terça-feira, julho 28, 2009

A Locomotiva Galt



Rodrigo Constantino

“Tente obter alimentos usando apenas movimentos físicos, e descobrirá que a mente do homem é a origem de todos os produtos e de toda a riqueza que já houve na terra.” (Ayn Rand)

Edward Peter Garrett nasceu em 1878, e mais tarde foi um jornalista bastante crítico do New Deal. Conhecido como Garet Garrett, ele foi editor de importantes jornais, assim como autor de diversos livros, entre eles A Bubble That Broke the World, escrito em 1932. Em seu romance The Driver, escrito em 1922, Garrett faz uma lúcida defesa do capitalismo através da figura de um empresário que mantém uma obsessão pela produção de riqueza, pelo progresso, a despeito de tantos obstáculos em volta.

O paralelo entre The Driver e a mais famosa novela de Ayn Rand, Atlas Shrugged, escrita em 1956, fez com que alguns autores especulassem sobre a influência de Garrett nos escritos da filósofa objetivista. De fato, apesar da inexistência de provas concretas, pareceu-me evidente tal influência. O grande herói de The Driver chama-se Henry Galt, enquanto o herói de Atlas Shrugged é John Galt. Além disso, em determinado momento do livro de Garrett perguntam “Quem é Henry Galt?”. A pergunta “Quem é John Galt?” é central na obra de Rand, a ponto de ser usada como título na versão traduzida no Brasil. Mas deixando de lado a questão das semelhanças entre ambos os livros, o fato é que Garrett merece ser resgatado do ostracismo, pois seus pensamentos, como os de Ayn Rand, poderiam iluminar bastante a escuridão em que se encontram os debates econômicos atuais, onde muitos defendem um novo New Deal.

O romance The Driver começa com uma grave crise econômica, fazendo o desemprego subir a níveis alarmantes. Este ambiente de desespero geral é propício ao surgimento de messias salvadores. O pânico dos leigos faz com que a demanda por ações do governo seja extremamente forte. Uma lei em que a prosperidade seja decretada pelo Congresso e a felicidade geral possa ser estabelecida na Terra, eis o sonho de todos. Se faltar emprego, que o governo crie dinheiro, que o torne abundante, e assim todos poderão prosperar. A necessidade de apontar culpados, de se atacar bodes expiatórios, passa a dominar as emoções. Um senso de “denuncismo” começa a se alastrar. A mente, incapaz de compreender a realidade ou lidar com ela, encontra conforto nas superstições, nas crenças irracionais. É mais fácil acreditar que pensar.

Mas nem todos sucumbem a esta psicologia das massas. Esse é justamente o caso de Henry Galt, um especulador de Wall Street obcecado por ferrovias. O perfil do Galt de Garrett se assemelha em inúmeros aspectos ao do Galt de Rand: ele é um individualista que não liga muito para a opinião dos outros sobre si próprio, que deseja apenas construir, conquistar suas metas, vencer seus desafios. Trata-se de alguém com enorme autoconfiança, capaz de mergulhar fundo e apostar tudo em suas convicções, sem se entregar ao medo comum. O dinheiro não é seu principal motivador, mas sim as conquistas criadoras. Enquanto os diretores da principal ferrovia do livro, incluindo seu presidente, haviam desistido dela, mantendo um estado de letárgica passividade, Galt tinha planos em mente, acreditava em seu futuro, queria apenas a oportunidade de colocá-los em prática. Quando outros vendiam suas ações na ferrovia, Galt acumulava participação nela, aguardando sua chance de assumir o comando e colocá-la no rumo da prosperidade novamente. Galt era audacioso enquanto os outros eram covardes.

Galt não tinha tempo para o supérfluo, para política ou para discursos populistas. Ele tinha uma ferrovia para dirigir. Tampouco ele se importava com os adjetivos que começavam a surgir na imprensa o desqualificando. O “ambicioso especulador” intimidava muitas pessoas, despertava medo muitas vezes, representava uma ameaça e incomodava principalmente os concorrentes acomodados ou perdulários. Em vez de se preocupar com aparências ou com suntuosos escritórios, Galt desejava tornar a ferrovia uma máquina de lucro, através da maior eficiência possível. Esse lucro seria reinvestido no crescimento da ferrovia, em aquisições que poderiam agregar valor, em mais produtividade. Tudo isso seria possível somente se ela atendesse melhor a demanda. A satisfação dos clientes e o lucro da ferrovia caminhavam juntos, contra os interesses dos concorrentes incompetentes e do governo parasitário.

Entretanto, a indiferença de Galt em relação aos políticos, jornalistas e à própria “opinião pública” iria custar caro no futuro. Acumulando inimigos em elevados escalões na sua trajetória de sucesso, Galt iria sofrer um ataque orquestrado por todos aqueles que gostariam de impedir a livre concorrência. O cenário econômico era adequado para a manipulação do público também, tantas vezes ávido por um bode expiatório rico. A simbiose entre o oportunismo de seus inimigos ricos e a inveja dos ignorantes era uma combinação poderosa. Galt começou a ser vítima de inúmeros processos legais, auxiliados por leis vagas e arbitrárias, que sempre podem ser modificadas de acordo com os interesses dos políticos. Ao mesmo tempo, os jornais escreviam diversos ataques a ele. Era uma grande conspiração contra Galt, que lutava praticamente sozinho à medida que antigos aliados, sentindo que a derrota era inevitável, abandonavam-no.

Mas Galt era mais forte que todos eles. Venceu as batalhas, mas acabou tão desgastado, que foi vítima de um derrame. Se não era possível destruir Galt, então conseguiram efetivamente matá-lo. No mundo real, os poucos e louváveis como Galt acabam quase sempre liquidados também, vítimas do avassalador poder político, alimentado por uma opinião pública manipulada. Em tempos de crise econômica, mais que nunca, são esses poucos empresários corajosos que podem servir como locomotiva do progresso, da recuperação econômica e criação de riqueza e empregos. Mas são justamente eles os alvos preferidos dos políticos oportunistas e dos invejosos de plantão. Eles são as grandes vítimas de programas como o New Deal de Roosevelt, ou sua versão moderna de Obama. E quando pessoas como Galt perdem, é o próprio povo que perde também. Sem as locomotivas, o restante do trem fica sem rumo definido, sem condições de avançar. O jeito mais rápido de obstruir o progresso é atacar aqueles capazes de criar o progresso.

4 comentários:

Felipe André disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Felipe André disse...

Muito interessante, Rodrigo. Não conhecia esse romance, e realmente há boas similaridades entre as histórias. Como grande fã de Ayn Rand e sua filosofia é sempre interessante ver outros romances que seguem a mesma linha de pensamento. Vou procurá-lo.

patricia m. disse...

Parece que o Galt de Garrett eh o Henry "Hank" Rearden de Rand... Ou uma mistura, enfim (Henry de Rearden + Galt de John). Mas ate ferrovias sao centrais ao tema, heim... Incrivel tamanha semelhanca.

José Carneiro da Cunha disse...

Òtimo comentário e colocações. Procurarei o livro para ler.

abs

José Carneiro