terça-feira, novembro 17, 2009

Deu no Valor Econômico

Palavra do gestor: Se é bom demais para ser verdade, então não deve ser verdade

Rodrigo Constantino
17/11/2009

"Im a great believer in luck, and I find the harder I work the more I have of it." (Thomas Jefferson)

Desconfie de todos os atalhos para o sucesso. Normalmente, o caminho para o sucesso é árduo e longo, repleto de obstáculos. Demanda esforço, trabalho, coragem, tolerância ao risco, dedicação e paciência. Thomas Edison dizia que a genialidade era 1% de inspiração e 99% de transpiração. As trilhas costumam levar a penhascos com frequência.

Exemplos do cotidiano não faltam. Quem deseja emagrecer, pode tomar aquelas bolinhas para cortar caminho. Não sem graves sequelas. A saúde cobra um elevado preço. O barato sai caro. O mesmo para quem deseja ficar forte num piscar de olhos. Os anabolizantes fazem o serviço parecer mais tranquilo, mas é tudo ilusão. O corpo vai contabilizando com juros o preço da aventura.

Quem deseja conhecimento passa pelo mesmo dilema. Aqueles livrinhos que fazem resumo do resumo para cada filósofo, prometendo aprendizado em apenas 90 minutos de leitura, atraem muita gente com preguiça de beber direto da fonte. Mas ninguém vai conhecer de fato a filosofia de Nietzsche, por exemplo, lendo um livro desses. Para uma conversa de bar, esses livros podem ser úteis. Mas o conhecimento verdadeiro custa mais caro em termos de investimento do tempo disponível.

Os saltos discretos normalmente não ocorrem no progresso da mente ou do corpo. Não há porque ser diferente quando se trata do bolso. Claro que existem exceções. Alguém pode ficar rico de repente, com uma ideia brilhante ou ganhando na loteria. Mas contar com isso é mais do que arriscado: é irresponsável.

O gradualismo quase sempre faz parte do sucesso, principalmente daquele sustentável. O campeão não se torna campeão no ringue. Ali, ele apenas é reconhecido. Está colhendo o que foi plantado ao longo de um período de árduo treinamento. Na vida, colhemos aquilo que plantamos, não o que sonhamos. Os golpes de sorte ou os raros casos de genialidade existem justamente para comprovar a regra. Portanto, uma boa dose de ceticismo diante de promessas fantásticas é sempre saudável. Aquilo que parece bom demais para ser verdade, normalmente não é verdade!

Como gestor de um fundo que investe em outros fundos, sempre olho com desconfiança redobrada para aqueles gestores com desempenho exageradamente positivo. Conseguir dobrar o capital em um ano pode acontecer uma vez, por mérito do gestor ou sorte. Mas quando alguém apresenta retornos incríveis por três, quatro anos seguidos, uma luz amarela acende automaticamente.

Pode acontecer, sem dúvida, como pode acontecer de alguém ganhar na loteria. Mas eu prefiro não arriscar o patrimônio dos clientes em um produto desses. Quando a esmola é demais, o santo desconfia. Essa sabedoria popular com frequência é ignorada no mercado financeiro. A tentação de ficar rico num curto espaço de tempo é sedutora demais.

O melhor exemplo desse risco foi a débâcle do LTCM em 1998. O fundo apresentou retornos incríveis por três anos seguidos até que tudo veio abaixo em poucos dias. Descobriu-se que o excesso de alavancagem e o risco de liquidez podem custar caro demais: a própria sobrevivência do negócio. No Brasil, o caso recente do GWI reforça a lição de que um desempenho bom demais pode ocultar por algum tempo um risco elevado demais também. Quando os ventos mudam de direção, a realidade fica exposta. A observação de Warren Buffett vai direto ao ponto: "Quando baixa a maré é que a gente vê quem estava nadando pelado."

Voltando à analogia com o corpo, todos sabem no fundo o que deve ser feito para emagrecer: fechar a boca e fazer exercício físico. Mas é mais fácil falar do que fazer. Esforço contínuo, perseverança e paciência são ingredientes necessários numa dieta saudável. E nem todos conseguem seguir essa trajetória. No caminho, os atalhos poderão ser tentadores demais, como o canto das sereias em Odisseia. E como Ulisses teria feito, amarrando-se no mastro, devemos criar mecanismos próprios de controle contra tais tentações. Elas podem ser fatais.

O mesmo costuma ocorrer quando se trata de riqueza. Como dizia novamente Warren Buffett, não importa quão grande seja o talento ou esforço, algumas coisas simplesmente demandam tempo: não é possível produzir um bebê em um mês engravidando nove mulheres. Evite as trilhas para o sucesso. Se fosse fácil chegar lá, todos já teriam chegado. E anotem em local de destaque a seguinte lição de David Starr Jordan: "Sabedoria é saber o que fazer; virtude é fazer."

Rodrigo Constantino é economista e gestor de recursos

3 comentários:

ntsr disse...

http://www.dilbert.com/strips/comic/2008-08-24/

Everardo disse...

Rodrigo, o investidor se obriga cada vez mais a compreender cenários cada vez mais complexos, com milhões de variáveis. E em um ambiente em transformação (digamos uma "pororoca" cultural) pela necessiadade de revisão em conceitos muito arraigados, é lúcido pensar que precisam deixar de ser apenas economistas ortodoxos e se transformem em bons observadores dos fenômenos sociais. O realismo deve susbstituir os preconceitos e as verdades devem começar a ser vistas com desconfiança. Creio que você está preparado para isso, mas é muito apegado a conceitos fragentários e escravo do maniqueísmo. Mas, como e disse antes, você está preparado para o passo seguinte.

fejuncor disse...

Um recente movimento do referido financista, que é o mais bem-sucedido dentre todos - aplicar US$ 26 bi NUMA FERROVIA -, acho que ajuda a ilustrar isto de certa forma.