segunda-feira, fevereiro 13, 2012

A polícia indefesa

Luiz Felipe Ponde, Folha de SP

A POLÍCIA é uma das classes que sofrem maior injustiça por parte da sociedade. Lançamos sobre ela a suspeita de ser um parente próximo dos bandidos. Isso é tão errado quanto julgar negros inferiores pela cor ou gays doentes pela sua orientação sexual.
Não, não estou negando todo tipo de mazela que afeta a polícia nem fazendo apologia da repressão como pensará o caro inteligentinho de plantão. Aliás, proponho que hoje ele vá brincar no parque, leve preferivelmente um livro do fanático Foucault para a caixa de areia.
Partilho do mal-estar típico quando na presença de policiais devido ao monopólio legítimo da violência que eles possuem. Um sentimento de opressão marca nossa relação com a polícia. Mas aqui devemos ir além do senso comum.
Acompanhamos a agonia da Bahia e sua greve da Polícia Militar, que corre o risco de se alastrar por outros Estados. Sem dúvida, o governador da Bahia tem razão ao dizer que a liderança do movimento se excedeu. A polícia não pode agir dessa forma (fazer reféns, fechar o centro administrativo).
A lei diz que a PM é serviço público militar e, por isso, não pode fazer greve. O que está corretíssimo. Mas não vejo ninguém da "inteligência" ou dos setores organizados da sociedade civil se perguntar por que se reclama tanto dos maus salários dos professores (o que também é verdade) e não se reclama da mesma forma veemente dos maus salários da polícia. É como se tacitamente considerássemos a polícia menos "cidadã" do que nós outros.
Quando tem algum problema como esse da greve na Bahia, fala-se "mas o problema é que a polícia ganha mal", mas não vejo nenhum movimento de "repúdio" ao descaso com o qual se trata a classe policial entre nós. Sempre tem alguém para defender drogados, bandidos e invasores da terra alheia, mas não aparece ninguém (nem os artistas da Bahia tampouco) para defender a polícia dos maus-tratos que recebe da sociedade.
A polícia é uma função tão nobre quanto médico e professor. Policial tem mulher, marido, filho, adoece como você e eu.
Não há sociedade civilizada sem a polícia. Ela guarda o sono, mantém a liberdade, assegura a Justiça dentro da lei, sustenta a democracia. Ignorante é todo aquele que pensa que a polícia seja inimiga da democracia.
Na realidade, ela pode ser mais amiga da democracia do que muita gente que diz amar a democracia, mas adora uma quebradeira e uma violência demagógica.
Sei bem que os inteligentinhos que não foram brincar no parque (são uns desobedientes) vão dizer que estou fazendo uma imagem idealizada da polícia.
Não estou. Estou apenas dando uma explicação da função social da polícia na manutenção da democracia e da civilização.
Pena que as ciências humanas não se ocupem da polícia como objeto do "bem". Pelo contrário, reafirmam a ignorância e o preconceito que temos contra os policiais relacionando-a apenas com "aparelhos repressivos" e não com "aparelhos constitutivos" do convívio civilizado socialmente sustentável.
Há sim corrupção, mas a corrupção, além de ser um dado da natureza humana, é também fruto dos maus salários e do descaso social com relação à polícia, além da proximidade física e psicológica com o crime.
Se a polícia se corrompe (privatiza sua função de manutenção da ordem via "caixinhas") e professores, não, não é porque professores são incorruptíveis, mas simplesmente porque o "produto" que a polícia entrega para a sociedade é mais concretamente e imediatamente urgente do que a educação.
Com isso não estou dizendo que a educação, minha área primeira de atuação, não seja urgente, mas a falta dela demora mais a ser sentida do que a da polícia, daí "paga-se caixinha para o policial", do contrário roubam sua padaria, sua loja, sua casa, sua escola, seu filho, sua mulher, sua vida.
Qual o "produto" da polícia? De novo: liberdade dentro da lei, segurança, a possibilidade de você andar na rua, trabalhar, ir ao cinema, jantar fora, dormir, não ser morto, viver em democracia, enfim, a civilização.
Defendem-se drogado, bandido, criminoso. É hora de cuidarmos da nossa polícia.

10 comentários:

Anônimo disse...

A questão é: como saber se algo está no preço de mercado (o único preço que poderíamos chamar de "justo") se não há um livre mercado determinando o salário dos policiais?

Qualquer determinação estatal seria arbitrária.

G.S.

Rodrigo Constantino disse...

Como Mises dizia, nem tudo deve ser avaliado pelo preço de mercado. O serviço policial não segue o mecanismo de incentivos comum no mercado. Oferecer segurança e respeito às leis não é como vender bananas.

Diego lima disse...

Gostei do texto, só não concordei com uma parte. A parte em que ele faz referência ao caso do pinheirinho de uma forma indireta. Ao que me parece, ele não acompanhou o caso, porque a justiça tinha proibido a invasão e mesmo assim os policias invadiram. As demais partes do texto foram bem colocadas.

Anônimo disse...

Parabéns ao Pondé!
Nessa barafunda de greve realmente mal conduzida pela PM, entre alhos e bugalhos, certo e errado, a sua foi A UNICA MANIFESTAÇÃO DE OPINIÃO NESSE SENTIDO, sejamos honestos.
Equilibrada e verdadeira.
Estranhamente, um Ministro da Justiça que quase não aparece falando, quando aparece dá um tom como se a polícia fosse bandido...hummm.
Uma Ministra dos Direitos Humanos que criticou a PM de SP,...hummm.
Um governo que critica uma ação judicial correta de desapropriação.....hummmm.
Mas que a PM conduziu mal sua justa reivindicação, conduziu!

Anônimo disse...

Prezado Diego Lima,

Você está equivocado (espero que esteja de boa-fé) quanto á “invasão” de Pinheirinho. Justiça Estadual de SP, há muitos meses, já havia determinado a desocupação do terreno (quem invadiu foram os moradores, não os policiais). Por mera manobra jurídica, a Justiça Federal foi acionada, mas era incompetente funcionalmente para decidir sobre o caso, já que não havia interesse da União.
A desocupação foi, durante 04 meses, planejada e debatida na presença do MP e do Judiciário. A juíza Marcia Loureiro, que decidiu sobre a reintegração de posse, elogiou o profissionalismo impar da operação. A PM de SP conseguiu a façanha de expulsar 6000 invasores com meia dúzia de levemente feridos.Ninguém foi gravemente machucado nem morto. Nem a polícia européia conseguiria tamanho sucesso.
Independentemente do mérito da decisão sobre Pinheirinho, a PM foi mera EXECUTORA da ordem. Não foi nenhum soldado nem coronel que decidiram sobre aquele terreno. Dá para entender? Por que vcs não canalizam seus ímpetos de revolucionários de Shopping Center contra o Judiciário?

Anônimo disse...

Vamos lá ao “preço de mercado”. Um soldado da PM do RJ ganha pouco mais de 1000 reais por mês para tomar tiro de fuzil no morro. Um ansessorista, copeiro ou seguranças do Senado ganham entre 15 e 20 mil para não fazerem nada.
Um oficial de Justiça federal começa ganhando 8 mil e se aposenta ganhando 15 mil para entregar intimações (ou seja, trabalho de carteiro). Um analista de Porra nenhuma de qualquer órgão federal desses aí ganha em média 10 mil por mês.
Aí partimos para o clichê “já entrou sabendo que ia ganhar mal”. Esse chavão é usado unicamente, no Brasil, para policiais. O limite de idade para o ingresso na PM é geralmente 24 anos, quando a regra é que o sujeito seja solteiro , universitário e more na casa dos pais. Ganhar mil reais nessas condições é ótimo. Mas o camarada envelhece, casa, tem filho e percebe que mil reais não dá nem para o supermercado. E ao contrário das outras carreiras de servidor público, ele não tem “letra”, ou seja, o salário dele não é reajustado anualmente.
Um professor também ganha uma miséria. Mas se ele se endividar, a solução pode ser dar mais aulas em hora-extra. O policial também tem essa opção, mas tem outras bem mais atrativas que o professor não tem. E tem um plus: o policial não tem 3 meses de férias escolares, como o professor possui.
Qualquer dona de casa sabe que não existe sabão em pó nem refrigerantes bons e baratos. A tubaína não pode custar o mesmo preço da coca-cola, pois a qualidade deles é diferente. Só o governo acha que existe polícia boa e barata. Aliás, nem acha, mas já fez sua opção pela polícia ruim mesmo. A PM de 1000 reais do RJ nunca vai ser boa,e por conseguinte, a segurança pública desse estado nunca vai ser boa também.
Um liberal sabe o que a classe média já faz há muito. Substitui o Estado no quesito educação e saúde. Mas nada substitui a função estatal da polícia, nem condomínio fechado, nem carro blindado, nem leão-de-chácara. A razão de existir do Estado é proteger o individuo de agressão externa e interna. Estado não é para transportar carta, extrair minério ou cuidar de aeroporto.
A solução seria um Estado apenas com Polícia, MP, Judiciário e Forças Armadas, além do poder político enxuto (poucos deputados, extinção do Senado, vereadores não-remunerados, etc). Todos esses raros servidores públicos deveriam ter a produtividade aferida e os incompetentes, demitidos, como NY fez em 1994. Lá, o salário do policial foi triplicado, mas a cobrança também foi. Só os bons sobreviveram, e a criminalidade caiu em média 80 por cento.

Rafa disse...

"Há sim corrupção, mas a corrupção, além de ser um dado da natureza humana, é também fruto dos maus salários e do descaso social com relação à polícia..."


Troque polícia por política ou justiça(juízes) e verás que "maus salários e descaso social" nunca foi o fruto da corrupção.

Anônimo disse...

Justiça também é importantíssima, mas não consigo defendê-la através de seus membros.

Mesma coisa com policiais.

http://www.hrw.org/node/87046/section/6

Anônimo disse...

'Vamos lá ao “preço de mercado”. Um soldado...'
Soldado não tem preço de mercado coisa nenhuma.

'Aí partimos para o clichê “já entrou sabendo que ia ganhar mal”. (...) solteiro , universitário e more na casa dos pais. Ganhar mil reais nessas condições é ótimo. Mas o camarada envelhece, casa, tem filho...'

Se ele não é capaz de pensar na vida dele a longo prazo, problema dele.Não sei de onde vc tirou que isso dá o direito de desprezar o contrato q ele assinou
obs: concordo que ganham pouco, só esse argumento que não cola.

Anônimo disse...

Ótimo texto, obviamente que os direitos humanos que nunca sentaram em uma viatura a noite em SP, que nunca trocaram tiro pelo menos uma vez por mês vai criticar a policia brasileira. Por sinal quem se preocupa demais em difamar a policia geralmente são ONGs de direitos humanos compostas por gente com interesses políticos, financeiros e mães e pais de assassinos, traficantes, sequestradores e por ai vai.