segunda-feira, abril 14, 2008

A Desigualdade Social



Rodrigo Constantino

"Quando as palavras perdem seu significado, as pessoas perdem sua liberdade." (Confúcio)

O conhecimento humano e a ação humana são fenômenos conceituais. Para a formação de conceitos, o uso da linguagem é fundamental. Ela é justamente a ferramenta que viabiliza a integração dos conceitos. Conforme escreveu Ayn Rand, "a linguagem é um código de símbolos visuais e auditivos que serve à função de converter conceitos no equivalente mental de concretos". As palavras são essenciais para o processo de conceitualização e, portanto, para todo pensamento. Isso é verdade para alguém isolado numa ilha ou na sociedade. Logo, aqueles que desejam inviabilizar o pensamento independente costumam escolher como principal alvo justamente os conceitos das palavras.

Em 1984, George Orwell tratou do assunto através do conceito de duplipensar, definido pelo autor como "a capacidade de guardar simultaneamente na cabeça duas crenças contraditórias e aceitá-las ambas". O mundo labiríntico do duplipensar consistia em usar a lógica contra a lógica, repudiar a moralidade em nome da moralidade, e aplicar o próprio processo ao processo. "Essa era a sutiliza derradeira: induzir conscientemente a inconsciência e então tornar-se inconsciente do ato de hipnose que se acabava de realizar". Ou seja, o objetivo era a destruição dos conceitos bem definidos, fundamentais para o pensamento humano. Guerra passava a significar paz, ditadura passava a significar democracia, e social queria dizer anti-social. Este ultimo termo é o foco desse artigo, pois o conceito da palavra "social" passou a ser tão vago, tão abstrato, tão flexível, que perdeu totalmente seu sentido objetivo. "Social" passou a ser uma palavra mágica, que associada a alguma outra palavra qualquer, cria uma expressão que implica numa finalidade a qual quaisquer meios são justificáveis.

Para o austríaco Hayek, o adjetivo "social" tornou-se provavelmente a expressão mais confusa em todo nosso vocabulário moral e político. A extraordinária variedade dos usos da palavra serve apenas para confundir, não elucidar. O próprio Hayek fez um levantamento e encontrou nada menos que 160 termos associados ao adjetivo "social". Na maioria dos casos, o termo "social" anexado servia na pratica para negar o sentido da palavra. Como exemplo, podemos pensar em justiça, e questionar o sentido de "justiça social", que quase sempre representa a destruição da própria justiça.

O uso do adjetivo "social" serve para insinuar que os resultados dos processos espontâneos do livre mercado foram, na verdade, fruto de uma criação humana deliberada. Em segundo lugar e como conseqüência disso, serve para instigar os homens a redesenhar aquilo que nunca foi desenhado por eles. Por fim, serve para esvaziar o sentido dos termos associados a este adjetivo vago. O exemplo já citado de "justiça social" é perfeito para ilustrar isso. A demanda que surge com o uso do adjetivo "social" ao lado de justiça é adotar uma "justiça distributiva", que é irreconciliável com a ordem competitiva de mercado, causa do crescimento da riqueza e da própria população. O que essas pessoas chamam de "social" representa o maior obstáculo à própria manutenção da sociedade. Social aqui passa a significar anti-social.

Se retirarmos o véu que cobre os motivadores reais por baixo do adjetivo "social", fica evidente que essas pessoas falam em desigualdade material apenas, nada mais. Estão condenando o fato de que alguns indivíduos conseguiram recompensas monetárias acima dos outros. Em suma, estão olhando somente para a conta bancária, como se nada mais existisse na vida. Eles sabem que se usarem o termo verdadeiro, eles perderão a pose de nobreza que vem como resultado do uso do adjetivo "social". Ora, desiguais os seres humanos já são ao nascer! A genética é diferente, as paixões e interesses, a educação em casa, os anseios e metas, a inteligência e o esforço, a sorte. É simplesmente impossível atribuir peso para cada um desses itens, e é o resultado dessas características na livre interação dos indivíduos que vai determinar as recompensas financeiras.

Isso não quer dizer valor, no sentido de estima, que é subjetivo. Um médico pode ser mais respeitado como indivíduo que um jogador de futebol, ainda que o último tenha uma conta bancária maior. Aqueles que pensam que justiça seria tirar na marra o dinheiro do jogador para dar ao médico estão assinando um atestado de materialistas, que só enxergam dinheiro na frente. Como disse Benjamin Franklin, "aquele que é da opinião que dinheiro fará qualquer coisa pode muito bem ser suspeito de fazer qualquer coisa por dinheiro". O caráter e a felicidade das pessoas não podem ser medidos pelo bolso. No entanto, parece ser justamente isso que os igualitários defensores da "justiça social" pensam. Eles apontam a desigualdade material e clamam por "justiça social", ou seja, saldos bancários similares.

O esforço não é garantia de sucesso no livre mercado competitivo. Aqueles que tentaram e não conseguiram a mesma recompensa que o vizinho podem ser alimentados pela inveja. Ainda que compreensível, tal sentimento é destrutivo, e trabalha contra o interesse da sociedade, dos indivíduos. Somente quando o processo de mercado determina a recompensa financeira há um funcionamento eficiente da economia, permitindo maior criação de riqueza e conforto material para todos. Aqueles que, guiados por instintos primitivos, fingem defender a liberdade enquanto condenam a propriedade privada, os livres contratos, a competição, o lucro e até mesmo o próprio dinheiro, representam uma ameaça para a civilização. Eles acham que são movidos pela razão, e que podem definir de cima para baixo como arranjar os esforços humanos da melhor forma para atender seus desejos, mas estão profundamente enganados.

Na realidade, eles usam e abusam do adjetivo "social", mas estão apenas deixando uma paixão anti-social falar mais alto: a inveja. Eis o que está por trás da máscara da maioria dos combatentes das "desigualdades sociais". Afinal, o foco de quem realmente se preocupa com os mais pobres deveria ser a pobreza em si, não as desigualdades, já que riqueza não é um bolo fixo. Um indivíduo fica rico no livre mercado somente criando valor para os demais. Michael Dell não teve que tornar ninguém mais pobre para ficar bilionário. Muito pelo contrário: ele ficou rico criando riqueza para os seus consumidores. A criação de riqueza, portanto, depende das tais "desigualdades sociais".

Quem pretende acabar com as desigualdades está mirando apenas na relação entre ricos e pobres, ignorando que os pobres melhoram de vida se os indivíduos puderem ficar ricos. Se antes o meu transporte era uma carroça e agora posso andar de carro, não importa se meu vizinho tem uma Ferrari. Minha qualidade de vida melhorou, meu conforto é maior, graças ao capitalismo. Focar apenas nas desigualdades materiais, ainda por cima disfarçando isso com o uso inadequado da palavra mágica "social", é um atentado contra a civilização, principalmente contra os mais pobres. Vamos atacar a miséria em si, e isso se faz com o capitalismo de livre mercado. Mas deixemos as desigualdades "sociais", leia-se materiais, em paz. Elas são fundamentais para preservar a ordem espontânea que reduz a miséria.

10 comentários:

Unknown disse...

Acho que o próximo termo a esvaziar-se de significado é "democracia". Vê-se um processso muito semelhante ao que você coloca. Qaulquer ação se justifica em pró da democratização de alguma coisa...

Anônimo disse...

Para mim o exemplo mais insólito é o emprego da palavra "liberal", que em cada lugar quer dizer uma coisa (o próprio Hayek fez referência a isso na introdução do seu clássico O Caminho da Servidão). Os esquerdistas em geral (inclusive os petitas) se rotulam "esquerda-liberais", e há inúmeros marxistas (e outros "istas" da mesma laia) que se intitulam "libertários". A confusão é grande.

Anônimo disse...

O distribitivista meramente materialista é rejeitado por alguns igualitários contemporâneos como Rawls e Sen. A perspectiva de ambos, o primeiro mais no campo da moral, e o segundo no campo da economia, são realmente significativos... Despresar o "igualitarismo" destes pensadores é tão falho quanto insistir a crítica no ultrapassado distributivismo materialista. Alguns liberais-libertários não foram capazes de discutir com Rawls ou Sen no nível de discussão que eles proporam, infelizmente...

Estes autores valem a pena serem lidos... parecem trazerem uma valiosa confrontação, e colocar relevantes espinhos no sapato do ideal libertário da ordem espontânea.

Pedro

Anônimo disse...

Isto, Pedro
Sem dúvida, está faltando, no mercado, liberais para discutirem com Rawls e Sen... Em que pese a crítica do Nozick ao Rawls, mas mesmo ele, não atingiu o ponto rawlsiano essencial, que é a justiça para a estrutura básica, não para a inter-relação individual... se bem que em 1974, quando Nozick publicou seu livro, a discussão recem tinha se iniciado...

CL>

Anônimo disse...

Indiquem um livro do Rawls sobre o assunto.

Anônimo disse...

Do Rawls:
"Uma Teoria da Justiça" (Marins Fontes)

"Justiça e Democracia" (Martins Fontes), especificamente o capítulo 1 "A Estrutura Básica como Objeto" que também é o capítulo 7 do livro "Liberalismo Político" (Atica).

Nota: jamais leiam qualquer obra do Rawls sem antes ter lido "Uma Teoria da Justiça", pois todas as demais são desdobramentos dela, impossível de serem entendidas sem ter pego o "fio da meada".

Do Sen, "Desigualdade Reexaminada" (Record)e "Desenvovlimento como Liberdade" (Cia. das Letras).

CL>

Anônimo disse...

Nunca ví um artigo mais ignorante em toda minha vida. Juro que não se precisa passar anos numa faculdade para escrever isso. a inveja é o motivo do desejo por justiça social? puta que pariu.. melhor ouvir isso do que ser surdo.

Anônimo disse...

Ao anonimo das 8:39

Na Roma antiga, após longos debates, os jurisconsultos chegaram á segunte definição de justiça " SUUM CUIQUE TRIBUERE ALTERUM NON LAEDERE", ou seja, justiça significa DAR A CADA UM O QUE É SEU E NÃO LESAR NINGUÉM.
Infelizmente,sua mentalidade tacanha ainda não conseguiu evoluir a ponto de se nivelar com o pensamento romano de 2000 anos atrás. O que é Justiça social? defina.
Ser preguiçoso, burro, incompetente e querer que o estado resolva todos os seus problemas através de expropriação tributária é vadiagem e inveja, mas é claro, em nome da "Justiça Social". Os homens já nascem desiguais em talento, inteligencia, esforço etc. Será que Ronaldinho tem que ganahr o mesmo salario de um jogador da terceira divisão? Não, pois ele é brilhante no que faz, porque tem gente que paga 200 dolares para ver o time dele jogar, e 100 dolares numa camisa com o nome dele. Por uma questão de JUSTIÇA, ele tem que ser milionario, pois nunca tirou nada de ninguém e o mercado de entretenimento (futebol) o reconhece. Os mediocres que fiquem com seus recalques.
Ao contrario do exemplo anteriormente citado,o socialista Lullinha ficou milionario sem mérito algum, apenas por ser filho de presidente. E como a Telmar não é casa de caridade (ela nunca me deu um centavo, por exemplo), pagamos e continuaremos a pagar dezenas de vezes mais pela generosidade dela com o ex0 alimentador de macacos que ganhava 600 reais por mês.
Em nome da maldita "Justiça social", mao tse tung matou 70 milhões de chineses, stalin matou 30 milhões de russos, fidel matou quase 100 mil cubanos. Poloneses, hungaros e outros povos de paises do leste europeu foram massacrados pelo regime comunista. Isso tem que ser sempre repetido para socialistas imbacis como você, mas não adianta.

Anônimo disse...

muito bom...gostei mesmo!

arnaldo arnolde disse...

Como foi dito no início, a linguagem é de suma importância para o entendimento de conceitos, porém, quando se usa a linguagem para pessoas que não conseguem entender o significado das palavras, a linguagem se torna inútl.
Tivemos um exemplo claro deste fato nos "Comentários" onde uma pessoa, sem nenhuma argumentação que se iguale a 1% da argumentação usada pelo autor, expressou seu descontentamento com o artigo.
Essa pessoa não entendeu nada do que foi escrito.
É este o dilema dos lúcidos no mundo atual e em especial no Brasil, a quantidade de analfabetos funcionais e congênitos é enorme.
E o pior, os mentores da "justiça social" não dão a menor importância para Rawls e Sen, ou para o autor deste artigo... por que?
Porque eles não visam os cultos, eles visam os milhões de analfabetos funcionais congênitos.
Então, não quero dizer que a discussão teórica culta não deva ser feita, mas, na prática ela é totalmente inútil.
Os defensores da "justiça social" falam para gente como a pessoa que se manifestou contra o artigo, tal pessoa "entende" facilmente o discurso dos defensores da "justiça social" pois isto é intuitivo nela, e jamais entenderá o significado deste artigo, por necessitar de capacidade intelectual isenta de valores pessoais.
Este artigo é valido para as poucas pessoas que o conseguem entender, mas, para os milhões de irracionais que existem no mundo o discurso deve ser feito de outra forma, neles deve-se usar muito o exemplo prático da mesma forma que se ensinam as crianças do pré-primário.