terça-feira, dezembro 15, 2009

O festival da vida privada



Por Carolina Foglietti

Diante das novas formas de comunicação características do mundo contemporâneo, nossos antigos diários íntimos, repletos de textos privados, secretos e introspectivos, foram totalmente substituídos por diários públicos e virtuais. Em sua esmagadora maioria, os chamados “blogs” são verdadeiras "cartas abertas", que revelam detalhes íntimos da vida de muitas pessoas.

Qual é o sentido dessa exposição virtual à qual estamos todos mais ou menos "submetidos"? O que essas práticas atuais significam, de fato, para nós? Será que são apenas meios de facilitar a rápida transmissão de muitas informações? Ou será que estamos diante de um fenômeno que está para além desse discurso prático da vida cotidiana?

As respostas a estas questões são incalculáveis, já que cada um de nós vai encontrar motivadores específicos e singulares para justificar o uso dessas ferramentas. Nao obstante, acredito haver um denominador comum nesse escancarar compulsivo da vida privada: o desejo de transformar a própria intimidade em um grande espetáculo.

Digo isso porque é o que mais vejo ao acessar esses dispositivos (Orkut, Twitter, Facebook, My Space etc). Salvo algumas exceções, a maioria das pessoas parece estar sedenta em mostrar a todos o quanto são felizes, bonitas, queridas e importantes. Afinal de contas, acreditar que o mundo cibernético pára ao saber que a sua depilação à laser foi um sucesso, ou que o seu namorado te presenteou com um anel de brilhantes, não é qualquer coisa; até pouco tempo, isso era restrito ao seleto mundo das celebridades. Parece brincadeira, mas não é.

Gostaria de entender o que leva um homem, por mais apaixonado que se considere, a expor para uma multidão o quanto sua amada é maravilhosa e indispensável para sua sobrevivência. Pior ainda: o que leva um ser humano a “postar” compulsivamente todas as atividades de seu dia-a-dia, incluindo a hora que acordou, o que comeu no café da manhã, quanto tempo levou para chegar ao trabalho, o que o chefe achou da sua roupa nova, quantas vezes retocou a maquiagem, entre outras informações enfadonhas e inúteis, que não interessam a absolutamente ninguém? Ou será que interessam? Frente a essa enxurrada de informações que invadem nossas páginas virtuais, penso em uma velha e irrefutável lei econômica: a Lei da Oferta e da Demanda.

Se estas pessoas não param de encher nossas caixas postais com notícias que não nos dizem respeito, isso é porque de alguma forma estamos aceitando lê-las e, o que é pior, alguns de nós chegam mesmo a comentá-las ou, até mesmo, “curti-las”. Demandamos, portanto, a oferta de dados privados da vida alheia. Talvez, em busca de alguma reciprocidade, façamos isso na esperança de garantir algum holofote para nós mesmos.

Com isso, não estou negando o imenso valor dessas ferramentas que nos conectam, em tempo real, a milhões de pessoas ao redor do mundo, permitindo que tenhamos acesso a um número praticamente ilimitado de informações. Acho isso fantástico. O que considero desagradável e mesmo “doentio” é o uso que muitas pessoas estão fazendo de um recurso que poderia ser muito melhor aproveitado. Poucas pessoas sequer filtram ou absorvem de fato essa chuva de informações.

Segundo Freud, nos constituimos a partir de uma falta fundamental. É impossível, exceto para os psicóticos, obter a satisfação completa de nossas pulsões (“instintos”). Essa falta, em cuja origem se encontra o conceito psicanalítico de desamparo primordial, é o que nos impulsiona constantemente a desejar algo a mais: criando, produzindo e sublimando nossas pulsões, incessantemente. Entretanto, para que esse precioso movimento humano não seja paralisado, é preciso poder administrar a angústia que nos atravessa de forma indelével.

Sabemos que, desde sempre, o homem inventou e criou recursos para driblar a angústia inerente à sua condiçao existencial. Não é fácil lidar com nossas falhas, incompletudes, imperfeições e, principalmente, com a nossa morte. Nesse sentido, entendo que o uso narcísico dos novos meios de comunicação possa ser útil para aliviar um pouco esse mal estar que nos acomete.

Entretanto, me pergunto até que ponto é possível ser um sujeito do próprio desejo nesse espetáculo de auto-engrandecimento e exposição, que visa a vender uma imagem completa e ilusória de pessoas que não existem para si mesmas. A noção de identidade não é a única que se dissolve nesse mercado de aparências. Perdem consistência, também, as fronteiras que costumavam dividir a efera pública e o espaço privado, sendo que a conquista deste último foi um dos grandes avanços de nossa civilização. O espaço privado está perdendo espaço e, com isso, a singularidade e a individualidade também.

29 comentários:

fejuncor disse...

Há dois lados nessa questão.

A meu ver, um deles é o que, dentre outros programas fúteis, alimenta o BBB: a "sede de voyerismo" da grande massa, na sua maioria de baixo nível intelectual e cultural, que transpôs as antigas "futricas e fofocas de vizinhança" para a telinha da TV ou do PC, sendo que esse produto da "sociedade do espetáculo" como já definiu Guy Debord há 40 anos, acaba se apoiando na estética pessoal e nos falsos relacionamentos afetivos.

Mas existem usuários com posturas diferentes, uns usam rede sociais pra “fazer amigos” outros, manter os que já têm. Para mim internet é como TELEFONE: meio de comunicação. Não sei porque, sempre vi assim, desde novo - quando comecei no ICQ, mIRC (quem não lembra o "Avalanche", "Scoop", conectar após as 9:00 pagar meio pulso rsrs) depois MSN, Orkut agora Twitter etc - mas apesar destas ondinhas O USO que fiz e faço nunca mudou.

É NUTRIR CONTATO com as pessoas conhecidas, avisar eventos, trocar uma idéia nada mais que isso. Ou melhor quando muito isso!, pois acesso cada vez menos e acho que vou acabar como meu velho que estranha pacas esse troço de jogar conversa fora pelo computador. Venho preferido navegar por blogs, bem como quando é para interagir o fazer focando no argumento mesmo, papo-reto. Mas claro que até ai ocorre coleguismo virtual, desconhecidos que ocasionalmente acabas conhecendo no meio, mas obviamente é coisa NESSE NÍVEL.

Enfim, vejo a Net muito boa pra gerir amizades já existentes, garantindo sua continuidade mesmo a grandes distâncias, mas ruim para criar do zero relações de qualidade. Imputo-a mais útil noutros sentidos, como, digamos, unir estudantes com interesses comuns.

Agora, bastante oportuna a observação da autora. Usar a web pra fazer uma infinidade de amigos (quase sempre não muy amigos) é uma especialidade brasileira. Será carência?

Hoje empolguei heim....

p.s.Quem é a convidada?

Rodrigo Constantino disse...

De pleno acordo, fejuncor!

A convidada é minha mulher, estudante de psicologia (com queda pela psicanálise lacaniana). Eu coloquei o mesmo ponto: não adianta atacar o instrumento, uma vez que o problema está no público (massas). Antes, lá atrás, já tinha o Coliseu para oferecer "pão e circo", e as fofocas sempre foram parte do cotidiano. Mudou o meio.

Mas o principal ponto dela, eu acho, é essa compulsão atual por tornar pública sua vida privada, nos mínimos detalhes. A perda voluntária de privacidade é um fenômeno espantoso. Pessoas comentando cada passo do seu dia. Who cares?!

Eu, como vc, uso tais instrumentos para espalhar idéias, trocar informações úteis, encontrar amigos. E só. Tem gente que perde a noção! Talvez seja muita carência, como vc colocou...

Rodrigo

Sergio Oliveira Jr. disse...

Excelente texto. Parabéns para a convidada. Economista com psicóloga deve dar um bom par. :-)

Como diria minha bisavó: Cão que ladra não morde.

Até hoje não consegui usar o tal do Twitter.

Malkav disse...

Eu tenho uma visão behaviorista para esse mesmo assunto (lembrando que sou estudante de sociologia, logo, posso comenter equivocos quanto a minha abordagem: O que acontece é que, a grosso modo, é reforçadora devido a sinais de aprovação (elogios, comentários, discussões enfim) o comportamento de "postar em blogs, se exibir, discutir em comunidades" etc etc. Mesmo o contra-controle produz um reforço no qual aquele sujeito na tela responde, lhe dá atenção de alguma forma. A vantagem da web 2.0 é a possibilidade dessa interação e de resposta, fazendo que ambos ("exibidor e comentador") acabem se "reforçando" a tomarem os mesmos comportamentos.

Isso, somado a uma cultura brasileira que por mais individualizante que esteja em relação ao passado, ainda é bastante ligada ao outro. O anfitrião deve sempre receber bem os convidados de sua casa, os outros sempre devem pensar muito bem de você (mesmo numa sociedade pós-moderna como a nossa, que hipocritamente diz que você não deve pensar "mal" da outra pessoa) e você é "careta" ou "nerd", no mínimo, se não tomar atitudes que se torne comportamentos socializantes (ir pra balada, ir pra igreja, sair, conversar) com frequência, faz acredito eu as pessoas tomar essa atitude com o orkut. Lembrando, os brasileiros. Os americanos eu iria comentar da cultura do loser, dos nipônicos como resposta ao isolamento sentido no mundo deles, dos cubanos como meio de expressão etc etc.

No mais, eu concordo com você, mas de outra forma.

ntsr disse...

Ela tem blog?

ntsr disse...

Agora sinceramente, eu n concordo.
'nossos antigos diários íntimos, repletos de textos privados, secretos e introspectivos, foram ##totalmente## substituídos por diários públicos e virtuais'
Só cria um blog quem quer, e mesmo quem cria pode muito bem usar só pra falar de assuntos que nao tem nada a ver com a vida particular

E quanto à psicanálise...é uma pseudo ciência, vcs sabem disso, n sabem?

Rodrigo Constantino disse...

Valeu Sérgio.

Malkav, ela chegou a mencionar Skinner e esse reforço, mas cortou, pois detesta Skinner (eu mais ainda). Mas, de fato, há um estímulo do público, sem dúvida. Eis o que foi citado.

ntsr, ela não tem blog. E não é que psicanálise seja uma pseudo-ciência, apenas não é uma ciência exata. Vejo dessa forma. Tem insights muito interessantes sobre natureza e comportamento humano.

ntsr disse...

Mas nao é pq o insight é interessante que vá ser verdadeiro!
Por ex o Freud chega e fala, que mulher grávida vomita por causa do desejo incosciente de abortar o feto.Podia até fazer muito sentido na época, quando ninguém sabia dos hormônios e tal, então o negócio não é se parece fazer sentido ou nao, mas sim as evidências.
Principalmente nas humanas, muita coisa que se diz ciência nao mostra evidência de nada.

Felipe André disse...

Eu comparo blogs mais com jornais e colunas do que com diários pessoais, ao menos os que frequento falam de idéias e notícias, e não da vida pessoal.

Quanto aos Orkuts e Twitters da vida, muita gente sente o ego inflar mostrando aos outros o que tem e o que faz, e muita gente tem curiosidade em saber o que os outros têm ou fazem. Uso o twitter, mas não comento sobre minha vida pessoal nele, apenas deixo links com artigos interessantes (às vezes deste blog) ou opiniões próprias sobre algo. Orkut não tenho, mas minha namorada usa pra mandar recados para as amigas e desejar feliz aniversário (depois do orkut ninguém mais esquece o aniversário dos outros, hehe...)

Sobre amizades de internet, eu tenho como um dos recursos mais úteis dela, pois você tem o mundo todo para achar pessoas com os mesmos gostos e idéias que você tem, coisa muitas vezes difícil de fazer na sua região.

Eu, por exemplo, não conheço pessoalmente ninguém que se interesse por Ayn Rand, ou por economia Austríaca. Já na internet você acha isso com certa facilidade. E isso também se aplica para música, jogos, ou seja lá o que lhe interesse.

Malkav disse...

Espera lá...

Psicanalise não é ciência, sendo similar ao "socialismo cientifico" nesse ponto. Mas isso não inválida de forma nenhuma argumentos, por uma razão pragmatica: É útil, é razoavelmente eficiente e permite, como toda ciência, prever e explicar alguns comportamentos. Comparada com outras abordagens em psicologia, não tem de longe a força e a confiabilidade cientifica que uma vez foi no behaviorismo e agora é o cognitivismo, mas ainda sim a grande maioria dos psicologos ainda são psicanalistas.

(Eu tenho um certo preconceito contra psicanalista, por mais que eu os defenda nesse post, contudo acho válido no argumento apresentado pelo Constantino).

Lembrando que ser válido não implica que será verdadeiro, ou indutivamente falando, mais provável que as outras abordagens.

ntsr disse...

'Mas isso não inválida de forma nenhuma argumentos, por uma razão pragmatica: É útil, é razoavelmente eficiente...'

Pro psicanalista com certeza, muito útil.Agora pro paciente, como ele sabe que aquilo é melhor que um placebo?

Malkav disse...

Primeiro, não se pode falar de placebo em algo não farmacológico. Psicologia, seja qual for, não é algo farmacologicamente induzido.

Mas se ele não for convencido que a psicanalise está ajudando ele e não aceitar, ela simplesmente não funciona. É o contrário do Behaviorismo ou terapia Gestalt que tem a pretensão de modificar os comportamentos mesmo com o sujeito acreditando que não vá funcionar mas cooperar com as atividades propostas, provavelmente vá funcionar.

Caso contrário, a psicanalise é eficaz. Pode não ser verdadeira sua teoria, mas ela funciona para pacientes suficientes para ser provavel cientificamente - deve ser razão do aprofundamento disso ao longo de tantos anos.

PS: Lembrando que eu odeio psicanalise, mas dessa vez eu não achei equivocado usar isso nesse argumento

Felipe Santos disse...

Opa, opa... interessante o ponto levantado sobre a validade da psicanalise x método científico... mas não vamos entrar numa guerra nesse segmento tal qual o faz a Cientologia, hein!!! X-D

Da minha parte, o que ela (psicologia) faz é mais ou menos como um apanhado "estatístico" de comportamentos comuns e, à partir deles, define um diagnóstico, porém partindo de premissas nem sempre confirmadas (pelo método científico), como bem exemplificou o ntsr, já que não podemos levantar TODAS as variáveis que levaram àquele resultado e, muito menos, como a mente de cada um lida com essas mesmas variáveis, mesmo que estivéssemos de posse da totalidade delas... porém, não creio que seja algo, como muitos alegam, parecido com uma RELIGIÃO, que mesmo quando segue uma lógica válida, parte de premissas FALSAS!!! Creio eu haver uma maior responsabilidade nessa parte QUANDO o profissional procura embasar-se em conhecimentos cada dia mais precisos vindos, principalmente, das Neurociências... mas quem nunca ouviu falar de "psicólogos kardecistas", por exemplo... o_O

Contudo, vejo até na Astrologia um certo quê de psicologia no que refere-se à esses "comportamentos comuns"... não que eu concorde com aquela divisão de características distribuídas pelos signos, mas sim que, se você reparar bem, TODOS temos os mesmos "traços" dentro das nossas personalidades, apenas cada um "tende a" ser mais parecido com um signo do que com outro... mas o interessante disso é como o homem procura ordem dentro de todo caos que nos envolve, os "pontos comuns" dentre as mais variadas nuances de personalidades que nos cercam!!! :-)

Enfim, tudo isso com relação ao texto só me diz que... não sei o que concluir!!! :-P

Só observo que, no caso do orkut, somos mais parecidos com os INDIANOS (uma cultura totalmente diferente) que com AMERICANOS ou mesmo EUROPEUS... e digo isso pelo M.O. (Modus Operandi) dos dois povos dentro desse ambiente...

Partindo de um uso útil da ferramenta, eu criei duas contas no orkut... uma pros amigos REAIS e outra pra "caçar" pessoas no exterior, conhecer o máximo possível o povo de cada país sem sair de casa (a vontade de viajar é grande, mas o dinheiro é curto)... levantei o número de países (193 reconhecidos atualmente, com a independência de Monte Negro) e procurei comunidades de cada um deles... e a grande maioria dos que me adicionam são indianos e/ou brasileiros no exterior... o_O

Ainda não tentei no Facebook, mas acredito que não haverá muita diferença... :-(

ntsr disse...

'Primeiro, não se pode falar de placebo em algo não farmacológico. Psicologia, seja qual for, não é algo farmacologicamente induzido.
'

Claro que pode, o efeito placebo não é só em pilulas, está em tudo
'The placebo effect can be produced by inert tablets, by sham surgery, and by ####false information###, such as when electrical stimulation is turned “off” in those with Parkinson’s disease implanted brain electrodes[1]

http://en.wikipedia.org/wiki/Placebo

Carolina Foglietti disse...

Gostaria de agradecer não só aos elogios como também às críticas referentes ao texto. É muito bom poder escutar diferentes pontos de vista e refletir acerca dos mesmos. O que me chamou mais a atenção, no entanto, foi o fato do debate ter se deslocado do tema tratado no artigo para uma discussão sobre psicanálise e ciência. Sendo assim, gostaria de colocar alguns pontos importantes, para que a psicanálise não seja tão mal interpretada! Acredito não ser mais necessário chamar a psicanálise de "pseudo-ciência", uma vez que há mais de 80 anos ela deixou de ter essa pretensão. Até os anos 20, Freud acreditava que os "corretivos" científicos, seriam capazes de modificar os comportamentos "não adaptativos", ajustando, assim, os homens ao processo de modernização. Naquela época, Freud estava impregnado pelos ideais cientificistas do Iluminismo e ainda acreditava que a ciência poderia curar completamente o sofrimento e o mal estar humanos, permitindo que se alcançasse a tão almejada harmonia entre o homem e a civilização. Com a evolução da teoria psicanalítica, sempre calacada em observações clínicas, e com a consequente formulação do conceito de pulsão de morte, Freud abandonou as tentativas de fundamentar a psicanálise no discurso científico. A Psicanálise, assim como as demais ciências humanas, não pode e nem quer ser tratada como uma ciência exata. Não existe saber exato sobre a subjetividade humana! Acho que é exatamente aí que entra a verdadeira beleza da Psicanálise, pois sobre o impossível a ser dito, presente em cada um de nós, ela aposta na criatividade individual e singular de cada sujeito. Há uma enorme diferença entre a Psicanálise Selvagem, praticada por muitos supostos "analistas", e a Teoria Psicanalítica criada por Freud, cuja premissa básica é a de que todo o saber humano é furado, incompleto.Por isso mesmo, a Psicanálise não admite generalizações ou afirmações arbitrárias como a de que, por exemplo, haveria um desejo inconsciente de abortar em todas as mulheres que vomitam durante a gravidez! Cada caso é um caso único e singular. Apesar de possuir conceitos fundamentais, a teoria psicanalítica foi construída a partir da prática, estando sempre pronta a ser revista e reconstruída. Por isso mesmo, Freud acreditava e defendia que a Psicanálise deveria ser reconfirmada em cada caso novo, ou seja, o inconsciente deveria ser posto à prova na própria experiência clínica. A Psicanálise, portanto, não se coloca como um saber absoluto e nem como uma nova teoria adaptativa do homem à sociedade, já que o conflito não é entendido como erro ou doença, mas intrínseco à natureza humana. A aposta da Psicanálise está na singularidade, no desejo inconsciente que está por trás de uma alienação excessiva ao Outro (pais, educadores, cultura, Estado,etc). A responsabilização pelo próprio desejo confere ao sujeito a possibilidade de ser sob o signo de sua liberdade e, felizmente, não há placebo que dê conta dessa mudança de posição. O Outro deixa de ter tanta consistência. Afinal ele é fruto de fantasias infantis baseadas na crença de que há uma exterioridade capaz de garantir o bem estar e a felicidade.
Abraços,
Carolina

ntsr disse...

Carolina
Quando eu falo em científico me refiro a algo muito muito simples, vc tem uma idéia de como imagina que algo seja, vc TESTA aquela idéia, e baseado nas evidências, nos resultados, é que vc conclui se aquela idéia tem alguma coisa a ver com o mundo real ou se foi só uma viagem da sua imaginação
Foi só DEPOIS dos avanços que essa ciência trouxe pras pessoas é que aparece um povo resolvendo se rotular cientista SEM seguir o método cientifico,falando tudo o que acha lindo e sem mostrar evidencias de nada, só pra pegar carona na fama da ciencia e se aproveitar dos resultados dos outros.
É a mesma coisa do homeopata que se rotula de MÉDICO homeopata, ou do partido do vice do lula se rotulando de partido LIBERAL
Agora deixando claro essa diferença, a psicanálise como vc mesma disse nao tem a pretensao de ser ciencia 'exata' como os homeopatas a chamariam, ou seja, ela chega e vem com seus ids, egos, desejos incoscientes, e hora nenhuma mostra NADA que confirme que isso tudo existe, com a desculpa, aparentemente, de que os desejos inconsciente e reprimidos sao diferentes pra cada um.
Mas ora, se vc mesma concorda que nao tem como testar, O que garante que seja assim mesmo?Nada!Quem garante que nao era o Young que estava certo, com a hitoria do inconsciente coletivo dele?Nada, tb!
Ou seja, a psicanálise já COMEÇA com um monte de pressuposicoes sobre o inconsciente, desejos etc sem nunca ter provado nada daquilo antes, é só uma questao de acreditar sem provas, ou seja de fé.É a mesma lógica que faz alguém acreditar em deuses

Citando o dicionário cético:
'O conceito mais fundamental da psicanálise é a idéia de que a mente inconsciente é um reservatório de lembranças reprimidas de eventos traumáticos, que continuamente influenciam o pensamento consciente e o comportamento. Não há provas científicas dessa repressão inconsciente '

http://brazil.skepdic.com/psicanalise.html

E sobre as pseudo ciencias:
http://www.youtube.com/watch?v=_EZcpTTjjXY

obs, pra terminar deixo só essa pergunta, o que me garante que o Young estava errado sobre o inconsciente coletivo dele?
Abraços

ntsr disse...

obs 2: mudei de idéia, pra terminar deixo a frase :
'Afirmaçoes extraordinárias requerem evidências extraordinárias'
Carl Sagan

ntsr disse...

O dragão na minha garagem - Carl Sagan.

- Um dragão que cospe fogo pelas ventas vive na minha garagem.

Suponhamos que eu lhe faça seriamente essa afirmação. Com certeza você iria querer verificá-la, ver por si mesmo. São inumeráveis as histórias de dragões no decorrer dos séculos, mas não há evidências reais. Que oportunidade!

- Mostre-me – você diz. Eu o levo até a minha garagem. Você olha para dentro e vê uma escada de mão, latas de tinta vazias, um velho triciclo, mas nada de dragão.

- Onde está o dragão? – você pergunta
- Oh, está ali – respondo, acenando vagamente. – Esqueci de lhe dizer que é um dragão invisível.
Você propõe espalhar farinha no chão da garagem para tornar visíveis as pegadas do dragão
- Boa idéia – digo eu –, mas esse dragão flutua no ar.

Então, você quer usar um sensor infravermelho para detectar o fogo invisível.
- Boa idéia, mas o fogo invisível é também desprovido de calor.

Você quer borrifar o dragão com tinta para torná-lo visível.
- Boa idéia, só que é um dragão incorpóreo e a tinta não vai aderir.

E assim por diante. Eu me oponho a todo teste físico que você propõe com uma explicação especial de por que não vai funcionar.

Qual a diferença entre um dragão invisível, incorpóreo, flutuante, que cospe fogo atérmico, e um dragão inexistente? Se não há como refutar a minha afirmação, se nenhum experimento concebível vale contra ela, o que significa dizer que o meu dragão existe?

A sua incapacidade de invalidar a minha hipótese não é absolutamente a mesma coisa que provar a veracidade dela. #### Alegações que não podem ser testadas,#### afirmações imunes a refutações não possuem caráter verídico, seja qual for o valor que possam ter por nos inspirar ou estimular nosso sentimento de admiração. O que eu estou pedindo a você é tão somente que, em face da ausência de evidências, acredite na minha palavra.

Extraído do livro de Carl Sagan : "O Mundo Assombrado por Demônios - a ciência vista como uma vela no escuro" - Companhia das Letras

Everardo disse...

É possível, Carolina, que a busca de sí mesmo, através de projeções, seja explicada pela Karen Horney, que realça o crescente alheamento de nós mesmos ("A Personalidade Neurótica do Nosso Tempo"). Apesar da exposição, é bom verificar que nessas ferramentas há sempre algo de "seguro" (inclusive o anonimato) e a distância física. O vazio de sí memso é, de certa forma, reconfortado na visão de sí mesmo, que esses meios propiciam.
Quanto à pretensão da psicanálise, lembro que Freud era fisiologista, afinado com o método científico. Só depois, foi abandonando a pretensão de obter "credibilidade científica" (no que agiu muito bem). Os behavioristas, esses, não, insistiram no modelo da máquina de Newton apicada ao homem. Skinner copiou Pavlov, que não queria, sequer, ouvir falar em algo que não obedecesse a cartilha científica moderna. Acho que não deveriam ser classificados de psicólogos. Freud, sim.

ntsr disse...

Everardo no time do pessoal com dragão invisível.Pq isso não me surpreende?

Anônimo disse...

Eu vejo a internet como um lazer, uma forma de entretenimento e fonte de informação.
É como muitos aqui disseram, não adianta culpar a ferramenta, mas sim quem a utiliza.
Se querem publicar porcarias ou detalhes da sua vida privada, muito bem, todos têm o direito de fazê-lo. Se alguém quiser ler essas coisas, também tem o mesmo direito.

Malkav disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Malkav disse...

Tentei escrever uma vez um textão e deu pau aqui e não foi, vamos nós de novo ... =P

NTRS, leia o próprio texto que me enviou: O efeito placebo é, necessariamente, farmacologicamente induzido onde a farmacia não se resume a pilulas ou quaisquer outros tipos de remedio, e sim a qualquer interferência fisico-química que altere o funcionamento normal de um organismo (pela mesma razão é possivel realizar um efeito placebo pela hipnose). O que pode se induzido por formas senão pela forma farmacologica é que a antropologia chama de efeito Nocebo, que é o efeito Placebo aplicado de maneira contrária devido a choque culturais: Indios que não acreditam no tratamento médico oferecido a eles, por exemplo, e começam a sabotar-los ou então acreditar que aquilo vá fazer mal até que o próprio corpo elimine as substâncias manipuladas neles.

Fora que você está usando uma visão Popperiana do método cientifico que, honestamente, não é útil para nós. Não quero aprofundar isso novamente (eu aprofundei no outro texto que não chegou aqui, mas não estou afim de escrever de novo), contudo tudo que não for "Hard Science" não é ciência para Karl Popper. Você estava correto ao acusar o recurso retórico de usar a ciência que alguns psicanalistas utilizaram no passado, porém não pode partir do pressuposto que todo conhecimento que não for verdadeiro segundo o método Popperiano não serve: Sociologia do Conhecimento/Ciência deixa claro que um conhecimento não necessariamente precisa ser verdadeiro para ser válido, ele pode ser somente util e/ou eficaz.

Um rapaz acima comentou que a psicologia usa estatísticas para se provar, sem querer ele definiu como funciona as comprovações do Cognitivismo que junto com o Behaviorismo (minha abordagem atual) fazem parte da ala mais cientifica da ciência. Eu, pessoalmente, julgo a psicanalise mentalista e, portanto, não explicativa de alguns fenomenos que percebo que as outras duas trabalha melhor e pelo que reparo, com mais eficiência.

Enfim, é isso =P

ntsr disse...

Resumindo, é válida pq tem alguns resultados, mesmo que nao exista nada desse negocio de desejos incoscientes controlando o livre arbitrio do cara, e mesmo que vc nao tenha como saber se esses resultados vem do efeito placebo.
Sobre o efeito placebo, nao vi novidade nenhuma.O que gera ele é a CRENÇA de que X vai resolver o problema , daí substitua X por pilulas de açucar, água, a afirmação de que nao está mais levando choques no cérebro, etc
Em outras palavras, pra muita gente, ACREDITAR que tomar um remédio homeopático vai fazer ele melhorar é o que vai fazer ele melhorar, e não o remédio em si
No caso, é irrelevante se o cara que passa o remédio é um farmaceutico, ou médico ou sei lá o que, contanto que o paciente ACREDITE no remédio
O feito nocebo é o mesmo princípio, o cara ACREDITA que aquilo vai fazer mal, e faz.
Não tem necessariamente que ter alguma ligação alguma com choques culturais.
Eu nao digo que psicanalise nao tenha validade nenhuma, do mesmo jeito que nao digo que conversar com um amigo sobre futebol nao vai servir pra descontrair.O que eu quero saber é baseado em que os psicanalistas afirmam que os resultados da psicanalise não são criados pela CRENÇA do paciente e só
(já que parece que em ids, egos etc nem eles mesmos acreditam)

ntsr disse...

E eu li sim, o texto que eu colei.
A placebo has been defined as "a substance or procedure ... that is objectively without specific activity for the condition being treated". Under this definition, a wide variety of things can be placebos and exhibit a placebo effect. (...)
Medical devices such as ultrasound can act as placebos.[8][9] Sham surgery,[10][11][12] sham electrodes implanted in the brain,[1] and sham acupuncture, either with sham needles or on fake acupuncture points, have all exhibited placebo effects.[13] Bedding not treated to reduce allergies has been used as a placebo to control for treated bedding.[14] The physician has even been called a placebo;[15]pp. 33–34 a study found that patient recovery can be increased by words that suggest the patient “would be better in a few days rather than negative words such as “"I am not sure that the treatment I am going to give you will have an effect"

http://en.wikipedia.org/wiki/Placebo

ntsr disse...

Só mais uma coisa
Não é ciência, não quer curar ninguém, joguinho de adivinhação sem certo ou errado,mas como é que "funciona" então?

resposta:
http://www.youtube.com/watch?v=btP_vy5cQq4

Malkav disse...

NTSR, a psicanalise é valida pelo fato dela resolver o problema, ela não é verdadeira por não se adequar ao posicionamento cientifico atual. Fora que sua afirmação só concorda comigo que o efeito placebo é farmacologicamente induzido - e o choque eletríco também entra nesse mérito. O efeito NOCEBO precisa ser produzido por um choque cultural, você não vai simplesmente desacreditar que aquilo funciona porque quer. Lembrando que cultura pode ser também a subcultura new age, por exemplo, o que forma um choque cultural.

Não é necessário, é um pre-requisito.

O efeito placebo, também para funcionar, é necessário que ocorra uma alteração no corpo para disparar. Tem gente que se cura pela "fé", mas essas pessoas provavelmente alteraram seu estado orgânico para ocorrer o efeito placebo, seja entraram em meditação usando disso, ou consumiram alguma substancia, ou passaram jejuns prolongados etc etc Não basta ACREDITAR, você tem que sofrer alguma alteração no corpo para acreditar - mesmo que mínima.

Senão, não haveria necessidade de haver a farmacia, já que bastaria eu fazer um ritual e você ACREDITAR que aquilo funciona para dá certo. Não haveria porque fazer testes contra-placebos anter de aplicar um remedio para a população. A descrença nessa atividade se dá quando você não pertence a cultura ocidental mainstream ou é uma subcultura dela, ocasionado o choque culturais.

Unknown disse...

"Quanto à pretensão da psicanálise, lembro que Freud era fisiologista, afinado com o método científico. Só depois, foi abandonando a pretensão de obter "credibilidade científica" (no que agiu muito bem).”
Pois...?
“Os behavioristas, esses, não, insistiram no modelo da máquina de Newton apicada ao homem. Skinner copiou Pavlov, que não queria, sequer, ouvir falar em algo que não obedecesse a cartilha científica moderna. Acho que não deveriam ser classificados de psicólogos. Freud, sim."
Parabéns. Você errou em TUDO que falou sobre o assunto! Adoro esses noobs que inventam de falar de assunto que não entendem! =D
Primeiro, você errou ao generalizar o uso de modelo “homem-máquina” ao dizer que TODOS os behavioristas o seguem. Aliás, os behavioristas radicais, skinnerianos, se apropriaram do modelo de causa do físico Ernst Mach, o modelo de relações funcionais e de multideterminação. O modelo é análogo ao modelo de seleção natural. Do mesmo modo que o ambiente “seleciona” genes, a interação pessoa-ambiente seleciona comportamentos.
Segundo, Skinner não copiou Pavlov, se for mentir, pelo menos baseie suas mentiras em algo que não seja sua cabeça. Pavlov influenciou sim, Skinner, assim como seus estudos foram úteis para qualquer biólogo e fisiologista, que, por tabela, é importante para a maioria dos psicólogos atuais. Além do quê, os estudos de Pavlov representavam apenas uma pequena parcela do comportamento humano, que corresponderia ao nível filogenético, selecionado durante a história evolutiva.
Terceiro, Pavlov era FISIÓLOGO, não psicólogo. Skinner era formado em Letras e fez pós em Psicologia, então ele é psicólogo e foi considerado em uma pesquisa do século XX, como sendo o mais importante psicólogo da época, e como 7°, se não me engano, mais importante de todos os tempos. Freud NÃO era psicólogo, embora influenciou grandemente a Psicologia.

Carolina Foglietti disse...

Isso é verdade! Freud não era psicólogo. Se formou em medicina e se especializou em neurologia. Passou a se interessar pelos sintomas histéricos após um breve estágio na Salpetrière sob a influência de Charcot...
Obs. Acredito que as neurociências estão confirmando, gradualmente, várias hipóteses da Psicanálise.Um exemplo disso, que me marcou bastante, foi a recente descoberta dos "neurônios espelho"...