sábado, março 31, 2012

Revoguem a anistia (do mensalão)

Guilherme Fiuza, O GLOBO

As comemorações do golpe de 64 ganharam um alento este ano. O patético "parabéns pra você" no 31 de março, data inaugural da ditadura militar, andava quase inaudível na caserna, quando ganhou um reforço de peso. Dessa vez, o Brasil inteiro ouvirá os nostálgicos dos anos de chumbo - graças à ex-guerrilheira Dilma Rousseff.

No final dos anos 70, quando o regime autoritário chegava ao seu último capítulo, o general João Figueiredo assumiu a Presidência da República com um inesquecível brado "democrático": avisou que ia "prender e arrebentar" quem fosse contra a abertura política. Figueiredo fez escola. Na polêmica sobre a Comissão da Verdade, Dilma Rousseff botou para quebrar, em nome da democracia.

A presidente do governo popular mandou amordaçar militares da reserva que criticaram duas de suas ministras. As auxiliares de Dilma haviam defendido a revogação da Lei da Anistia - o pacto nacional para a saída da ditadura. Os militares contrariados publicaram um manifesto de repúdio no site do Clube Militar. Dilma mandou o Exército apagar o texto e enquadrou os militares como insubordinados. Quem for contra a Comissão da Verdade, ela prende e arrebenta (ou pelo menos censura).

Era o que faltava para ressuscitar as almas penadas leais ao golpe de 64. Autoritarismo é vitamina para elas. Mas ser a favor do regime militar também não pode. O governo de esquerda aceita o pensamento de direita, desde que ninguém o manifeste. A democracia popular tem dono: ame-a ou deixe-a.

Foi com esse espírito que um bando de militantes de partidos filiados ao poder central foi para a porta do Clube Militar, no Centro do Rio. Lá dentro ocorria uma homenagem ao movimento de março de 64. Do lado de fora, em defesa dos direitos humanos e da verdade, os manifestantes fecharam a Avenida Rio Branco na marra. Atiraram ovos contra seguranças do prédio, incendiaram cartazes e tentaram agredir militares que saíam do evento, provocando a reação da polícia que tentava protegê-los e transformando a Cinelândia em praça de guerra. Um show de democracia.

A Comissão da Verdade pretende investigar os crimes cometidos pela direita no poder. O país não pode mesmo dormir tranquilo sobre certos disparates, como a versão militar de que Vladimir Herzog se suicidou na cela do DOI-Codi. É um escárnio. O problema dessa revisão é que não se encontrará a verdade no passado sem saber onde ela anda no presente.

Hoje o Brasil é governado pela esquerda. E a esquerda combateu a ditadura, defendendo a democracia, a liberdade e os pobres. Como essa autoridade moral foi usada no poder? De várias formas - algumas delas não contabilizadas. Quando estourou o escândalo do mensalão, Delúbio Soares, então poderoso tesoureiro do PT, negou o flagrante com convicção: "É uma conspiração da direita contra o governo popular." O ex-guerrilheiro José Dirceu, apontado como chefe da quadrilha, caiu em desgraça, mas fez sua sucessora na Casa Civil: a "querida companheira de armas" Dilma Rousseff. Em meio às tramoias, a mística da resistência à ditadura estava intacta.

A virtude de mulher-coragem, ex-refém dos militares, levou Dilma longe. Candidata a presidente, transformou em ministra da Casa Civil a obscura companheira Erenice Guerra, também ungida pela mística da militância de esquerda. Enquanto Erenice caía por tráfico de influência, descobria-se que Dilma se fizera passar pela atriz Norma Bengell numa foto da Passeata dos Cem Mil, em 1968, divulgada por sua campanha. O que seria dela sem a ditadura?

Dilma não teria sido eleita - nem qualquer outro afilhado revolucionário de Lula - se os companheiros do mensalão tivessem sido punidos. Ali estava, para quem quisesse ver, a conversão de um partido e de uma causa "libertária" em sistema de perpetuação no poder, a partir de um planejado assalto ao Estado.
Transcorridos quase sete anos, essa fraude política sem precedentes permanece misteriosamente no colo do Supremo Tribunal Federal, prestes a sumir do mapa pela extinção do processo.

Aí a Justiça brasileira terá legalizado as palavras do general Lula: "O mensalão não existiu." Haverá uma Comissão da Verdade para desenterrar o crime dos heróis da resistência?

Enquanto o mito não se desmancha, as vítimas profissionais da ditadura vão fazendo o seu pé de meia. Na série de revoluções ministeriais, os comunistas se destacaram partilhando o dinheiro do Esporte entre as ONGs amigas do PCdoB. A imprensa burguesa bombardeou essa distribuição de renda e o ministro caiu, mas a companheira Dilma manteve o cargo com a agremiação. Em comunismo que está ganhando não se mexe (ainda mais em véspera de Copa do Mundo).

Assim como o ex-guerrilheiro Fernando Pimentel, que uniu forças com a amiga Dilma e se tornou um próspero consultor, muitos companheiros viverão em paz sob a anistia do mensalão. Essa, ninguém revoga.

Papai Krugman sabe o que é melhor para você!


Rodrigo Constantino

Se alguém for apontar cada absurdo que sai do teclado do prêmio Nobel de economia, Paul Krugman, esta pessoa não fará outra coisa da vida! É tanta falácia, tanta mentira, que espanta como este senhor, que demandou uma bolha imobiliária para "curar" o crash de tecnologia e hoje posa como detentor da "cura" para a nova crise - naturalmente, mais uma bolha produzida artificialmente pela impressão desenfreada de papel-moeda para financiar gastos públicos (ainda que contra alienígenas), como eu dizia, espanta que este senhor ainda tenha tanto espaço na imprensa, inclusive a nossa.

Eis que em artigo publicado hoje na Folha, Krugman ataca os juízes que Suprema Corte americana que ousam, vejam só!, preservar a Constituição do país. O governo americano não pode impor a compra de algum produto, mas o governo Obama não quer saber desses detalhes insignificantes, e seu ObamaCare pretende impor a compra de um seguro-saúde a todos os cidadãos (ou súditos?) do país. Um dos juízes disse que, se hoje o governo pode fazer isso, amanhã poderá obrigar todos a comprar brócolis. Claro que o juiz estava forçando a barra para fazer seu ponto, que ficou claro: quando a idéia de que o indivíduo sabe o que é melhor para si próprio se perde, dando lugar à premissa de que cabe ao governo decidir por todos, então por que parar no seguro de saúde? O governo poderia muito bem avançar e "proteger" ainda mais cada um, impondo, sim, uma dieta mais saudável.

Mas Krugman, democrata (leia-se esquerdista por lá) fanático, não quer saber dessas coisas bobas. No artigo, ele diz que é má-fé comparar as duas coisas, e explica o motivo: "Quando as pessoas optam por não comprar brócolis, não tornam o produto indisponível para aqueles que o desejam. Mas, quando as pessoas não fazem um plano a não ser que adoeçam - que é o que ocorre se a compra não for obrigatória -, o agravamento do paiol de risco resultante dessa decisão torna os planos mais caros, e até inacessíveis, para os demais". Vejam só que coisa interessante! Não obstante o coletivismo, as falácias são enormes. Vamos a elas.

Em primeiro lugar, a demanda mais escassa costuma afetar qualquer produto, não apenas plano de saúde. Se ninguém mais quiser comer brócolis, a verdura ficará indisponível também, ou muito cara pela perda de escala na produção, prejudicando aqueles que a consomem pensando na melhor saúde. Krugman, um prêmio Nobel de economia, deveria saber que as leis de oferta e procura se aplicam a todos os bens e produtos.

Em segundo lugar, a premissa do economista é interessante: ninguém faz plano de saúde saudável, apenas quando já está doente. Atenção, pois esta é a parte mais importante: Krugman, como todo esquerdista, sempre trata os indivíduos consumidores como mentecaptos, incapazes de escolher algo bom para si. É exatamente isso que Krugman está dizendo: que o povo, se puder escolher, não vai fazer plano de saúde porque não valoriza tal seguro. Afinal, ninguém faz seguro de carro, não é mesmo? Só quando bate de carro! É o que o prêmio Nobel assume como premissa para defender o avanço do governo sobre o indivíduo, inclusive rasgando a Carta Magna para tanto!

Esquerdistas paternalistas são sempre arrogantes e autoritários. Pensam ter uma visão holística da coisa, e encaram indivíduos como peças de xadrez no tabuleiro que eles, como mestres clarividentes e altruístas, vão mexer ao seu bel prazer em nome do "bem geral". Portanto, fiquem tranquilos: o papai Krugman sabe o que é melhor para você. E ainda que você discorde, isso não vem ao caso. Ele vai te obrigar a fazer aquilo que é "certo".

sexta-feira, março 30, 2012

O Brasil perdeu o que tinha de melhor

Mário Guerreiro, Filósofo

O brasileiro pode ter muitos defeitos e eu os tenho apontado há algum tempo, mas um defeito ele nunca teve e dificilmente terá: falta de senso de humor – um dos mais graves defeitos do ser humano!
O brasileiro é capaz de rir até mesmo da própria desgraça, e nas situações trágicas em que ele perde tudo, só não perde essa extraordinária capacidade.
Por incrível que pareça um hai-kai de Matsuo Basho - grande poeta japonês do período Tokugawa - expressa, com grande sutileza, exatamente isso que eu disse a respeito do brasileiro.
Um ladrão entrou na sua casa e levou tudo quanto lá havia, mas parece que, do ponto de vista do poeta, só não levou mesmo o que não podia levar...

O ladrão
Só se esqueceu de levar
A lua da janela

Há quem veja nessa capacidade de rir de si próprio sinais de desdém em relação a tudo e ausência de amor próprio do brasileiro considerando que “desgraça pouca é bobagem”.
Mas o grande Nietzsche que seguramente não carecia de amor próprio e de indiferença a tudo, não que disse que “Zombo daquele que não zomba de si próprio”?!
Contrariamente aos que vêem os sinais de falta de autoestima e desdém no riso do brasileiro, eu vejo sinais das virtudes da determinação e da superação dos maiores infortúnios. “Levanta, sacode a poeira e dá volta por cima”. “O que não mata, engorda”. “Brasileiro, profissão: esperança”.
Afinal, o que importa não é o que nos atinge, mas sim a maneira como somos atingidos e nossa reação diante da coisa. “O que dá pra rir dá pra chorar; questão de peso e de medida, problema de hora e de lugar”.
O Brasil é um país fora de série, tanto no que tem de bom como no que tem de ruim. Tem uma personalidade sui generis. Nossos políticos nos fazem rir e nossos humoristas nos fazem pensar na política.
Mas há ao menos dois tipos de humorista: aqueles cujo senso de humor lhes é endógeno: nascem com ele, vivem com ele e morrem com ele.
Como Voltaire que, no seu leito de morte, recebeu um padre e este ansioso por convertê-lo, disse para ele “Meu filho, eu sou um embaixador de Deus”.
E Voltaire: “Então, mostre-me então suas credenciais.”
E aqueles que fazem rir por ofício, como coveiros que não cavam covas para malhar os braços nem por lazer e diversão.
Os primeiros fazem humor em cena e fora de cena: são mesmo assim e não conseguem ser diferentes do que são. Os segundos só o fazem por dever de ofício: fora de cena ou desempenhando atividades sérias, eles carecem totalmente de senso de humor.
Vejam o caso de Agildo (Barata) Ribeiro. Ele é um sujeito bem humorado dentro e fora cena. O humor é parte constituinte de seu ser. Antes, durante e depois do Cabaré do Barata, aquele quadro cômico da TV em que Agildo conversava com bonecos caricatos de políticos famosos, como Brizola, Maluf, Lula, etc.
Vejam o caso de Luís Fernando Veríssimo. Quando ele se propõe a fazer humor cria estórias e tipos assaz hilariantes, como o Analista de Bagé, o maior psicanalista vivo depois de Freud. Bá! Índio velho muy vivo!
Porém, quando ele fala sério em seus artigos de jornal exala um esquerdismo delirante e perde totalmente seu sense of humour. Só me faz rir para não chorar ou para não decepcionar um velho amigo que contou uma piada “infame”.
Mas não é desses dois humoristas que eu pretendo falar, mas sim de outros dois.
No ano da graça ou da desgraça de 2012, lá pelos terríveis Idos de Março em que Júlio César foi traiçoeiramente apunhalado por seu filho adotivo Brutus e alguns senadores de Roma, o Brasil ficou de luto.
Perdeu dois de seus maiores humoristas: Chico Anysio e poucos dias depois Millôr Fernandes. Cada qual desenvolveu um estilo de humor, mas ambos foram excelentes no que faziam.
Chico criava um humor mais popular, embora nem sempre tivesse se limitado a simples bazófia ou ao besteirol. Muitas vezes seu humor era crítico dos costumes e dos tipos humanos. Foi talvez o mais rico criador de tipos, depois de Balzac na Comédia Humana – que, como A Divina Comédia de Dante, não era coisa para rir - pois criou mais de 200 tipos ao longo de sua carreira.
Examinando detidamente seus tipos mais conhecidos, podemos perceber na sua caracterização uma aguçada observação de figuras populares, principalmente do Nordeste bem conhecido por ele, que era de Maranguape (CE).
Mas ele não se limitou a ser um humorista regional nordestino. Sua tipologia incluía tipos cariocas, paulistas e até a gaúcha Salomé ao telefone conversando com figuras importantes do cenário nacional com a maior intimidade de uma conversa de comadres.
Foram tantos e tão interessantes que careço de espaço para falar sobre eles. Destaco o Painho, aquele pai-de-santo baiano que desmunhecava [Tivesse sido criado hoje, Chico seria considerado homofóbico e teria sido censurado!].
Destaco Bento Carneiro, o vampiro brasileiro, e seu fiel escudeiro Calunga. Segundo penso, o tipo mais hilariante do ponto de vista plástico da indumentária e da maquiagem.
Lembro-me bem do dia em que ele cravou os caninos no pescoço de numa vítima, mas tudo que conseguiu foi quebrar os dentes, podres que estavam por ele não ter dinheiro para pagar dentista. No Brasil, até vampiro, para sugar o sangue, é incompetente!
E havia também tipos políticos, como o notável deputado Justo Veríssimo, o representante do povo mais sincero de todos os tempos, que tinha um projeto para acabar com a fome no Brasil.
Não distribuindo por toda parte bolsas-família, mas sim dando comida envenenada para os pobres. De fato, sem pobres não há pobreza, a não ser pobreza de espírito. Mas isto não tem remédio que cure!
Justo Veríssimo era dotado de uma franqueza cavalar capaz de superar Immanuel Kant e Benjamin Franklin, que alegavam nunca ter mentido em todas as suas vidas. Ele estava sempre dizendo coisas que políticos só costumam dizer em off, cercado de apaniguados complacentes.
Coisas tais como: “Eu quero mais que os pobres se explodam”, “Eu só quero mesmo é me arrumar”. “Quem gosta de pobre é empada de botequim e chinelo velho”.
Se Chico fazia um humor mais popular, mas nunca descambando para o baixo nível e para a grosseria, Millôr fazia um humor mais intelectual, mas nunca descambando para o hermetismo e para o pedantismo.
Além de humorista, ele era um ótimo dramaturgo e tradutor de Shakespeare, por quem tinha grande admiração.
Conheci Chico ouvindo a Rádio Mayerink Veiga. Quando eu era criança não perdia A Cidade se Diverte, onde Chico Anysio entrava no ar juntamente com Matinhos, Walter Dávila, Emma Dávila e outros Conheci Millôr lendo a revista Cruzeiro em que ele adotou o pseudônimo de Vão Gogo e tinha uma coluna chamada Pif-Paf.
Nunca ninguém foi capaz de escrever peças de teatro tão breves e desconcertantes como as do Teatrinho Relâmpago, um vapt-vupt que terminava invariavelmente com o refrão: Cai rapidamente o pano.
Anos depois ele passou a escrever no Pasquim, juntamente com o Jaguar, Paulo Francis e outros. E finalmente encerrou sua carreira em Veja.
Para mim, Millôr foi o humorista brasileiro mais inteligente e perspicaz, de uma coerência a toda prova, que sempre se manteve fiel ao que pensava e nunca teve medo de dizer o que pensava, mesmo sabendo que iria desagradar a muitos.
Ora, nem Cristo conseguiu agradar a todos e aquele que tenta fazer tal coisa sempre acaba desagradando a si próprio.
Seu livro A Bíblia do Caos é uma ótima seleção das melhores do Millôr. E entre suas melhores e das últimas foi uma a respeito dos guerrilheiros de 1968 que, na Nova República, receberam polpudas indenizações e pensões vitalícias para suas viúvas.
Millôr chegou à conclusão de que sua ação guerrilheira nada mais era do que um investimento de longo prazo...
Mas eu não tinha dito que nossos políticos são pândegos e nossos humoristas nos fazem pensar na política?!

O encontro das cigarras com a realidade

Deu no G1: Espanha faz greve geral contra reformas trabalhistas

Diz a reportagem:

"A Espanha enfrenta nesta quinta-feira (29) uma greve geral de 24 horas contra as reformas trabalhistas propostas pelo governo. Os sindicatos espanhóis destacam a adesão “em massa”. Segundo informações das agências de notícias, trabalhadores fazem piquetes em frente às empresas.

Grupos sindicalistas foram às ruas e protestaram em frente as empresas e às estações de transporte público. De acordo com informações do governo espanhol, 33 pessoas foram detidas e cinco policiais ficaram feridos em incidentes menores."

No começo de 2010, escrevi para a revista VOTO um artigo sobre este inevitável encontro das cigarras europeias com a realidade. Nele, eu alertei:

Há, entretanto, um grave problema na equação: convencer esse povo, agora já acostumado, a abrir mão dos privilégios insustentáveis. Muitos já ameaçam ou até fazem greves gerais, mostrando que não aceitarão, sem luta, regressar à realidade, largar o osso oferecido pelo governo no passado. A cigarra, mesmo doente, não deseja abrir os olhos e verificar que aquela dolce vita não existe mais. Ela irá relutar até o final. Só que as formigas cansaram de bancar a farra da cigarra. Até quando ela conseguirá cantar assim?

quinta-feira, março 29, 2012

Os comissários da “verdade”


Foto: Celso Pupo/Foto Arena/AE

Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

Nesta quinta-feira ocorreu um evento no Clube Militar com o título “1964 – A Verdade”. Os painelistas convidados eram o jornalista Aristóteles Drummond, Dr. Heitor De Paola e o general Luiz Eduardo Rocha Paiva. O objetivo, como fica claro, era debater o contexto do “golpe” (para alguns um contragolpe) militar que derrubou Jango do poder. Tratava-se de uma evidente resposta a esta tentativa de se reescrever a história com forte viés ideológico por meio da dita Comissão da Verdade.

Manifestantes de esquerda, entretanto, partiram para ataques verbais, acusando os presentes de “torturadores”. Policiais tentaram liberar a avenida, fechada pelos manifestantes, que, por sua vez, começaram a jogar ovos nos representantes da lei e da ordem. Os protestos acabaram em pancadaria, como de praxe quando estes adoradores de Che Guevara resolvem “protestar”.

O episódio ilustra perfeita e sarcasticamente a contradição destes idólatras do comunismo. No afã de apagar os fatos daqueles tempos com a borracha do poder e colocar em seu lugar uma versão totalmente deturpada e maniqueísta, os comunistas acabam deixando transparecer seu real apreço pela democracia, ou seja, zero. Essa gente jamais tolerou o livre debate de idéias, e encara a coisa como uma batalha no ringue, em que socos falam mais que argumentos. Quem esqueceu de José Dirceu incitando seus discípulos a ganhar nem que fosse na pancada?

É assim que os “heróis da democracia”, pela ótica orwelliana moderna, com o beneplácito do poder, enxergam a tolerância democrática. Naqueles tristes anos, a turma, armada e financiada pelos soviéticos, lutava para impor uma ditadura comunista ao estilo cubano no país. Hoje, querem impor sua versão falsa dos fatos, calando com ameaças e violência aqueles que ousam contar o outro lado da história. Com tanto amor assim pela liberdade, esses comissários da “verdade” ainda vão transformar o Brasil em um “paraíso” como Cuba ou Venezuela!

Fracassamos

Marco Antonio Villa, Folha de SP

Nem o dr. Pangloss, célebre personagem de Voltaire, deve estar satisfeito com os rumos da nossa democracia. Não há otimismo que resista ao cotidiano da política brasileira e ao péssimo funcionamento das instituições.

Imaginava-se, quando ruiu o regime militar, que seria edificado um novo país. Seria a refundação do Brasil. Ledo engano.

Em 1974, Ernesto Geisel falou em distensão. Mas apenas em 1985 terminou o regime militar. Somente três anos depois foi promulgada uma Constituição democrática. No ano seguinte, tivemos a eleição direta para presidente.

Ou seja, 15 anos se passaram entre o início da distensão e a conclusão do processo. É, com certeza, a transição mais longa conhecida na história ocidental. Tão longa que permitiu eliminar as referências políticas do antigo regime. Todos passaram a ser democráticos, opositores do autoritarismo.

A nova roupagem não representou qualquer mudança nos velhos hábitos. Pelo contrário, os egressos da antiga ordem foram gradualmente ocupando os espaços políticos no regime democrático e impondo a sua peculiar forma de fazer política aos que lutaram contra o autoritarismo.

Assim, a nova ordem já nasceu velha, carcomida e corrompida. Os oligarcas passaram a representar, de forma caricata, o papel de democratas sinceros. O melhor (e mais triste) exemplo é o de José Sarney.

Mesmo com o arcabouço legal da Constituição de 1988, a hegemônica presença da velha ordem transformou a democracia em uma farsa.

Se hoje temos liberdades garantidas constitucionalmente (apesar de tantas ameaças autoritárias na última década), algo que não é pouco, principalmente quando analisamos a história do Brasil republicano, o funcionamento dos três Poderes é pífio.

A participação popular se resume ao ato formal de, a cada dois anos, escolher candidatos em um processo marcado pela despolitização. A cada eleição diminui o interesse popular. Os debates são marcados pela discussão vazia. Para preencher a falta de conteúdo, os candidatos espalham dossiês demonizando seus adversários.

O pior é que todo o processo eleitoral é elogiado pelos analistas, quem lembram, no século 21, o conselheiro Acácio. Louvam tudo, chegam até a buscar racionalidade no voto do eleitor.

Dias depois da "festa democrática", voltam a pipocar denúncias de corrupção e casos escabrosos de má administração dos recursos públicos. Como de hábito, ninguém será punido, permitindo a manutenção da indústria da corrupção com a participação ativa dos três Poderes.

Isso tudo, claro, é temperado com o discurso da defesa da democracia. Afinal, no Brasil de hoje, até os corruptos são democratas.

No último dia 15, a Nova República completou 17 anos. Ninguém lembrou do seu aniversário. Também pudera, lembrar para que?

No discurso que fez no dia 15 de janeiro de 1985, logo após a sua eleição pelo colégio eleitoral, Tancredo Neves disse que vinha "para realizar urgentes e corajosas mudanças políticas, sociais e econômicas, indispensáveis ao bem-estar do povo".

Mais do que uma promessa, era um desejo. Tudo não passou de ilusão.

Certos estavam Monteiro Lobato e Euclides da Cunha. Escreveram em uma outra conjuntura, é verdade. Mas, como no Brasil a história está petrificada, eles servem como brilhantes analistas.

Para Lobato, o Brasil "permanece naquele eterno mutismo de peixe". E Euclides arremata: "Este país é organicamente inviável. Deu o que podia de dar: escravidão, alguns atos de heroísmo amalucado, uma república hilariante e por fim o que aí está: a bandalheira sistematizada".

MARCO ANTONIO VILLA, 55, é historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)

The Dangers of an Interventionist Fed



By JOHN B. TAYLOR, WSJ

America has now had nearly a century of decision-making experience under the Federal Reserve Act, first passed in 1913. Thanks to careful empirical research by Milton Friedman, Anna Schwartz and Allan Meltzer, we have plenty of evidence that rules-based monetary policies work and unpredictable discretionary policies don't. Now is the time to act on that evidence.

The Fed's mistake of slowing money growth at the onset of the Great Depression is well-known. And from the mid-1960s through the '70s, the Fed intervened with discretionary go-stop changes in money growth that led to frequent recessions, high unemployment, low economic growth, and high inflation.

In contrast, through much of the 1980s and '90s and into the past decade the Fed ran a more predictable, rules-based policy with a clear price-stability goal. This eventually led to lower unemployment, lower interest rates, longer expansions, and stronger economic growth.

Unfortunately the Fed has returned to its discretionary, unpredictable ways, and the results are not good. Starting in 2003-05, it held interest rates too low for too long and thereby encouraged excessive risk-taking and the housing boom. It then overshot the needed increase in interest rates, which worsened the bust. Now, with inflation and the economy picking up, the Fed is again veering into "too low for too long" territory. Policy indicators suggest the need for higher interest rates, while the Fed signals a zero rate through 2014.

It is difficult to overstate the extraordinary nature of the recent interventions, even if you ignore actions during the 2008 panic, including the Bear Stearns and AIG bailouts, and consider only the subsequent two rounds of "quantitative easing" (QE1 and QE2)—the large-scale purchases of mortgage-backed securities and longer-term Treasurys.

The Fed's discretion is now virtually unlimited. To pay for mortgages and other large-scale securities purchases, all it has to do is credit banks with electronic deposits—called reserve balances or bank money. The result is the explosion of bank money (as shown in the nearby chart), which now dwarfs the Fed's emergency response to the 9/11 attacks.

Before the 2008 panic, reserve balances were about $10 billion. By the end of 2011 they were about $1,600 billion. If the Fed had stopped with the emergency responses of the 2008 panic, instead of embarking on QE1 and QE2, reserve balances would now be normal.

This large expansion of bank money creates risks. If it is not undone, then the bank money will eventually pour out into the economy, causing inflation. If it is undone too quickly, banks may find it hard to adjust and pull back on loans.

The very existence of quantitative easing as a policy tool creates unpredictability, as traders speculate whether and when the Fed will intervene again. That the Fed can, if it chooses, intervene without limit in any credit market—not only mortgage-backed securities but also securities backed by automobile loans or student loans—creates more uncertainty and raises questions about why an independent agency of government should have such power.

The combination of the prolonged zero interest rate and the bloated supply of bank money is potentially lethal. The Fed has effectively replaced the entire interbank money market and large segments of other markets with itself—i.e., the Fed determines the interest rate by declaring what it will pay on bank deposits at the Fed without regard for the supply and demand for money. By replacing large decentralized markets with centralized control by a few government officials, the Fed is distorting incentives and interfering with price discovery with unintended consequences throughout the economy.

For all these reasons, the Federal Reserve should move to a less interventionist and more rules-based policy of the kind that has worked in the past. With due deliberation, it should make plans to raise the interest rate and develop a credible strategy to reduce its outsized portfolio of Treasurys and mortgage-backed securities.

History shows that reform of the Federal Reserve Act is also needed to incentivize rules-based policy and prevent a return to excessive discretion. The Sound Dollar Act of 2012, a subject of hearings at the Joint Economic Committee this week, has a number of useful provisions. It removes the confusing dual mandate of "maximum employment" and "stable prices," which was put into the Federal Reserve Act during the interventionist wave of the 1970s. Instead it gives the Federal Reserve a single goal of "long-run price stability."

The term "long-run" clarifies that the goal does not require the Fed to overreact to the short-run ups and downs in inflation. The single goal wouldn't stop the Fed from providing liquidity when money markets freeze up, or serving as lender of last resort to banks during a panic, or reducing the interest rate in a recession.

Some worry that a focus on the goal of price stability would lead to more unemployment. History shows the opposite.

One reason the Fed kept its interest rate too low for too long in 2003-05 was concern that raising the interest rate would increase unemployment in the short run. However, an unintended effect was the great recession and very high unemployment. A single mandate would help the Fed avoid such mistakes. Since 2008, the Fed has explicitly cited the dual mandate to justify its extraordinary interventions, including quantitative easing. Removing the dual mandate will remove that excuse.

A single goal of long-run price stability should be supplemented with a requirement that the Fed establish and report its strategy for setting the interest rate or the money supply to achieve that goal. If the Fed deviates from its strategy, it should provide a written explanation and testify in Congress. To further limit discretion, restraints on the composition of the Federal Reserve's portfolio are also appropriate, as called for in the Sound Dollar Act.

Giving all Federal Reserve district bank presidents—not only the New York Fed president—voting rights at every Federal Open Market Committee meeting, as does the Sound Dollar Act, would ensure that the entire Federal Reserve system is involved in designing and implementing the strategy. It would offset any tendency for decisions to favor certain sectors or groups in the economy.

Such reforms would lead to a more predictable policy centered on maintaining the purchasing power of the dollar. They would provide an appropriate degree of oversight by the political authorities without interfering in the Fed's day-to-day operations.

Mr. Taylor is a professor of economics at Stanford and a senior fellow at the Hoover Institution. This op-ed is adapted from his testimony this week before the Joint Economic Committee, which drew on his book "First Principles: Five Keys to Restoring America's Prosperity." (W.W. Norton, 2012).

quarta-feira, março 28, 2012

Demanda agregada


Rodrigo Constantino*

“As estatísticas são como o biquíni: o que revelam é interessante, mas o que ocultam é essencial.” (Roberto Campos)

Não sei quanto ao leitor, mas eu demandaria um iate, um helicóptero e um jatinho se eu tivesse bilhões de dólares sobrando. Minha demanda tende ao infinito. Se não desfruto de tais bens materiais, isso se deve à falta de recursos, não de demanda. Esta conclusão pode parecer extremamente óbvia, e deveria. Infelizmente, a obviedade é algo em escassez quando se trata da economia keynesiana.
O foco obsessivo dos keynesianos em dados agregados acabou deturpando sua visão de mundo. Em vez de compreenderem que tais agregados servem, no máximo, como modelos simplificadores imperfeitos, esses economistas acabaram aceitando que a abstração era a realidade, gerando muita confusão teórica. O exemplo mais claro desta inversão é o tratamento dado ao PIB. A fórmula conhecida, Y = C + I + G + (X – M), produziu na cabeça dos mais desatentos uma crença absurda, qual seja, a de que o aumento dos gastos públicos é algo positivo para o crescimento econômico.
Como o governo não pode dar nada sem tirar do setor privado, pois suas fontes de recursos são os impostos, a inflação (que não passa de um imposto disfarçado) e o endividamento (que terá de ser pago eventualmente), claro que o aumento dos gastos públicos terá como contrapartida, inevitavelmente, a redução ou dos investimentos privados ou do consumo privado. Mas o foco demasiado no curto prazo, fruto de uma visão míope, faz com que os keynesianos negligenciem esses impactos negativos ao longo do tempo. Se o governo quer estimular o crescimento econômico e, portanto, a criação de empregos, basta ele expandir seus gastos.
Em Os pecados do capital, Robert Murphy dá um exemplo politicamente incorreto de falha no cálculo do PIB. Ele cita o caso de um homem que se casa com sua governanta, e explica: “Antes do casamento, os serviços dela (lavar, aspirar e cozinhar) eram comprados no mercado aberto e, portanto, contribuíam para o PIB oficial. Mas, depois do casamento, a nova dona-de-casa realiza essas mesmas tarefas ‘de graça’, fazendo o PIB oficial diminuir em função de seu salário anual anterior”. Da mesma forma, as operações no mercado negro, enormes em um país burocrático como o Brasil, não são computadas nos números oficiais do PIB. Ao excluir os gastos “intermediários” do cálculo, para evitar dupla contagem, o PIB “minimiza a importância dos capitalistas e exagera o papel dos consumidores finais e os gastos do governo”.
O economista Mark Skousen aponta outro exemplo dessas falhas:

Especialmente durante as festas natalinas, a mídia informa quase diariamente sobre as perspectivas das vendas a varejo, sugerindo que, se as vendas do Natal subirem, a economia está saudável e sólida. Por trás desses relatórios está a noção de que, se as festas natalinas durassem o ano inteiro, a economia poderia se expandir ainda mais

Entre vários problemas no cálculo do PIB, talvez o mais importante seja esse foco excessivo nos gastos, tanto dos consumidores como do governo. Isso passa a ideia de que são os gastos que geram a produção e, portanto, o crescimento econômico.
Keynes argumentava que, em períodos de insuficiente demanda agregada, caberia ao governo compensar esta queda com o aumento dos gastos. É a famosa política anticíclica. Foi a justificativa teórica perfeita para políticos ansiosos para torrar o dinheiro da “viúva” e conquistar votos pelas vias populistas. Claro que, na época da bonança e do forte crescimento econômico, o termo “anticíclico” era ignorado. A política acabava unidirecional, como se feita por economistas manetas. Mas o próprio conceito de demanda agregada insuficiente é falacioso. Parece que o rabo é que balança o cachorro, e não o contrário.
A lógica, de forma simplificada, funciona assim: a crise econômica ocorre como reação a uma queda da demanda agregada, sabe-se lá por qual motivo. Os empreendedores perderam seu “espírito animal” de repente. E cabe ao governo estimular a economia com aumento de gastos. Isso fará a demanda agregada subir, empregos serão criados e o consumo poderá retomar sua trajetória. Com mais consumo, as empresas produzem mais, empregando mais gente. Os salários podem aumentar, gerando um ciclo virtuoso. Parece tão simples que toda a miséria do mundo fica parecendo apenas resultado da falta de “vontade política”.
Claro que isso tudo não passa de uma grande falácia econômica. Os keynesianos trocam a ordem dos fatores, alterando o produto final. Basta pensar em Robinson Crusoé e Sexta-Feira em uma ilha. Seria absurdo supor que é a demanda de algum deles que produz o crescimento econômico. Robinson Crusoé pode demandar uma enorme casa, mas esta só será produzida se houver recursos disponíveis. E estes dependem da poupança e da produtividade. Logo, é a poupança efetiva que permite o investimento produtivo, que, por sua vez, possibilita mais consumo depois. É preciso fazer o bolo para depois comê-lo. Keynesianos pensam que podem ter e comer o bolo ao mesmo tempo.
Se alguém questiona quais fatores permitem o aumento da “renda nacional”, a resposta deverá ser: a melhoria dos equipamentos, das ferramentas e máquinas empregadas na produção, por um lado, e o avanço na utilização dos equipamentos disponíveis para a melhor satisfação possível das demandas individuais, por outro lado. O primeiro caso depende da poupança e da acumulação de capital; o segundo, das habilidades tecnológicas e das atividades empresariais. Se o aumento da renda nacional em termos reais é chamado de progresso, devemos aceitar que este é fruto das conquistas dos poupadores, investidores e empreendedores.
Os gastos do governo costumam desviar recursos destes fins mais produtivos. Keynes chegou no ponto absurdo de defender que seria justificável o governo, durante uma crise, contratar gente para cavar buracos e mais gente para tampá-los. Evidentemente que o fantástico desta proposta não passou despercebido na época. Questionado sobre o efeito de tais medidas no longo prazo, Keynes cunhou sua famosa frase: “No longo prazo estaremos todos mortos”. O longo prazo, porém, inexoravelmente chega, por razões cronológicas. Hoje, nada mais é que o longo prazo de algum tempo atrás. E, para aqueles vivos, o custo desta mentalidade keynesiana costuma ser bastante elevado.
Com esta ferramenta equivocada, os keynesianos conseguiram até mesmo creditar guerras pela recuperação econômica. Paul Krugman, laureado com o Prêmio Nobel de Economia e um dos maiores ícones do keynesianismo moderno, repete o tempo todo que foi a Segunda Guerra Mundial que salvou os Estados Unidos da Grande Depressão. Mais recentemente, ele chegou a defender que gastos públicos para criar um mecanismo de defesa contra a hipotética invasão alienígena seria uma medida sensata para conter a crise. Eis o grau de absurdo que chega à lógica keynesiana. Qualquer reflexão mais atenta mostraria que jamais pode ser favorável para a economia desviar recursos escassos para fins inúteis. Qual o ganho social em utilizar aço e trabalho escasso para produzir navios que serão afundados na guerra? Como dizia Mises, a prosperidade que a guerra traz para a economia é a mesma dos furacões e terremotos.
Na verdade, esta falácia é bem antiga, e já tinha sido refutada por Bastiat em seu exemplo da janela quebrada. Algum vândalo joga uma pedra que estilhaça a janela de uma loja. Em seguida, algumas pessoas tentam consolar o dono da loja alegando que, ao menos, ele estará gerando emprego ao consertar a janela. Afinal, se janelas nunca fossem quebradas, de que iriam viver os reparadores de janelas? Esta linha de raciocínio cai justamente na falácia anteriormente citada, pois ignora aquilo que não se vê de imediato. Sim, o conserto da janela iria propiciar um ganho para o vidraceiro. Mas o que seria feito desse dinheiro gasto caso a janela não tivesse sido quebrada? Eis a pergunta que nem todos fazem, porém crucial para o entendimento da economia.
Existem várias alternativas de uso que o dono da loja poderia dar ao dinheiro. Ele poderia investi-lo para aumentar a produção, poderia poupá-lo ou poderia gastar com qualquer outra coisa. Supondo que ele gastasse a mesma quantia na compra de um terno, o alfaiate teria sido beneficiado, mas agora que o dinheiro foi usado para consertar a janela, esse terno deixou de ser vendido. Isso é aquilo que não se vê, ao menos de imediato. O alfaiate do exemplo é ignorado, é o homem esquecido na análise superficial da coisa. Parece ridículo de tão óbvio este caso, mas o leitor mais leigo ficaria chocado com os demais casos, que são apenas variações dessa mesma falácia.
Como espero ter deixado claro, as recessões econômicas não são resultado de ausência de demanda agregada, pois esta nada mais é que o somatório da demanda de todos os agentes econômicos, que tende ao infinito. O buraco é bem mais embaixo. E quando o governo tenta estimular a economia gastando mais, endividando-se e contratando trabalhadores para tarefas improdutivas, isso apenas agrava o problema estrutural. Os consumidores e empresários sabem que terão de pagar a conta mais cedo ou mais tarde, e isso afeta suas decisões. Consumo estimulado artificialmente produz apenas inflação, se financiado pela emissão de moeda sem lastro. E o tiro keynesiano sai pela culatra, pois os investidores ficam receosos com o futuro aumento de impostos, necessário para honrar os gastos mais elevados do governo.
A hiperatividade do governo durante as crises costuma afetar negativamente a economia, ao contrário do que pensam os keynesianos. Manipular a “demanda agregada” jamais foi ou será uma política sensata de crescimento econômico sustentável. Os keynesianos são como alquimistas modernos, que acreditam poder transformar chumbo em ouro por meio da magia. Como os alquimistas antigos, estão fadados ao fracasso, sempre. Infelizmente, aprendemos com a história que poucos aprendem com a história.
A despeito dos inúmeros fracassos das políticas keynesianas no passado, eles sempre dão um jeito de ignorar as lições históricas e reinterpretar os fatos de forma a jogar a culpa dos erros em ombros alheios. O governo gastou trilhões em estímulos e, ainda assim, a economia ameaça nova recessão? Então, claro que o problema só pode ter sido falta de estímulo! Insanidade, já alertava Einstein, é fazer tudo igual novamente e esperar resultados diferentes. Os insanos estão no poder.

* Artigo inédito do livro "Liberal com orgulho" (Ed. Lacre, 2011)

terça-feira, março 27, 2012

Brasil: um país emergente?

The Great Escape: Delivering in a Delevering World

Bill Gross, PIMCO

• When interest rates cannot be dramatically lowered further or risk spreads significantly compressed, the momentum begins to shift, not necessarily suddenly, but gradually – yields moving mildly higher and spreads stabilizing or moving slightly wider.
• In such a mildly reflating world, unless you want to earn an inflation-adjusted return of minus 2%-3% as offered by Treasury bills, then you must take risk in some form.
• We favor high quality, shorter duration and inflation-protected bonds; dividend paying stocks with a preference for developing over developed markets; and inflation-sensitive, supply-constrained commodity products.
About six months ago, I only half in jest told Mohamed that my tombstone would read, “Bill Gross, RIP, He didn’t own ‘Treasuries’.” Now, of course, the days are getting longer and as they say in golf, it is better to be above – as opposed to below – the grass. And it is better as well, to be delivering alpha as opposed to delevering in the bond market or global economy. The best way to visualize successful delivering is to recognize that investors are locked up in a financially repressive environment that reduces future returns for all financial assets. Breaking out of that “jail” is what I call the Great Escape, and what I hope to explain in the next few pages.
The term delevering implies a period of prior leverage, and leverage there has been. Whether you date it from the beginning of fractional reserve and central banking in the early 20th century, the debasement of gold in the 1930s, or the initiation of Bretton Woods and the coordinated dollar and gold standard that followed for nearly three decades after WWII, the trend towards financial leverage has been ever upward. The abandonment of gold and embracement of dollar based credit by Nixon in the early 1970s was certainly a leveraging landmark as was the deregulation of Glass-Steagall by a Democratic Clinton administration in the late 1990s, and elsewhere globally. And almost always, the private sector was more than willing to play the game, inventing new forms of credit, loosely known as derivatives, which avoided the concept of conservative reserve banking altogether. Although there were accidents along the way such as the S&L crisis, Continental Bank, LTCM, Mexico, Asia in the late 1990s, the Dot-coms, and ultimately global subprime ownership, financial institutions and market participants learned that policymakers would support the system, and most individual participants, by extending credit, lowering interest rates, expanding deficits, and deregulating in order to keep economies ticking. Importantly, this combined fiscal and monetary leverage produced outsized returns that exceeded the ability of real economies to create wealth. Stocks for the Long Run was the almost universally accepted mantra, but it was really a period – for most of the last half century – of “Financial Assets for the Long Run” – and your house was included by the way in that category of financial assets even though it was just a pile of sticks and stones. If it always went up in price and you could borrow against it, it was a financial asset. Securitization ruled supreme, if not subprime.
As nominal and real interest rates came down, down, down and credit spreads were compressed through policy support and securitization, then asset prices magically ascended. PE ratios rose, bond prices for 30-year Treasuries doubled, real estate thrived, and anything that could be levered did well because the global economy and its financial markets were being levered and levered consistently.
And then suddenly in 2008, it stopped and reversed. Leverage appeared to reach its limits with subprimes, and then with banks and investment banks, and then with countries themselves. The game as we all have known it appears to be over, or at least substantially changed – moving for the moment from private to public balance sheets, but even there facing investor and political limits. Actually global financial markets are only selectively delevering. What delevering there is, is most visible with household balance sheets in the U.S. and Euroland peripheral sovereigns like Greece. The delevering is also relatively hidden in the recapitalization of banks and their lookalikes. Increasing capital, in addition to haircutting and defaults are a form of deleveraging that is long term healthy, if short term growth restrictive. On the whole, however, because of massive QEs and LTROS in the trillions of dollars, our credit based, leverage dependent financial system is actually leverage expanding, although only mildly and systemically less threatening than before, at least from the standpoint of a growth rate. The total amount of debt however is daunting and continued credit expansion will produce accelerating global inflation and slower growth in PIMCO’s most likely outcome.
How do we deliver in this New Normal world that levers much more slowly in total, and can delever sharply in selective sectors and countries? Look at it this way rather simplistically. During the Great Leveraging of the past 30 years, it was financial assets with their expected future cash flows that did the best. The longer the stream of future cash flows and the riskier/more levered those flows, then the better they did. That is because, as I’ve just historically outlined, future cash flows are discounted by an interest rate and a risk spread, and as yields came down and spreads compressed, the greater return came from the longest and most levered assets. This was a world not of yield, but of total return, where price and yield formed the returns that exceeded the ability of global economies to consistently replicate them. Financial assets relative to real assets outperform in such a world as wealth is brought forward and stolen from future years if real growth cannot replicate historical total returns.
To put it even more simply, financial assets with long interest rate and spread durations were winners: long maturity bonds, stocks, real estate with rental streams and cap rates that could be compressed. Commodities were on the relative losing end although inflation took them up as well. That’s not to say that an oil company with reserves in the ground didn’t do well, but the oil for immediate delivery that couldn’t benefit from an expansion of P/Es and a compression of risk spreads – well, not so well. And so commodities lagged financial asset returns. Our numbers show 1, 5 and 20-year histories of financial assets outperforming commodities by 15% for the most recent 12 months and 2% annually for the past 20 years.
This outperformance by financial as opposed to real assets is a result of the long journey and ultimate destination of credit expansion that I’ve just outlined, resulting in negative real interest rates and narrow credit and equity risk premiums; a state of financial repression as it has come to be known, that promises to be with us for years to come. It reminds me of an old movie staring Steve McQueen called The Great Escape where American prisoners of war were confined to a POW camp inside Germany in 1943. The living conditions were OK, much like today’s financial markets, but certainly not what they were used to on the other side of the lines so to speak. Yet it was their duty as British and American officers to try to escape and get back to the old normal. They ingeniously dug escape tunnels and eventually escaped. It was a real life story in addition to its Hollywood flavor. Similarly though it is your duty to try to escape today’s repression. Your living conditions are OK for now – the food and in this case the returns are good – but they aren’t enough to get you what you need to cover liabilities. You need to think of an escape route that gets you back home yet at the same time doesn’t get you killed in the process. You need a Great Escape to deliver in this financial repressive world.
What happens when we flip the scenario or perhaps reach the point at which interest rates cannot be dramatically lowered further or risk spreads significantly compressed? The momentum we would suggest begins to shift: not necessarily suddenly or swiftly as fatter tail bimodal distributions might warn, but gradually – yields moving mildly higher, spreads stabilizing or moving slightly wider. In such a mildly reflating world where inflation itself remains above 2% and in most cases moves higher, delivering double-digit or even 7-8% total returns from bonds, stocks and real estate becomes problematic and certainly much more difficult. Real growth as opposed to financial wizardry becomes predominant, yet that growth is stressed by excessive fiscal deficits and high debt/GDP levels. Commodities and real assets become ascendant, certainly in relative terms, as we by necessity delever or lever less. As well, financial assets cannot be elevated by zero based interest rate or other tried but now tired policy maneuvers that bring future wealth forward. Current prices in other words have squeezed all of the risk and interest rate premiums from future cash flows, and now financial markets are left with real growth, which itself experiences a slower new normal because of less financial leverage.
That is not to say that inflation cannot continue to elevate financial assets which can adjust to inflation over time – stocks being the prime example. They can, and there will be relative winners in this context, but the ability of an investor to earn returns well in excess of inflation or well in excess of nominal GDP is limited. Total return as a supercharged bond strategy is fading. Stocks with a 6.6% real Jeremy Siegel constant are fading. Levered hedge strategies based on spread and yield compression are fading. As we delever, it will be hard to deliver what you have been used to.
Still there is a place for all standard asset classes even though betas will be lower. Should you desert bonds simply because they may return 4% as opposed to 10%? I hope not. PIMCO’s potential alpha generation and the stability of bonds remain critical components of an investment portfolio.
In summary, what has the potential to deliver the most return with the least amount of risk and highest information ratios? Logically, (1) Real as opposed to financial assets – commodities, land, buildings, machines, and knowledge inherent in an educated labor force. (2) Financial assets with shorter spread and interest rate durations because they are more defensive. (3) Financial assets for entities with relatively strong balance sheets that are exposed to higher real growth, for which developing vs. developed nations should dominate. (4) Financial or real assets that benefit from favorable policy thrusts from both monetary and fiscal authorities. (5) Financial or real assets which are not burdened by excessive debt and subject to future haircuts.
In plain speak –
For bond markets: favor higher quality, shorter duration and inflation protected assets.
For stocks: favor developing vs. developed. Favor shorter durations here too, which means consistent dividend paying as opposed to growth stocks.
For commodities: favor inflation sensitive, supply constrained products.
And for all asset categories, be wary of levered hedge strategies that promise double-digit returns that are difficult in a delevering world.
With regard to all of these broad asset categories, an investor in financial markets should not go too far on this defensive, as opposed to offensively oriented scenario. Unless you want to earn an inflation adjusted return of minus 2-3% as offered by Treasury bills, then you must take risk in some form. You must try to maximize risk adjusted carry – what we call “safe spread.”
“Safe carry” is an essential element of capitalism – that is investors earning something more than a Treasury bill. If and when we cannot, then the system implodes – especially one with excessive leverage. Paul Volcker successfully redirected the U.S. economy from 1979-1981 during which investors earned less return than a Treasury bill, but that could only go on for several years and occurred in a much less levered financial system. Volcker had it easier than Bernanke/King/Draghi have it today. Is a systemic implosion still possible in 2012 as opposed to 2008? It is, but we will likely face much more monetary and credit inflation before the balloon pops. Until then, you should budget for “safe carry” to help pay your bills. The bunker portfolio lies further ahead.
Two additional considerations. In a highly levered world, gradual reversals are not necessarily the high probable outcome that a normal bell-shaped curve would suggest. Policy mistakes – too much money creation, too much fiscal belt-tightening, geopolitical conflicts and war, geopolitical disagreements and disintegration of monetary and fiscal unions – all of these and more lead to potential bimodal distributions – fat left and right tail outcomes that can inflate or deflate asset markets and real economic growth. If you are a rational investor you should consider hedging our most probable inflationary/low growth outcome – what we call a “C-“ scenario – by buying hedges for fatter tailed possibilities. It will cost you something – and hedging in a low return world is harder to buy than when the cotton is high and the living is easy. But you should do it in amounts that hedge against principal downsides and allow for principal upsides in bimodal outcomes, the latter perhaps being epitomized by equity markets 10-15% returns in the first 80 days of 2012.
And secondly, be mindful of investment management expenses. Whoops, I’m not supposed to say that, but I will. Be sure you’re getting value for your expense dollars. We of course – perhaps like many other firms would say, “We’re Number One.” Not always, not for me in the summer of 2011, but over the past 1, 5, 10, 25 years? Yes, we are certainly a #1 seed – with aspirations as always to be your #1 Champion.

E o aquecimento global, hein?

Rodrigo Constantino

Deu no WSJ: Global Warming Models Are Wrong Again

Diz um trecho do artigo, cujo autor é professor de física em Princeton:

What is happening to global temperatures in reality? The answer is: almost nothing for more than 10 years. [...] The lack of any statistically significant warming for over a decade has made it more difficult for the United Nations Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) and its supporters to demonize the atmospheric gas CO2 which is released when fossil fuels are burned. [...] Frustrated by the lack of computer-predicted warming over the past decade, some IPCC supporters have been claiming that "extreme weather" has become more common because of more CO2. But there is no hard evidence this is true.

Não sou especialista no tema, naturalmente. Mas algumas coisas sempre me incomodaram muito quando o assunto era aquecimento global. Em primeiro lugar, a histeria, que não combina com ciência séria. Em segundo lugar, o oportunismo político de gente como Al Gore, que usa o tema como desculpa para concentrar mais poder no governo. Em terceiro lugar, o refúgio ideológico que muitos comunistas encontraram para atacar o capitalismo, desta vez por sua criação de riqueza insustentável. São os "melancias", verdes por fora, mas vermelhos por dentro.

Por fim, o fato de o IPCC ser ligado ao governo, a ONU, e a postura contra os "dissidentes" ser radical, fanática, denotando linguagem de seita religiosa, e não da ciência. Tentaram encerrar o debate calando na marra aqueles que ousavam questionar. Isso é a morte da ciência propriamente dita. Como sou cético sempre, fiquei com a pulga atrás da orelha, li livros sobre o assunto, e fiquei cada vez mais convencido de que havia mentira demais naquilo vendido ao grande público. Quando mudaram a acusação de "aquecimento global" para "mudanças climáticas", deram a senha de que provavelmente se tratava de embuste mesmo. Mudanças climáticas é termo vago o suficiente para englobar qualquer coisa! E assim eles podem manter a histeria, independente dos FATOS.

Escrevi vários artigos sobre o assunto. Segue um desses artigos, com base no livro de Bjorn Lomborg.

Máfias sindicais italianas

Rodrigo Constantino

Deu no Financial Times: OECD urges ‘ambitious’ eurozone reform

Diz um trecho da reportagem:

The OECD indirectly backed Mr Monti’s reform agenda, and called on Italy among others to reduce restrictions on labour mobility, ease job protection and reform the wage bargaining system.

Qualquer economista sabe que é preciso flexibilizar as leis trabalhistas na Europa e reduzir a enorme quantidade de regalias artificiais que impedem maior dinamismo no mercado de trabalho. O desemprego está em patamares elevados, especialmente para os mais jovens, menos produtivos na média. O welfare state cobra seu pesado custo!

Mas politicamente é muito difícil reformar o mercado de trabalho, pois uma máfia sindical tomou conta da situação. Na Inglaterra, uma líder corajosa como Thatcher conseguiu dobrar a espinha dos mafiosos. Mas faltam lideranças na Europa hoje! E um governo tecnocrata como o de Mario Monti não tem o respaldo popular para enfrentar este desafio. Monti já começa a perder apoio.

Há dez anos, Marco Biagi, um economista reformador, tentava implementar na Itália mudanças nas leis trabalhistas, nos moldes propostos por Monti hoje. Seu destino: foi baleado e morto! É assim que a máfia sindical costuma agir quando enxerga risco aos seus privilégios, obtidos sempre à custa dos trabalhadores e pagadores de impostos.

Será que Monti dessa vez consegue levar adiante as reformas? Espero que sim, mas é cedo para dizer. Os obstáculos são enormes, e acho difícil ele ter força suficiente para mexer nesse vespeiro. O mais provável é mudar pouca coisa, e as máfias sindicais preservarem seu poder.

Roberto Saviano sabe como é mexer com a máfia italiana. E os sindicatos podem não ser a Camorra, mas não estão muito longe disso. Apenas mais uma coisa que faz a Itália parecer o Brasil da Europa...

Filmes de Páscoa

João Pereira Coutinho, Folha de SP

1. Brandon é um viciado. Não em drogas, não em bebida, nem sequer em pastilhas socialmente aceitáveis. O negócio dele é sexo.
O leitor sorriu com essa possibilidade: sexo é vício que não mata ninguém. E a ciência médica tem dúvidas sobre isso. "Dependência sexual" será uma compulsão patológica ou a melhor forma de aliviar a consciência da mulher traída?
Deixemos de lado essas discussões. Voltemos a Brandon. No início de "Shame", filme de Steve McQueen, ele está deitado sobre uma cama. Tronco despido. Pele branca. Rosto pálido, magro, seco. Lençóis muito azuis.
McQueen, o diretor, é também artista plástico. O plano não é inocente: uma evocação perfeita de um Cristo nas suas mortalhas, como os maneiristas o pintaram repetidamente. Aquele homem está morto. Difícil saber se haverá ressurreição.
Existe uma sequência do filme que exprime esse óbito -e peço desculpa aos leitores por revelá-la aqui (os interessados podem sempre saltar alguns parágrafos): acontece quando Brandon, o supremo predador sexual, não consegue ter relações com uma colega de escritório.
A sequência vale o filme porque é, no duplo sentido da expressão, um "turn off". Os dias de Brandon são o avesso desse fracasso: prostitutas, orgias, encontros casuais em bares -o homem é um garfo insaciável. Tão insaciável que a pornografia e a masturbação servem de aperitivo e sobremesa para os pratos principais.
Só que Brandon falha naquele prato. A razão é tão simples e trágica que qualquer admiração adolescente por ele morre ali, na cama: a moça era a única mulher com quem Brandon tivera uma sombra de envolvimento emocional.
Jantaram antes. Conversaram trivialidades. Beijaram-se, acariciaram-se. E, quando finalmente chegam aos finalmentes, há um olhar trocado entre os dois -um olhar de desejo, sim, mas sobretudo de vulnerabilidade- que acaba com o nosso garanhão.
Ele se afasta, cobre o rosto e sente vergonha, a vergonha de que fala o título. Não a vergonha de ter brochado -Brandon encarrega-se, logo a seguir, de contratar uma profissional para mostrar que ainda é homem.
Mas nós, testemunhas de tudo, sabemos que ele não é. E que a vergonha maior é esta mesma: a vergonha de ser incapaz de estabelecer com qualquer ser humano uma ligação substancial.
Essa incapacidade será amplificada pela irmã de Brandon, que chega a Nova York e instala-se no seu apartamento por uns dias. Sissy é o avesso do irmão: envolve-se muito, sente muito, magoa-se muito.
Brandon não gosta do estilo. Não por se preocupar com a irmã -isso é pedir muito para quem deixou atrofiar a linguagem básica da afeição. Mas porque a irmã devolve-lhe o reflexo da seu incomensurável vazio. "Você me encurrala", grita, na noite em que a expulsa do apartamento. Brandon precisa do seu espaço imaculadamente vazio.
"Shame" é um dos filmes do ano. Porque há muitos anos o cinema não mostrava, de forma tão sem piedade e adulta, a intransponível solidão de um homem.
2. Michael Fassbender, em "Shame", é um prodígio de representação dramática que Hollywood, na sua temporada de prêmios, não foi capaz de suportar. Mas existe um lugar "ex aequo" para Michel Piccoli em "Habemus Papam".
Sou espectador de Piccoli há vários anos e só ele me faria assistir a um filme de Manoel de Oliveira (no caso, "Vou Para Casa", em 2001).
Em "Habemus Papam", Piccoli é o cardeal Melville, eleito papa no conclave, que, na hora de apresentação aos fiéis, é acometido por um pânico paralisante.
Piccoli é magistral nessa combinação de medo, tristeza e doçura infantil. E o filme de Nanni Moretti, contrariamente ao que foi escrito na Europa, não é um ataque à igreja -ou, mais amplamente, ao cristianismo.
Arrisco mesmo dizer que, ao filmar a fragilidade de um homem sobre quem os seus pares (ou o Espírito Santo?) colocaram tão ciclópica tarefa, Moretti realizou uma obra cristã por excelência.
"Pai, por que me abandonaste?", teria suspirado Cristo nos momentos finais da sua agonia na cruz.
Se ao filho de Deus foi permitido um tal momento de fraqueza, por que não a um mero filho de homens?

A incompetência virou elogio

Marco Antonio Villa, O GLOBO

O governo Dilma Rousseff lembra o petroleiro João Cândido. Foi inaugurado com festa, mas não pôde navegar. De longe, até que tem um bom aspecto. Mas não resiste ao teste. Se for lançado ao mar, afunda. Não há discurso, por mais empolgante que seja, que consiga impedir o naufrágio. A presidente apresenta um ar de uma política bem-intencionada, de uma tia severa e até parece acreditar no que diz. Imagina que seu governo vai bem, que as metas estão cumpridas, que formou uma boa equipe de auxiliares e que sua relação com a base de sustentação política é estritamente republicana. Contudo, os seus primeiros 15 meses de governo foram marcados por escândalos de corrupção, pela subserviência aos tradicionais oligarcas que controlam o Legislativo em Brasília e por uma irritante paralisia administrativa.

Inicialmente, a presidente vendeu a ideia que o Ministério não era dela, mas de Lula. E que era o preço que teria pagado por ser uma neófita na política nacional. Alguns chegaram até a acreditar que ela estaria se afastando do seu tutor político, o que demonstra como é amplo o campo do engodo no Brasil. Foi passando o tempo e nada mudou. Se ocorreram algumas mudanças no Ministério, nenhuma foi por sua iniciativa. Além do que, foi mantida a mesma lógica na designação dos novos ministros.

Confundindo cara feia com energia, a presidente continuou representando o papel de hábil executiva e que via a política com certo desprezo, como se os seus ideais de juventude não estivessem superados. Como sua base não é flor que se cheire, acabou até ganhando a simpatia popular. Contudo, não se afastou deste jardim, numa curiosa relação de amor e ódio. Manteve o método herdado do seu padrinho político, de transformar a ocupação do Estado em instrumento permanente de negociação política. E ainda diz, sem ficar ruborizada, que não é partidária do toma lá dá ca. Dá para acreditar?

O Ministério é notabilizado pela inoperância administrativa. Bom ministro é aquele que não aparece nos jornais com alguma acusação de corrupção. Para este governo, isto basta. Sem ser enfadonho, basta destacar dois casos. Aloizio Mercadante teve passagem pífia pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Se fosse demitido na reforma ministerial - aquela que a presidente anunciou no último trimestre do ano passado e até hoje não realizou -, poucos reclamariam, pois nada fez durante mais de um ano na função. Porém, como um bom exemplo do tempo em que vivemos, acabou promovido para o Ministério da Educação. Ou seja, a incapacidade foi premiada. O mesmo, parece, ocorrerá com Edison Lobão, que deve sair do Ministério de Minas e Energia para a presidência do Senado, com o beneplácito da presidente. O que fez de positivo no seu ministério?

Numa caricata representação de participação política, Dilma patrocinou uma reunião com o empresariado nacional para ouvir o já sabido. Todas as reclamações ou concordâncias já eram conhecidas antes do encontro. Então, para que a reunião? Para manter a aura da Presidência-espetáculo? Para garantir uma fugaz manchete no dia seguinte? Será que ela não sabe que não tem o poder de comunicação do seu tutor político e que tudo será esquecido rapidamente?

Uma das maiores obras da atualidade serve como referência para analisar como o governo trata a coisa pública. Desde quando foi anunciada a transposição de parte das águas do Rio São Francisco, inúmeras vozes sensatas se levantaram para demonstrar o absurdo da proposta. Nada demoveu o governo. Além do que estava próxima a eleição presidencial de 2010. Dilma ganhou de goleada na região por onde a obra passaria - em algumas cidades teve 92% dos votos. Passaria porque, apesar dos bilhões gastos, os canteiros estão abandonados e o pouco que foi realizado está sendo destruído pela falta de conservação. Enquanto isso, estados como a Bahia estão sofrendo com a maior seca dos últimos 30 anos. E, em vez de incentivar a agricultura seca, a formação de cooperativas, a construção de estradas vicinais e os projetos de conservação da água desenvolvidos por diversas entidades, a presidente optou por derramar bilhões de reais nos cofres das grandes empreiteiras.

A falta de uma boa equipe ministerial, a ausência de projetos e o descompromisso com o futuro do país são evidentes. O pouco - muito pouco - que funciona na máquina estatal é produto de mudanças que tiveram início no final do século XX. A ausência de novas iniciativas é patente. Sem condições de pensar o novo, resta ao governo maldizer os países que estão dando certo em vez de aprender as razões do êxito, reforçando um certo amargor nacional com o sucesso alheio. No passado a culpa era imputada aos Estados Unidos; hoje este papel está reservado à China.

Como em um conto de fadas, a presidente acredita que tudo terá um final feliz. Mas, até agora, o lobo mau está reinando absoluto na floresta. Basta observar os péssimos resultados econômicos do ano passado quando o Brasil foi o país que menos cresceu na América do Sul. E a comparação é com o Paraguai e o Equador e não com a Índia e a China.

Não é descabido imaginar que a presidente foi contaminada pelo "virus brasilienses". Esta "espécie", que prolifera com muita facilidade em Brasília, tem uma variante mais perigosa, o "petismus". A vacina é a democracia combinada com outra forma de governar, buscando a competência, os melhores quadros e alianças programáticas. Mas em um país marcado pela subserviência, a incompetência governamental se transformou em elogio.

MARÇO ANTONIO VILLA é historiador

segunda-feira, março 26, 2012

Ouch! It's a Hard Landing

By ALAN ABELSON, Barron's

Spring seems to have come a little early this year, and we're pleased, of course, to greet it warmly. Still: What happened to winter? In these parts, anyway, it made a brief and frosty appearance way back in October and then…vanished! More, we suspect, the result of meteorological mischief than mishap. It must be that whoever is in charge of the weather up there is bored to tears, hungry for diversion and intent on turning the world upside down.

We're not complaining, understand; for who can argue that this pockmarked planet with its bloody bouts of suppression and mayhem couldn't use a bit of straightening out?

For openers, we'd urge those devilish deities to engage in a little spring cleaning of the Middle East, concentrating on Iran and Syria. We're not suggesting biblical plagues or anything of that nature. Just a judicious culling of the ne'er-do-wells that have a foot on the necks of the populace. Not only would that miraculously relieve the oppressed natives, but, equally important, it would also sharply cut the price of a gallon of gasoline.

And the fix-it impulse might well be extended to Europe, subject, as it is, to recurring economic hemorrhaging inflicted largely by the populace's imprudence and aggravated by the stubborn insistence of the powers that be that austerity is a credible tourniquet.

As it happens, moreover, from all indications, China, which has become the biggest shopper for everything ever known to acquisitive man, has begun to show unmistakable signs of economic fatigue. Here, those prankish heavenly beings apparently have already started messing with the command economy.

For example, the China Banking Regulatory Commission owned up to the fact that the country's banks had underestimated the risk of some 20% of their outstanding loans—a cool $286 billion worth—to local governments. Reclassifying such loans, moreover, will take more than a stroke of the pen. The sinning banks may have to kick in a heap of yuan to build up their kitties against loan losses and scare up more collateral. The worry is that, if the local governments come up shy and banks fail to be repaid, Beijing will have to engineer its third bank bailout in not quite two decades.

China's trade numbers have turned disappointing as the dread combo of deleveraging in Europe and the U.S. and the deepening recession on the Continent are taking a toll. Increasingly, too, it strikes us that it's no longer a question of whether the Chinese economy will have a hard or soft landing, but how hard a landing.

Indeed, a fortnight ago, according to a report by Bloomberg News, at a conference in Singapore, JPMorgan Chase's chief Asian and emerging-market strategist, Adrian Mowat, declared that—no ifs, ands, or buts—"China is in a hard landing." He proceeded to reel off the negatives: "Car sales are down, cement production is down, steel production is down, construction stocks are down. It's not a debate anymore, it's a fact."

Mowat went on to stress that "One should be concerned about what's happening in the China property market. People are too complacent that the government can turn what's going on in this market."

It all sounds very much like the bursting of the bubble here, when only a lonely few thought it was for real. Mowat said that a pickup in property demand seems unlikely, and he can't find "any evidence of a policy move that will cause the economy to reaccelerate."

We've saved the best for last. Undeniably, as our quirky stock market gives evidence, our own proud nation is by no means immune to those offshore troubles enumerated above or the whimsy of the gods. Indeed, it may be that, as Messrs. Obama, Romney and Santorum agree, the U.S. is exceptional for all its spasms of fiscal imprudence.

While the rest of humanity struggles to regain its economic balance, we manage to amble along keeping our economy in a recovery mode, nipping away at unemployment and actually adding jobs. We may not be out of the woods yet, but at least we're not lost deep inside them.

And now comes Goldman Sachs, heralding the outlook for equities, calling it as good as it has been in a generation. That was the gist of a 40-page report, which at first sight seems like you would need a generation to digest it. It's called "The Long Good Buy," and, while it's nicely put together and even mostly comprehensible, a quick but attentive leaf-through left us unpersuaded.

In short, we hadn't even a flicker of interest in rushing out to buy a stock. But then, hey, what's the hurry, we've got a generation to think it over.

Desindustrialização ou lobby?

João Luiz Mauad, O GLOBO

Alguém já disse: torture os números e eles confessarão qualquer coisa. De fato, as estatísticas são, hoje em dia, as grandes aliadas dos mistificadores, que as utilizam de forma indiscriminada para dar aparencia científica às falácias e mentiras em prol de suas causas. Você pode desenvolver rígida argumentação lógica a respeito de um assunto sem convencer muita gente, mas basta acrescentar alguns números, tabelas e gráficos para respaldá-la e as pessoas passam a olhar os seus argumentos com outros olhos.

Um exemplo gritante disso apareceu no jornal Folha de São Paulo, de 09 de março. Nesse dia, uma matéria naquele diário informava - sob o título “Participação da indústria no PIB recua aos anos JK” - que “a participação da indústria no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro recuou aos níveis de 1956, quando a indústria respondeu por 13,8% do PIB. De lá para cá, a indústria se diversificou, mas seu peso relativo diminuiu. O auge da contribuição da indústria para a geração de riquezas no país ocorreu em 1985: 27,2% do PIB. Desde então, tem caído.”

Malgrado o título bombástico, até aqui a matéria é meramente informativa e apenas noticia um fato que as estatísticas a respeito desvendam. Seu uso oportunista só fica claro a partir do ponto em que se começa a apontar eventuais causas para um suposto problema. Assim, depois da introdução, entra em cena o senhor Paulo Skaf, que vem a ser o presidente da FIESP. Eis o que diz o valente: “Temos energia cara, spreads bancários dos maiores do mundo, câmbio valorizado, custo tributário enorme e uma importação maciça. A queda da indústria no PIB é a prova do processo de desindustrialização”.

Exceto pelo exagero de afirmar que há no Brasil - um dos países mais protecionistas do mundo - volumes de importação maciços, quase tudo o que ele diz, fora a conclusão, é a mais pura verdade. O problema é que temos ali várias verdades sendo ditas com o propósito de retirar delas conclusões absolutamente falsas.

Primeiro, a maioria dos entraves listados por Skaf, além de outros tantos integrantes daquilo que se convencionou chamar de “custo Brasil, não prejudicam somente a indústria, mas todos os setores da economia. Segundo, se a queda da participação relativa do setor manufatureiro no PIB é prova da famigerada desindustrialização, então o que temos hoje é uma desindustrialização mundial.

De acordo com dados compilados pelas Nações Unidas, a queda da participação do setor de manufaturas no PIB é um fenômeno global, a exemplo do que já ocorrera anteriormente com a agricultura. Assim, de 1970 a 2010 esta queda foi de 24,5% para 13,5% no Brasil, de 22% para 13% nos EUA, de 19% para 10,5% no Canadá, de 31,5% para 18,7% na Alemanha e de 27% para 16% no mundo inteiro.

A causa dessa queda generalizada não está, evidentemente, numa suposta desindustrialização, mas no aumento da participação de outros setores, antes irrisórios, como serviços em geral, comércio, finanças, saúde, educação, ciência e tecnologia, etc. A verdade é que a produção total da indústria no mundo, se não está no seu pico está muito perto dele. Já a produção industrial brasileira é certamente muito maior hoje, em termos absolutos, do que era em 1985, ano em que, segundo a matéria, o setor manufatureiro alcançou a sua maior participação relativa no PIB.

Desindustrialização e Doença Holandesa são duas expressões caras aos lobbistas da indústria local. Uma rápida pesquisa com essas palavras no Google mostra diversos estudos e trabalhos “científicos” a respeito, repletos de gráficos e tabelas, a maioria deles patrocinada por entidades como FIESP, CNI e congêneres. Esse é também um importante nicho do pensamento nacionalista e intervencionista, utilizado amiúde para defender interesses, vantagens e privilégios diversos junto ao governo. Os pleitos desse pessoal não costumam variar muito. Seus alvos prioritários são as ditas políticas industriais (geralmente baseadas em subsídios e isenções fiscais) e protecionistas, leia-se: controles cambiais e barreiras alfandegárias / tarifárias.

O argumento aparente é quase sempre a criação e manutenção de empregos domésticos, mas a real intenção é a transferência de renda de consumidores para produtores ineficientes. Para que a estratégia seja 100% eficaz, a manipulação da opinião pública e o consequente respaldo político são essenciais, é claro.

As filhas da desgraça

Luiz Felipe Pondé, Folha de SP

"Eu sou um ex-covarde", escreveu Nelson Rodrigues, no "Globo", no dia 18/10/1968. E continua: "... o medo começa nos lares, e dos lares passa... para as universidades, e destas para as Redações... Sim, os pais têm medo dos filhos; os mestres, dos alunos".
Sobre Nelson, leia "Inteligência com Dor, Nelson Rodrigues Ensaísta", de Luís Augusto Fischer (ed. Arquipélago). Grande livro, rodriguiano até a medula: a inteligência é mesmo uma ferida aberta.
Paulo Francis dizia que um dia o mundo seria tomado pelos comissários do povo. Chegamos perto disso: os comissários dos ofendidos babam de vontade de tomar conta do pensamento público, esmagando tudo o que não concorda com sua autoestima.
Não conseguirão porque o pensamento público é como uma guerra. A arena do pensamento público cria valores na mesma medida em que enfrenta seus algozes.
Não ter medo é um tema mais filosófico do que parece. O filósofo alemão Nietzsche, crítico feroz do cristianismo e da metafísica, era na realidade um crítico do medo. A chave de sua crítica ao ressentimento é a identificação do medo como morte do Eros. E Eros é tesão pela vida.
Quando ele diz que o homem do futuro não necessitará de artigos de fé, ele não pensa apenas na religião, nível menor da sua crítica e onde muita gente fica, mas sim em artigos de fé menos evidentes como "meu eu", "meus valores", "minha dignidade", "minha concepção de vida" ou "meu direito a autoestima".
Enfim, toda essa parafernália brega em moda hoje em dia entre os puritanos seculares (aqueles que perderam Deus, mas continuam derretendo de medo dos seus demônios). Escondidos atrás de esquemas para garantir que seu "eu" não seja inundado pelo pânico da "hostilidade primitiva do mundo", da qual fala Camus.
Por isso basta falar de figuras malditas que o horror sobe à superfície. Uma das figuras que mais carrega esse halo de mal é a prostituta, essa filha da desgraça, como dizia Nelson. Basta mencioná-la e o atávico horror vem à tona.
E aí..., pânico na bancada da classe média. A classe que se define pelo medo, principalmente quando assume ares de rigor moral: treme em surtos de eterno puritanismo.
O problema com a classe média é seu espírito. Diria um marxista blasé que "espírito" é mero epifenômeno do "bolso", mas, como não sou marxista, dou o benefício da dúvida para classe média. O espírito da classe média é um ressentido, por isso teme qualquer abalo em seu mundo do bem. Para ele, enxergar o mundo de frente é fora do orçamento, como uma BMW para alguém que ganha salário mínimo.
Mas o que é a prostituta e por que ela é eterna? A prostituta não é apenas o sexo fácil, é a mulher fácil. É o "lugar" onde o homem descansa e, por isso, é parte essencial de toda civilização. Por isso é um mito.
Para mim, ver o mito da prostituta nos sonhos femininos mais misteriosos é um elogio ao Eros da mulher. Enfim, talvez nem todos os homens amem as prostitutas, só os normais. O amor à promiscuidade confessa é uma arte rara.
Às vezes, segundo as profissionais do ramo, o consumidor nem quer sexo, quer uma "namorada" que o ouça e que ele saiba exatamente quanto custa. Sem ter que pagar pelo "amor" dela (jantares, joias, discussões sobre a relação, cobranças, desempenho sexual, atenção).
Os homens temem as mulheres, e as prostitutas são aquelas de quem eles podem ter menos medo porque acham que as tem em suas mãos.
Mas é difícil para muitas mulheres entender isso. Quer ver?
Colaborei com um veículo importante da mídia numa pesquisa sobre garotas de programa de luxo. Meninas caras, mas nunca tão "caras" quanto namoradas e esposas de verdade.
O que disse acima aparece na pesquisa: a prostituta é a companheira fácil, por tempo determinado e custo previamente estabelecido.
Mas o incrível é que, mesmo essas profissionais, quando indagadas se achariam que seus futuros maridos precisariam de suas ex-colegas um dia, respondem: "Não, nós seríamos mais do que suficiente para eles".
"Ignorance is bliss." A realidade é mesmo insuportável, e a verdade é uma ferida incurável.

Mentalidade autoritária

Meu artigo no OrdemLivre hoje: Pessoas que costumam afirmar que deveria ter uma lei contra isso ou aquilo, porque não gostam disso ou daquilo, denotam forte tendência autoritária.

sábado, março 24, 2012

Ética de mercado


Rodrigo Constantino, revista VOTO

Uma reportagem do “Fantástico” na Rede Globo gerou indignação em muitos brasileiros, cansados das cenas constantes de corrupção que vem à tona sem surtir o efeito desejado. Nas imagens chocantes, ainda que o fato em si seja de conhecimento geral, representantes de empresas privadas fornecedoras de produtos para um hospital público conversavam tranquilamente sobre as propinas envolvidas no negócio.

A certa altura, um dos envolvidos repete que esta é a “ética de mercado”, querendo dizer que este tipo de esquema é o normal. A deixa foi aproveitada pelos governantes. O foco voltou-se totalmente para os corruptores. Falou-se em CPI, em investigação das empresas privadas envolvidas, em cancelar os contratos. Ou seja, ataca-se os sintomas do problema, preservando intactas as verdadeiras causas da enorme corrupção que campeia no país.

E quais seriam então estas causas? Em primeiro lugar, no topo da lista, a impunidade. Não basta mostrar imagens que embrulham o estômago dos brasileiros decentes, se estes sabem que nada de concreto vai acontecer com os culpados. Após tantos escândalos de corrupção e nenhum peixe graúdo atrás das grades, fica difícil manter a confiança na justiça. Vale lembrar que nem o “mensalão” foi julgado ainda. Um país com tanta impunidade destroça seu tecido social, as pessoas perdem a esperança e o incentivo para serem corretas. O jeitinho compensa, a honestidade é punida.

Mas acabar com a impunidade, ainda que necessário, não é suficiente. Mesmo um país com severas punições vai se ver diante de diversos casos de corrupção quando o governo concentra poder e recurso em demasia. A explicação é simples: o dinheiro é da “viúva”, e faz parte da gestão pública um desleixo maior na administração dos recursos. É da natureza humana cuidar melhor daquilo que se tem a propriedade.

Ninguém apresenta o mesmo esmero ao cuidar de um carro alugado em comparação aos cuidados com o próprio carro. E funcionários públicos administram fortunas de titularidade alheia. Um convite e tanto à corrupção. O sujeito negocia contratos bilionários, sem o escrutínio de sócios privados preocupados com o uso de seus recursos, e sem um mecanismo adequado de incentivos à sua eficiência. Ou seja, ele não é premiado por competência como ocorre no setor privado, tampouco é punido da mesma forma quando se mostra pouco produtivo.

No setor público, de forma geral, há um estímulo às trocas de “favores”, não de produtos e serviços eficientes em busca de maior lucratividade. Depender somente do altruísmo e da honestidade do funcionário que concentra tanto poder é um risco enorme. Qualquer um minimamente informado tem consciência disso, bastando pensar nos esquemas de licitação para obras públicas. Uma maior transparência pode ajudar, mas não resolve. As somas envolvidas e a natureza do governo fazem com que a corrupção seja tentadora demais.

Por isso o desvio do foco para o corruptor é um erro, que agrada justamente àqueles interessados em manter o status quo. Não que o corruptor deva ser poupado. Ao contrário: é preciso puni-lo com rigor, mas ciente de que isso não vai resolver o problema, não vai atacar suas raízes. As empresas X, Y e Z sairão de cena, apenas para dar lugar às empresas A, B e C. E a propina continuará existindo, assim como o superfaturamento das obras e outras formas de se desviar recursos públicos.

A ética do mercado, portanto, não tem nada a ver com o escândalo mostrado pelo “Fantástico”. É justamente o oposto: a verdadeira ética do mercado é premiar a meritocracia, a competência, fazendo com que os melhores e mais eficientes no atendimento da demanda fiquem com os lucros justos, as recompensas legítimas das trocas voluntárias entre consumidores e produtores.

A fortuna que Steve Jobs criou ao oferecer ao mundo os desejados produtos da Apple, eis um bom exemplo da “ética de mercado”. A livre concorrência garantindo que os mais aptos a satisfazer as demandas possam enriquecer de maneira honesta. Quando entendemos isso, fica claro que empresas subornando funcionários públicos para furar a livre concorrência não apresentam semelhança alguma com esta ética descrita acima, uma ética capitalista ou de mercado, na falta de termo melhor.

Enquanto o governo for o dono de um cartão de débito que lhe dá o direito de gastar 40% de tudo aquilo que é produzido no país, corruptores vão voar em torno dos funcionários públicos como moscas em volta de mel. A hipertrofia do governo é um convite irresistível aos parasitas de plantão, que disputam as infindáveis tetas estatais não por meio da ética de mercado, mas sim através das tentadoras propinas.

Resumindo, enquanto os brasileiros não voltarem sua atenção e energia para o cerne da questão, cenas abjetas como aquelas mostradas na TV serão parte de nosso cotidiano. A impunidade deve ser o primeiro alvo, sem dúvida. Tolerância zero com corruptos e corruptores. Mas é preciso mais. É preciso reduzir o poder e a quantidade de recursos que trafega pelo governo.

Felicidade coletiva e mensurável


Rodrigo Constantino

Deu no Estadão: Índice vai medir felicidade do brasileiro

Diz a matéria:

A riqueza do País pode começar a ser mensurada de outra forma. No lugar do Produto Interno Bruto (PIB), a Felicidade Interna Bruta (FIB). A Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) está empenhada na elaboração da metodologia do novo índice. A intenção é fornecer os resultados ao governo federal para auxiliar no desenvolvimento de políticas públicas.

O FIB já existe no Butão, um pequeno reino incrustado nas cordilheiras do Himalaia. Lá, o contentamento da população é mais importante que o desempenho da produção industrial. O índice pensado pela FGV, no entanto, não será tão radical. "O PIB será um dos componentes do cálculo", esclarece Fábio Gallo, professor da FGV-SP que, ao lado de Wesley Mendes, encabeça o desenvolvimento do estudo.


Modéstia às favas, até porque antecipar certas tendências neste país é tão complicado quanto acertar as próximas fases da Lua, eis um artigo meu profético, publicado em 2010. Nele, eu mostro meu lado Nostradamus:

O próximo passo talvez seja aquele adotado no Butão, que largou os indicadores mais objetivos, como renda per capita, e trocou PIB por FIB, ou seja, Felicidade Interna Bruta para medir o “progresso” do país.

E estamos chegando lá, Huxley! Anotem o próximo passo: o governo vai oferecer "soma" para todos os cidadãos, e o índice de "felicidade" (sic) vai às alturas! Se medir bananas somadas às maçãs já é algo extremamente complicado para calcular o PIB, imagina somar a "felicidade" do José com a do Pedro! A gente tem que rir para não chorar neste país. Alguém me consegue um Prozac?

sexta-feira, março 23, 2012

Socialismo não funciona... mais?

Rodrigo Constantino

Deu no GLOBO: Papa diz que comunismo não funciona mais em Cuba. Há duas coisas absurdas na simples chamada: Como assim não funciona MAIS? E como assim em Cuba? Ele NUNCA funcionou, e em lugar ALGUM!

Ao menos a reportagem teve um momento engraçado. Em um dia triste para quem aprecia o humor, com a perda do incomparável Chico Anysio, a matéria trouxe a PIADA DO DIA, proferida por Bruno Rodriguez, ministro de Relações Exteriores de Cuba: "Nós respeitamos todas as opiniões. Consideramos útil a troca de ideias". Um tanto de mau gosto, é verdade. Mas uma grande piada!

Para quem quer saber os motivos que sempre levaram e levariam o socialismo ao fracasso total, recomendo minha palestra (parte 1 e parte 2) no Forum da Liberdade sobre o assunto. Aqueles que argumentam que o socialismo nunca existiu de fato, lembro que enquanto fim ele jamais existirá, pois se trata de uma (terrível) utopia. Mas enquanto meio, existiu sim, deixando sempre um rastro de miséria e escravidão por onde passou.

Portugal é a próxima Grécia?

Rodrigo Constantino

A revista alemã Der Spiegel perguntou ao gestor da PIMCO, El-Erian, se Portugal seria a segunda Grécia em 2011. Ele respondeu de forma direta: "Yes, unfortunately that will be the case". A revista discorda, e argumenta que as reformas estão acontecendo de forma muito mais rápida em Portugal, que teria condições de evitar o destino do calote grego. Como pontos positivos, Portugal conseguiu reduzir o défict de 9,8% para 4,5% do PIB, as medidas de austeridade desfrutam de maior apoio popular, a economia já está saindo da recessão, e o país possui algumas empresas competitivas, ao contrário da Grécia.

O veredicto ainda não saiu. O futuro é incerto. O que se sabe, entretanto, é que os excessos da era da bonança precisam ser ajustados, e que o ajuste será doloroso para os portugueses. Alguns jovens já começam a migrar para outros países em busca de oportunidade de emprego. Em artigo no Globo ano passado, eu expliquei melhor a situação de Portugal, fazendo inclusive um paralelo com o Brasil. A desgraça de nossos patrícios serve como alerta para os brasileiros. É melhor prevenir do que remediar, como diz o ditado.

Cuba capitalista?


Rodrigo Constantino

A revista alemã Der Spiegel publica matéria sobre Cuba, afirmando que Havana começa a sentir o gosto do livre mercado. A reportagem alega que o "presidente" (sic) Raul Castro tem adotado reformas liberalizantes no país, e que a Igreja Católica tem apoiado maior abertura.

A revista britânica The Economist dessa semana trata do mesmo assunto, com matéria de capa sobre Cuba. A reportagem afirma que finalmente o capitalismo está dando o ar de sua graça na ilha, e que os Estados Unidos deveriam incentivar estas mudanças.

Será que a ilha-presídio caribenha realmente vai caminhar em direção ao capitalismo, com reformas liberalizantes? Será que o feudo particular dos Castro vai fazer como a China, que manteve o controle político, mas adotou inúmeras mudanças econômicas em prol de maior liberdade, colhendo como resultado elevadas taxas de crescimento e milhões de indivíduos saindo da miséria? Tomara que sim! Mas eu teria muito mais cautela que as duas revistas. É cedo demais para comemorar.

Enquanto alguém com o sobrenome Castro estiver dando as cartas no inferno comunista do Caribe, eu duvido que mudanças realmente expressivas ocorram. Espero estar enganado, mas quem aposta para ver?

Em 2010, quando o próprio Fidel Castro supostamente afirmou que o modelo cubano não funcionada "mais", escrevi um artigo sobre o assunto. Recomendo a leitura.