segunda-feira, agosto 09, 2010

A Filantropia dos Ricos



Rodrigo Constantino, para a Revista Voto

Os bilionários Bill Gates e Warren Buffett entraram numa campanha para que outros ricaços doassem no mínimo metade de suas fortunas a instituições de caridade. Pelo menos quarenta bilionários já aderiram à campanha. A atitude levanta algumas reflexões interessantes, e expõe também as diferenças culturais entre Estados Unidos e Brasil. O senso de caridade parece mais enraizado lá, sem dúvida. Mas, a despeito da maioria considerar tal ato louvável, faz-se necessário evitar algumas conclusões precipitadas.

São vários os motivadores que podem levar alguém a doar boa parte de seu patrimônio. O altruísmo pode sim ser um fator, quando o rico acredita que tem como ajudar mais ainda a sociedade por meio da filantropia. A vaidade exerce seu papel, pois a caridade não deixa de ser uma forma de se “imortalizar”. A preocupação com a educação dos filhos pode ter alguma influência, pois não deve ser fácil passar valores e princípios sólidos quando o jovem sabe ser herdeiro de bilhões. E, por fim, o fator tributário também tem sua parcela nas motivações, pois ninguém gosta de morrer e deixar boa parte da fortuna que construiu para os burocratas do governo, cuja ineficiência nos gastos é praticamente certa – para não falar dos enormes riscos de corrupção.

O grande problema que vejo em tais atos de generosidade é quando os próprios doadores justificam seus gestos com argumentos falaciosos. Infelizmente, é esse o caso de muitos deles. David Rockfeller, por exemplo, disse que os ricos têm uma responsabilidade com a sociedade, e devem retribuir aquilo que ela lhes deu. Há uma desinformação perigosa nessa argumentação.

A sociedade não deu nada por caridade aos empreendedores ricos. Ao contrário, eles ficaram ricos justamente por atender a várias demandas da sociedade, dos consumidores. E fizeram isso gerando riqueza, empregos e bem-estar social. A fortuna dos ricos, quando obtida por mérito no livre mercado, já representa uma retribuição da própria sociedade. Ter carros melhores, computadores rápidos, navegadores de internet, remédios e uma infinidade de outros bens e serviços é o que permitiu que os ricos empresários ficassem ricos. Nada mais justo!

Ao falar da necessidade de “devolver” para a sociedade aquilo que ela os deu, esses filantropos ajudam a disseminar a mentalidade marxista de que o lucro não é legítimo, mas fruto de uma exploração. É uma espécie de sentimento de culpa da elite financeira por ser rica. Mas, se esta riqueza for resultado de esforço e mérito próprio, por meio de trocas voluntárias com os consumidores, então não há razão para tal sentimento de culpa. Muito pelo contrário: todo rico honesto deveria sentir orgulho de sua riqueza. Foi na fase de construção dela que ele mais beneficiou a sociedade.

Além disso, deve-se ter em mente o alerta que o economista francês Bastiat, do século XIX, fez, ao falar daquilo que se vê e daquilo que não se vê. A filantropia é celebrada pois o impacto dos gastos com caridade são visíveis de imediato. Mas não devemos ignorar o que não se vê no curto prazo. O que a poupança investida no setor produtivo pode oferecer para a sociedade é muito mais do que a caridade momentânea. Bastiat usa a comparação entre dois irmãos, Mondor e Aristo, para explicar melhor seu ponto. Após repartirem a herança do pai, cada um deles parte para um estilo de vida totalmente distinto. Um pratica a filantropia, e outro resolve poupar e investir o dinheiro.

Os felizes fornecedores dos luxos de Mondor, o filantropo, representam aquilo que se vê. Não é tão fácil de se perceber, do ponto de vista do interesse dos trabalhadores, o que se tornam os rendimentos de Aristo, o poupador. Mas todos esses rendimentos, até o último centavo, servem para dar emprego aos operários tanto quanto certamente os rendimentos de Mondor. Mas há uma diferença importante: “Os gastos loucos de Mondor estão condenados a diminuir sempre e a chegar a um fim necessário. A sábia despesa de Aristo vai engordando de ano para ano”. A poupança de Aristo pode ser canalizada para investimentos produtivos. Os gastos de Aristo, feitos em parte por terceiros à distância, representam aquilo que não se vê.

Ao final de dez anos, é provável que os gastos com filantropia de Mondor estejam se esgotando. Bastiat conclui: “Ao final dos mesmos dez anos, Aristo continua não somente a pôr o seu dinheiro em circulação, mas continua aumentando seus rendimentos de ano para ano. Ele contribui para fazer crescer o capital nacional, ou seja, o fundo que alimenta os salários. E, como a demanda de trabalho depende da extensão desse fundo, ele concorre para o aumento progressivo da remuneração da classe operária. Se ele vier a morrer, deixa os filhos preparados para substituí-lo nessa obra de progresso e de civilização. Do ponto de vista moral, a superioridade da poupança sobre o luxo é incontestável. É consolador poder-se pensar que o mesmo se dá do ponto de vista econômico, para quem quer que, não se fixando nos efeitos imediatos das coisas, saiba levar suas investigações até os seus últimos efeitos”.

O presidente Lula já chegou a afirmar que dar dinheiro aos pobres, mesmo que para a compra de cachaça, era melhor para a economia do que deixar o dinheiro com o rico, aplicado no banco. Segundo Lula, isso faria a roda da economia girar, estimulando o comércio e a criação de empregos. O presidente cometeu esta falácia apontada por Bastiat, ao enxergar os efeitos econômicos com uma visão míope. A caridade tem efeito imediato, mas está fadada a se esgotar. Quando é “caridade” estatal é pior ainda, pois o governo antes precisa tirar recursos dos outros, justamente recursos que poderiam ser investidos de forma mais produtiva. Muito melhor para a sociedade, especialmente para os mais pobres, seria deixar os ricos investirem suas poupanças. Desta forma o progresso pode acelerar, beneficiando a todos.

Em suma, cada um faz com seu patrimônio aquilo que lhe apraz, e já é um absurdo o estado taxar a herança, um direito legítimo não apenas do herdeiro, mas principalmente do proprietário da fortuna, que deve ser livre para dar o destino que quiser a ela. Se esta escolha for pela filantropia, então ótimo. Mas acredito que a escolha de investir ainda mais nos negócios, nas empresas, no empreendedorismo, merece mais aplausos. O resultado costuma ser bem melhor do que a filantropia.

9 comentários:

Rafael Gargalhão disse...

Rodrigo, você foi simplesmente SUBLIME nesse artigo. É isso mesmo! Não há altruísmo do mundo que compense os benefícios da ganância capitalista! Esses bilionários são, no fundo, marxistas enrustidos e com senso de culpa.

Compreendo a estupidez de um estudante secundário brasileiro, ao execrar o livre-mercado. Não compreendo a estupidez de quem, com seu próprio esforço, paga milhares de salários por mês, promove a inovação e o desenvolvimento econômico, gera emprego e renda.

É TÃO DIFÍCIL ASSIM ENTENDER A MÃO INVISÍVEL DO MERCADO??? É TÃO DIFÍCIL ASSIM ENTENDER QUE O EGOÍSMO INDIVIDUAL PROMOVE O BEM-ESTAR COLETIVO???

Estou lendo seu blog num computador de última geração. Mais tarde, estudarei no meu Kindle. O serviço do blog, o computador e o Kindle foram criados por quem? Pelo Viva Rio? Pelo governo federal? Ou pelos capitalistas "sanguinários" da Era da Informação?

Bando de bilionários bobos...

Fernando Cinelli disse...

Ótimo texto Rodrigo. Porém, seria prudente não afirmar com veemência o que os outros intentam em expressar por suas palavras. No caso, David Rockfeller, ninguém sabe ao certo o que ele quer dizer com retribuição a sociedade.
Feita a ressalva, excelente ponto ao citar o exemplo de Bastiat, e realmente seria muito melhor se esses bilionários resolvessem empregar suas poupanças, principalmente, no setor produtivo. Não podemos nos esquecer da contribuição das escolas e universidades na geração de riqueza.

Carapicuiba disse...

Nos EUA existe uma série de incentivos específicos como desconto para doações realizadas à escolas onde o contribuinte pode abater até 50% dos impostos, assim, é notório que universidades e centros de pesquisa norte-americanos recebam bilhões de dólares todos os anos de grandes empresários do país, tornando-as referências, reconhecidamente as melhores atraindo pesquisadores de todo mundo.

Anônimo disse...

Discordo; existe, na minha opinião, uma caridade legítima: a que ensina a pescar e não simplesmente dá o peixe pronto.

Dar o peixe pronto para quem está a beira da morte, de fome, aí é da consciência de cada um.

Dar pinga, ou bolsa-família é legalizar compra de voto.

Em todo caso, eu não me arriscaria a chamar de bobos os que reuniram bilhões em uma única existência.

Anônimo disse...

Se é ilegítimo taxar heranças, qual é a legitimidade de taxar o consumo, ou a renda? afinal de contas, todas as taxas que pagamos sai do nosso patrimônio...

Poderia explicar pq taxar a renda pode mas a herança não?

Rodrigo Constantino disse...

Para começo de conversa, seria dupla taxação; como vc mesmo diz, a renda já foi taxada. Taxar a herança seria taxar novamente a renda acumulada.

Mas pense assim: vc acha que o governo deveria taxar um presente? Vc compra um presente (e já paga imposto), depois vc dá o presente e o governo tasca uma parte? Pois herança é apenas isso: um presente! O sujeito pode dar em vida, ou deixar depois que morrer.

Anônimo disse...

O Sr. Warren Buffett já declarou, em vários momentos, ser favorável ao imposto sobre heranças, por ser este o mais justo dos impostos. Os herdeiros, segundo Buffett, não tem nenhum mérito próprio para herdar uma fortuna. Esse foi um dos motivos para ele doar a maior parte da sua fortuna.

samuel disse...

Faço meu o comentário do Rafael Gargalhão: "Bando de bilionários bobos..."
Querem competir com os socialistas e Lulas da Vida. Como bem explicou o prof Constantino, ao invés de financiarem a permanência do Liberalismo econômico que os enriqueceram e dar assim oportunidade aos capitalistas prospectivos das novas gerações, estão EGOISTICAMENTE enterrando suas fortunas em bondades que os glorificam...
Os socialistas por meio de sua "INTERNACIONAL SOCIALISTA" financiam eleição de governos que passam a extorquir os que produzem para que os governos, NÃO ELES COM SUAS FORTUNAS, passem a fazer caridade... mas com o dinheiro dos outros... Isso é que ter idéias claras de como ganhar o jogo.
Os partidos “libertários” estão ahi morrendo a míngua por falta de recursos. É de chorar...

Vieira disse...

E lá vem o PT querendo criar impostos para os milionários brasileiros.

Lamentável. Mais dinheiro pra pinga!