Carlos Alberto Sardenberg, O GLOBO
Quase todo mundo tem uma bronca com companhia telefônica. Celular que não pega, conta alta e ininteligível, instalação demorada e errada de internet - a lista é infinita.
É o fracasso da privatização, anima-se muita gente por aí. Desse ponto de vista, seria natural que brotasse um movimento pela reestatização das teles, mas não é o que se vê. A atitude dominante é reclamar, infernizar a vida das empresas com burocracias e impor prejuízos a elas.
Acham com isso que estão punindo as empresas, mas acertam no consumidor.
Considerem o caso recente de Porto Alegre, onde o Procon suspendeu a venda de novas linhas de celulares, por falhas no serviço atual. Os celulares não funcionam em certas áreas. Enquanto isso não for resolvido, as teles amargam a perda de vendas. Quem precisa de um celular, fica na fila.
Ora, celulares dependem de antenas e, pois, de torres. Quanto mais, melhor o sinal. Logo, parece lógico, as teles não podem mesmo vender linhas se não têm as torres.
Mas, no outro lado da história, os executivos das teles notam que as sete licenças necessárias para levantar uma torre em Porto Alegre não são concedidas em menos de seis meses, isso se a burocracia funcionar perfeitamente. Ou seja, leva muito mais. Além disso, mesmo quando saem as licenças, fica proibido colocar torres e antenas em tal número de locais que não há como evitar as "zonas de sombra".
Acrescente-se ao quadro que as empresas, ao vencerem licitações e receberem outorgas de frequência, são obrigadas a cumprir prazo para oferecer as linhas.
Resumo da ópera: o poder público concede, depois impõe regras que limitam a instalação de antenas e pune as teles por não entregar o serviço adequado.
Além das normas nacionais, há mais de 250 legislações estaduais e municipais, criando uma teia de entraves.
Tanto é problema que o Comitê Organizador da Copa fixou procedimento especial para as 12 cidades-sede. As licenças para instalação de torres têm de sair em no máximo 60 dias. Isso porque as teles estão obrigadas a instalar as redes de quarta geração (4G) até abril de 2013. E essa frequência exige um número maior de antenas. Porto Alegre é sede. Seu prefeito, José Fortunati, assinou o protocolo, mas a legislação restritiva continua em vigor. Resultado, estão todos lá tentando desfazer o embrulho.
No país, e mundo afora, as restrições baseiam-se em dois pontos. Um é urbanístico: as torres, obviamente, afetam o visual. Alguns dirão: estragam o cenário. Outros entenderão que armações com arquitetura avançada podem ser um ganho para a paisagem urbana. O outro ponto é ambiental e de saúde: uma preocupação com as consequências da emissão de raios. O que restringe, por exemplo, a colocação de antenas em áreas populosas, ali onde são mais necessárias.
Mas a Organização Mundial de Saúde já disse não haver evidências de que as antenas de celulares e os próprios causem danos às pessoas. Quanto à paisagem urbana, é decisão das populações.
Nada, portanto, que não se possa resolver com leis e regras simples e claras. Por que temos o contrário?
Pelo viés anticapitalista. Vamos reparar: a privatização das telecomunicações é um êxito espetacular. Em poucos anos, saímos da idade da pedra para o quinto mercado mundial de telefonia, com mais de 250 milhões de linhas.
Parte dos problemas vem dessa rapidez. Em um mercado muito competitivo e sob pressão para cumprir prazos da concessão, as teles mandaram ver. Parece claro que, não raro, faltaram equipamentos e mão de obra.
Mas está aí instalado e funcionando, de novo, o quinto sistema mundial de telefonia e internet, em constante processo de modernização. Por isso mesmo, nem os mais anticapitalistas pedem a reestatização. Mas sustentam o viés contra a empresa privada, especialmente a grande. É vista como predadora, ávida de lucros, para o que não hesita em esmagar os consumidores.
Logo, tem de ser regulada, controlada e taxada com impostos pesados, para que seus lucros sejam divididos com a sociedade, como dizem.
Tudo que conseguem é mandar a conta para o consumidor, de duas maneiras. Ou há barreiras à ampliação dos serviços, gerando ineficiência econômica, um custo para todos, ou o preço fica mais caro. Impostos, taxas e contribuições já formam a maior parte da conta.
Esse viés está espalhado dentro e fora do governo. Vai muito além das teles. Reparem a demora do governo em avançar nas concessões, mesmo depois de colocá-las como meta, e observem os termos e exigências dos editais. É como se dissessem aos concessionários: OK, vamos privatizar, não tem outro jeito, mas vocês vão ver só...
8 comentários:
Cada vez mais gosto desse Sardenberg. É lúcido, lógico e certeiro em suas análises.
Como sempre, nunca é culpa das empresas ! é sempre do governo. Daqui a pouco vão dizer que foi o governo que manipulou a Libor na Grã Bretanha !!!! O setor privado é o "bom selvagem" que sofre com uma sociedade invejosa ! Me poupe né Constantino !!!!
Uai, vc não soube que o banco central tinha conhecimento da manipulação da Libor????
O Anonymous é tão ingênuo que não sabe que quem falsifica a moeda são os Bancos Centrais! Para mim, está muito claro que a manipulação da Libor foi obra do Bank Of England. Recomendo ler os economistas austríacos para entender melhor de Economia Monetária.
O que me espanta desse estardalhaço todo com o setor de telecomunicações é que o Estado é visto como um bom samaritano. Alta carga tributária, burocracia crescente, barreiras a entrada no setor e etc. não sào discutidas nos jornais! A At&t e a Vodafone, as duas maiores empresas de telecomunicações dos EUA, poderiam oferecer esse serviço aqui no Brasil mas não o fazem por causa das restrições do governo. É preciso lembrar também que o leilão da 4G feita pelo governo esse ano exigiu um mínimo de conteúdo nacional. Qual empresa séria vai investir no Brasil com essas imposições geiselistas do governo atual?
Um detalhe interessante neste texto e que mostra claramente a atuação absurda do Estado paquidérmico: o estado cria leis rígidas, mas ao mesmo tempo consegue criar meios que dificultem o cumprimento das mesmas!!!!!
Simplesmente ridículo!
Diogo Rengel Santos
Perfeito este artigo de Sardenberg.
O Brasil ainda vai morrer asfixiado pela própria burocracia, a continuar nesse ritmo.
Rodrigo, acabei achando este vídeo por acaso no YouTube falando justamente sobre o tema da privatização das telecomunicações... só que na Guatemala. Não sei se você já o viu, mas em todo o caso deixo aqui o link. É bem interessante e esclarecedor:
http://www.youtube.com/watch?v=cmyPDjJ4l7o
Constantino,
Concordo com alguns dos seus pontos, como o controle e a taxação de impostos pesados, que não ocorre apenas com o setor de telefonia.
Mas questiono (de um ponto de vista liberal), se a Anatel, como agência reguladora do setor de telefonia, não estaria cumprindo seu papel? Entendo como um bom sistema um mercado livre, porém fiscalizado por instituições fortes. Gostaria de saber seu ponto de vista! Abraços!
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