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quinta-feira, julho 11, 2013

Escutem o bilionário sueco!

Rodrigo Constantino

Deu no Valor: Bilionário sueco ataca protecionismo e cobra liberalização do Brasil

Marcus Wallenberg, presidente da holding familiar sueca Investor AB, que controla multinacionais como ABB, Atlas Copco, Electrolux, Ericsson e Saab, engrossou ontem o coro dos que pedem mais comprometimento do Brasil com abertura da economia.

Em entrevista ao Valor, o bilionário sueco disse que o Brasil tem uma "oportunidade fantástica" de levar adiante uma agenda de liberalização com a posse do brasileiro Roberto Azevêdo na Organização Mundial do Comércio (OMC) em setembro.

"Aguardamos um engajamento muito firme do Brasil [na liberalização]", acrescentou Wallenberg. Ele basicamente reforça o que vários executivos e diplomatas têm repetido, de passagem por Genebra: se o Brasil brigou para comandar o órgão que liberaliza o comércio mundial, deve então dar exemplo a partir de agora também nesse sentido.

O bilionário sueco é um dos empresários mais ativos na Câmara de Comércio Internacional (CCI), órgão que recentemente voltou a apontar o Brasil como a economia mais fechada entre as do G-20, grupo que reúne os principais países desenvolvidos e emergentes.
[...]

O bilionário sueco está certo, naturalmente. O Brasil ainda é uma economia muito fechada, protecionista, e isso nos prejudica. Há inclusive formas indiretas, além das simples tarifas, que o governo usa para impedir a livre concorrência com produtos importados. O sueco, que também é banqueiro (o que ele não é?), defendeu ainda o livre fluxo de capitais. Sem dúvida são bandeiras liberais, que devemos endossar. 

O povo brasileiro, especialmente a parte dos mais pobres, só tem a ganhar com a maior abertura comercial. Isso reduziria o preço dos produtos no país, colocaria maior pressão na busca de eficiência por parte de nossas empresas, e traria um dinamismo econômico muito maior. O Brasil precisa parar de temer a concorrência global. Ela só tem a nos favorecer. Escutem o sueco!  

A estranha lógica de Stiglitz

Fonte: Telegraph
Rodrigo Constantino

Em artigo traduzido no GLOBO hoje, Joseph Stiglitz ataca as rodadas de negociação de livre comércio, pois elas seriam instrumentos de interesses corporativos contra os reais interesses dos cidadãos. Estes, segundo Stiglitz, são melhores atendidos por meio de subsídios estatais que colocam outros valores acima dos comerciais. Vejam esse trecho, volto depois:

O ponto mais geral, a que já se aludiu, é que os acordos de comércio colocam tipicamente os interesses comerciais à frente de outros valores – o direito a uma vida saudável e à proteção do ambiente, para nomear apenas dois. A França, por exemplo, exige uma “exceção cultural” nos acordos de comércio que lhe permita continuar a apoiar o seu cinema – o que beneficia todo o mundo. Este e outros valores mais amplos deveriam ser não-negociáveis.

Na verdade, a ironia é que os benefícios sociais de tais subsídios são enormes, mesmo que os custos sejam negligenciáveis. Alguém acredita realmente que um filme de arte Francês represente uma ameaça séria a uma grande produção cinematográfica para o verão de Hollywood? E no entanto a cobiça de Hollywood não conhece limites, e os negociadores comerciais da América não fazem prisioneiros. E é precisamente por isso que estas questões deveriam ser retiradas da mesa antes do início das negociações. De outro modo, haverá braços torcidos, e existe um risco real de que um acordo sacrifique valores básicos a interesses comerciais.

Se os negociadores criassem um regime genuíno de comércio livre que colocasse o interesse público em primeiro lugar, dando às opiniões de cidadãos vulgares pelo menos tanto peso como o dado às dos lobistas empresariais, eu poderia esperar que o acordo que deles emergisse iria fortalecer a economia e melhorar o bem-estar social. A realidade, contudo, é que temos um regime comercial controlado que coloca os interesses empresariais em primeiro lugar, e um processo de negociações que é antidemocrático e não-transparente.

A possibilidade de emergir das próximas conversações um acordo que sirva os interesses dos Americanos vulgares é baixa; as perspectivas para os cidadãos vulgares de outros países são ainda piores.

Não sei se o leitor compreendeu direito, mas eu tentarei explicar: o cinema francês, segundo Stiglitz, é um valor incrível para a humanidade; mas o público pagante não necessariamente concorda, pois, quando livre para escolher, acaba indo ver os enlatados de Hollywood. Logo, o governo francês precisa proteger seus produtores de cinema, para beneficiar o público, que, lembrando uma vez mais, prefere ver os filmes americanos. Entenderam?

A lógica de Stiglitz é a mesma de todo autoritário: o que eu considero melhor deve ser pago pelos outros, caso eles sejam ignorantes demais para entender a superioridade das minhas escolhas. Quem defende subsídios, protecionismo e barreiras comerciais, e não o faz pelo simples interesse de lucrar com a falta da concorrência, está partindo justamente desse tipo de premissa autoritária. Quer impor goela abaixo dos demais as suas preferências.

O problema é que cada um tem suas próprias escolhas, e quando há o instrumento à disposição, ele poderá ser capturado por qualquer grupo de interesse. No Brasil, vemos o estado subsidiando até mesmo funk! Será engraçado ver Stiglitz defender a importância disso para a "humanidade". 

Você pode adorar filmes franceses, ou filmes iranianos. Pode detestar os filmes de Hollywood. Mas quem deve escolher é o indivíduo, o público votando com seu próprio bolso. Haverá nichos para gostos específicos, mais refinados até, se for o caso. Só não é correto obrigar o mais pobre a bancar o luxo do rico, forçar o "bruto" a pagar a conta do "intelectual". Isso é absurdo. Isso é autoritário. Isso é esquerda. Isso é Stiglitz!

PS: Alguns brasileiros usam o mesmo discurso, para garantir privilégios nacionalistas, como podemos ver aqui. E nesse artigo para a Folha, eu explico o risco de proselitismo ideológico quando o mecenas é o estado. Definitivamente, a livre escolha individual sem subsídios e protecionismo estatal é o melhor caminho.

segunda-feira, julho 08, 2013

Protecionismo em alta, Mercosul em baixa

Rodrigo Constantino

A insistência no Mercosul por motivos estritamente ideológicos tem custado muito caro ao Brasil. Em reportagem no Valor hoje, as duas maiores confederações empresariais do país batem nessa tecla. Diz a matéria:

Para evitar que a paralisia argentina dificulte avanços nas discussões, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) sugerem ao governo uma nova estratégia comercial: um "acordo guarda-chuva" do Mercosul com a UE.

Regras gerais poderão ser definidas em conjunto, o que constituiria um "guarda-chuva" mais amplo, na proposta feita pelas entidades ao Ministério do Desenvolvimento e ao Itamaraty. Já os setores e o ritmo de abertura ficariam a cargo de cada país, caso não haja consenso entre os sócios do Mercosul. Um modelo semelhante foi usado em negociações com o México e com a Comunidade Andina, mas o governo ainda resiste em aplicar a mesma lógica no acordo comercial com a UE.

"Se der para fazer um acordo via Mercosul, ótimo. Mas não podemos perder essa oportunidade por causa da resistência argentina", diz a presidente da CNA, Kátia Abreu. Segundo ela, o empresariado brasileiro nunca esteve tão afinado como agora para fazer uma oferta aos europeus. "Já temos uma harmonia quase perfeita entre a indústria e o agronegócio", afirma Kátia, que é também senadora (PSD-TO).

A Argentina tem sido um entrava para o avanço das negociações de livre comércio do Brasil. Até quando vamos pagar esse alto preço pela afinidade ideológica dos governantes de ambos os países? O protecionismo comercial interessa apenas a alguns poucos produtores, enquanto prejudica todo o restante do país. E, conforme mostra o advogado Eduardo Matias, em artigo no mesmo jornal, esse protecionismo está em alta no mundo todo:

Estudo recente da Global Trade Alert mostra que 431 novas medidas protecionistas foram implementadas de junho de 2012 até hoje. Os dois últimos trimestres superaram, com folga, o número de medidas deste tipo em qualquer trimestre anterior desde 2008 -inclusive o recordista deles até então, o primeiro de 2009, no auge da crise.

Os efeitos disso são muito negativos. No caso brasileiro, um país relativamente fechado, a escalada protecionista produz resultados ainda piores:

Internamente, a proteção excessiva leva à perda de competitividade e diminuição do bem-estar geral da população. O protecionismo pode estar atendendo aos anseios de apenas uma parte ineficiente do setor produtivo, em detrimento da sociedade - que arca com a inflação de preços - ou do setor produtivo como um todo. Além disso, penalizar as importações - que caíram 2% no Brasil em 2012, segundo a OMC - pode causar um aumento no preço de insumos necessários à produção, o que torna nossa economia menos competitiva também nas exportações. Seria um tiro no pé para um país que já exporta pouco - segundo o mesmo levantamento, continuamos em 22º lugar, com participação de apenas 1,3% das exportações mundiais. Em 2012, as vendas brasileiras para o exterior sofreram uma redução de 5% em relação ao ano anterior, situação que pode ser atribuída, em grande parte, à crise na Europa - grande importadora - e à queda nos preços das commodities, mas que, certamente, não se beneficia da ausência de novos acordos de livre comércio e dos entraves à produção em nosso país.

O Brasil precisa se abrir mais, reduzir barreiras protecionistas que só protegem setores ineficientes, e mergulhar de vez no livre comércio. O Mercosul tem sido um obstáculo a isso.

quarta-feira, outubro 31, 2012

O duplipensar de Pimentel

Rodrigo Constantino

O ministro de Desenvolvimento, Fernando Pimentel, tem mesmo um uso das palavras bastante diferente do meu. Nesta matéria do site G1, consta que o governo pretende segurar o dólar acima de R$ 2. Ele teria dito:

O câmbio é flutuante mas o Banco Central tem agido usando os instrumentos de mercado no sentido de manter o patamar do câmbio brasileiro num estágio competitivo. Em dois reais por um dólar é um câmbio que traz conforto ao exportador.

O leitor entendeu direito? O câmbio é flutuante, mas deve "flutuar" muito perto de dois reais por dólar, quase imóvel. É um pêndulo que oscila sem sair do lugar, entendem? 

Mas não acabou. Justificando as medidas protecionistas do governo Dilma, que prejudicam os próprios brasileiros, Pimentel inverteu os fatos na maior naturalidade ao afirmar:

Os países desenvolvidos, que são campeões de protecionismo, dizem que nossas medidas são protecionistas quando o Brasil não está fazendo nada mais que proteger o seu mercado de práticas desleais. Nós não vamos admitir práticas predatórias e desleais no comércio internacional.

Ministro, qual fonte o senhor usou para constatar que os países desenvolvidos são mais protecionistas? Gostaria muito de saber, pois todas as fontes que tenho, incluindo a OCDE, mostram que o Brasil é bem mais protecionista do que os países desenvolvidos. Quer alguns exemplos? Verifique quanto custa trazer um carro coreano importado para o Brasil e quanto custa para os Estados Unidos. Faça isso para todos os outros produtos. 

Claro que as tarifas não são o único meio de impor barreiras protecionistas. Existem outras formas, como barreiras sanitárias, burocracia etc. Mas alguém acha realmente que o Brasil utiliza menos tais mecanismos do que os países desenvolvidos? Sério?

Segundo o Índice de Liberdade Econômica do Heritage Foundation, o Brasil está quase em centésimo lugar no ranking geral, e a abertura comercial tem sido responsável pela piora do posicionamento do país. Eis o que diz o estudo:

The trade weighted tariff rate is 7.6 percent. Non-tariff barriers and the use of antidumping measures are a cause for concern. Foreign investors are granted national treatment, but their activity is restricted in some sectors, including communications and mining.

Os Estados Unidos, que acusaram o Brasil de adotar medidas protecionistas, despertando a fúria do nosso governo, possuem tarifa média de apenas 1,8%, contra 7,6% do Brasil. A nota dos EUA em questão de comércio internacional é 86,4 (37º lugar no ranking), comparado a 69,7 do Brasil (126º lugar no ranking). Como acusar os EUA de serem mais protecionistas que o Brasil? Com base em qual critério?

Em suma, fica claro que o ministro Pimentel gosta de abusar do duplipensar orwelliano. Deve ser por tal habilidade que ele conseguiu juntar milhões prestando consultoria fora do governo...

terça-feira, setembro 25, 2012

Sacrificando os Consumidores


Rodrigo Constantino (2006)

“Quando um produto chega até nós a partir do estrangeiro, e quando podemos adquiri-lo por menos trabalho do que se produzíssemos nós mesmos, a diferença é um presente gratuito que é conferido a nós.” (Bastiat)

Em Economic Sophisms, o francês Frédéric Bastiat (1801-1850) expõe as incoerências do protecionismo comercial. As barreiras protecionistas sempre representam um privilégio a poucos produtores à custa dos consumidores. Selecionei três casos analisdos pelo economista.

No primeiro caso, Bastiat simula uma petição dos fabricantes de velas, lanternas e lâmpadas, assim como dos produtores de petróleo, resina e álcool, em defesa do protecionismo de seus mercados. Eles alegam que estão sofrendo uma competição injusta, já que seu rival pode trabalhar sob circunstâncias bem superiores que as deles, inundando assim o mercado doméstico com um produto concorrente de preço inacreditavelmente mais baixo.

O rival estrangeiro é o sol, que declarou guerra sem misericórdia aos fabricantes domésticos de substitutos de iluminação natural. A petição pede que o governo bloqueie o máximo possível o acesso à luz natural, criando uma necessidade por iluminação artificial, estimulando a indústria doméstica.

Ora, a justificativa para não seguir tal pedido seria o custo que os consumidores teriam que arcar? Mas sempre que o governo cria barreiras que dificultam o acesso aos bens importados mais baratos, não ocorre o mesmo tipo de sacrifício dos consumidores, para beneficiar alguns poucos produtores? A desculpa de que o protecionismo visa ao encorajamento da indústria nacional e aumento do emprego não se aplica da mesma forma nesse caso? Não alegam que o consumidor e o produtor são a mesma pessoa, e que se um fabricante local lucra com o protecionismo, isso terá uma contrapartida no consumo maior de outros produtos, beneficiando os demais setores? E o mesmo “argumento” não é válido no caso da iluminação artificial?

Não condenam a competição como injusta quando recursos naturais favorecem os produtores estrangeiros, justificando assim a proteção? E qual seria a diferença de parte do custo de proteção do importado ser de graça devido a natureza, e seu custo total ser nulo, como no caso do sol? Como pode fazer sentido proteger produtores domésticos quando uma parte dos custos dos importados tem vantagem natural, e não proteger quando sua totalidade possui esta vantagem?

No segundo caso, Bastiat diz ter chegado a uma imensa descoberta, de como reduzir a diferença entre o preço dos produtos nos locais onde são produzidos e onde são consumidos. Apesar de empresários quebrarem a cabeça pensando nisso, buscando a redução dos custos de transporte, principal barreira natural para a importação ao mesmo preço, o governo, em contrapartida, cria barreiras artificiais do outro lado, muitas vezes anulando o efeito das inovações no transporte.

A solução “mágica” de Bastiat: redução das tarifas! O economista questiona como pode ter sido possível pensarem em algo tão fantástico como se gastar milhões com o propósito de remoção dos obstáculos naturais entre os países, como a construção de pontes e ferrovias, ao mesmo tempo que se gasta outros tantos milhões com o propósito de substituição dos obstáculos artificiais que possuem exatamente o mesmo efeito. O resultado é que o obstáculo criado – as tarifas protecionistas – neutraliza o obstáculo removido, e as coisas continuam como antes, sendo a única diferença uma despesa dobrada pela operação toda.

O terceiro e último caso trata da reciprocidade. Muitos alegam que o livre comércio tem que ser recíproco para ser benéfico. Bastiat afirma que pessoas com tal mentalidade são protecionistas em princípio, mesmo que não reconheçam, e são apenas mais inconsistentes que os protecionistas puros, que são por sua vez mais inconsistentes que os defensores da abolição completa de produtos estrangeiros.

Para provar seu argumento, ele utiliza uma fábula de duas cidades, Stulta e Puera, que construíram uma grande estrada as conectando. Após o término da construção, Stulta teria reclamado que os produtos de Puera estavam inundando o seu mercado, e criou o cargo assalariado de encarregados pela obstrução do tráfego dos importados. Logo em seguida, Puera fez o mesmo, e o resultado era mutuamente perverso.

Até que um homem velho de Puera, suspeito até de receber pagamento secreto de Stulta, disse que os obstáculos criados por Stulta eram maléficos a Puera, o que era uma pena. E que os obstáculos criados pela própria Puera também eram maléficos, novamente uma pena. Completou que não havia nada que pudessem fazer quanto ao primeiro problema, mas que poderiam solucionar a outra parte, criada por eles mesmos.

Logo houve forte reação, e o acusaram de sonhador, utópico e até “entreguista”. Alegaram que seria mais difícil ir que vir pela estrada, ou seja, exportar que importar. Isso colocaria Puera em desvantagem em relação à Stulta, como as cidades na beira dos rios estão em desvantagem frente às montanhosas, já que é mais complicado subir que descer. Só que uma voz disse que as cidades na beira dos rios prosperaram mais que as montanhosas, causando alvoroço.

No entanto, era um fato! Infelizmente para o povo de Puera, decidiram que tais cidades tinham prosperado contra as regras, e optaram pela manutenção dos obstáculos, em nome da “independência nacional”, da honra, da proteção da indústria doméstica contra a competição selvagem, etc. E os consumidores continuaram sendo sacrificados para o benefício de alguns produtores privilegiados, como sempre ocorre nas medidas protecionistas. 

segunda-feira, março 26, 2012

Desindustrialização ou lobby?

João Luiz Mauad, O GLOBO

Alguém já disse: torture os números e eles confessarão qualquer coisa. De fato, as estatísticas são, hoje em dia, as grandes aliadas dos mistificadores, que as utilizam de forma indiscriminada para dar aparencia científica às falácias e mentiras em prol de suas causas. Você pode desenvolver rígida argumentação lógica a respeito de um assunto sem convencer muita gente, mas basta acrescentar alguns números, tabelas e gráficos para respaldá-la e as pessoas passam a olhar os seus argumentos com outros olhos.

Um exemplo gritante disso apareceu no jornal Folha de São Paulo, de 09 de março. Nesse dia, uma matéria naquele diário informava - sob o título “Participação da indústria no PIB recua aos anos JK” - que “a participação da indústria no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro recuou aos níveis de 1956, quando a indústria respondeu por 13,8% do PIB. De lá para cá, a indústria se diversificou, mas seu peso relativo diminuiu. O auge da contribuição da indústria para a geração de riquezas no país ocorreu em 1985: 27,2% do PIB. Desde então, tem caído.”

Malgrado o título bombástico, até aqui a matéria é meramente informativa e apenas noticia um fato que as estatísticas a respeito desvendam. Seu uso oportunista só fica claro a partir do ponto em que se começa a apontar eventuais causas para um suposto problema. Assim, depois da introdução, entra em cena o senhor Paulo Skaf, que vem a ser o presidente da FIESP. Eis o que diz o valente: “Temos energia cara, spreads bancários dos maiores do mundo, câmbio valorizado, custo tributário enorme e uma importação maciça. A queda da indústria no PIB é a prova do processo de desindustrialização”.

Exceto pelo exagero de afirmar que há no Brasil - um dos países mais protecionistas do mundo - volumes de importação maciços, quase tudo o que ele diz, fora a conclusão, é a mais pura verdade. O problema é que temos ali várias verdades sendo ditas com o propósito de retirar delas conclusões absolutamente falsas.

Primeiro, a maioria dos entraves listados por Skaf, além de outros tantos integrantes daquilo que se convencionou chamar de “custo Brasil, não prejudicam somente a indústria, mas todos os setores da economia. Segundo, se a queda da participação relativa do setor manufatureiro no PIB é prova da famigerada desindustrialização, então o que temos hoje é uma desindustrialização mundial.

De acordo com dados compilados pelas Nações Unidas, a queda da participação do setor de manufaturas no PIB é um fenômeno global, a exemplo do que já ocorrera anteriormente com a agricultura. Assim, de 1970 a 2010 esta queda foi de 24,5% para 13,5% no Brasil, de 22% para 13% nos EUA, de 19% para 10,5% no Canadá, de 31,5% para 18,7% na Alemanha e de 27% para 16% no mundo inteiro.

A causa dessa queda generalizada não está, evidentemente, numa suposta desindustrialização, mas no aumento da participação de outros setores, antes irrisórios, como serviços em geral, comércio, finanças, saúde, educação, ciência e tecnologia, etc. A verdade é que a produção total da indústria no mundo, se não está no seu pico está muito perto dele. Já a produção industrial brasileira é certamente muito maior hoje, em termos absolutos, do que era em 1985, ano em que, segundo a matéria, o setor manufatureiro alcançou a sua maior participação relativa no PIB.

Desindustrialização e Doença Holandesa são duas expressões caras aos lobbistas da indústria local. Uma rápida pesquisa com essas palavras no Google mostra diversos estudos e trabalhos “científicos” a respeito, repletos de gráficos e tabelas, a maioria deles patrocinada por entidades como FIESP, CNI e congêneres. Esse é também um importante nicho do pensamento nacionalista e intervencionista, utilizado amiúde para defender interesses, vantagens e privilégios diversos junto ao governo. Os pleitos desse pessoal não costumam variar muito. Seus alvos prioritários são as ditas políticas industriais (geralmente baseadas em subsídios e isenções fiscais) e protecionistas, leia-se: controles cambiais e barreiras alfandegárias / tarifárias.

O argumento aparente é quase sempre a criação e manutenção de empregos domésticos, mas a real intenção é a transferência de renda de consumidores para produtores ineficientes. Para que a estratégia seja 100% eficaz, a manipulação da opinião pública e o consequente respaldo político são essenciais, é claro.

quinta-feira, março 22, 2012

Escalada protecionista

Deu no jornal Valor Econômico:

Centrais pedem mais conteúdo nacional em peças

Por Thiago Resende, Lucas Marchesini e Francine De Lorenzo | De Brasília e de São Bernardo do Campo

Dirigentes das seis principais centrais sindicais do país propuseram ontem ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, que o setor automotivo eleve o chamado conteúdo local das partes e peças nacionais usadas na produção de veículos. O presidente da Força Sindical, deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, defende a elevação, de 8% para 21%, no índice atualmente em vigor. "Estamos questionando a nacionalização de peças porque o setor automotivo hoje tem 8% de exigência. Nós queremos aumentar esse número. Nossa proposta é que o conteúdo local chegue a 21%", afirmou. O governo, segundo o sindicalista, aceitou negociar a reivindicação das centrais sindicais. Mas, para ele, esse é um processo "lento".

O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, explicou que, no cálculo de conteúdo nacional "como um todo", pode ser considerado até o gasto com publicidade no país. "Não queremos apenas ser apertador de parafuso e montador de peça. Queremos discutir projetos de política industrial", disse.

[...]

Pouco depois, no mesmo jornal, consta a seguinte matéria:

UE estuda protecionismo nas compras do governo

Por Alex Barker e Joshua Chaffin | Financial Times, de Bruxelas

As autoridades da União Europeia (UE) receberão novos poderes para adotar medidas de retaliação contra países que se recusarem a dar às empresas europeias um acesso justo aos contratos governamentais, segundo um plano de reformas formulado por Bruxelas (sede da UE).

A iniciativa poderá gerar tensão nas relações com a China e provocar acusações de protecionismo dos parceiros comerciais.

A proposta, que deverá ser divulgada amanhã, pretende fortalecer o poder dos negociadores da UE que tentam derrubar as barreiras enfrentadas por empresas europeias desejosas de obter contratos governamentais em mercados emergentes, como a China.

Mas o plano de criar poderes para autoridades da UE de recusar propostas de fornecimento procedentes de empresas provenientes de mercados fechados provocou um debate acalorado na Comissão Europeia, lançando os liberais em termos de comércio exterior contra os que defendem uma política mais forte de "reciprocidade".

[...]

Comento: Em momentos de crise, erguer barreiras protecionistas parece uma "solução" atraente para políticos com visão míope. Na década de 1930, esse foi um dos fatores que aceleraram o agravamento da depressão americana. O Smoot-Hawley Tariff Act representou um ícone protecionista na até então liberal economia americana, desencadeando uma escalada protecionista generalizada. Hoover assinou a lei mesmo com mais de mil economistas escrevendo uma carta aberta onde tal medida era duramente condenada. A medida se mostrou catastrófica, e retaliações ocorreram no mundo todo. As importações americanas caíram mais de 40%.

O governo Dilma está avançando a passos largos nesta direção caótica. Diante de tanta estupidez econômica, resta apenas a ironia como arma. Para quem ainda não leu, segue a minha petição nacionalista, em nome da ABPCO (Associação Brasileira dos Produtores de Coisas Obsoletas), que foi publicada no jornal O Globo. É rir para não chorar!

sexta-feira, março 16, 2012

Pintados para a guerra

ROGÉRIO FURQUIM WERNECK, O Globo

Findo o carnaval, o ano, afinal, teve início. E, ao governo, boas novas não trouxe. De certas notícias, já se sabia. Dos 5% de crescimento do PIB, prometidos com grande alarde, só foi possível entregar pouco mais da metade: 2,7%. E, ainda assim, a inflação por pouco não ultrapassa o teto de tolerância da meta. De outras, só agora se soube. A indústria de transformação mostrou crescimento próximo de zero em 2011. E, em janeiro, a produção industrial sofreu queda de 2,1%.

Tal conjunção de más notícias foi o que bastou para que se formasse em Brasília quadro propício a reações impensadas. A começar pela retórica bombástica - mais apropriada a operações militares ou de mobilização da defesa civil - que passou a pautar o discurso econômico do governo: "guerra cambial", "arsenal ilimitado" e "tsunami monetário". Em meio à coreografia guerreira, o que na verdade se vê é uma equipe econômica atarantada - pressionada pelo Planalto e assediada por lobbies de todo tipo - pronta a prometer, a torto e a direito, todo o ativismo que a situação vier a exigir. Não surpreende que, nesse ambiente, tenha ressurgido no País um festival de ideias estapafúrdias, que vão do fechamento da economia à taxação de exportações.

Mais do que nunca, o que a situação exige é reação serena da política econômica, pautada por análise objetiva dos fatos. Tudo indica que, na esteira dos estímulos à demanda já desencadeados, a economia deverá chegar ao quarto trimestre crescendo a uma taxa anualizada perfeitamente aceitável. Estímulos adicionais servirão apenas para tornar ainda mais árdua a tarefa de manter a inflação sob controle em 2013. Mas é improvável que, com a insegurança de que foi tomado, o governo consiga evitar o excesso de ativismo.

O que, sim, complica em muito a situação é a enorme dificuldade que vem enfrentando a indústria para absorver o choque de realidade a que vem sendo submetida, ao contemplar a real extensão de sua perda de competitividade. É claro que uma taxa de câmbio mais depreciada ajudaria. O problema, contudo, é que, ao longo dos anos, a indústria se habituou a desprezar outros fatores cruciais que vinham erodindo sua competitividade.

Não é de hoje que boa parte da indústria vem apostando na ideia de que tudo, ou quase tudo, poderia ser resolvido pelo lado do câmbio. Mesmo que não voltassem os "bons tempos" de uma taxa de câmbio típica de economia com séria restrição externa, o governo, se devidamente pressionado, poderia perfeitamente assegurar um câmbio bem mais depreciado. Viável era. Ou, pelo menos, era essa a fantasia. E, enquanto insistia em falar grosso contra a política cambial, grande parte da indústria se permitia falar bem mais fino contra o crescimento descontrolado de gastos correntes do governo, a carência de investimentos públicos e a elevação sem fim da carga tributária.

Só agora a indústria começa a se dar conta das dificuldades de manter a competitividade em uma economia cada vez mais sobretaxada, em que os três níveis de governo já extraem 36% do PIB em tributos e, nem de longe, conseguem desempenhar como deveriam os papéis que lhes cabem na oferta de serviços públicos e na expansão da infraestrutura. No setor serviços, o aumento persistente de Custo Brasil tem sido repassado aos preços sem maiores dificuldades. Na indústria, contudo, exposta à concorrência externa, o aumento de Custo Brasil vem, pouco a pouco, estrangulando a competitividade.

Dissipada a miragem da depreciação cambial fácil, parte da indústria agora se agarra à triste bandeira da escalada protecionista. O que, para o país, seria um colossal retrocesso. As dificuldades da indústria têm de ser superadas sem que a economia se torne ainda mais fechada do que já é. E, para isso, claro, vai ser preciso bem mais do que a nova aspersão de paliativos que o governo contempla. Mas, para viabilizar esforço de mais fôlego e menos imediatista nessa linha, é fundamental que a indústria mude o discurso e, pelo menos, passe a bater nas teclas certas.

Miolo mole com Sangue de Bois


Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

Deu no Estadão: “O governo brasileiro quer tornar o vinho importado mais caro ou retirá-lo da prateleira como forma de proteger a indústria nacional. Após analisar as compras nos últimos anos, o governo concluiu que as importações causaram um ‘prejuízo grave à indústria doméstica’ e decidiu abrir uma investigação para imposição de salvaguarda, a medida comercial mais dura no âmbito da Organização Mundial de Comércio (OMC), cujo resultado prático será a imposição de uma quantidade máxima de vinho importado ou aumento dos tributos cobrados na aduana”.

É assim que funciona a mentalidade mercantilista do governo atual. Tudo aquilo que gera superávit comercial é bom, e tudo aquilo que gera déficit é ruim. Importar é ruim! É preciso “proteger” a indústria nacional, independente daquele velho conceito apontado por Adam Smith e David Ricardo: as vantagens comparativas. Quem liga para o detalhe de que a qualidade do vinho depende do solo e do clima? Se não podemos reproduzir as características climáticas do Chile ou de Portugal por decreto, ao menos podemos criar barreiras para seus produtos. Vamos logo produzir vinhos da Caatinga e criar uma reserva de mercado para eles!

O mercantilismo é antigo, e o Brasil já se fechou para o mundo em outras ocasiões, como na Lei da Informática, que condenou o país ao atraso tecnológico. Claro que impedir a importação de vinhos baratos não vai gerar efeitos tão graves à economia como um todo. Vai apenas prejudicar os consumidores, que serão obrigados a tomar cidra nacional como se fosse uma legítima Veuve Clicquot.

Os vinhos mais baratos são justamente os alvos prediletos do governo. Ou seja, os maiores afetados serão os mais humildes, que finalmente descobriam os prazeres de Baco. Em vez de beber um razoável Concha y Toro, vão ter de se contentar com um “Sangue de Bois” daqueles que deixa forte ranço na garganta. É o que dá ter Miolo mole e acreditar nesta baboseira de “interesse nacional” que, na prática, sempre serviu para beneficiar alguns poucos empresários “amigos do rei” em detrimento de milhões de consumidores. Bebamos à estupidez, marca registrada da cultura nacional. Tim-Tim.

terça-feira, março 13, 2012

O custo de a Petrobras fazer política industrial

Editorial de O Globo

A indústria da construção naval no Brasil, que passou um longo período encolhendo desde o apogeu dos anos 70, praticamente renasceu com a incremento da produção de petróleo e gás na Bacia de Campos. Além da construção de plataformas de produção para a Petrobras, a atividade petrolífera, por estar a dezenas ou centenas de quilômetros da costa, precisa se amparar em uma diversificada rede de apoio marítimo, que envolve desde embarcações especializadas em levantamentos sísmicos até as que lançam equipamentos no fundo do mar ou transportam pessoas, materiais e suprimentos.
A legislação brasileira permite que armadores afretem embarcações no exterior para prestar serviços de transporte no nosso litoral se construírem navios no país. Assim, estaleiros que estavam quase paralisados começaram a se recuperar, especialmente no Estado do Rio, que, na época, respondia por 90% da capacidade instalada do setor.
Mas, enquanto a construção naval não ganhava rimo de produção, a Petrobras também tinha a necessidade de encomendar plataformas no exterior, para concretizar investimentos, de cujo retorno de capital depende para financiar sua expansão dentro de prazos razoáveis. Essas encomendas foram objeto de críticas, que acabaram sendo usadas, habilmente, na campanha presidencial de 2002 pelo então candidato Lula. Eleito, logo no seu primeiro mandato Lula determinou que novas plataformas fossem construídas preferencialmente no Brasil pela Petrobras, tendência, aliás, que já vinha se configurando como natural de recuperação do setor, mas sem a criação de uma reserva de mercado.
Assim, a Petrobras, cumprindo promessa de campanha do presidente Lula, encomendou grandes plataformas a estaleiros nacionais, passando a absorver um custo adicional em decorrência de atrasos no cronograma de entrega e do encarecimento de materiais e serviços, compreensível pela falta de escala da indústria no país e até por distorções tributárias.
Em face do grande crescimento potencial para a produção de petróleo e gás, desde a abertura do mercado brasileiro, o governo resolveu associar esta demanda a uma política de estímulo à indústria e aos prestadores de serviços. As empresas petrolíferas que disputaram blocos para exploração tiveram que se comprometer a contratar internamente um determinado percentual de bens e serviços. Mas, além disso, com o pré-sal, a Petrobras recebeu a responsabilidade de montar uma cadeia de fornecedores no país.
A estatal não deveria ter essa incumbência, a qualquer preço, pois isso já tem se refletido na elevação de seus custos. O governo não pode confundir política industrial com a reserva de mercado que, no passado, trouxe mais prejuízos que benefícios ao país. A política de substituição de importações no governo Geisel deixou grande passivo para a sociedade. Desta vez, ela recai sobre a estatal, ainda com a incumbência de monopolizar a operação no pré-sal, deter 30% dos consórcios que venham a ganhar licitações na área e ainda subsidiar a gasolina devido à inflação. A Petrobras pode ser a grande vítima desta custosa aventura estatista

terça-feira, outubro 04, 2011

Uma petição nacionalista

Rodrigo Constantino, O GLOBO

Em memória de Frédéric Bastiat.

Prezados ministros, ilustre presidente Dilma. Venho, aqui, apresentar uma petição em nome da Associação Brasileira dos Produtores de Coisas Obsoletas (ABPCO). Tendo observado atentamente as últimas medidas do governo, tal como a elevação do imposto para carros importados, não pude deixar de notar um claro viés mercantilista.
O governo, finalmente, assume sua postura nacional-desenvolvimentista, que busca proteger produtores nacionais da concorrência externa. Objetivo deveras legítimo. Afinal, faz-se mister garantir os empregos dos brasileiros, não dos chineses ou coreanos. “Quem ama protege”, disse Carlos Lessa. E é justamente com base neste nobre ideal que vos apresento esta humilde petição.
A ABPCO representa produtores de carroças, máquinas de escrever, gramofones, lampiões, tudo aquilo que foi injustamente prejudicado pelo avanço da tecnologia capitalista, importada de outros países. Pergunto: é justo um produtor de máquinas de escrever ir à falência só porque inventaram o computador?
Alguns liberais podem argumentar que o computador trouxe inúmeros benefícios para todos os consumidores, gerou produtividade maior na economia e ajudou no progresso da nação. Mas, e quanto aos empregos de todos aqueles pobres trabalhadores envolvidos na manufatura das máquinas de escrever? Como eles ficam sem proteção?
Como representante da ABPCO, regozijo-me ao saber que Vossas Excelências não sois insensíveis como os liberais. Vós compreendeis a importância de se proteger os empregos dos produtores nacionais, ainda que seus produtos sejam piores e mais caros.
Muitos empresários argumentam que o “Custo Brasil” é alto demais, que não é justo competir com esta infraestrutura, alta taxa de juros, burocracia asfixiante e impostos escorchantes. São reclamações legítimas. Mas o que o governo pode fazer? Reformas estruturais? E como fica a governabilidade? O governo vai reduzir seu raquítico gasto público, de um trilhão de reais? E como ficariam aqueles que dependem do governo? Políticos, burocratas, centrais sindicais, MST, ONGs, empreiteiras e milhões de famílias que vivem do Bolsa Família...
Aliás, permitam-me um parêntese: parabéns pelo recente anúncio do aumento de beneficiados com este programa. Já são quase 14 milhões de famílias! É assim que um programa social, que tem como meta reduzir a miséria, deve ser julgado: quanto mais gente depender do governo para viver, maior o seu sucesso. Maravilhoso será o dia em que todos estiverem no programa. Seremos tão ricos quanto Cuba!
Mas divago. Devo regressar à crítica dos empresários. O governo teria que demitir funcionários, e sabemos como os serviços públicos hoje são excelentes, justamente por conta do enorme aumento no quadro de pessoal durante a gestão petista. A saúde pública, segundo o ex-presidente Lula, é quase perfeita. Esta é uma conquista importante que não podemos abrir mão. Escolas excelentes, transporte público de primeira, segurança, e vamos sacrificar isso tudo só para permitir juros menores?
Creio que o caminho escolhido por vosso governo é mais sábio: decretar a redução dos juros na marra, mesmo sem cortar gastos públicos; aceitar mais inflação (o que são míseros 7% ao ano?); aumentar impostos; direcionar crédito subsidiado do BNDES para grandes empresas; e, claro, proteger o produtor nacional.
Alguns ousam chamar o aumento do IPI de protecionismo. Um disparate! O ministro Pimentel soube dar uma resposta à altura: argumentou que não é protecionismo porque as importações não foram proibidas. Brilhante! E é justamente pegando carona nesta lógica impecável que gostaria de propor, em vez de proibir a importação dos concorrentes, uma singela tarifa de 1.000% (o número é arbitrário; aceitamos 900%). Ninguém poderá acusar vosso governo de protecionista.
Finalizo esta petição confiante de que o governo será sensível à demanda dos produtores em questão. Empregos estão em jogo. Não podemos sacrificá-los apenas para o benefício dos consumidores, que, como bem colocou o ministro Mantega, sofrem assédio dos importados.
PS: gostaria de vos alertar quanto a uma campanha que circula na internet, de boicote aos carros nacionais após o aumento do IPI. Se os consumidores deixarem de trocar de carro até o fim do ano, os estoques poderão subir muito, entupindo os pátios das montadoras. Seria terrível para o governo. Mas não fiqueis tão preocupados. O povo é nacionalista. Quem ama o país está disposto a comprar até carroça nacional pelo preço de Ferrari. Contamos com isso...

sábado, outubro 01, 2011

Entrevista com Ian Bremmer

Ótima entrevista nas páginas amarelas da revista VEJA esta semana, com o cientista político Ian Bremmer, presidente da consultoria Eurasia Group. Seguem alguns trechos de destaque:

"O grande risco que as economias emergentes correm é cair na tentação estatizante. Existe sempre o perigo de, a pretexto da crise global, os emergentes se deixarem levar pelo ímpeto de intervir mais fortemente na economia. Como se sabe, a qualidade dessas ingerências cedo ou tarde se deteriora e elas passam a ser motivadas por interesses políticos e empresariais localizados ou, pior, por bandeiras ideológicas. É na interferência excessiva do estado que reside o maior de todos os perigos para os países emergentes. Nos momentos de crise, isso pode parecer justificável, pois tem-se a impressão de que há alguém no comando enfrentando a turbulência econômica. Nessas horas, a idéia estatizante fica ainda mais perigosa."

"Espero que as autoridades dos países emergentes resistam à tentação de ampliar seus tentáculos pretextando a necessidade de ter mais poderes para enfrentar a crise externa. Espero que segurem o ímpeto desastroso de instrumentalizar as estatais, os bancos públicos ou os fundos soberanos - e, o que seria ainda mais ruinoso, bulir com o destino das empresas privadas que recebem alguma forma de ajuda financeira do estado. Na crise, sob a justificativa de estimular o crescimento e criar mais empregos, esses movimentos podem parecer naturais e necessários. Mas são fatais. O capitalismo de estado desencoraja a competição e, por isso, é insustentável as longo prazo."

"O atual capitalismo de estado nada mais é do que a expressão nova do velho e arcaico nacionalismo. [...] O viés nacionalista é um elemento integrante da cultura nas nações hoje emergentes. Esse componente histórico torna mais fácil o trabalho de convencimento dos governantes que desejam intervir excessivamente na economia, oferecendo ao povo diversas modalidades de protecionismo. Isso precisa ser superado pelos países emergentes."

"Adotar a verdadeira economia de mercado é o único caminho que os chineses têm para continuar a enriquecer e a sobressair na competição global."

"Falta ao governo brasileiro uma reflexão mais aprofundada e menos ideológica sobre as consequências de optar por esse rumo intervencionista."

"Será que a ajuda estatal não acabará criando uma relação de dependência do setor privado em relação à máquina pública? Até que ponto as verbas do governo não criam um ambiente de negócios artificial, em que as empresas se tornam incapazes de sobreviver pelas próprias pernas? Para mim, existe um balizamento claro para todas essas indagações: o mercado livre das amarras do estado será sempre mais eficaz."

"O cenário é favorável. Mas o Brasil precisa se livrar de vez de anacronismos ideológicos que convergem para um aparelho estatal grande, pouco eficiente e burocrático. Só isso pode sabotar o avanço do Brasil."

E claro que a presidente Dilma está se esforçando ao máximo para tornar tal sabotagem uma realidade...

sábado, setembro 24, 2011

Nacional-desenvolvimentismo

Rodrigo Constantino, revista VOTO

O governo Dilma tem deixado cada vez mais claro seu viés ideológico nas últimas medidas econômicas. Trata-se de uma ideologia antiga, cuja essência se traduz pela inabalável fé na capacidade do próprio governo agir como locomotiva do crescimento econômico. O corolário desta crença é uma profunda desconfiança do livre funcionamento dos mercados.

Durante o governo Lula esta característica já era bastante visível, especialmente após a crise de 2008, que deu a oportunidade para que o governo avançasse com seus tentáculos sobre a economia. Calhou com a véspera das eleições, e o então presidente Lula juntou a fome com a vontade de comer. O BNDES foi o grande instrumento desta política expansionista do Estado, assim como os gastos públicos.

Bastou o agravamento da crise mundial desta vez para que o governo Dilma partisse com mais ferocidade ainda nesta direção. O Banco Central, que no Brasil ainda não é independente, tomou a ousada medida de reduzir a taxa básica de juros de forma inesperada, mesmo com uma inflação rodando acima de 7%, e sem perspectiva para grande arrefecimento. Foi um tiro no escuro, representando perigosa mudança de postura.

Um Banco Central independente com claras metas de inflação é importante como guardião da moeda, justamente porque sempre há o risco de ele ser capturado pelos interesses momentâneos do governo. Quando isto ocorre, a maior sacrificada acaba sendo a responsabilidade monetária, e aquele que controla o poder de emissão da moeda se transforma num caixa automático do governo, permitindo maiores gastos públicos por meio do pior imposto de todos, pois disfarçado e prejudicial aos mais pobres: o inflacionário.

Após este fundamental pilar da estabilidade ser gravemente abalado, o governo Dilma ainda sacudiu com força outro pilar crucial: o livre comércio. É verdade que o Brasil já não era uma das economias mais abertas do mundo. Basta comparar as taxas médias aduaneiras que praticamos com aquela de países mais abertos. Mas a direção era de maior abertura. Até o governo resolver atender ao lobby das grandes montadoras nacionais e subir drasticamente os impostos sobre carros importados.

Esta decisão absurda pode desencadear uma guerra comercial, o pesadelo de qualquer economia. Basta refletir sobre a ótica militar para compreender isso: quando um país entra em guerra com outro, um dos primeiros alvos é justamente o acesso do inimigo aos produtos importados, ou seja, fechar o livre fluxo comercial. Aquilo que inimigos fazem durante uma guerra é feito pelo nosso próprio governo, em tempos de paz. Trata-se de um tiro certeiro nos consumidores, sob o manto da proteção aos empregos nacionais.

Nenhum brasileiro com mais de 30 anos pode ignorar os efeitos maléficos desta medida. Basta se lembrar da fatídica “Lei da Informática”, aquela que criou enormes obstáculos ao progresso nacional ao obrigar todos a consumir máquinas obsoletas. Ou então o próprio setor automotivo antes da abertura realizada pelo governo Collor, quando éramos forçados a pagar preço de Mercedes por verdadeiras carroças.

O protecionismo comercial sempre foi uma bandeira dos nacional-desenvolvimentistas, que já atenderam pelo nome de mercantilistas no passado. Ocorre que suas falácias econômicas já foram devidamente refutadas desde o século XVIII, por Adam Smith, ou pelo economista francês Bastiat no século seguinte. Em outras palavras, trata-se de uma ideologia antiga e ultrapassada, que sempre trouxe atraso onde foi implementada.

Quando o governo Dilma argumenta que pretende proteger o emprego local com tais tarifas, ele está ignorando que a contrapartida é um gasto maior dos consumidores. Este gasto extra é o que Bastiat chamou de “aquilo que não se vê”, ou seja, o custo de oportunidade derivado do aparente benefício imediato. Um simples exemplo resume a falácia: se, enquanto consumidores, compramos o mesmo tipo de carro pagando menos, parece evidente que esta economia irá para outros setores, seja no consumo de outros bens, seja como poupança para investimentos.

O governo Dilma resolveu mostrar sua face verdadeira. Ninguém consegue sustentar uma máscara por tempo demais. E esta face agora exposta tem rugas que datam do século XVIII. O governo está derrubando, um a um, os mais importantes pilares de uma economia. Os gastos públicos cresceram demais e, até agora, nada além de pura retórica indica que vão cair na magnitude necessária.

Em vez de fazer o dever de casa, cortar gastos e encaminhar reformas estruturais ao Congresso, o governo Dilma escolhe uma perigosa rota de fuga. Permite mais inflação derrubando os juros na marra, fornece crédito subsidiado pelo BNDES a grandes grupos nacionais, e ainda cria barreiras protecionistas que afetam todos os consumidores. São, em sua essência, os principais pontos do manual nacional-desenvolvimentista, o velho e fracassado mercantilismo. É lamentável ver que uma presidente economista ainda acredita nestas tolas receitas. O custo será alto para o país.

sexta-feira, setembro 23, 2011

Lógica perversa

João Luiz Mauad, O GLOBO

Ainda no início de agosto, quando do lançamento do “Plano Brasil Maior”, já era possível imaginar as reais intenções do governo e apaniguados em termos de “política industrial”. Embora o objetivo oficial do plano fosse “aumentar a competitividade da indústria nacional, à partir do incentivo à inovação tecnológica e à agregação de valor”, tudo mais fazia crer que iríamos mesmo descambar para velhas políticas protecionistas, que, na prática, são exatamente o oposto do que normalmente chamamos de competitividade.

Dentre os vários sinais embutidos no escopo do plano, um era clamoroso: a nomeação de 14 representantes da dita sociedade civil para compor o “Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI)”, que será o “nível superior de aconselhamento institucional do Plano”. Entre os empossados, estavam empresários, sindicalistas e presidentes de entidades de classe, porém, sugestivamente, não havia um representante sequer do grupo mais interessado: os consumidores (porque pagam a conta).

Pois bem, foram necessários apenas 45 dias para que o governo cedesse ao forte lobby e resolvesse aumentar as alíquotas do IPI para veículos importados, decisão que o jornal inglês Financial Times avaliou como possível início de uma guerra comercial. Pensando bem, esta talvez seja mesmo a definição mais adequada para uma decisão que foge completamente à lógica econômica mais elementar. Resta saber quem serão os vencedores e os perdedores.

Durante as guerras – não as metafóricas mas as reais -, a primeira coisa que os exércitos procuram fazer é inutilizar as linhas de suprimento do inimigo. É absurdo, portanto, que em tempos de paz os nossos próprios governos façam exatamente aquilo que um eventual inimigo faria em tempo de guerra: obstruir a livre circulação de mercadorias.

A prosperidade de uma nação se mede não pelo dinheiro em circulação, mas pela quantidade de produtos e de serviços disponíveis para consumo, a preços acessíveis. Quanto mais abundante for o mercado, não importa a proveniência dos bens, maior será o conforto dos cidadãos. O comércio em geral é uma consequência lógica dos processos de especialização e divisão do trabalho. Quanto mais amplo for este processo, melhor para todo mundo. O fim de toda a atividade econômica é o consumo. O trabalho, portanto, é apenas o meio utilizado para alcançarmos aquele fim.

O foco da política econômica no trabalho e na produção, e não no consumo, está na raiz da maioria dos problemas econômicos criados pela intervenção dos governos na economia. É a oferta que deve estar voltada para as necessidades e anseios do consumidor, e não o inverso. Fazer do consumidor um mero instrumento para beneficiar empresas é estupidez.

A malfadada política nacionalista, apelidada de "substituição de importações", executada no passado através de reservas de mercado, cotas e tarifas de importação, controles de câmbio e desvalorizações periódicas da moeda, foi a principal responsável pelo retardamento técnico da nossa indústria. Progresso tecnológico exige investimentos maciços em pesquisa e desenvolvimento, fato que só ocorre em ambientes competitivos, onde as empresas brigam incessantemente pelas menores fatias do mercado, vale dizer, para satisfazer o consumidor. A lei de reserva de mercado para a informática ainda é o melhor exemplo de como esse tipo de política é contra-producente.

Ademais, a própria premissa de que se estaria preservando empregos domésticos através do aumento de tarifas alfandegárias é falsa, pois o dinheiro gasto a mais por um automóvel, para benefício de algumas poucas empresas, deixará de irrigar tanto a poupança (geradora de novos investimentos) quanto o consumo de outros bens e serviços - cuja produção gera empregos para outras categorias de trabalhadores.

Em resumo, a ação do governo acarretará os seguintes resultados: transferência forçada de renda dos consumidores para meia-dúzia de empresários; proteção de uma indústria ineficiente; manutenção de alguns empregos num determinado setor, em detrimento de outros tantos em outros setores; redução de novos investimentos.

Será que a boa política econômica deve incentivar a escassez e a carestia, no lugar de facilitar a abundância e os preços baixos? Qual é a racionalidade dessas leis, que operam dentro de uma lógica perversa segundo a qual todos nós (consumidores) devemos ser forçados a sustentar empresas nacionais cujo maior “mérito” é dispor de um lobby agressivo e muito bem articulado?

quinta-feira, setembro 22, 2011

Protectionism in Brazil: A self-made siege

The Economist

ON SEPTEMBER 15th Guido Mantega, Brazil’s finance minister, announced a 30-point increase in the country’s industrial-product tax on cars. The amount was startling, but the purpose familiar. Cars that are mostly made in Brazil, Mexico or the Mercosur trade block will be exempt; only importers will pay. “Brazilian consumption has been appropriated by imports,” he said in announcing the tax.

According to the National Carmakers’ Association, poor infrastructure and pricey credit and labour mean that making cars is 60% more expensive in Brazil than in China. Local manufacturers have long relied on high tariffs. Imports are gaining market share, from 16% of sales in 2009 to 23% this year. The new measure will probably reverse that trend, since it will increase the price of imports by a quarter.

The government has taken small steps to help local firms. In August it cut payroll taxes for a few labour-intensive industries. But mostly it has tried to keep out foreign goods and capital. Mr Mantega says Brazil is “under siege” from imports. Last month the government tweaked procurement rules to favour local products (Chinese-made army uniforms were an irritant). In the past year Mr Mantega has raised taxes on foreign capital. He wants the World Trade Organisation (WTO) to let countries levy tariffs on imports from places that artificially weaken their currencies.

This muscular approach continues a practice of rewriting rules to favour locals. Foreign firms can only pump oil in the recently discovered pré-sal oilfields as junior partners of the state-controlled Petrobras. Previously they could bid for all concessions on equal terms. Tax breaks will soon make locally built tablet computers a third cheaper than imports, leading Foxconn to set up a Brazilian plant to make iPads. The national development bank, BNDES, has transformed from a stodgy local lender into a chooser of national champions. Its loan book is now twice as big as the World Bank’s, and it funds foreign buying sprees by Brazilian firms.

Farmland is being treated as a strategic asset on a par with oil. Last year, spooked by the idea of foreign sovereign-wealth funds and state-owned firms buying up vast tracts, the government resurrected a 1971 law limiting the amount of rural land foreigners can buy. It was revived even though in the 1990s it was deemed incompatible with the new democratic constitution and open economy. The details are under review: foreigners may be allowed to buy a bit more without restriction, and still more if the government thinks it is in the national interest. But there is no timetable for passing a new law. The Brazilian Rural Society estimates that $15 billion of planned foreign agriculture investments are being dropped.

The strength of the new protectionist mood can be gauged by the government’s willingness to tolerate legal uncertainty and collateral damage. It reintroduced the antique land-ownership law despite knowing that its flawed design would almost halt much-needed foreign investment. Since it limits the total share of each district that can be owned by foreigners, many land registries are playing it safe and rejecting all foreign purchasers. Kory Melby, an agricultural consultant, advises foreigners on land purchases in Brazil. He says he has heard from furious sellers whose deals are now “as good as garbage”.

Car importers are mulling a challenge to the tax increase at the WTO. At issue is whether a tax that can be avoided by producing locally is an import tariff in disguise. Their trade group is trying a different legal tack: it says that the government was obliged to give 90 days’ notice (it gave only one). Chinese carmakers building Brazilian factories are lobbying hard. They say that they will be unfairly hit, since ramping up production in a new plant takes years. Foreigners whose plans are less advanced may opt for a complete rethink.

terça-feira, setembro 20, 2011

Boicote contra protecionismo

Quero lançar uma campanha nacional de boicote aos carros das 4 grandes montadoras. Que tal se todos ficarem 3 meses sem comprar carro novo? Não pode ser tão urgente assim trocar o carro. E esses meses já fariam o estoque das montadoras ficar empilhado nos pátios. É a pressão que podemos fazer enquanto consumidores. O que acham? Gostaram? Então repassem! Ninguém compra carro da Fiat, VW, Chevrolet e Ford por 3 meses. Boicote contra o protecionismo jurássico!

sábado, setembro 17, 2011

Lambança político-industrial

Editorial do Estadão

O governo acaba de promover, sob o disfarce de política industrial, mais uma lambança a favor de grupos selecionados. Com o pretexto de proteger o setor automobilístico e o emprego do trabalhador brasileiro, o Executivo federal aumentou o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e definiu condições para isenção das novas alíquotas. As condições beneficiam claramente uma parte das montadoras e criam, indiretamente, barreiras à importação de veículos e de componentes fabricados fora do Mercosul e do México. Ao estabelecer uma discriminação baseada em critério de conteúdo nacional, o governo se expõe a ser contestado na Organização Mundial do Comércio (OMC). O governo, segundo fontes ouvidas pela reportagem do Estado, admite essa possibilidade, mas decidiu correr o risco.

"O consumo dos brasileiros está sendo apropriado pelas importações", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Segundo ele, é preocupante ver a indústria acumular estoques e dar férias coletivas aos funcionários. É conversa sem fundamento. O número de veículos nacionais licenciados até agosto foi 2,2% maior que o de um ano antes, segundo a associação das montadoras (Anfavea). A receita de exportações de veículos foi 17,3% superior à de janeiro-agosto de 2010. A das vendas externas de máquinas agrícolas, 52,1%. O licenciamento de veículos importados aumentou, de fato, e chegou a 22,4% do total de licenciados. Em todo o ano passado a proporção foi de 18,8%. Mas, com produção, venda e exportação em alta, poderia o governo ter apelado para medidas explícitas de proteção? Conseguiria provar um surto de importação gravemente prejudicial para justificar as salvaguardas admitidas pela OMC?

A resposta parece implícita na escolha do protecionismo disfarçado. Uma bem fundada suspeita de dumping poderia ter justificado, igualmente, uma ação defensiva. As autoridades preferiram outro caminho, com o pretexto, também discutível, de incentivar o desenvolvimento tecnológico.

A ação adotada pelo Executivo favorece as indústrias em operação há mais tempo no Brasil e mais integradas na cadeia produtiva nacional. Na melhor hipótese, poderá induzir os demais fabricantes a elevar até 65% o conteúdo nacional de seus produtos. Mas isso não tornará a indústria mais competitiva. O investimento em tecnologia - pelo menos 0,5% da receita bruta, descontados os tributos incidentes sobre a venda - é uma das condições para a empresa se livrar das novas alíquotas. Esse requisito será com certeza cumprido ou contornado com facilidade, graças, especialmente, à notável ineficiência dos fiscalizadores.

Essa condição é obviamente um disfarce concebido para enfeitar uma decisão arbitrária e discriminatória, destinada basicamente à proteção de certos interesses particulares. A mera proteção, explícita ou disfarçada, nunca bastou e jamais bastará para tornar mais competitiva a produção de autopeças ou de veículos. As principais desvantagens desses e de outros segmentos da indústria são muito bem conhecidas - impostos, custos logísticos, entraves burocráticos, etc. - e não vale a pena repetir a longa lista. Nenhuma dessas desvantagens será sequer atenuada pelas novas medidas oficiais. Se o governo atacasse com seriedade esses problemas, todos os setores e toda a economia seriam beneficiados. Mas favores especiais são a negação da seriedade.

Não por acaso as novas providências foram aplaudidas pela diretoria da Anfavea, dominada pelas montadoras tradicionais, e pelo vice-presidente da Força Sindical. O presidente da Força é vinculado ao PDT, assim como o ministro do Trabalho, engajado na defesa dos novos benefícios antes do anúncio oficial.

Os brasileiros já assistiram a esse tipo de jogo, vantajoso para poucos e custeado por muitos. Como sempre, é muito mais fácil entrar na fila dos pedintes de favores do que pressionar o governo para cortar o excesso de gastos, diminuir impostos e favorecer o investimento necessário à modernização do País. O presidente da associação da indústria elétrica e eletrônica já entrou na fila, depois de elogiar a decisão do governo. Política industrial digna desse nome é outra coisa.

sexta-feira, setembro 16, 2011

Assédio dos importados


Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

Em mais uma medida totalmente absurda, sem pé nem cabeça do ponto de vista econômico, o governo Dilma decidiu elevar o IPI de veículos importados. Os preços poderão subir até 28%, penalizando os consumidores brasileiros. Argumenta-se que a intenção é proteger os empregos nacionais. O ministro Guido Mantega afirmou que o Brasil “passou a sofrer o assédio da indústria internacional”. Segundo ele, existe “o risco de exportarmos empregos para o exterior”.

O governo Dilma deixa cada vez mais evidente seu ranço mercantilista. Estas falácias econômicas já foram devidamente refutadas desde o século XVIII. Mas os brasileiros nunca aprendem! Não bastou a “Lei da Informática” para convencer esta gente dos males do protecionismo. Não bastou o país ser obrigado a comprar carroças ao preço de Ferrari antes da abertura comercial. A experiência nunca basta por aqui. É preciso insistir no erro até seu custo ficar alto demais para ser suportado.

Na lógica de Mantega, há muito mais que ser feito para “proteger” os empregos domésticos. Somos “assediados” por eletrônicos importados, como laptops e tablets. Chega da invasão da Apple! Vamos criar reserva de mercado para a Positivo. Somos “assediados” por filmes estrangeiros, especialmente os do “império” americano. Está na hora de aumentar as cotas para cinema nacional e preservar o emprego dos cineastas engajados que fazem filmes horríveis sobre comunistas como Olga e Che. E por aí vai.

Claro que ninguém com um pingo de bom senso cai mais nesse papo de “proteger emprego local”. É história para boi dormir. O dinheiro economizado com a compra do importado mais barato não desaparece, mas é direcionado para outro setor, gerando empregos. O que se deu, na verdade, foi pura pressão do lobby das montadoras, somado ao desejo do governo de aumentar a arrecadação (cumprir a meta fiscal assim é moleza).

No mercantilismo é assim: concentram-se os privilégios e dispersa o custo entre consumidores e pagadores de impostos. Grande modelo econômico!

sexta-feira, julho 01, 2011

Protecionismo e ufanismo: dois lados da mesma moeda


Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

O tema da fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour gerou forte reação na imprensa. A celeuma demonstra que o país está cansado de tanta safadeza nesta simbiose entre governo e grandes empresários. O aporte esperado de R$ 4 bilhões via BNDESpar é escandaloso demais, sintomático demais. A turma do andar de cima perdeu qualquer resquício de vergonha na cara, e resta aos simples mortais reagir, reclamar, fazer barulho.

Acredito no poder das idéias, e é fundamental não desistir, expor o que está na raiz desta relação mais que suspeita entre governo e grandes empresários. E o que seria isso então? Acredito que a mentalidade ainda predominante no país de que cabe ao governo ser locomotiva da economia, assim como um nacionalismo infantil que aplaude tudo que é “brasileiro”. Enquanto estas crenças ultrapassadas não mudarem, casos absurdos como este serão regra. Sai Abílio Diniz e entra algum outro oportunista qualquer, aproveitando-se dos privilégios do governo e da docilidade de um povo ignorante.

O que devemos atacar, mais até do que a própria malandragem do empresário paulista que declarou publicamente sua admiração ao governo atual, é a existência deste instrumento disponível para o uso dos malandros. Afinal, se tem algo que não falta no Brasil é malandro! Note-se que o Pão de Açúcar abusou da retórica nacionalista, com os aplausos do ministro mercantilista Pimentel, para justificar o uso imoral do BNDES na operação. Em carta aos acionistas em 2010, o presidente do Grupo Pão de Açúcar, já com elevada participação dos franceses do Casino, estampou em letras garrafais o “ORGULHO DE SER BRASILEIRO”. Às vezes eu tenho é vergonha disso.

“Precisamos manter o controle nacional no setor de varejo”, reza a cartilha ufanista. O motivo concreto ninguém explica, pois não tem explicação mesmo. Para os consumidores, não faz a menor diferença qual a nacionalidade dos principais acionistas das empresas varejistas. O que importa é ter livre concorrência, apenas isso. Em suma, o que importa é ter livre mercado, o oposto deste modelo fascista que concentra poder pela via política.

sexta-feira, junho 17, 2011

Etanol: Conquista importante nos EUA


Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

O Senado americano realizou votação histórica ontem. Com 73 votos a favor e apenas 27 contra, foi decidido o fim dos subsídios ao etanol no país. O governo torrava US$ 6 bilhões por ano para proteger poucos produtores influentes, à custa de todos os consumidores e pagadores de impostos americanos. Esta política protecionista já durava três décadas, mostrando o poder do lobby deste setor.

A decisão ainda não é definitiva, pois precisa ser aprovada pela Câmara – o que não será nada fácil. Mas já foi uma sinalização na direção correta, e por isso merece comemoração. O protecionismo serve apenas para transferir recursos dos consumidores para poucos produtores organizados, com influência política. Como o benefício é concentrado e o custo é disperso, os produtores se organizam para pleitear subsídios, enquanto cada consumidor paga alguns centavos extras e não se mobiliza contra o privilégio. E assim medidas protecionistas conseguem ser perpetuadas a despeito de seus resultados econômicos maléficos. No agregado, a conta sai cara.

O Brasil, que tem vantagem competitiva na produção de etanol, tem muito a comemorar com a decisão. Mas poucos se dão conta que isto vale para outros setores também, inclusive aqueles que o governo brasileiro tenta proteger na marra. O ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, pretende estimular o setor de tecnologia nacional justamente por meio de medidas protecionistas, resgatando a idéia fracassada da “Lei da Informática”. Trata-se do mesmo tipo de falácia econômica, típica daqueles que enxergam o comércio internacional como uma batalha de soma zero, em que importar é ruim e exportar é bom. Nada mais falso!

Que a decisão do Senado americano sobre o etanol sirva de combustível para o debate ideológico no Brasil. Protecionismo, subsídios, medidas que favorecem poucos produtores selecionados, sempre acabam por prejudicar os consumidores e os pagadores de impostos. Subsidiar o etanol lá é ruim, tal como subsidiar informática ou bois no Brasil é ruim. O ideal é deixar o mercado livre mesmo, para que a lógica das vantagens comparativas possa fazer seus “milagres” econômicos.