimos para o crescimento do Brasil. Com a promessa de cortar 50 bi, quem pagou a conta foi o PAC e o crescimento será menor que 3%. Agora que o governo quer acelerar a execução do PAC após o resultado do PIB do terceiro trimestre, agora que a vaca já foi pro brejo e 2011 é ano praticamente perdido em matéria de crescimento.
The following letter was sent to Greg Mankiw by the organizers of today’s Economics 10 walkout.
Wednesday November 2, 2011
Dear Professor Mankiw—
Today, we are walking out of your class, Economics 10, in order to express our discontent with the bias inherent in this introductory economics course. We are deeply concerned about the way that this bias affects students, the University, and our greater society.
As Harvard undergraduates, we enrolled in Economics 10 hoping to gain a broad and introductory foundation of economic theory that would assist us in our various intellectual pursuits and diverse disciplines, which range from Economics, to Government, to Environmental Sciences and Public Policy, and beyond. Instead, we found a course that espouses a specific—and limited—view of economics that we believe perpetuates problematic and inefficient systems of economic inequality in our society today.
A legitimate academic study of economics must include a critical discussion of both the benefits and flaws of different economic simplifying models. As your class does not include primary sources and rarely features articles from academic journals, we have very little access to alternative approaches to economics. There is no justification for presenting Adam Smith’s economic theories as more fundamental or basic than, for example, Keynesian theory.
Care in presenting an unbiased perspective on economics is particularly important for an introductory course of 700 students that nominally provides a sound foundation for further study in economics. Many Harvard students do not have the ability to opt out of Economics 10. This class is required for Economics and Environmental Science and Public Policy concentrators, while Social Studies concentrators must take an introductory economics course—and the only other eligible class, Professor Steven Margolin’s class Critical Perspectives on Economics, is only offered every other year (and not this year). Many other students simply desire an analytic understanding of economics as part of a quality liberal arts education. Furthermore, Economics 10 makes it difficult for subsequent economics courses to teach effectively as it offers only one heavily skewed perspective rather than a solid grounding on which other courses can expand. Students should not be expected to avoid this class—or the whole discipline of economics—as a method of expressing discontent.
Harvard graduates play major roles in the financial institutions and in shaping public policy around the world. If Harvard fails to equip its students with a broad and critical understanding of economics, their actions are likely to harm the global financial system. The last five years of economic turmoil have been proof enough of this.
We are walking out today to join a Boston-wide march protesting the corporatization of higher education as part of the global Occupy movement. Since the biased nature of Economics 10 contributes to and symbolizes the increasing economic inequality in America, we are walking out of your class today both to protest your inadequate discussion of basic economic theory and to lend our support to a movement that is changing American discourse on economic injustice. Professor Mankiw, we ask that you take our concerns and our walk-out seriously.
Sincerely,
Concerned students of Economics 10
Parabéns! Artigo enxuto. Sem mais palavras, boas festas.
Gostei da bronca que o LF de Paula deu em vc no forum keynes-hayek. Suas visões keynesianas são equivocadas e você continua a aliar keynes com desenvolvimentismo-populista.
E seus textos sobre liberdade são fracos conceitualmente. Reproduzem apenas um vocabulário geral, sem entrar na sofisticação, por exemplo, de um Isaiah Berlim.
Anônimo, se eu associo Keynesianismo ao desenvolvimentismo populista, o faço apenas porque os keynesianos são assim atualmente! Vide Krugman e tantos outros.
O próprio LF Paula, com rasos argumentos, acabou elogiando o modelo Dilma, populista ao extremo e oficialmente desenvolvimentista. Elogiou corte de juros na marra, expansão de gasto público etc, no BRASIL!
Não me culpe pelo fato de que os neo-keynesianos são manetas, e ignorem o "anticíclico" na era da bonança...
Mas o mesmo LFP ressaltou que Keynes pregava superávits em tempos bons para possibilitar expansão fiscal em tempos ruins.
Krugman não pode ser chamado de populista. Ele tb várias vezes expos que keynesianismo não é propor deficit fiscal a qualquer momento. Ele defende essa ação agora em que a economia americana está longe do pleno emprego e em uma armadilha da liquidez. Ele, alías, propos aumento do crédito imobiliário pós bolha da internet, mas jamais no nível que possibilitou a crise, tanto que alertou sobre a bolha imobiliária em artigos de 2006. É interessante que as previsões dele (juros e inflação baixos) mesmo com gastos goveramentais um pouco maiores e quatitative easing ocorreram, enquanto as previsões de austricos seria de maior inflação e juros altos. Além disto, como falar em recessão como forma de ajuste estrutural entre setores com níveis diferentes de eficiência quando o desemprego aumenta em quase todos os setores da economia?
não gosto de debater com anônimos por motivos óbvios, mas vamos lá: Krugman PEDIU uma bolha imobiliária em 2002 para "salvar" o crash do Nasdaq. Ele teve o que pediu. Eu nunca vejo os neo-keynesianos pregando CORTE drástico de gastos públicos ou AUMENTO de juros para conter a inflação. É mais raro isso do que ver um unicórnio.
Não falo tanto de Keynes, mas dos keynesianos, que são MUITO piores que o guru da "seita".
Obrigado por responder, coisa rara em debatedores no Brasil. Mas e quanto à comparação entre a previsão de Krugman x Austrians e à pergunta ao final do post?
Para os austríacos, a recessão será em todos os setores mesmo, ou quase, justamente porque o boom foi generalizado, graças aos fatores exógenos (criação de crédito sem lastro pelo BC e bancos).
Pleno emprego é resultado de fim dos obstáculos criados pelo governo em conluio com sindicatos. Por que há desemprego estrutural em primeiro lugar? Há gente disposta a trabalhar, mas não encontra emprego NAS CONDIÇÕES impostas pelo governo (salário mínimo, horas semanais limitadas, férias remuneradas, encargos enormes etc). O resultado é mercado negro ou desemprego.
Só um adendo.
Quem você se refere como neo-keynesiano é, na verdade, pós-keynesiano.
O Alex Shwartzman é neo-keynesiano. O Mankiw, Woodford, Galli, idem. Aqui no Brasil, o Márcio Garcia é neokeynesiano. E todos esses chiam, sim, de gastança exagerada nos momentos de boom. Neokeynesiano é quem acredita nos modelos microfundamentados onde a política monetária faz efeito no curto prazo devido a alguma rigidez nominal.
Quem defende estado gigante e gastança desenfreada são os pós-keynesianos, como exemplo os departamentos de Macro da Unicamp e UFRJ.
E é preciso um pouco de cautela nessa hora. Por exemplo, nas universidades supra-citadas, há grupos que se definem como neo-shumpeterianos e que usam o conceito "austríaco" de destruição criativa para defender as maluquices de usar o BNDES para criar os "campeões nacionais".
Rodrigo, a recessão não deveria ser em todos os setores para os austríacos, porque para eles ela é a chance de realocação de fatores em setores mais eficientes e não há como uma economia não ter nehum setor eficiente. Essa sua argumentação é falha e não salva os austriacos da evidência de desemprego generalizado por setores, compatível com a visão de falta de demanda agregada.
O que é demanda agregada?
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