sexta-feira, janeiro 20, 2012

Leviatã capitalista


Rodrigo Constantino

A revista The Economist traz em sua última edição uma reportagem de capa sobre o avanço do capitalismo de estado nos países emergentes. A matéria disseca em várias páginas este “novo” modelo, fazendo um grande esforço para enxergar o lado positivo dele. Argumenta que há mudanças em relação ao passado, como uma maior profissionalização nas estatais ou o uso dos mercados de capitais para alavancar estas empresas.

Mas, mesmo sob uma lente obsequiosa, as conclusões da revista britânica não são nada favoráveis ao capitalismo de estado. Ele fomenta o “capitalismo de compadres”, onde governantes escolhem os amigos vencedores, prejudicando todas as outras empresas. Ele acaba engessando a “destruição criadora”, limitando as inovações dinâmicas. Ele causa grandes estragos sob governos incompetentes. Ele estimula bastante a corrupção e o autoritarismo, concentrando poder demais em poucos governantes. E por aí vai.

A revista conclui, portanto, que as desvantagens superam as vantagens, e que as falhas do modelo levam alguns anos até ficarem evidentes. Se as estatais são tão eficientes e competitivas como se argumenta, então mais um motivo para que não precisem do apoio estatal. Subsídios e protecionismo servem para garantir sobrevida aos incapazes de competir no livre mercado.

A conclusão da revista é óbvia para qualquer brasileiro mais atento, cansado de conhecer as desgraças do capitalismo de estado. Podem ter algumas mudanças no cenário que limitam o estrago do modelo, como uma maior abertura comercial e a presença de investidores estrangeiros atentos. Mas nada disso pode alterar sua essência, que será sempre a ineficiência. Faltam os mecanismos adequados de incentivo, presentes somente no capitalismo de livre mercado.

Para quem tiver interesse em se aprofundar no tema, recomendo a leitura do livro “The Commanding Heights”, de Daniel Yergin e Joseph Stanislaw. Ele não é novo, mas tampouco o agora reverenciado capitalismo de estado o é.

25 comentários:

Paim F.º disse...

Bom dia, Rodrigo!

Que tal, também, uma olhada em "Capitalismo de laços", cuja sinopse diz "Com uma abordagem despolitizada e livre de estereótipos, Sérgio Lazzarini explica a dinâmica do capitalismo no Brasil.
O autor desvenda o poder dos relacionamentos entre os donos das principais empresas brasileiras e abre discussão para os prós e contras decorrentes da participação do Estado na economia."?
Um abraço,
Adivo Paim Filho
Santa Maria, RS

Rodrigo Constantino disse...

Boa dica. Já li e escrevi até uma resenha.

reinaldo disse...

Não podemos dizer que o Brasil é um "capitalismo de estado". Tirando a Petrobras e o Banco do Brasil, as principais empresas brasileiras são privadas. E a participação do mercado de capitais no financiamento está aumentando no Brasil. Ontem no valor econômico, uma reportagem mostrou que o percentual subiu para 48%(era 20% em 2006).

Rodrigo Constantino disse...

Falso, Reinaldo. O Brasil ainda tem mais de 120 estatais. Na bolsa, representam 38% do valor total. O governo ainda exerce influência indireta, via regulação excessiva, gastos (40% do PIB) e crédito (BNDES cresce sem parar, subsidiando poucos grupos grandes, e o estado já responde por 40% do crédito total do país).

Ou seja, somos claramente um capitalismo de estado!

Anônimo disse...

Faltou dizer que os fundos de pensão das estatais operam majoritariamente. São fábulas de dinheiro que namobram e são de fato estatais a administração destes fundos bilionarios, escolhidas por politicos e onde penduram ativistas. Ocorre que as contribuições das estatais a tais fundos acabam, muitas vezes, superando os lucros e assim os impostos cobrem estes roumbos, mais propriamente ROUBOS, que locupletam a nomenklatura estatal e mesmo os agregados de baixa caixa que até parecem trabalhar, pero no mucho. Ficam então agradecidos e subservientes a hierarquia estatal e politiqueira. Afinal, sabem que estão levando vantagem sobre a iniciativa privada que arca com todos os prejuizos decorrentes das benesses politiqueirasp-estatais.

reinaldo disse...

120 estatais num universo de milhares de empresas é pouco. Tirando Petrobras, BB, Caixa e Eletrobras, as outras são irrelevantes. Na bolsa, Petrobras e Vale praticamente dominam os negócios. Boa parte desses 38% são por causa da Petrobras. Bem, e 62% são de empresas privadas. O mercado de capitais tem aumentado como fonte de financiamento. A única coisa que concordo é a alta carga tributária. Mas chegar a dizer que somos um "capitalismo de estado", é um enorme exagero. Capitalismo dfe Estado é a China, Rússia, Venezuela.

antonio barbosa filho disse...

Capitalismo de Estado é aquele que levou a Grã-Bretanha a doar e emprestar a fundo perdido bilhões de libras aos bancos; o mesmo fizeram os EUA com seguradoras, bancos e indústrias. A Grécia, apontada como modelo neoliberal, entrega todo o patrimônio público à banca européia, que ainda quer mais.
De fato o capitalismo de Estado prospera, mas principalmente nos países ditos "desenvolvidos", e sempre em favor dos "compadres".

Leandro disse...

Rodrigo, não seria correto afirmar que, no geral, todos os países praticam o capitalismo de Estado?
Digo isso pois todos possuem um Banco Central que controla/manipula expansão monetária, crédito, taxa de juros, coletam impostos e "redistribuem" da forma que julgam mais proveitosas, etc.
No geral, todos os Estados metem (e muito) o bedelho na economia e distorcem todo o sistema produtivo, a diferença está entre os mais e os menos intervencionistas. Ou estou enganado?

Julio disse...

Vc vem falar isso com as economias capitalistas liberais falidas e a China mantendo seu ritmo de crescimento de 10% há décadas?

Rodrigo Constantino disse...

Claro! Justamente para que as pessoas possam entender que as economias capitalistas desenvolvidas não estão em crise POR CAUSA do liberalismo, muito pelo contrário, e para alertar que o crescimento nas economias de capitalismo de estado é insustentável.

Correlação não é causalidade. O capitalismo de estado, especialmente durante a revolução industrial tardia e seu choque de produtividade (China), consegue entregar elevado crescimento por um tempo. Mas suas falhas intrínsecas logo aparecerão. Já vimos isso antes, muitas vezes.

André Souza disse...

Quando a Economist se esforça para repensar as vantagens de se ter o Estado atuando na economia, é sinal que algo mudou.

Sobre a fábula do BNDES que só ajuda poucas e grandes empresas, vale lembrar que:

- o número de pequenas e micro empresas que obtiveram financiamento do BNDES é INFINITAMENTE SUPERIOR ao número de grandes empresas.

- os valores para um ou outro grupo é que se apresentam invertidos. Afinal, 1 ou 2 financiamentos feitos a projetos da Vale (por exemplo) atingem uma soma de diversos projetos de pequenas empresas.

Rodrigo, você que tem acesso mais fácil a esses números, toparia fazer essa comparação aqui no blog?

Pegar os dados do BNDES de 2010, por exemplo, e comparar:

1) o tanto de recursos voltados a pequenas e micro empresas via BNDES, em comparação às grandes
2) a quantidade de FINANCIAMENTOS à pequenas e micro empresas em comparação às grandes.

Tenho certeza que, feito esse levantamento, a tese de que o BNDES dá preferência às Grandes empresas irá cair por terra.

Alguém se arrisca?

Rodrigo Constantino disse...

Da carteira total de crédito do BNDES, nada menos que 38% representam dez, isso mesmo, DEZ grupos!

E tem gente que defende esta política...

O slogan do BNDES deveria ser: há décadas concentrando renda no país!

E o mais bizarro: a esquerda, agora no poder, aplaude!

Rodrigo Constantino disse...

Na era Lula, o número que tenho na cabeça é algo entre 60 e 70% dos desembolsos subsidiados direcionados para grandes empresas.

Mas posso chegar o número exato depois.

É uma piada de mau gosto esquerdista defendendo esta simbiose entre governo e grandes grupos empresariais. Só aqui mesmo.

E um liberal condenando isso, para depois ser acusado pela mesma esquerda de defender os ricos.

Seria cômico, não fosse trágico!

André Souza disse...

Rodrigo,

os números que li em algum blog por aí diziam que, em 2010, foram feitas umas 600 mil operações.
Dessas, mais de 90% beneficiaram pequenas e médias empresas e pessoas físicas.

Eu tenho uma porção de críticas ao modo de operar do BNDES, só acho que se os números acima se confirmam, fica difícil dizer que ele está "subsidiando poucos grupos grandes".

Não acho a outra fonte 100% confiável. Alguma ideia de onde conseguir esses números de maneira confiável?

André Souza disse...

Rodrigo, desculpe a mensagem dupla.

Encontrei o seguinte documento no site do BNDES:

http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/empresa/estatisticas/Int2_1D_a_porte_qtd.pdf

De acordo com ele, entre 2003 e 2010 (Lula), as operações voltadas às médias, micro/pequenas empresas e pessoas físicas representaram 92% do total de operações.

Isso me mostra que seu argumento não confere.
Oras, é óbvio que os projetos para as grandes, como a Vale, vão representar uma quantia muito maior de dinheiro que projetos de pequenas empresas.

Se os números mostram que em 92% dos cados em que o banco atua, ele beneficia o grupo menos favorecido, ele tem cumprido sim a função "Social".

Isso não exclui uma porção de outras críticas que podem ser feitas à instituição e sua maneira de agir.
Se meus cálculos estiverem errados, peço desculpas. Não sou economista!

Abraços

Rodrigo Constantino disse...

André,

Vc está vendo QUANTIDADE de operações, quando o que importa é o VOLUME, naturalmente.

O BNDES realiza inúmeras operações de crédito com pequenas empresas, mas em valor pequeno. E o grosso do desembolso vai para grandes grupos.

André Souza disse...

Rodrigo, meu argumento é exatamente esse.

Lê-se muito por aí que o BNDES virou as costas aos pequenos empresários, quando na verdade não é o que os números mostram.

E os números de 2011 (1° Dilma) indicam um aumento nessa tendência. Apenas 5% das operações foram com as grandes empresas.

Discutir o critério usado para escolher as grandes empresas faz sentido pra mim, e tenho diversas críticas quanto a isso.
Dizer que ele não cumpre seu papel de incentivar o pequeno empreendedor nacional é uma mentira.

Rodrigo Constantino disse...

André, vc entendeu a diferença entre o volume de transações e o VALOR delas?

São POUCAS operações com grandes empresas, em ENORME valor!

Só a Petrobrás levou R$ 55 bilhões em UM ano!

O BNDES é uma máquina de transferência de riqueza do povo (pagadores de impostos) para poucos e grandes grupos, com lobby organizado e influência em Brasília.

Rodrigo Constantino disse...

Está até no editorial da Folha, que ano passado foi o RECORDE de transferência para pequenas e médias empresas na gestão petista, e o valor foi de 36% do total de desembolso.

Ou seja, durante o governo Lula, conforme eu havia dito, o BNDES destinou uma média de 70% do valor total de desembolsos para grandes grupos. E a esquerda aplaude a escolha dos "campeões nacionais"...

André Souza disse...

Eu entendo, Rodrigo.

Minha pergunta pra você é: se o BNDES, repentinamente, deixasse de financiar grandes empresas e ficasse apenas com o outro grupo, você ficaria contente?

A minha suspeita é que a própria existência da instituição incomoda, por motivos ideológicos.
Ok, sem problemas quanto a isso.
Pois então os liberais deveriam dizer isso à sociedade, claramente, e não encontrar subterfúgios como esse, de que o banco só existe pra financiar grandes empresas.

Isso é mentira.

Rodrigo Constantino disse...

André, em primeiro lugar, os liberais vão argumentar que vc não deve focar nas boas intenções apenas, pois a realidade é diferente do sonho. Logo, liberais vão mostrar que bancos como o BNDES tendem justamente a ser "capturados" por grandes lobbies. Ou seja, o BNDES real é o que liberais esperam, enquanto vcs sonham com algo diferente.

Em segundo lugar, não é uma questão ideológica, mas de resultado. O BNDES gera ineficiências no mercado, crowding out de crédito privado (nosso mercado de debêntures até hoje não deslanchou, em boa parte, devido ao BNDES), etc. Ou seja, MESMO o BNDES focando em pequenas empresas, o que é difícil pela própria natureza da política, ele vai estar selecionando vencedores, sujeito à corrupção e politicagem.

O mercado de crédito privado funciona muito melhor. Não é preferência ideológica. É lógica econômica!

André Souza disse...

Ótimo, Rodrigo, então é isso que precisa ser dito.

A discussão assim é muito mais construtiva do que quando se mistura com ódios partidários e coisas do tipo.

O problema que vejo quando se discute política econômica na mídia, é que fala-se muito de política e pouco de economia.

E, sejamos realistas, o Brasil tem uma cultura que tende a se afastar dessas soluções de mercado.
Dizer para um microempresário que ele terá de buscar crédito no mercado, num país com os juros brasileiros, é infrutífero.

Eu sei, o fim do BNDES implicaria em uma outra realidade, incluindo a de juros, estimularia o mercado de micro crédito, etc...

O problema é que os "especialistas" tentam simplificar o discurso para ter o apelo das massas, e acabam criando esse tipo de argumento frankenstein, que conta meias verdades.

Anônimo disse...

Rodrigo, isso me lembra uma entrevista pra Roda Viva com o falecido Roberto Campos. Um dos entrevistadores era o Marco Aurélio Garcia que criticava justamente o uso do Estado pra beneficiar certos grupos empresariais através do BNDES. E veja agora que o PT no poder faz exatamente isso. Essa ética socialista é confusa...

Gustavo Sauer

João disse...

120 estatais em milhares de empresas é coisa pacas. Aliás, 120 estatais é sempre muita coisa. Pior que achar isso pouco, como o cara que achou, só o petralha que chamou a Grécia de neoliberal - aliás, qualquer um que usa o termo "neoliberal" a sério.

reinaldo disse...

Só queria entender porque se vc discorda de alguém que seja liberal, é logo tachado de "petralha", como disse o joão ? nem votei na dilma na eleição ! eu acho que a internet está muito radical ultimamente