terça-feira, dezembro 11, 2007

A Confissão do Papa



Rodrigo Constantino

Na sua segunda Encíclica, chamada Spe Salvi, o Papa Bento XVI ataca o ateísmo:

"O ateísmo dos séculos XIX e XX é, de acordo com as suas raízes e finalidade, um moralismo: um protesto contra as injustiças do mundo e da história universal. Um mundo, onde exista uma tal dimensão de injustiça, de sofrimento dos inocentes e de cinismo do poder, não pode ser a obra de um Deus bom. O Deus que tivesse a responsabilidade de um mundo assim, não seria um Deus justo e menos ainda um Deus bom. É em nome da moral que é preciso contestar este Deus. Visto que não há um Deus que cria justiça, parece que o próprio homem seja agora chamado a estabelecer a justiça. Se diante do sofrimento deste mundo o protesto contra Deus é compreensível, a pretensão de a humanidade poder e dever fazer aquilo que nenhum Deus faz nem é capaz de fazer, é presunçosa e intrinsecamente não verdadeira. Não é por acaso que desta premissa tenham resultado as maiores crueldades e violações da justiça, mas funda-se na falsidade intrínseca desta pretensão. Um mundo que deve criar a justiça por sua conta, é um mundo sem esperança. Nada e ninguém responde pelo sofrimento dos séculos. Nada e ninguém garante que o cinismo do poder – independentemente do revestimento ideológico sedutor com que se apresente – não continue a imperar no mundo."

De fato, é inegável que as revoluções ateístas ligadas ao socialismo causaram um estrago enorme. No entanto, não é justo jogar todos os ateus no mesmo saco podre do socialismo. As experiências socialistas não falharam por causa do seu ateísmo, mas porque eram irracionais, clamando contra a natureza humana, e indo na direção da servidão. Ateus ou agnósticos notaram isso e previram o caos que seria o socialismo, não pelo ateísmo, mas por sua inconsistência teórica e seu abandono da razão. O marxismo não tem nada de científico. É, no fundo, uma nova religião, sendo Marx o seu profeta. Somente com base na fé, na necessidade de crer, alguém consegue defender coisas tão absurdas e sem sentido. Se a religião é o ópio do povo, o socialismo é a cocaína! Ele fala através das emoções aos angustiados, desesperados, despreparados. As seitas que prometem o paraíso – sejam terrestres ou após a vida – costumam brilhar apenas na escuridão.

Ayn Rand, uma adepta do ateísmo e grande defensora da liberdade, por isso anti-socialista, já tinha previsto a desgraça do socialismo muito antes das pessoas descobrirem o fracasso que ele foi. Os pensadores da Escola Austríaca, como Mises e Hayek, ambos agnósticos, também condenaram o socialismo, não por conta do seu ateísmo, mas por sua irracionalidade. Não é preciso ser um crente para condenar o socialismo. Qualquer ateu com bom senso, que respeita a razão e a liberdade individual, abomina esta ideologia, que não passa de idealização da inveja. Por outro lado, várias crenças religiosas também geraram caos, destruição e miséria. O próprio catolicismo foi, durante muitos anos, uma poderosa arma política, e a Inquisição deixou profundas cicatrizes. Atualmente, vemos no Jihad muçulmano um movimento violento e irracional, em nome de Deus. A irracionalidade existe no mundo ateu e no mundo crente. Não é monopólio de nenhum grupo específico.

Mas um trecho do discurso do Papa merece destaque, pois se trata de uma confissão e tanto:

"Se diante do sofrimento deste mundo o protesto contra Deus é compreensível, a pretensão de a humanidade poder e dever fazer aquilo que nenhum Deus faz nem é capaz de fazer, é presunçosa e intrinsecamente não verdadeira".

O que Deus não é capaz de fazer? Essa pequena confissão nos remete diretamente ao que Epicuro já havia questionado milênios atrás:

"Deus deseja prevenir o mal, mas não é capaz? Então não é onipotente. É capaz, mas não deseja? Então é malevolente. É capaz e deseja? Então por que o mal existe? Não é capaz e nem deseja? Então por que lhe chamamos Deus?"

Pois é. Eu não sei. Eu prefiro chamar esse "Deus" apenas de natureza, ou qualquer outro nome que não crie uma tremenda confusão com o Deus antropomórfico criado pelos homens, como o Deus cristão, que teria feito o homem à sua imagem e semelhança (um cavalo que pudesse pensar com certeza diria o mesmo, e seu Deus seria um grande cavalo poderoso). Pelo que ficou parecendo na Encíclica, o Papa Bento XVI também compartilha desse dilema. Deus, afinal de contas, não é capaz de muitas coisas!

Concordo que a pretensão humana de que podemos ser deuses e criar um paraíso terrestre, ainda mais concentrando poder, é arrogante e perigosa, o caminho da servidão e miséria. No entanto, não acho que todo ateu tem esta arrogância. Os liberais – muitos são ateus ou agnósticos – são humildes, e defendem a liberdade individual com a descentralização de poder, justamente para evitar estes riscos. Onde está a arrogância de um Hayek, por exemplo, que tanto condenou justamente a arrogância dos "iluminados"? Mas o homem pode sim melhorar o mundo, e continuamente se aproximar da justiça, não divina, mas terrestre. Ele pode, através da sua razão, questionar o que é justo de fato, e chegar a um código adequado de conduta, compatível com sua natureza, independente de alguma "revelação divina". O "não matarás" e o "não roubarás" são máximas justas, e não é preciso uma Bíblia para nos dizer isso. Por fim, há muitas coisas que o homem não tem como saber. A ignorância humana precisa ser reconhecida como ponto de partida. Mas não vejo motivo algum para ter que chamá-la de "Deus". E vejo, ao contrário do Papa, uma pretensão vinda justamente dos crentes, que juram já ter todas as respostas, contidas no "livro sagrado" através de uma "revelação". Isso me dá calafrios...

12 comentários:

Bruno disse...

Caro Rodrigo,

Costumo ler seus textos e acho sua linha de pensamento extremamente concisa. Quero parabenizá-lo pelo esforço em mostrar às pessoas o "outro lado da moeda", principalmente suas críticas às imbecilidades do socialismo. Só quero fazer um comentário sobre o tópico "Confissão do papa": qdo vc diz que o homem foi feito a imagem e semelhança de Deus de acordo com a idéia cristã é um equívoco.(...como o Deus cristão, que teria feito o homem à sua imagem e semelhança...). Não são todas as religiões e filosofias cristãs que pensam desse jeito. O Espiritismo não segue essa linha de raciocínio, acreditando ser Deus uma força superiora, questionando sempre O QUE É, não QUEM É Deus.

Abraços

Anônimo disse...

Bruno, quem está equivocado é vc...
o espiritismo não é uma religião cristã, e todas as religiões cristãs(ou filosofias, como queira), apesar das diferenças de doutrina acreditam no mesmo Deus, "que criou o homem à sua imagem e semelhança".
O texto tá perfeito!!muito bom!!
Abraços

Anônimo disse...

Sugestão: pede pro Olavo explicar as tais contradições

Bruno disse...

Tales, leia O Evangelho Segundo o Espiritismo e tire suas conclusões...
Depois diga onde está o equívoco...
Não confunda Jesus Cristo com Deus.
Provavelmente Olavo de Carvalho não é espírita, creio eu.

Anônimo disse...

Bruno, não estou confundindo Jesus com Deus, As religiões cristãs fundamentam-se na Bíblia, ou Escrituras Sagradas que, por sua vez se divide em Antigo e Novo Testamento.A profissão de fé cristã é a de que Deus, revelado a Abraão, Moisés e aos profetas, envia à Terra seu filho como Messias (Cristo, em grego), o Salvador. Já o espiritismo sua base doutrinária é o Livro dos Espíritos, primeira das chamadas obras básicas escritas por Rivail, que são base para os demais livros que compõem a Codificação espírita.
Segundo muitos de seus estudiosos, a doutrina espírita tem INSPIRAÇÃO cristã, apesar das concepções teológicas bem diferenciadas no que diz respeito a conceitos como divindade, natureza humana, salvação, graça e destino.
O Evangelho Segundo o Espiritismo é uma obra de Allan Kardec, lançada em abril de 1864, que avalia os evangelhos canônicos sob a óptica da Doutrina Espírita, portanto ele utiliza os ensinamentos de cristo apenas como inspiração.
E tb não vamos ficar discutindo religião que pra mim isso td eh soh questão de definição. Prefiro chamar Deus de natureza tb e acabou!

Anônimo disse...

Questão de definição?
Deus existe ou não?
Jesus veio pra cá há dois mil anos ou não?
Isso não é questão de definição: é a base mesma da religião, da cristã pelo menos.

Segundo o bruno, pelo fato de o Olavo não ser espírita, ele não pode explicar as coisas. Q absurdo!
espero q eu tenha entendido mal.

Anônimo disse...

questão de definição me refiro no sentido de o espiritismo ser uma religião cristã ou não.
Não sobre se Deus existe ou se jesus veio pra cá ou não. Isso cabe a cada um achar ou crer nas respostas!!

Anônimo disse...

Caro Tales
A existêncoia de Deus se prova racionalmente, ou desconhece as provas? Por via das dúvidas: http://pt.wikipedia.org/wiki/Tom%C3%A1s_de_Aquino
Já sobre jesus, basta confiar (fé não é nada além disso) no que conta a história. Do mesmo modo que nós aceitamos que, por exemplo, Aristóteles tinha seus discípulos, e isso através de relatos.
Pronto

Para ateus militantes como o constantino, deveríamos perguntar pra ele provar que deus não existe. Como a gente vai defender uma idéia sem provas?

Anônimo disse...

Ninguem aqui disse que Deus não existe. Só foi dito que ele não um ser(ou uma entidade sobrenatural), como prega a maioria das religiões.
E se essas demonstrações de Tomás de Aquino podem ser consideradas provas da existência de Deus tb podemos considerar o livro "Deus um delírio" do biólogo Richard Dawkins uma prova da não existencia.
Na verdade nenhum dos dois são provas, apenas argumentos.

Anônimo disse...

Li na coluna do Ancelmo (O Globo) que ele mandou rasgar a lista de convidados da festa.

Alvaro Augusto W. de Almeida disse...

Eu vejo essa frase do papa mais como um ato falho do que como uma confissão propriamente dita. É isso que dá não fazer uma revisão adequada do texto! Ainda assim, se pressionado por explicações, garanto que o papa vai se sair com a clássica explicação do livre arbítreo: Deus quer e pode fazer o bem, mas o homem é livre para escolher o mal. Mas não me perguntem como um ser onipotente pode acabar limitado por algo que ele mesmo criou...

Alvaro Augusto
alvaro@lunabay.com.br
http://www.alvaroaugusto.com.br

Anônimo disse...

Para começo de conversa, o artigo é pobre... lamentável.
Agora confundir ateismo com comunismo, com materialismo ou o que o valha é uma renomada estupidez.
A fé cega porque só sobrevive se for dogmática. Por isso emburrece. Por isso o Brasil está nas mãos dos católicos da teologia da dominação e da teologia da libertação, correndo por fora os Edir Macedo.
Ateus são maus. Hitler e Stalin eram católicos, o primeiro bem fervoroso, o segundo abandonou a batina e foram gente finíssima. Tenha dó.
Além do mais esse Papa é a glória das paradas gay da Europa. Sejamos mais sérios.