sexta-feira, março 21, 2008

Direto do Sarcófago


Rodrigo Constantino

O artigo do presidente do Ipea Márcio Pochman, no jornal Valor de quinta-feira (20-03-08), foi realmente um show de horrores. É tanta besteira que mal sei por onde começar as críticas. Normalmente, nem vale a pena perder tempo com isso, mas nesse caso creio se tratar de uma exceção, por dois motivos: a elevada posição do autor, dirigindo um importante órgão de pesquisas econômicas do governo; o fato de estas falácias contidas no artigo serem repetidas ad nauseam pela esquerda, desinformando os leigos no assunto. Faz-se necessário expor, portanto, a mentalidade absurda presente no texto.

Logo no começo, o autor tenta colocar no mesmo saco podre o capitalismo e o comunismo: “Sabe-se, contudo, que simultaneamente ao desarranjo do império soviético, o centro da nata do capitalismo mundial convive com sinais de perda de influência no novo cenário econômico internacional”. O que Pochman quer dizer com isso? Será que ele está tentando afirmar que o capitalismo e seu grande ícone, os Estados Unidos, fracassaram tanto quando a União Soviética fracassou? Isso foi alguma piada sutil que eu não consegui entender? A economia americana ainda responde por cerca de um quarto do PIB mundial. Poderia alguém no cargo ocupado por Pochman ignorar este fato?

O economista tenta explicar: “Nos dias de hoje, a China já responde por um quarto da produção mundial de máquinas de lavar, um terço da de televisores, dois quintos da de microondas, metade da de câmeras, dois terços da de foto copiadoras e 90% da de brinquedos eletrônicos”. Ótimo! Eis a maravilha do mundo globalizado: cada um pode focar naquilo que possui vantagem comparativa. Os Estados Unidos viraram uma economia basicamente de serviços, enquanto a China se transformou na indústria mundial, principalmente de produtos mais simples, por enquanto. Todos ganham com essas mudanças.

Mas Pochman parece ter entendido tudo errado sobre as causas do recente sucesso chinês: “De posse de duas a cada três gruas do mundo, o país do meio na Ásia constrói a base material mais moderna da atualidade, reinventando o sistema econômico com inovação e padrão tripartite de gestão da produção (empresa, sindicato e Estado)”. A China não reinventou nada, ela apenas permitiu um funcionamento mais livre do mercado. Com suas zonas livres, menor intervenção estatal, capital estrangeiro abundante e o direito de propriedade melhor estabelecido, o país conseguiu retirar milhões da miséria, uma herança socialista. A China está melhorando a despeito do Estado, não por causa dele. Pelo contrário: ainda há intervenção demais, como no caso do setor financeiro. Isso prejudica o país, diferente do que Pochman acha. Isso sem falar da completa falta de liberdade em diversos campos, pois não devemos esquecer que a China convive com uma ditadura.

As pérolas continuam: “O desarranjo imposto pelas administrações recentes nos Estados Unidos somente consegue ser superado pelo largo fracasso do modelo neoliberal defendido pelos organismos multilaterais e aceito passivamente por diversos governos latino-americanos e caribenhos”. Não obstante ser muito cedo para falar em “desarranjo americano”, de onde será que Pochman tirou esta idéia maluca de que o neoliberalismo falhou na América Latina? Ele simplesmente nunca nos deu o ar de sua graça! Os países que abraçaram o liberalismo – ou um grau mais elevado de liberdade – prosperaram, enquanto a América Latina fracassou justamente por se afastar deste modelo, mantendo um governo inchado, gestor de empresas, interventor ao extremo na economia. Como pode alguém que comanda o Ipea inverter tanto a realidade dessa forma?

Mas o economista não parece satisfeito, e continua cavando mais fundo no buraco: “O resultado hoje é reconhecido: abertura comercial, privatização e internacionalização da produção não permitiram expansão sustentada do crescimento, tampouco transferência tecnológica e expansão social”. Desde quando abertura comercial e privatização prejudicam algum país? Não existem casos deste tipo! Podemos analisar os casos do Chile, Irlanda, Espanha, Austrália, Nova Zelândia, Islândia, todos eles são exemplos de sucesso das reformas liberais, que Pochman tanto condena. O governo brasileiro, por outro lado, continua dono de várias estatais sem sentido, como o Banco do Brasil e a Petrobrás, e nossa abertura comercial foi muito tímida. Não foi a globalização que falhou: foi a sua falta!

Mas para quem pensa que viu absurdo suficiente, está enganado: “O projeto de país circunscreveu ao primitivismo do combate à inflação, acreditando que, por conseqüência, o crescimento econômico se sustentaria por si próprio”. Pochman, recentemente, reclamou que o presidente Lula foca demais na inflação. Será possível que ainda exista economista que acredita na falsa dicotomia de mais inflação, mais emprego? Não foi suficiente observar que os países com maiores taxas sustentáveis de crescimento foram justamente os países com menor índice de inflação? O que Pochman está sugerindo? Que o país aceite conviver com um pouco mais de inflação, para gerar um crescimento artificial? Inflação, como bem sabem os brasileiros, é o imposto mais perverso que existe, pois ataca diretamente os mais pobres. Com amigos como Pochman, os pobres brasileiros não precisam de inimigos!

As idéias do presidente do Ipea parecem surgir direto de um sarcófago. São tão ultrapassadas, tão absurdas, tão refutadas pela lógica econômica e pelas evidências empíricas, que espanta ainda serem levadas a sério nesse país. Mas, caso fossem apenas motivo de piada, como deveriam ser, aí sim o tal neoliberalismo teria chegado ao país, e com certeza a realidade seria muito diferente. Seria muito melhor!

21 comentários:

Anônimo disse...

"As idéias do presidente do Ipea parecem surgir direto de um sarcófago. São tão ultrapassadas, tão absurdas, tão refutadas..."

Rodrigo, quem está ultrapassado é você. A idéia de que a partir do fim da união soviética o mundo deveria se tornar totalmente capitalista liberal sem nenhum vestígio de política de esquerda é um paradigma dos anos 90, que acabou resultando em crises e recessões em diversos países onde a política neoliberal foi imposta, incluindo o Brasil. Na primeira década do novo século, os países que eram excessivamente neoliberais deram uma guinada para a esquerda, enquanto os países que eram excessivamente socialistas abriram mais os mercados, levando o mundo a uma política econômica mais balanceada entre capitalismo e socialismo, que resultou em uma série de anos de bom crescimento econômico mundial. Agora que estão sob a ameaça de uma recessão, até o governo republicano (de direita) dos EUA está recorrendo a forte intervenção estatal, tomando medidas que você prefere fingir que ignora porque vai contra o seu argumento. Você é um fundamentalista, o mundo andou e você parou nos anos 90, se baseando em teorias econômicas ainda mais ultrapassadas de Adam Smith, que hoje são consideradas simplistas demais para modelar com precisão o mercado.

Anônimo disse...

Na verdade, o liberalismo puro e simples já havia morrido em 1929. Desde então, o governo americano intervem na economia sempre que julga necessário, quando há ameaça de crise. Os EUA só defendem o liberalismo quando a maré está favorável para eles.

Anônimo disse...

Será que ele, com este gesto, não estaria preparando o colchão para amortecer o impacto que a volta da inflação poderá causar a seu Amo? Evidentemente que não faz sentido forçar a volta da inflação, por um índice minimo que seja, como forma de impulsionar o crescimento. Talvez seja essa a forma do "campineiro" e ex-secretário da "relaxa e goza" Marcio Pochman usa para definir Mais-Valia, ou seja, tudo que é produzido a partir do nada constitui excedente. A verdade é o seguinte: o que sustenta este gobierno no pudê é justamente o controle inflacionário, na faixa de um dígito anual e muito espetáculo circense. Ademais, o problema do Brasil é que tem muita gente com diferentes gostos principalmente aqueles que aprenderam a desfrutar das benesses (esmolas) e das palhaçadas que se faz a partir do Gran Circus Brasilia que tem em Ignacio Lulla da Silva sua maior atração.

André Barros Leal disse...

Acredito que esse foco todo na possível volta da inflação nao passa de (mais) uma desculpa para esse governo nao trabalhar.

Um governo de valor aproveitaria um momento favorável da economia para investir pesado em infra estrutura, pavimentando o caminho para um verdadeiro crescimento sustentável.

O que continua a me impressionar é a quantidade de defensores do coletivismo que ainda acrddittam nessa mentira que o capitalismo e o liberalismo falhou.

Quanto as intervençoes de governos nas economias, acho que seria interessante vermos um pouco de laissez faire e ver, ao menos uma vez uma economia sem governo se metendo no meio.

Acho engraçado falar de falhas no capitalismo quan do foi esse sistema que nos deu todos os avanços tecnologicos que possuimos hoje.

Anônimo disse...

Certamente que há problemas no capitalismo anonymous, mas citar a China como exemplo de solução através da reinvenção da gestão da produção é pura demagogia. Só se calote e mão-de-obra semi-escrava forem a solução:

CHINA MAQUIA CADÁVER

A China é vista hoje como o último trunfo do comunismo. Após a queda do Muro, o desmoronamento da URSS e a miséria generalizada de Cuba, a China goza no Ocidente da fama de prosperidade econômica, mesmo sendo comunista. Quando este argumento é brandido, sempre fico com um pé atrás. Pois se a China tiver 100 milhões de ricos, isto não significa sequer 10% da população do país. Que é feito dos outros 90%?

Nos dias em que vivi na Suécia, um diplomata contou-me que, segundo as autoridades chinesas, a população do país oscilava entre 800 e 840 milhões. Essa margem de imprecisão era de... cinco vezes a população da Suécia. A China está se preparando para as Olimpíadas de agosto próximo com obras de arquitetura colossais, de fazer inveja ao Ocidente. Mas que sabemos da miséria do país?

No Estadão deste domingo, Cláudia Trevisan nos dá uma idéia do drama vivido pelo gigante asiático, e geralmente escondido do grande público. Segundo a repórter, um contingente de 150 milhões de chineses – quase um Brasil – vaga pelo país em busca de emprego na construção civil e em fábricas que não exigem qualificação.

Chamados de “migrantes rurais”, eles formam uma população flutuante, considerada clandestina em seu próprio país. Como são oficialmente moradores do campo, não recebem benefícios que os habitantes da cidade usufruem nas áreas de saúde e educação e são tolerados em razão da forte demanda por mão-de-obra barata.

Se quiserem matricular seus filhos em escolas públicas, por exemplo, são obrigados a pagar mensalidades muito mais altas que as cobradas das pessoas registradas como habitantes das cidades - a China tem um sistema chamado hukou, que restringe a movimentação de pessoas pelo país e divide a população entre urbana e rural. Também terão dificuldade para vacinar os filhos e conseguir a mais básica assistência médica gratuita.

As relações de trabalho são precárias. Normalmente não há contrato e o pagamento do salário é feito depois de seis meses ou um ano de trabalho. “Se eu trabalhar só dois ou três meses e quiser ir para casa, a empresa não me paga ou paga apenas uma parte do que eu deveria receber”, diz Wu (camponês entrevistado pela repórter).

Pior ainda, há casos de não pagamento de salários. O governo chinês afirma que no período de 2004 a julho de 2007 ajudou migrantes rurais a recuperarem o equivalente a US$ 5,66 bilhões em salários atrasados. No início deste ano, começou a vigorar uma nova lei que estabelece punições mais severas para empresas que retiverem pagamento de operários, incluindo o de migrantes rurais.

Há quem tema a China como uma ameaça à economia ocidental. Se ameaça há, ela existe graças a um sistema de trabalho que podemos chamar de escravo. Ou seja, apesar de exibições arquitetônicas e de notícias sobre uma suposta prosperidade econômica, o comunismo na China continua sendo um fracasso, como o foi no mundo todo. Só o louvam as viúvas desesperadas de Moscou, que ainda querem um raminho em que segurar-se, em meio à catástrofe generalizada de um sistema ditatorial, obsoleto e ineficaz.
As Olimpíadas só servirão de maquiagem ao cadáver de uma ideologia moribunda.

Anônimo disse...

"Será possível que ainda exista economista que acredita na falsa dicotomia de menos inflação, mais emprego?"

É o contrário Rodrigo! A falsa dicotomia é menos inflação, menos emprego e mais inflação, mais emprego.
Falou!

Anônimo disse...

Aliás gostaria de dizer tambpem que prefiro os seus textos quando eles falam de economia. Aqueles de religião não são muito legais...

Anônimo disse...

Falando em religião, os europeus estão fazendo um grupo de pesquisa para descobrir pq as pessoas são religiosas:

http://www.economist.com/daily/news/displaystory.cfm?story_id=10903480

Anônimo disse...

Esse Márcio Pochman é um poço de imbecilidade e ignorância.

Como um cara desses está num cargo importante como esse é coisa que só o PT explica...

PT = vitória da mediocridade e da burrice!

Anônimo disse...

Cara, incrível isso.

O que me deixa com raiva é o fato dos esquerdistas acusarem o neo-liberalismo que nunca existiu por aqui, quando é a falta do mesmo que gera pobreza.

E os professores de geografia e de história, além dos universitários, de tanto repetirem isso, acabam impregando a mente das novas gerações.

Mises provou que não existe meio termo entre Estado Socialista e Estado Liberal. Pois quanto mais um Estado intervir, mais efeitos colaterais ele vai gerar e o mesmo achará que precisará intervir mais ainda para consertar o erro inicial.

Assim, qualquer estado social-democrata tende ao autoritarismo do Estado.

É como você gerar um borrão em um tecido, e querendo limpar o mesmo, acaba sujando mais ainda o tecido.

Anônimo disse...

Olha o radicalismo

Ricardo disse...

Muito bem posta sua crítica, Rodrigo.
Na verdade para mim o que mais salta aos olhos num artigo como o desse Sr. Marcio é:
1) O anti-americanismo, no sentido de "tomara que se ferrem" e "olhá lá, já estão se ferrando"
2) A insistência de recriar toda a ciência (econômica e etc) a partir de uma base nacional, tupiniquim (reinventar ao invés de aplicar)

Isso faz lembrar dois pontos. Primeiro da piada do Brasileiro (alguns dizem português) que foi trabalhar em Londres na construção civil. Quando estava na hora do almoco, lá dos andaimes, viu um Rolls Royce estacionar e pegar um cavalheiro muito bem vestido sair de lá, acompanhado de uma bela mulher. Um colega de trabalho na obra, inglês, apontou e disse "Um dia eu vou estar lá". O brasileiro apontou para o carro que já dobrava a esquina e gritou "Um dia tua ainda vais estar aqui!".

Essa é a diferença entre a ambição e a inveja.

O segundo ponto é a reversão lógica , do antigo mote da esquerda, que fazia graça e ironia com a frase "o que é bom para os EUA é bom para o Brasil". (que supostamente alguém de direita no Brasil usou, supostamente).

Pois bem, a esquerda brasileira depois de destruir a frase, que de fato no sentido absoluto é indefensável, resolveu abraçar o conceito oposto, mas igualmente indefensável, de que "o que é bom para os EUA não é bom para o Brasil". Ou seja, a CEPAL, o PT, o MST, o Brasil precisa inventar uma solução única e necessariamente diferente dos ingleses, americanos, chineses, etc... pois "o que é bom para XXX não é bom para o Brasil"!

Mas isso é ilógico, estúpido e arrogante. Embora as duas frases extremadas sejam burrice, certamente é mais burro se agarrar à segunda. Ser cego ao que dá certo, ou melhor, ser explicitamente contra o que deu certo em outros lugares, é sinal de masochismo-enrustido e arrogância-ignorante.

Anônimo disse...

"Mises provou que não existe meio termo entre Estado Socialista e Estado Liberal."

É pra rir?

"Pois quanto mais um Estado intervir, mais efeitos colaterais ele vai gerar e o mesmo achará que precisará intervir mais ainda para consertar o erro inicial."

É, é pra rir...
Então...hahahahahahahaha

Thyago, larga de ser mané, rapaz!
"O preço da liberdade é a eterna vigilância". A sociedade civil deve vigiar o Estado ostensivamente contra o excesso de intervenção, mas, não pode prescindir da ação do Estado para evitar situações de colapso. Veja, por exemplo, a crise atual do crédito imobiliário. A falta de regulamentação dos níveis de alavancagem ´dos fundos e as avaliações de risco maliciosamente equivocadas das agências americanas permitiram a criação de uma bolha gigantesca no mercado financeiro. Vc vai fazer o quê? Evocar Mises pra testemunhar a quebradeira? Avise ao FED que vc e o Constantino vão psicografar o economista e propor solução melhor para evitar o caos...
Essa lenga-lenga extremista é boa pra essas briguinhas de blogueiros mas simplesmente não se aplicam ao caso prático...Porque na prática a teoria é outra! No mundo real, os indivíduos, sejam funcionários do estado ou empreendedores do setor privado têm vícios de comportamento e podem agir contra vc quando for conveniente para eles. E vc precisa de mecanismos de defesa que as vezes vão ser a livre concorrência - nos casos em que os "vícios privados convertem-se em benefícios públicos" - e outras vezes vão ser a regulamentação do estado - nos casos em que os vícios privados exacerbarem a concentração dos meios de produção gerando monopólios ou oligopólios. NÃO HÁ SOLUÇÃO FÁCIL!
A tese liberal de Mises baseia-se em mercados eficientes e na isonomia de informação, o que é irresponsavelmente utópico para qualquer cidadão que tenha concluído pelo menos o curso primário.
Vc vai encontrar uma bela abordagem desta questão em "Vícios privados, benefícios públicos?" do Eduardo Giannetti.
Fique claro contudo, que nada disso justificará ou explicará a estupidez do Sr. Pochman.

Anônimo disse...

MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"

RECORDEM a sexta-feira, 14de março de 2008: foi o dia em que o sonho de um capitalismo de livre mercado e alcance mundial morreu. Por três décadas avançamos na direção de sistemas financeiros propelidos pelo mercado. Com sua decisão de resgatar o Bear Stearns, o Federal Reserve (Fed), instituição responsável pela política monetária dos Estados Unidos e principal defensor do capitalismo de livre mercado, decretou o fim de uma era.
O banco central americano mostrou em forma de ação sua concordância com o sentimento expresso por Joseph Ackermann, presidente-executivo do Deutsche Bank, ao declarar: "Não acredito mais que o mercado possa se curar sem interferência". A desregulamentação encontrou seu limite.
Não estou avaliando, aqui, se o Fed estava ou não certo ao resgatar o Bear Stearns da insolvência. Não sei se os riscos justificavam a decisão de não só servir como fonte de recursos de emergência ao banco de investimento como de aceitar ativos de crédito de risco no balanço do banco central. Mas os funcionários envolvidos são pessoas sérias. Devem ter tido motivos para suas ações.
Podem certamente apontar para os perigos do momento -uma crise que Alan Greenspan, ex-presidente do Fed, definiu como "a mais devastadora desde o final da Segunda Guerra Mundial"- e para o papel do Bear Stearns nos frágeis mercados atuais.
Meu julgamento gira em torno das implicações da decisão do Fed. Em resumo, permitir que o Bear Stearns falisse foi considerado como risco sistêmico. Foi uma posição desenvolvida apressadamente, é fato, em um momento de crise. Mas momentos de crise são aqueles em que novas funções emergem, em especial as práticas associadas à função dos bancos centrais como fonte final de recursos do mercado, que surgiu no século 19.
As implicações da decisão são óbvias: terá de haver regulamentação muito maior dessas instituições. O Fed oferece uma forma valiosa de seguro aos bancos de investimento. Isso de fato se torna evidente tendo em vista o que aconteceu no mercado de ações desde o resgate: as ações dos demais grandes bancos de investimento subiram consideravelmente. É uma demonstração visível do risco moral. O Fed decidiu que a "greve" do mercado monetário contra os bancos de investimento era o equivalente a uma corrida a um banco comercial.
Concluiu que, por isso, tinha de abrir as torneiras monetárias em benefício dessas instituições. Regulamentação maior certamente está a caminho.
Os lobbies que servem Wall Street com certeza resistirão a onerosas regras de capitalização ou liquidez, depois que a crise passar. Podem até encontrar sucesso. Mas sua posição se tornou intelectualmente insustentável. As instituições cuja falência representaria risco sistêmico precisam pagar pela proteção oficial que recebam.
Sua capacidade de desfrutar das vantagens pelos riscos em que incorrem enquanto transferem as desvantagens à sociedade precisa ser restringida. Não se trata de questão de simples justiça (ainda que esse aspecto evidentemente importe), mas também de uma questão de eficiência. Um cassino subsidiado mas não regulamentado certamente alocará mal seus recursos. Além disso, o subsídio se aplica agora não apenas aos acionistas mas a todos os credores. Seu efeito é tornar o custo dos fundos insensatamente barato. Esses incentivos grotescamente desalinhados precisam ser corrigidos.
Lamento profundamente o fato de que o Fed tenha considerado necessário agir como agiu. No passado, eu costumava esperar que a securitização fosse capaz de transferir parte substancial dos riscos para além do sistema bancário regulamentado, no qual os governos não mais teriam de intervir. Isso se provou ilusório. Um volume imenso de empréstimos arriscados, se não escancaradamente fraudulentos, tornou muito arriscados os mercados de instrumentos securitizados. Isso prejudicou as instituições, especialmente o Bear Stearns, que operavam de maneira intensiva nesses mercados.
No entanto, o fato de que o Fed tenha estendido sua rede de segurança aos bancos de investimento não é a única razão para que a crise represente um ponto de inflexão nas atitudes quanto à liberalização financeira. A confusão no mercado da habitação dos Estados Unidos (e talvez em breve de outros países desenvolvidos) também contribuiu. Ben Bernanke, o chairman do Fed, um homem conhecido pela moderação de seus pronunciamentos, descreveu boa parte dos empréstimos hipotecários de risco ("subprime") dos últimos anos como "nem responsáveis nem prudentes", em discurso cujos detalhes são de arrepiar os cabelos. Isso, na linguagem do Fed, quer dizer "criminosos e loucos". Uma vez mais, é preciso garantir que situação semelhante não aconteça de novo, especialmente porque os prejuízos causados por esses empréstimos ao sistema financeiro podem ainda se provar enormes. O colapso nos preços das casas, a inadimplência em alta e a execução de hipotecas prejudicarão milhões de eleitores.
Os políticos não poderão ignorar a situação deles, mesmo que isso resulte em um dispendioso resgate aos imprudentes. Mas as conseqüências certamente envolverão regulamentação mais pesada do que a atual.
Se os Estados Unidos chegaram ao ponto máximo de desregulamentação financeira e estão começando a recuar, as implicações para a economia mundial mais ampla serão consideráveis. Até recentemente, era possível dizer aos chineses, aos indianos ou a quem tivesse sofrido crises financeiras significativas, nas duas últimas décadas, que existia um sistema financeiro tanto livre quanto robusto. Mas esse já não é mais o caso. Será difícil, de fato, persuadir esses países de que as falhas de mercado reveladas nos Estados Unidos e em outros países de alta renda não representam um severo alerta. Se os Estados Unidos, com sua vasta experiência e recursos, não conseguiram evitar essa armadilha, por que, eles poderiam perguntar, deveríamos nos sair melhor?
Essas implicações de prazo mais longo para as atitudes quanto aos mercados financeiros desregulamentados estão longe de ser o único motivo para que a crise atual seja considerada importante. Temos ainda de superar a crise imediata.
O colapso dos lucros financeiros (tão significativos na economia dos Estados Unidos), o "crash" nos preços das casas e uma grande elevação nos preços das commodities formam combinação que deve resultar em longa e profunda recessão.
Para enfrentar esse perigo, o Fed já reduziu as taxas de juros de curto prazo a 2,25%. Enquanto isso, o Fed também está claramente correndo o risco de uma fuga aos passivos denominados em dólares e de uma retomada na inflação. É difícil ver motivo para que os rendimentos de títulos de longo prazo do Tesouro norte-americano sejam tão baixos, excetuado o desejo de controlar o passivo do Tesouro dos EUA, o mais seguro dos emissores de títulos denominados em dólares.
Kenneth Rogoff, economista da Universidade Harvard, recentemente citou o poeta Robert Frost -"alguns dizem que o mundo terminará em fogo; outros em gelo"- para descrever os riscos de ruína financeira (fogo) e inflação (gelo) que temos de enfrentar. O momento é perigoso. O momento é também histórico. Os Estados Unidos mostraram os limites da desregulamentação. Administrar essa virada inevitável sem jogar fora o que ganhamos nas três últimas décadas é um imenso desafio. E o mesmo se aplica a sobreviver incólume ao processo de redução de endividamento que está por vir. Mas precisamos começar no lugar certo: reconhecendo que até mesmo o passado recente é uma terra estrangeira.

Anônimo disse...

"Veja, por exemplo, a crise atual do crédito imobiliário. A falta de regulamentação dos níveis de alavancagem ´dos fundos e as avaliações de risco maliciosamente equivocadas das agências americanas permitiram a criação de uma bolha gigantesca no mercado financeiro."

É pra rir ?

O problema foi justamente que o governo decidiu regulamentar as avaliações de risco e promoveu uma expansão monetária.

Anônimo disse...

Regulamentar as avaliações de risco (???)promovendo expansão monetária (sic)???
Do que vc está falando?
É linguagem cifrada?
Deve ser javanês... ou melhor, jeovanês.
É cada um que aparece...

Anônimo disse...

"Regulamentar as avaliações de risco (???)promovendo expansão monetária (sic)???
Do que vc está falando?
É linguagem cifrada?
Deve ser javanês... ou melhor, jeovanês.
É cada um que aparece..."

Number ONE:

Já ouviu falar no Community Reinvestment Act ? Pelo visto, não. É uma lei federal americana (de 1977) que obriga instituições financeiras a conceder empréstimos a certas pessoas e empresas, mesmo que o risco de um calote seja maior. O problema foi justamente a "regulamentação dos níveis de alavancagem ´dos fundos e as avaliações de risco". Curiosamente, as medidas que você propôs para prevenir novas crises foram adotadas há 30 anos !

Number TWO

Você não sabe o que é expansão monetária ou não entende o que expansão monetária tem a ver com uma crise que iniciou no sistema monetário ? Não sei o que é pior.

Expansão monetária é imprimir mais moeda. O FED adotou essa política de expansão monetária há algum tempo e isso também ajudou a gerar a bolha. Dá uma olhada na teoria dos clicos econômicos de Mises.

Enquanto você fala mal do Mises, ele dá a explicação para essa crise de forma bastante clara.

Anônimo disse...

hauahuahhauahuauhau!
Vc vai mesmo sustentar as bobagens que disse antes?
Confesso, com um pouco de constragimento, que isso até me dá um certo prazer mórbido.
Jeová, vc é resultado da explosiva e deletéria mistura do orgulho com a ignorância.
Vamos explodir mais esta bolha...
Primeiro: Os níveis de alavancagem dos fundos NADA TÊM A VER com os créditos na ponta tomadora e sim com as operações financeiras feitas a posteriori com os títulos lastreados em hipotecas. Ou seja, as operações de hedge e de composição de carteiras que contém créditos hipotecários como garantia. É a sucessiva composição de produtos financeiros usando a mesma garantia que permitiram que os níveis de alavancagem fossem tão altos e não os empréstimos em si. Ou vc acha que a população de baixa renda dos EUA está aplicando dinheiro na Europa, no Brasil, na China, etc...?
Segundo: Expansão monetária é medida para cobrir o endividamento do governo, dos gastos públicos, e tem reflexos diretos na inflação e NADA TÊM A VER COM REGULAMENTAÇÃO DE CRÉDITO E DE RISCO, portanto não tente fazer emendas nas tolices que vc disse porque está ficando bem pior que o soneto...
Terceiro: agora vem o mais hilário...O FED adotou política de emissão de moeda????????????
Com que poderes???????????????
Para que então operar a taxa de juros???????
Para que vender títulos do tesouro ( considerados os mais seguros do mundo)??????
Até agora, a inflação americana não é problema. Poderá vir a ser se estas taxas de juros permanecerem em patamares tão baixos por muito tempo.
Quarto: não...pensando bem o mais hilário vem agora: O CRA (community reinvestment act) que foi inclusive revisado em 1995, determina EXPRESSAMENTE que sua regulamentação e implementação não criam critérios específicos para a avaliação de desempenho das instuições depositárias. Sendo esta avaliação de responsabilidade EXCLUSIVA destas últimas. Assim, a aprovação de linhas de crédito fica a critério da instituição que empresta (como deve ser...).
Portanto, meu caro Jeová, eu, que já desconfiava dos seus excessos em Levíticos, estou começando a achar que seu Novo Testamento segundo Mises vai resultar no mesmo destino de sempre: Genocídio. O genocídio intelectual vc já iniciou por aqui, resta saber até onde sua babação de ovo vai te levar...
Quinto: And last but not least...Tenha a santa paciência...Querer atribuir a crise de crédito hipotecário de 2007 a uma lei de 1977 e à emissão de moeda SÓ pra tentar ocultar o aspecto ESPECULATIVO da sobrealavancagem dos fundos só cabe mesmo na conta da mais completa desonestidade intelectual.

Rodrigo Constantino disse...

Da revista The Economist:

"If altering pay cannot stop manias, can regulation? The criticism that this crisis is the product of the deregulation of finance misses an important point. The worst excesses in the securitisation mess are encrusted precisely where regulation sought to protect banks and investors from the dangers of untrammelled credit growth. That is because regulations offer not just protection, but also clever ways to make money by getting around them.

Existing rules on capital adequacy require banks to put some capital aside for each asset. If the market leads to losses, the chances are they will have enough capital to cope. Yet this rule sets up a perverse incentive to create structures free of the capital burden—such as credits that last 364 days, and hence do not count as “permanent”. The hundreds of billions of dollars in the shadow banking system—the notorious SIVs and conduits that have caused the banks so much pain—have been warehoused there to get round the rules. Spain's banking regulator prudently said that such vehicles could be created, but only if the banks put capital aside. So far the country has escaped the damage seen elsewhere. When reformed capital-adequacy rules are introduced, this is an area that will need to be monitored rigorously.

It is the same with rating agencies, the whipping boys of the crisis. Most bonds used to be issued by companies, and to judge something AAA was straightforward. Perhaps back then it made sense for some investors, such as pension funds, to be obliged to buy top-rated bonds. But this rule created a boundary between AAA and other bonds that was ripe for gaming. Clever people, abetted by the rating agencies, set out to pass off poor credit as AAA, because they stood to make a lot of money. And they did. For a while."

Rodrigo

Anônimo disse...

Rodrigo,
Concordo que regulamentações mal feitas ou incompletas podem gerar oportunidades de ganhos predatórios. Mas não há, no artigo, a confrontação efetiva entre as falhas do sistema regulatório e a ausência do mesmo.
Ainda assim o autor reconhece e exemplifica que há formas prudentes de lidar com estas regras e finalmente alerta para o recorrente oportunismo do "clever people".
Ora, citei o Giannetti antes e vou citá-lo novamente:
"1) As regras do jogo e qualidade dos jogadores são os dois elementos essenciais de qualquer sistema econômico; 2)a qualidade dos jogadores - as variações de motivação e conduta na ação individual - afeta a natureza das regras do jogo e exerce, juntamente com elas, um papel decisivo no desempenho da economia."
"A noção de que o auto-interesse dentro da lei basta, e as regras do jogo do mercado significam "férias morais" para os jogadores - deve ser rejeitada."

Anônimo disse...

"Os níveis de alavancagem dos fundos NADA TÊM A VER com os créditos na ponta tomadora e sim com as operações financeiras feitas a posteriori com os títulos lastreados em hipotecas."

Eu citei os níveis de alavancagem equivocadamente. A intenção era apenas citar você defendendo a regulamentação das avaliações de risco.

"Expansão monetária é medida para cobrir o endividamento do governo, dos gastos públicos, e tem reflexos diretos na inflação e NADA TÊM A VER COM REGULAMENTAÇÃO DE CRÉDITO E DE RISCO, portanto não tente fazer emendas nas tolices que vc disse porque está ficando bem pior que o soneto..."

Eu não estou escrevendo tolices. Vocês está lendo tolices, pois não sabe interpretar. Eu nunca disse que havia uma relação na expansão monetária com a regulamentação. Eu disse que AS DUAS COISAS provocaram a crise.

"agora vem o mais hilário...O FED adotou política de emissão de moeda????????????
Com que poderes???????????????
Para que então operar a taxa de juros???????
Para que vender títulos do tesouro ( considerados os mais seguros do mundo)??????
Até agora, a inflação americana não é problema. Poderá vir a ser se estas taxas de juros permanecerem em patamares tão baixos por muito tempo."

Quando o FED baixa a taxa de juros, a oferta de moeda aumenta, sabia ? A inflação não é o problema do momento. O "problema" é a recessão, sendo que, para evitar essa recessão, que é um ajuste necessário às distorções causadas pelo governo, o FED está baixando muito as taxas de juros, o que causará uma inflação.

"O CRA (community reinvestment act) que foi inclusive revisado em 1995, determina EXPRESSAMENTE que sua regulamentação e implementação não criam critérios específicos para a avaliação de desempenho das instuições depositárias. Sendo esta avaliação de responsabilidade EXCLUSIVA destas últimas. Assim, a aprovação de linhas de crédito fica a critério da instituição que empresta (como deve ser...)."

O CRA OBRIGA OS BANCOS A CONCEDER EMPRÉSTIMOS PRA CERTOS TIPOS DE PESSOAS ! Como é, então, que o banco só aprova essas linhas de crédito se quiser ????

"And last but not least...Tenha a santa paciência...Querer atribuir a crise de crédito hipotecário de 2007 a uma lei de 1977 e à emissão de moeda SÓ pra tentar ocultar o aspecto ESPECULATIVO da sobrealavancagem dos fundos só cabe mesmo na conta da mais completa desonestidade intelectual."

A maior culpada pela crise atual é a expansão monetária. Graças ao CRA e a dificuldades para as construtoras americanas lançarem novos empreendimentos, além de regulamentações nos aluguéis, os efeitos da expansão monetária apareceram primeiro no setor imobiliário.