Rodrigo Constantino
"O poder sindical é essencialmente o poder de privar alguém de trabalhar aos salários que estaria disposto a aceitar." (Hayek)
Qualquer liberal entende que, por mais bem intencionada que seja, uma lei que tenta estabelecer um patamar artificial de retorno está fadada ao insucesso. É justamente este o caso do salário mínimo. Parece natural que as pessoas de bem observem os baixos salários de certas funções e fiquem revoltadas, defendendo que o governo passe a intervir para desfazer tal injustiça. Infelizmente, o inferno está cheio de boas intenções, e este é apenas mais um caso onde a boa intenção não consegue alterar a lógica econômica. O tiro sai pela culatra.
Todo preço será definido pela lei da oferta e demanda, não há como escapar disso. O salário é mais um preço, e segue o mesmo princípio. Os empresários assumem um risco pela incerteza do futuro, e antecipam parte dos ganhos aos trabalhadores, através de salários fixados independente do lucro do negócio. Em outras palavras, os empresários estão reduzindo as incertezas dos trabalhadores, definindo a priori seus ganhos, enquanto o resultado dos acionistas é totalmente incerto, podendo variar de um prejuízo que leva à bancarrota até um lucro extraordinário. Neste ambiente de riscos e incertezas, os empregadores procuram pagar o mínimo possível aos empregados, e este preço será totalmente dependente da produtividade do trabalho. Por outro lado, os empregados estarão buscando maximizar seus ganhos, como qualquer indivíduo. No encontro dessa oferta de trabalho com essa demanda pelo trabalho, ocorrerá uma troca voluntária, significando que aquele preço estabelece uma transação mutuamente benéfica, dado as circunstâncias. Fica claro que quanto maior a demanda por trabalho, ou seja, quanto mais competição houver entre empregadores, mais alto tende a ser o preço do salário. Em contrapartida, quanto maior for a oferta de trabalho, menor tende a ser o salário.
Com isso em mente, fica mais fácil entender porque o salário mínimo não ajuda os mais pobres. Ele costuma ser definido sempre acima deste nível de mercado, caso contrário não faria sentido existir. Mas isso faz com que empregadores desistam de contratar empregados com baixa produtividade, pois passa a não ser vantajosa tal contratação. Em A Solução Liberal, Guy Sorman trata do tema, explicando que "os que trabalham e não querem dividir construíram em torno da cidadela uma muralha, a mais alta possível: ela se chama ‘salário mínimo’". Os trabalhadores ficam assim protegidos contra todos aqueles cuja produtividade não vale o salário mínimo, isto é, os mais jovens e os menos qualificados. Ele continua: "Os sindicatos só protegem os sitiados que constituem sua clientela principal, não os desempregados, que não militam e nem são contribuintes". Além disso, "esses defensores dos direitos dos trabalhadores criaram uma técnica que mantém os sitiantes à distância: o seguro-desemprego". Quanto mais alto for este, menos os assaltantes mostram agressividade. Em resumo, o salário mínimo seria uma conquista dos sindicatos e seus aliados à custa de todo restante, principalmente dos desempregados que aceitariam trabalhar por um pouco menos.
Sendo Guy Sorman um francês, ele escreve com conhecimento de causa. A rigidez das leis trabalhistas na França é enorme, e os sindicatos são muito poderosos. Recentemente, o desemprego entre os jovens estava na faixa dos 20%, e entre os jovens imigrantes chegava a 50%. O caso brasileiro também é muito útil para exemplificar esta teoria. Com leis trabalhistas que datam dos tempos fascistas, além de sindicatos muito poderosos, o desemprego é elevado e a informalidade chega a praticamente metade do total de empregos. É o resultado claro do excesso de encargos e privilégios artificiais, eufemisticamente chamados de "conquistas trabalhistas". São conquistas sim, mas apenas daqueles dentro do sistema, que criam regras através do governo dificultando o acesso dos demais, mantidos no desemprego ou informalidade, sem benefício algum. Enquanto isso, as leis trabalhistas dos Estados Unidos são consideradas como uma das piores do ponto de vista de direitos legais, por serem flexíveis demais, e no entando os trabalhadores ganham muito mais que a média do resto do mundo.
Isso faz Guy Sorman concluir que "a chave do pleno emprego reside, pois, realmente na flexibilidade dos salários, o que não significa sua redução geral, mas sua adaptação, caso por caso, à situação da empresa". Ele compara a situação no Silicon Valley, com muita flexibilidade e praticamente sem desemprego, com a de Detroit, com regras rígidas, mas 12% de desemprego na época que o livro foi escrito, na década de 1980. Ainda assim, Sorman separa a solução liberal em duas vertentes, a do velho liberalismo e a do novo. Para o velho, bastaria "demolir as paredes da cidadela do emprego, reduzir o seguro-desemprego, suprimir o salário mínimo, colocar de novo todo mundo na concorrência, e a flexibilidade geral dos salários restabelecerá automaticamente o pleno emprego". Ele entende que isso está perfeito na teoria, mas considera politicamente absurdo, inalcançável. Os assalariados não teriam como ver de imediato os benefícios, e se organizariam para impedir tais mudanças.
Isso leva Guy Sorman à solução proposta pelo novo liberalismo, que seria defender uma espécie de "emprego para a vida toda". Em outras palavras, uma participação dos empregados nos negócios. Os empregados passariam a aceitar que os salários fossem tributários dos resultados de cada empresa. Sorman acredita que esta talvez seja a única condição para que a flexibilidade seja aceita. Os empregados estariam mais claramente unidos aos acionistas no risco do negócio. Teriam que aceitar as maiores incertezas e, portanto, maior volatilidade dos ganhos também. De fato, nos Estados Unidos vem ocorrendo algo deste tipo, já que o capital das corporações é totalmente pulverizado entre milhares de empregados através dos fundos de pensão e plano de opções de ações. Trata-se nitidamente de uma saída liberal, decidida entre empregados e empregadores, independente do governo. Este, no fundo, passa a ser visto como o inimigo comum tanto de trabalhadores como patrões, tributando pesadamente os ganhos da empresa.
De forma geral, o mais importante é entender que o "milagre" do emprego não tem nada de milagre na verdade, tampouco através da caneta estatal. Ele é fruto de uma lógica econômica, e o melhor caminho para valorizar o emprego é torná-lo realmente valioso. Isso é possível pelo aumento da produtividade do trabalho, de uma ampla competição entre empresas e de grande flexibilidade das leis trabalhistas.
10 comentários:
É bom lembrar que salários elevados artificialmente - pela força estatal, da qual depende os sindicatos e os rufiões que deles se valem - produzindo lucros pequenos, desestimulam investimentos que demandariam mais MO e com isso elevariam salários, lastreados na maior quantidade de bens e serviços disponíveis.
Ou seja, se as atividades não dão lucro capaz de recuperar os investimentos, estes não existirão, ou serão proporcionais aos lucros, e com isso, com menos empresas - demanda de MO - os salários não subirão naturalmente e tão pouco haverá produção para ser adquirida pelos salários artificialmente elevados.
Em resumo, os rufiões de trabalhadores - sindicalistas - apenas elevam nominalmente os salários de forma relativa, já que ao desestimularem investimentos e gerarem consumo estéril - que não decorrente da ampliação da produção - estão dificultando que o aumento nominal possa usufruir do aumento da produção disponível: se não houver produtos e serviços disponiveis para os valores nominais da moeda trocada, haverá aumento/adaptação nos preços que trarão o aumento nominal para o mesmo valor anterior.
Abraços
C. Mouro
"Emprego bom mesmo é no Estado..Trabalha pouco, ganha bem e é estável, não depende de produtividade..."
Assim pensa nossa sociedade, ninguém quer trabalhar, produzir, e sim sugar um pouquinho nas grandes tetas do Estado inchado...
Até quando isso??????
A gente pensa que o Brasil está mudando pura enganação, pois aqui na cidade de Curitiba, qualquer órgão público que vc vai têm estagiário para atender, pois os concursados não querem mesmo e fazer nada. Quem paga esse estagiário?
Caraca, o cara da foto é algum francês lutando contra a flexibilização das leis daquele país?
Foto boa mesmo, lembra o povo do Sintust, os xiitas da USP.
Corrigindo: "SINTUSP"
Sindicato forte hoje no Brasil só os que representam o setor público mesmo e alguns da metalurgia. O resto é resto.
Caro R. Constantino,
Então para os liberais a solução é implementar aspectos do modelo desenvolvido por Taiichi Ohno há, se não estiver enganado, quase três décadas? Pelo menos foi o que deixou a entender a idéia de “emprego para a vida toda”.
Saudações,
Baal Hammon
"Enquanto isso, as leis trabalhistas dos Estados Unidos são consideradas como uma das piores [...] e no entando os trabalhadores ganham muito mais que a média do resto do mundo."
Será que isso não acontece em função da economia americana ser mais forte do que as economias de todos os outros 7 países que formam o G-8?
Então na sua visão a solução seria o fim do salário mínimo? Se a resposta fosse tão fácil assim, nós viveríamos num paraíso.
Mesmo que extinguíssem os encargos sociais e o salário mínimo, isso não acabaria com o desemprego involuntário.Num país subdesenvolvido (como o Brasil) onde esse extinção fosse adotada, os trabalhadores desqualificados e com baixa escolaridade provavelmente ganhariam um salário médio bem abaixo do preço da cesta básica.Numa situação destas, eles prefeririam trabalhar de "bicos", adotando, por exemplo, "profissões" como "guadador de carros em centros urbanos".Estariam procurando emprego do mesmo jeito e estariam, portanto, DESEMPREGADOS.E mesmo que boa parte não estivessem procurando emprego, isso não mudaria em nada a conclusão, porque subemprego NÃO É emprego.Modelos econômicos neoclássicos que dizem que existiria pleno emprego em países que extinguissem o salário mínimo e os encargos sociais, estão implicitamente dizendo que mesmo em países pobres existe estoque de capital e tecnologia suficiente para empregar todas as pessoas do país com um salário que seria, no mínimo, igual ao salário de restrição (nível de salário que é considerado por um trabalhador individual suficientemente baixo a ponto de torná-lo indiferente entre trabalhar e permanecer desempregado).Conclusão:em países pobres, falta de emprego também é um problema de FALTA DE PRODUÇÃO POTENCIAL.Obviamente, os fundamentalistas de livre-mercado (como o autor deste artigo) não admitem isso porque sempre querem acreditar que o mercado nunca (ou quase nunca) é incapaz de fazer algo bom (como garantir o pleno emprego).
Como estudante de graduação de Economia, eu dou graças a Deus (apesar de ser ateu) pelo fato de hoje os professores de Macroeconomia estarem ensinando a função WS-PS versão Novo-Keynesiana da Teoria do Equilíbrio de Mercado de Trabalho.Ela é mais "sincera" e não traz deduções absurdas para esconder ideologias.
Você está se esquecendo de uma coisa, os empregados de uma empresa também são consumidores de todas as outras. Minimizar o número de empregados e seus salários pode parecer ótimo do ponto de vista de uma empresa, mas se muitas empresas começam a fazer isso você gera um problema crônico na economia como um todo pois faltarão consumidores. Ainda mais levando em conta que o processo contínuo de automação dos meios de produção tende a diminuir cada vez mais o HH necessário. Se houverem leis trabalhistas adequadas e planejamento macroeconômico (que não pode ser feito por empresas privadas a não ser que elas sejam monopolistas), a automação permitirá que no futuro a jornada de trabalho seja reduzida, melhorando a qualidade de vida da população. Mas em um sistema de liberalismo econômico, a automação que a princípio seria boa, gera um problema crônico já que os trabalhadores são cada vez menos necessários, e com menos assalariados para quem você vai vender os produtos? Não resta dúvidas, o processo de automação torna o seu liberalismo econômico obsoleto. Não é a toa que o governo americano está preparando um pacote que vai pagar U$1200 por casal mais U$300 por filho para tentar salvar a economia americana de uma recessão.
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