terça-feira, abril 03, 2012

Um peso, uma medida

Rodrigo Constantino, O GLOBO

Não existe oposição liberal organizada no Brasil. Há uma clara hegemonia da esquerda entre os vários partidos. Mas o DEM seria o mais próximo desta bandeira que prega menos intervenção estatal e mais liberdade econômica. E, dentro do DEM, o senador Demóstenes Torres tem sido uma das vozes mais firmes em defesa destes valores, assim como da ética.
Por isso é fundamental usar o escândalo envolvendo o senador e sua mais que suspeita amizade com um contraventor para marcar as diferenças entre a esquerda e os liberais, estes ainda sem representação política.
Quando os homens estão unidos por princípios claros, não há espaço para arbitrariedade. Os princípios servem como critério objetivo para julgar os atos. Em contrapartida, quando se trata de um grupo tribal, o seu membro será sempre tratado com complacência, enquanto os "de fora" serão duramente condenados. O uso de dois pesos e duas medidas é característica comum a estes grupos, e vale tudo para salvar a pele do companheiro, por mais criminoso que tenha sido seu ato.
Aristóteles dizia que uma sociedade adequada é governada por leis, não por homens. Com isso ele queria dizer que devemos adotar um império de leis igualmente válidas para todos, em oposição ao poder arbitrário que aos amigos tudo dá, enquanto aos inimigos aplica o rigor das leis. Da mesma forma, uma associação adequada é unida por idéias, não por homens, e seus membros são leais às idéias, não ao grupo. A máfia, por exemplo, é o oposto de tal associação, pois seus membros devem lealdade aos demais membros, e não a valores objetivos.
Com esta distinção em mente, fica claro que boa parte da esquerda sempre adotou postura tribal ou mesmo mafiosa. Seus membros são tratados como “especiais”, detentores de um salvo-conduto para “malfeitos”. Os fins “nobres” sempre justificam os meios obscuros, e os crimes perpetrados por seus líderes nunca são crimes, ao contrário daqueles realizados pela oposição. São sempre dois pesos diferentes, para se obter duas medidas diametralmente opostas.
Foi assim que um assassino frio e cruel como Che Guevara chegou a se tornar herói, ou a mais longa e opressora ditadura do continente até hoje é defendida. Abro um parêntese para lembrar que tanto Mussolini como Hitler, apesar de tratados como os monstros que eram, porque são vistos como de “direita”, eram na verdade coletivistas antiliberais que nasceram na esquerda socialista e sempre condenaram o capitalismo. Fecho o parêntese.
É com base na mesma lealdade mafiosa que alguns petistas sempre partem para a acusação de uma fantasiosa “mídia golpista” quando escândalos envolvendo seus aliados vêm à tona. Curiosamente, eles logo esquecem esta imprensa “golpista” quando o escândalo envolve a oposição. Dois pesos e duas medidas, a marca registrada da nossa esquerda. Para eles, o camarada não é um “homem comum”, mas sim alguém acima das leis. Não se importam com “o que” acontece, mas sim com “quem” acontece.
Os liberais não aceitam esta postura. No final de 2011, escrevi para a revista “Época” algumas palavras em homenagem justamente a Demóstenes Torres. Não conheço o senador pessoalmente, mas acompanhei suas lutas no Senado. Esteve quase sempre do lado que julgo correto. Condenou as cotas racistas, denunciou a doutrinação ideológica pelos órgãos estatais, pregou maior rigor penal para combater a criminalidade, atacou sempre o desvio de recursos públicos e defendeu a urgência de um partido que tenha a economia de mercado e sólidos valores morais como plataforma.
Não poderia concordar mais! O que falta em nossa política é um partido que rejeite esta visão predominante de que o governo é uma espécie de deus clarividente capaz de gerar progresso por decreto. Países com mais intervencionismo estatal invariavelmente acabam com menos riqueza e liberdade. E nada mais absurdo do que combater o racismo com segregação racial.
Logo, Demóstenes mereceu cada elogio que fiz. Afinal, eu focava no “que” foi dito, e não em “quem” o disse. Da mesma forma, agora que gravações comprometedoras vieram a público, enorme decepção à parte, continuo focando no “que” mostram os fatos, não sobre “quem” eles recaem. Defendo uma investigação minuciosa e, se for o caso, a severa punição do senador. Sob meu ponto de vista, ele é apenas um homem comum, um indivíduo como qualquer outro, que deve respeitar as mesmas leis.
Infelizmente, isso é algo que a esquerda em geral e os petistas em particular parecem nunca compreender: a importância de se ter apenas um peso, e uma medida.

19 comentários:

Bruno De Cnop disse...

O que está ficando claro neste caso do DEM, é a diferença entre a velha tradição do político corrupto e a nova cultura da quadrilha de políticos corruptos.

No DEM a expulsão do senador parece eminente, já na quadrilha do PT, quanto mais emporcalhado mais ele é protegido para não denunciar os demais. Isto se chama RPG (Rabo Preso Generalizado).

Este é o grande legado do Lula e do PT para o Brasil, a corrupção desenfreada.

Anônimo disse...

Rodrigo, e a IDELI - como fica? E o mensalão? E o agnello? E o filho do LULA?

Enfim, para os amigos tudo e para os inimigos, a lei

eta gentinha hipócrita esta do PT

Felipe disse...

"Dois pesos e duas medidas, a marca registrada da nossa esquerda."

No caso, acho que marca registrada de todas as esquerdas, porque nunca vi alguma que agisse de outro jeito. No mais, ótimo texto.

Anônimo disse...

Rodrigo, só prá seu conhecimento, a editoria da seção de cartas d'O Globo não está aceitando nenhuma carta com teor semelhante à sua coluna de hoje, ou seja, apontando a diferença da postura do DEM e de seu eleitorado para a postura do PT e de seu eleitorado diante de escândalos. Foram duas tentativas. No sábado, editaram miseravelmente uma carta que meu irmão enviou. Hoje, sequer publicaram uma que escrevi com o cuidado de não deixar margem a que trechos pudessem ser eliminados. Parece que estão com medo de ser identificados como aliados do DEM pela esgotosfera e pela militância petista. Ao mesmo tempo, permitem o trabalho sujo de demonização da oposição que o Ilimar Franco realiza com gosto na página 2. Infelizmente, esse é o melhor jornalismo que temos.

Anônimo disse...

Rodrigo, só prá seu conhecimento, a editoria da seção de cartas d'O Globo não está aceitando nenhuma carta com teor semelhante à sua coluna de hoje, ou seja, apontando a diferença da postura do DEM e de seu eleitorado para a postura do PT e de seu eleitorado diante de escândalos. Foram duas tentativas. No sábado, editaram miseravelmente uma carta que meu irmão enviou. Hoje, sequer publicaram uma que escrevi com o cuidado de não deixar margem a que trechos pudessem ser eliminados. Parece que estão com medo de ser identificados como aliados do DEM pela esgotosfera e pela militância petista. Ao mesmo tempo, permitem o trabalho sujo de demonização da oposição que o Ilimar Franco realiza com gosto na página 2. Infelizmente, esse é o melhor jornalismo que temos.

Fernando Felipe disse...

Não custa lembrar a doutrinação ideológica de décadas, que já seduziu algumas gerações de jovens desatenciosos, reiterando em suas cabecinhas de melão o maniqueísmo bocó de comunistas/petistas "do bem" e capitistas "do mal". Isso ainda cola! E muito! Por mais contraditório que isso seja, já que a petezada e todo comunista adora grana, desde que não tenha que produzi-la!

Não custa lembrar também o apparatchik que Dirceu e Martins montaram, contratando ex-jornalistas a peso de ouro, e pagos com bufunça pública, simplesmente para achincalhar seus adversários e os que ameaçam sua hegemonia no poder. São milhares de bocozinhos que visitam esses lixos.

Por fim, acho boa a distinção entre máfia e associação, mas a petezada há muito aprofundou o conceito de máfia, adentrando em outra categoria mais complexa, aproveitando-se de alguns elementos das teorias de Gramsci.

O processo de petezização no Brasil está num estágio avançado. É um alento ver Constantino, Reinaldo, Pannunzio, e alguns outros brigando bravamente para combater essa praga.

Anônimo disse...

Rodrigo eu já perguntei isso aqui e vc não respondeu. Porque o Instituto Liberal não cria um partido político?

Rafael Gargalhão disse...

Existe uma contradição entre ser político e ser liberal. Políticos, até por senso de sobrevivência, defendem o reforço do poder estatal. Liberais lutam pela sua diminuição.

Perceba-se que mesmo governos identificados com o liberalismo, como o de Reagan e Tatcher, na prática foram muito menos liberais que o propagandeado. Basta ver, por exemplo, o quesito "tamanho da carga tributária" no início e no final de suas gestões: pouca diferença.

Liberalismo de verdade, creio eu, somente pode existir fora da política institucional, defendido por indivíduos que não se encontrem ligado a nenhum grupo específico da sociedade.

Anônimo disse...

Rodrigo, a frase: "Porque o Instituto Liberal (ou o Milenium) não cria um partido político?" pode lhe estar parecendo um elogio (não que eu não pudesse fazê-lo!), mas trata-se de uma pergunta mesmo! Vc poderia respondê-la? Pura curiosidade!

Fernando Felipe disse...

Rafael Gargalhão, interessante teu argumento, mas qual seria a "contradição" - conceituando-a como impossibilidade lógica de duas coisas coexistirem - em um camarada ser um político e defender o ideário liberal, ou seja, em ser um político liberal?

Acho que há sim dificuldades em ser um político liberal, especialmente no Brasil, por diversas razões, mas há algo que impossibilite de maneira absoluta a existência desse ser alienígena?

Se eu estiver falando besteira, me avise, ok? Talvez não tenha entendido direito. Abraço!

Rodrigo Constantino disse...

O Instituto Liberal é um think tank, e assim deve permanecer. Outros ILs já até mudaram o nome, como em POA, para Instituto Liberdade, para não serem confundidos com o Partido Liberal antigo. Política é um meio um tanto sujo. É importante ter liberais no meio, mas não devemos misturar a função de quem combate no campo das idéias, com a dos políticos.

Anônimo disse...

Ok só não acabem por me convencer que liberalismo de verdade só existe na cabeça dos liberais radicais. Precisamos mais de ações do que de idealismos, principalmente se levarmos em considedação o atraso em que estamos.

Gustavo Sauer disse...

Já há uma tentativa para criar um partido liberal. Procure no google sobre o LIBER

Anônimo disse...

Para o Anonymous que postou às 8:52:

Existem três organizações que estão tentando virar partidos com idéias liberais:

http://oglobo.globo.com/pais/jovens-se-organizam-tentam-criar-legendas-da-nova-direita-4305063

Anônimo disse...

Gustavo, Rodrigo, vcs votariam no Liber?

Anônimo disse...

É isso aí! Falou e disse tudo, ponto.
Parabéns!

Bruno Tôrres de Melo Rêgo disse...

Rodrigo, sua defesa, que também é minha, do liberalismo é perfeita. Sua análise econômica também. Sabemos que economia e política são indissociáveis e complementares, mas quando você fala de política, permita uma crítica de um admirador, é uma tragédia. Acredito fielmente que você defenda todas as punições cabíveis ao Demóstenes, mas duvido que aconteça alguma coisa com ele. Demóstenes deixou o DEM porque a situação é absolutamente insustentável e o desgaste seria absurdo para o partido, só por isso. Se os liberais do DEM fossem tão éticos como você diz, não permitiriam César e Rodrigo Maia em seus quadros e nem faria aliança com Clarissa, Rosinha e Anthony Garotinho.

Não há liberal, por mais ético que seja que consiga resistir à democracia burocrática brasileira. Isso não é uma defesa das ditaduras. Mas a democracia brasileira aliada à burocracia e a pusilanimidade da nossa Justiça é o melhor dos mundos para os corruptos e corruptores. Imagine o melhor dos homens, inteligente, honesto e cheio de boas intenções tentando mudar as coisas no congresso nacional, no senado ou na presidência. Ele seria enrolado pelo sistema de uma tal maneira que se tornaria absolutamente inútil e indiferente. Enquanto não houver JUSTIÇA para todos nesse país nada vai mudar. O Demóstenes tinha que ser preso, mas vai continuar solto. E sabe o que isso significa, de modo bem simples e rasteiro? Que o crime compensa. Onde não há ordem quem tenta seguir a ordem se sente um verdadeiro babaca enquanto quem não segue a ordem faz o que quer. Não é que eu vá justificar meus erros com os erros dos outros, eu sei que as coisas começam a mudar por mim, mas muita gente vai pensar diferente de mim.

Anônimo disse...

Lembremos que DEM é o PFL...:-P

A postura mais anti-liberal de Demóstenes foi em relação a "war on drugs", mais especificamente contra uma mudança na política quanto a maconha e até mesmo contra a discussão do assunto.

Bem, considerando que ele é sócio de mafioso (ingenuidade achar que 'bicheiro' se limita ao jogo ilegal), faz sentido ele defender os interesses do narco-tráfico e manter a política atual, tão lucrativa ao mercado negro.

Anônimo disse...

o problema do LIBER, q eh muito anarquista, a maioria de seus "fundadores" eh anarquista..... Minarquistas sao vistos como socialistas .... ou seja, um grupo de imbecis radicais q parecem ter saido do PSTU pq finalmente descobriram as vantagens do Livre-Mercado.....ou vc eh socialista ou anarco-capitalista.... sao tao retardados como a extrema esquerda, pregam um paraiso q nao existe.... o Brasil precisa de um Partido Liberal q defenda a Democracia Liberal e o Estado de Direito, o Estado exercendo apenas o q eh legitimo, Defendar a Vida, Liberdade e Propriedade....o resto a cargo da Livre-Iniciativa... Mas isso eh trabalho para uma Revolucao Cultural de DECADAS....e nao para radicalismo juvenil de idiotas uteis

Alemao